Bleeding escrita por caiquedelbuono


Capítulo 25
União.




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— Ah, francamente, eu não estou acreditando que vocês chegaram a esse ponto. — dizia Sophia enquanto pressionava um cubo de gelo sobre o canto da boca de Logan — Quero dizer, brigar assim desse jeito? Onde vocês estavam com a cabeça?

Logan estava sentado sobre a cama no dormitório das meninas e Sophia estava tentando dar um jeito em seus leves ferimentos. Suas costelas ainda estavam doendo devido aos chutes de Tommy, mas não se comparava à vermelhidão que se formara no canto de sua boca.

Helena estava em pé, diante à janela, andando em círculos.

— Eu sabia que isso aconteceria. — ela dizia ao mesmo tempo em que olhava para Logan reclamar que Sophia estava apertando demais o cubo gelo contra o machucado — Sempre que dois garotos estão metidos em discussões dessa magnitude, acaba saindo pancadaria.

Logan revirou os olhos.

— Não foi bem uma pancadaria. Nós só apenas nos estranhamos um pouco.

Sophia apertou com toda sua força o cubo de gelo sobre seu machucado e ele gritou de dor. Água já estava pingando por todos os cantos de sua roupa e o cubo escorregou da mão dela, atingindo o chão em cheio e se espatifando em pequenos pedaços.

— Estranharam-se? — ela perguntou com a sobrancelha franzida numa expressão de irritação — Você levou um soco no rosto e dois chutes na costela e logo depois tentou enforcar o coitado do Tommy e você diz que foi apenas um estranhamento?

— Eu estava imerso em um ataque de fúria — Logan lembrou-se de como se sentia irritado quando isso acontecia e não conseguia controlar os próprios atos — e não havia muito que eu pudesse fazer para impedir que eu descontasse toda minha ira nele. Quero dizer, eu não consigo pensar meticulosamente quando estou tendo um ataque. É como se eu não respondesse por mim e a única coisa que eu tenho vontade de fazer é destruir algo.

Sophia balançou a cabeça.

— Nesse caso, o pescoço do Tommy.

Helena se aproximou deles e sentou na cama ao lado de Logan. Olhou profundamente nos seus olhos e pela primeira vez ele pôde perceber que ela estava preocupada. Ela provavelmente não seria sarcástica e não usaria daquele momento para fazer alguma piada.

— Logan, já pensou em conversar mais a respeito disso? — ela fitou o chão — Sei que vocês talvez nunca pudessem imaginar que eu admitiria tal fato, mas eu fico apreensiva. Isso pode ser uma doença.

Logan percebeu a sinceridade no tom de voz da amiga e a encarou.

— Eu já fui a alguns médicos antes de ser transferido para cá e apenas me disseram que eu tenho leves sintomas de esquizofrenia devido ao trauma que sofri quando meus pais morreram. Existem vários tipos de esquizofrenia, geralmente é caracterizada por a pessoa ter alucinações e ver coisas que nunca poderiam existir, como um elefante cor de rosa voando pelos céus, mas a minha é pós-traumática.  

Talvez fosse a primeira vez que ele contava isso a alguém daquele internato; nem mesmo Sophia sabia sobre a causa dos seus ataques de fúrias. E ele se sentia bem ao fazer isso, como se um peso de quinhentos quilos estivesse sendo retirado de suas costas.

— E não existe tratamento para isso? — perguntou Helena.

— Tecnicamente não. Existem alguns remédios tarja preta que as pessoas com alucinações tomam. Mas no meu caso não é necessário. O médico disse que eu apenas preciso evitar situações estressantes e que esse trauma passaria em alguns meses.

Helena balançou a cabeça.

— Evitar situações estressantes é algo difícil aqui em Shavely.

Sophia pigarreou como se estivesse tentando mostrar que ainda estava no dormitório.

— Falando nisso, nenhuma notícia de Mark?

Por um momento, Logan havia se esquecido disso. Estava tão concentrado em tentar conversar com Tommy que nem se lembrava de que Mark estava desaparecido, correndo o risco de estar escondido sob as sombras apenas esperando o momento certo para pegar todos desprevenidos.

— Isso está me deixando apavorada. — disse Helena, se agarrando ao lençol da cama e mostrando os dentes numa expressão de medo. Helena estar a cinco minutos sem falar qualquer coisa que fosse engraçada era um grave sinal de que estava realmente apavorada.

— Nada me tira da cabeça o fato de ele estar se passando por outra pessoa. — disse Logan, passando a mão no queixo.

