Senti a fina lâmina ser cravada em meu peito ao mesmo tempo em que atirei a minha.

Não doía. Ou, pelo menos, não dor física, como deveria ser. Apenas um leve formigamento que percorria todo o meu corpo, fazendo-me estremecer. Mas a dor psicológica. Ah, sim, essa existia. O gosto do fracasso não me era familiar, mas agora eu o estava provando. Ácido. Amargo. Azedo. Não havia uma definição apropriada, apenas o desgosto.

Eu sentia vontade de morrer. Sabia que era exatamente o que estava acontecendo ali e agora, mas eu apenas ansiava que a hora final chegasse. Tentava fechar meus olhos. Estava cansada de toda aquela luz, de todas aquelas pessoas. Mas não podia. Toda vez que o tentava, algum mísero detalhe, insignificante, me trazia de volta.

Dessa vez eram os olhos. Surpresa. Incredulidade. Tristeza.

Meus joelhos foram forçados a ceder. Pouco me importava. Logo, os dela também cederam. Pois, assim como eu possuía a lâmina cravada em meu peito, ela a possuía nas costas.

Sorri por saber que não iria sozinha. Eu sempre estivera sozinha. Mas agora, algo reconfortante me dizia que havia companhia. Talvez meu fracasso não houvesse sido tão completo. Pois a traidora iria também.

A cena que vira lá fora perturbava minha mente. Cada um dos caídos morrendo pelo tiro de um humano, ou mesmo de um renegado. Malditos traidores. Sempre estiveram em nosso lado, porém, desta vez, algo os fizera mudar. Bem, agora não me importava.

Depois de tudo se apagar, não haveria mais volta para mim. Por que eu me importava tanto com o que aconteceria dali para frente? A guerra provavelmente seria perdida. Nossas forças haviam sido completamente direcionadas para esta batalha. Desta vez, era o fim.

O gosto de sangue chegou à minha boca e senti meu corpo cair. Minha consciência, porém, permanecia ali. Pisquei algumas vezes, tentando superar a ansiedade e a impaciência.

Logo à minha frente, o garoto loiro permanecia incrédulo e assustado. A pouca luz que tochas e uma lanterna emitiam refletiam o dourado de seu cabelo. Refletiam o dourado do meu sangue que escorria até a entrada do túnel. Ele estava intacto. Seria nossa esperança. Uma renúncia, um sacrifício que poderia trazer a Majestade de volta. Em vão. Sabendo de seu destino agora, provavelmente salvaria a suprema Divindade.

Duas forças que lutavam desde o princípio dos tempos, mas que apenas agora haviam permitido a guerra estourar. Era uma balança. Não existia o mal sem o bem nem o bem sem o mal. Na verdade, não existia nenhum dos dois. E eu era uma das poucas que o sabiam.

Essa guerra era ridícula. Dois seres superiores haviam permitido o envolvimento de suas criaturas em uma briga que duraria para sempre. Ou não.

Não queria mais pensar nisso. Não queria mais pensar em nada.

E a escuridão se abateu sobre mim.

Repentinamente, parei de sentir o frio. Parei de sentir o medo e parei de sentir a dor. Parei de ver a luz, e o dourado maravilhoso que brilhava no túnel. Era apenas eu, era apenas a escuridão.

“Finalmente, me fora concedida a morte.”