— Será que ele cometeu outro assassinato? — perguntou Sophia.

Logan não respondeu. Estava pensando na última vez que vira Mark, na mesa do jantar, antes de contar aos amigos toda a verdade. Talvez estivesse muito óbvio que ele tinha de algum jeito, descoberto que Logan havia descumprido a chantagem. Que outro motivo ele teria para desaparecer e permanecer escondido? Será que eles já não estavam aterrorizados o suficiente?

— Sabe o que eu acho? — perguntou Helena — Vocês já viram aqueles filmes que milhões de zumbis estão atacando a cidade? Vocês sabem o que as pessoas fazem? — ela revirou os olhos quando percebeu que Logan e Sophia não estavam entendendo o que ela estava falando — Ficam juntas! As pessoas permanecem juntas o tempo inteiro e é isso que iremos fazer.

— Como assim? — perguntou Sophia — Não estou entendendo.

— Meu Deus! Será que vocês querem que eu pegue um dicionário para mostrar o significado de “juntas”? — ela fez um sinal de aspas com as duas mãos — A partir de hoje, faremos tudo juntos. Não nos desgrudaremos nem por um segundo porque se Mark resolver atacar, teremos o apoio um do outro.

Logan acenou levemente com a cabeça e começou a gostar da ideia de Helena. Tudo seria mais fácil se eles estivessem juntos como jamais estiveram antes.

— Mas para isso — ela continuou falando — precisaremos de Tommy. Eu vou chamá-lo agora mesmo e vocês dois irão fazer as pazes ou eu mergulharei a cabeça de vocês no vaso sanitário e darei descarga. — ele deu um sorriso e se levantou da cama, indo em direção à porta e saindo, sem ao menos perguntar se Logan se importaria em ver Tommy depois do que acontecera. Mas era claro que ele não havia sido justo com o amigo e a coisa que mais queria era pedir desculpas.

Ele olhou em volta e notou que estava sozinho com Sophia. A menina sentou ao lado dele na cama e se aproximou.

— O que será que ela está pensando em fazer? — perguntou.

Logan balançou a cabeça com um olhar vago em seu rosto.

— Eu não sei, mas acho que deveríamos aproveitar esse pequeno momento de privacidade.

Um sorriso se formou nos lábios de Sophia e ela segurou nas mãos de Logan. Ele a puxou para ainda mais perto até que seus lábios se encontrassem em um beijo.

Era tão bom poder ficar ao lado de Sophia no meio de tanta balbúrdia e ainda sentir que a amava. Seu beijo dizia o quão importante ela era e seus lábios macios só o fazia sentir cada vez mais vontade de tê-la. Ela era a melhor coisa a qual ele poderia se agarrar dentro daquele internato; ao mesmo tempo em que ela era sua namorada, também era sua amiga. Sempre estaria disposta a ouvi-lo, a ajudá-lo, a aconselhá-lo e jamais permitiria que se sentisse para baixo.

Eles se desvencilharam e Logan, ofegante, passou o dorso da mão sobre a boca.

— Sabia que eu achei muito bonitinho você com ciúmes de mim hoje na piscina?

Ela primeiramente riu e depois deu um leve tapinha em seu ombro.

— Bonitinho vai ser quando eu deixar uma faca cair acidentalmente no peito de qualquer sirigaita que tentar se engraçar com você.

Logan arregalou os olhos.

— Você me assusta falando desse jeito. Até parece que você é uma...

Mas ele não terminou de falar porque Sophia agarrou a gola de sua camiseta e o puxou para outro beijo, ainda mais ardente que o primeiro. Suas mãos brincavam à procura de algo novo no corpo do outro. Seus corações palpitavam no mesmo ritmo e a cada segundo que passava a paixão só aumentava.

Um clique na porta e eles rapidamente se afastaram. Helena e Tommy estavam parados diante dela, com os braços cruzados e a boca contorcida em uma expressão de nojo. Logan e Sophia se entreolharam e arriscaram dar uma gargalhada, mas Tommy já havia começado a falar:

— Bom, se você me trouxe até aqui para ver um casal se pegando, sinto muito, mas vou voltar para o meu dormitório.

Tommy já estava se virando quando Logan gritou.

— Tommy, espere!

Ele se levantou da cama rapidamente e foi à direção dele, que estava com a mão apoiada sobre o batente da porta com uma expressão de tédio no rosto.

Helena olhou de soslaio para Tommy e saiu de perto dele, indo em direção à Sophia e sentando ao lado dela.

— O que você quer? — o tom amargurado em sua voz fez Logan estremecer. — Vai tentar decepar minha cabeça agora?

— Tommy, por favor, seja razoável. Eu te devo um pedido de desculpas por ter feito o que fiz. Você sabe que eu tenho aqueles ataques de fúria e eu não consigo me controlar quando estou imerso em um. É simplesmente mais forte do que eu. Você precisa entender isso.

Tommy ficou em silêncio por alguns segundos. Logan podia ver que engrenagens se formavam dentro do seu cérebro enquanto ele refletia como se tivesse que tomar a decisão mais importante de toda sua vida.

Logan também se pegou refletindo naquele momento de silêncio que se formara no quarto. Talvez Tommy tivesse razão quando dissera que Logan sempre dera uma menor importância a ele. Mas ele nunca fez isso de propósito.

— O mundo ficou muito mais fácil depois que a desculpa foi inventada. É muito cômodo magoar alguém e logo depois pedir desculpas como se isso fosse realmente resolver alguma coisa.

Logan olhou para as meninas e Sophia fez um sinal positivo com a mão como se estivesse o encorajando. Talvez ela soubesse que se fosse um pouco mais insistente Tommy acabaria cedendo e o desculparia.

— Olha, você tem todo o direito de estar chateado assim e eu não o culpo por isso. Mas por que não tentamos ver as coisas por outro ângulo?

— Eu não vejo outro ângulo. A única coisa que eu sei é que você mentiu para todos nós.

Logan ouviu um ruído saindo da boca de Helena, mas foi interrompido quando Sophia colocou a mão na frente.

— Eu não menti. — a voz de Logan estava fraca, soando quase cansada — Apenas omiti. São duas coisas bem diferentes.

— Ter omitido uma coisa tão séria não anula a sua culpa.

Logan suspirou impacientemente.

— Quer parar de agir feito uma criança, Tommy? Pare com isso e me desculpe logo de uma vez. Eu sei que no fundo isso é a coisa que você mais deseja fazer.

Tommy parou por um instante e levou a mão ao queixo. Ele parecia estar imerso em um momento de reflexão. Deu um pequeno sorriso amarelo e olhou para Logan antes de abrir a boca para dizer:

— Bem, eu não tenho outro amigo homem mesmo.

Logan levantou as duas mãos para o alto como se estivesse agradecendo a uma divindade superior e Helena levantou exasperada da cama.

— Ah, finalmente! Pensei que as duas moças iam ficar até amanhã para fazerem as pazes.

— Helena... — Sophia começou a dizer, mas logo parou quando percebeu que a menina deu de ombros e foi na direção de Logan para empurrá-lo a fim de dar um abraço em Tommy.

Os dois meninos se abraçaram e Logan deu leves tapinhas nas costas dele. Mesmo que eles não fossem tão amigos assim como Logan era com Mark, era bom poder contar com ele novamente. Poder saber que ele o havia perdoado, apesar de tudo.

— A próxima vez que você apertar meu pescoço — disse Tommy depois que eles se afastaram — vou lhe aplicar um golpe mortal de karatê.

Helena se aproximou dele com os olhos brilhando e colocou a mão no seu ombro.

— Você sabe lutar karatê?

Um leve rubor preencheu o rosto de Tommy quando percebeu que a mão de Helena apertava o seu ombro e ela o olhava como se estivesse pronto a beijá-lo a qualquer momento.

— Digamos que eu saiba alguns golpes essenciais.

— E por que não os usou em mim quando estávamos brigando? Quero dizer, você me deu um soco no rosto e dois chutes na costela, mas não acho que isso sejam golpes de karatê.

— E não são. — disse Tommy, dando um sorriso e andando alguns milímetros para o lado apenas para que a mão de Helena deslizasse sobre seu ombro e caísse sobre o ar — Mas é que eu nunca usaria golpes de karatê em um amigo.

— Não sabia que você era assim tão meigo com o Logan. — disse Helena com seu usual tom sarcástico.

Tommy mostrou a língua para a garota, que retribuiu com um gesto obsceno.

— Fico feliz por vocês terem se acertado — Sophia estava se levantando da cama e indo em direção aos garotos — mas suponho que a Helena tenha algo a nos dizer.

Uma lâmpada pareceu se acender sobre a cabeça de Helena e ela começou a andar em círculos.

— Agora que o nosso grupo de amigos está completo novamente, temos que pôr em prática o plano de ficarmos sempre juntos.

— Do que é que você está falando? — perguntou Tommy.

Helena revirou os olhos.

— Cale a boca e escute. — o seu tom ríspido fez com que Tommy se retraísse — Todos nós sabemos que Mark está à solta por aí e a melhor forma de nos protegermos contra ele é permanecemos unidos. E como eu sou linda e maravilhosa, tive a brilhante ideia de vocês — ela apontou para Logan e Tommy — trazerem os seus colchões para o nosso quarto e começarem a dormir aqui com a gente.

Logan não sabia se ria ou se entrava em pânico com o que Helena acabara de sugerir. Dormir no mesmo quarto que Sophia poderia ser apavorante se ele considerasse que era um convite para algumas coisas que habitavam sua mente se tornassem reais.

— Mas isso não é contra as regras do colégio? — perguntou Logan — Acho que Janeth não permitiria que meninos dormissem no mesmo quarto que as meninas.

— E quem se importa com o que aquela vadia pensa? — argumentou Sophia.

— E além do mais, — acrescentou Helena — vocês não serão loucos de discordarem dessa ideia, quando eu posso muito bem fazer vocês trazerem os colchões sob a posse de um chicote e...

Tommy não pestanejou nem um segundo em concordar.

— Isso não será necessário! Nós concordamos, não é mesmo, Logan?

— Claro que sim. — ele deu um sorriso amarelo e percebeu que as meninas estavam se divertindo — Até já estamos saindo do quarto.

Eles abriram a porta e saíram correndo, cada um em direção ao próprio dormitório, mas não sem antes dar uma última olhada para Sophia e perceber o sorriso em seus lábios.

No corredor em direção ao seu quarto, Logan percebeu que o caminho estava mal iluminado, o que indicava que já estava anoitecendo. O colégio parecia estar vazio, seus passos ecoando por todos os cantos e fazendo as paredes de pedra tremer levemente.

Ele imaginou se estaria fazendo a coisa certa ao definitivamente mudar para o quarto de Helena e Sophia. Talvez isso apenas aumentasse as chances de serem atacados por Mark enquanto estivessem dormindo. Logan não conseguia tirar da cabeça o fato de que ele estava escondido em algum canto do colégio, disfarçado de uma pessoa de sua extrema confiança. E se ele matara alguns dos seus amigos? E se Helena fosse, na verdade, Mark, e apenas dera essa ideia para que a execução pudesse ser mais fácil?

Logan balançou a cabeça rapidamente e afastou aquele pensamento insólito. Não fazia o menor sentido. Ele conhecia bem a amiga para saber que ela não era um zumbi disfarçado e que continuava viva e segura.

Ele alcançou a porta do seu dormitório, acendeu o interruptor e o ambiente foi invadido por uma luz brilhante. Adentrou no cômodo e percebeu que havia um papel dobrado em cima dos lençóis da sua cama. A cama de Mark ainda estava intocada e parecia não haver sinais de que ele esteve lá.

Pegou o pequeno pedaço de papel, engolindo em seco, e o desdobrou até que seus olhos se esbugalhassem quando pôde ler o que estava escrito em pequenas letras vermelhas e cursivas:

Estou bem debaixo do seu nariz.

Logan quis gritar, mas sua voz não saía. Ele analisou bem aquelas palavras grossas e espessas sobre o papel fino e percebeu que elas foram escritas com sangue, o mesmo material utilizado nas ameaças do espelho.

Mark, ele pensou e teve a certeza de que mais alguém tinha sido morto. Aquela provocação tinha sido escrita com o sangue do recém-assassinado e os músculos do corpo de Logan começaram a tremer.

Ele lembrou-se da fúria que sentira quando viu o espelho do banheiro pichado o acusando de ser o assassino e a única coisa que sua ira permitiu que fizesse foi amassar o papel e o arremessar contra a janela aberta. O vento levou-o para bem longe e provavelmente deve ter caído sobre o gramado de Shavely.

Suas forças haviam sido aniquiladas depois que lera aquilo. Odiava se sentir acuado, ainda mais por algo do qual ele nem sabia como se defender. O que ele teria que fazer para que Mark parasse de aterrorizar a todos? Quando essa tormenta passaria e ele teria paz novamente?

Logan levou a mão à cabeça e bagunçou os cabelos até que seus pensamentos se tornassem obscuros. Ele se concentrou em apenas arrancar o colchão da sua cama, não se importando com quão pesado ele era, e o arrastar até o dormitório de Helena e Sophia.


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