P. Bailey escrita por CellyLS


Capítulo 11
A relíquia além da relíquia




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A pequena lanterna clareou ao redor. Dentro do estreito túnel, Nigel estava rodeado por gelo, água e barras de metal verticais, que pendiam do alto do teto e das paredes. As lanças formavam ângulos provenientes do mesmo ponto no alto, e todas elas desciam até o chão, onde foram firmemente enterradas na rocha quando a armadilha fora acionada.

Havia uma cortina de barras de metal a cada metro. As lanças haviam rompido o gelo do corredor nas áreas menos densas, mas por sorte, várias delas permaneceram presas pela espessa camada congelada. Era nesses espaços, onde algumas das lanças de ferro estavam faltando, que Nigel começou a se espremer e passar com dificuldade entre as barras quase paralelas.

Estava tão frio. O jovem ouvia seus dentes batendo entre sua respiração. Era difícil tomar fôlego, seu corpo quase não dava oportunidade para o ar entrar em seus pulmões por estar tremendo convulsivamente. Nigel teve vontade de se encolher em um canto do túnel, mas sabia que não poderia parar. Suas roupas molhadas não o estavam ajudando a manter o calor do corpo e não havia como tirar os pés da água. Precisava se movimentar ou morreria de frio.

O espaço normal entre as barras era tão mínimo que mal permitia a Nigel passar a mão por ele para se apoiar com mais firmeza e tirar o peso de seu tornozelo dolorido. Comprimiu seu corpo ao máximo para passar em um ponto onde havia uma falha de três barras. Continuou tremendo e com muito esforço repetiu este mesmo processo mais algumas vezes, só não conseguia dizer exatamente quantas, sua concentração parecia lhe escapar facilmente naquele frio.

Depois de alguns minutos de avanço, olhou novamente ao seu redor. Caminhar por ali estava se tornando mais difícil. O gelo das paredes foi suficiente para bloqueara as lanças até a metade do caminho até Jonathan, mas a partir daí a camada congelada diminuía. Apontou a lanterna para frente, tomando cuidado para não iluminar o cadáver que deveria estar por perto. A partir deste ponto os espaços entre as barras de metal estavam ficando escassos e parecia não haver falhas nas grades mais distantes.

Nigel soltou algo parecido com um suspiro e encolheu-se, cruzando os braços com força para tentar se aquecer. Considerou sua situação, e mesmo com o raciocínio levemente entorpecido sentiu calafrios com a conclusão. Estava claro que não conseguiria chegar ao outro lado. O homem morto logo adiante era prova irrefutável disso. Talvez os únicos motivos de ainda não ter entrado em pânico fossem o frio insuportável que nublava sua mente e a escuridão que mascarava sua falta de alternativas. Sentiu o corpo entorpecendo ainda mais e obrigou-se a se movimentar. Avançaria o máximo que conseguisse pelo caminho e pensaria no que fazer depois disso. Não deveria ficar parado.

Atravessou vagarosamente mais duas cortinas de metal. Estava tremendo de forma incontrolável e a coordenação de suas mãos começou a falhar. Estava sentindo profunda raiva e cansaço. Cada passo lhe exigia mais esforço enquanto suas pernas o obedeciam cada vez menos. Talvez não conseguisse levantar do chão na próxima vez que tropeçasse, já não sentia quase nada na parte inferior de seu corpo. Movimentou a lanterna e constatou exasperado o fato de estar cada vez mais frio, embora agora quase não houvesse mais gelo nas paredes.

Abaixou a lanterna e arregalou os olhos. Girou sobre seus pés, conferindo o que estava vendo. O nível da água havia subido novamente! Mas como? Mesmo usando muito esforço ele não conseguia enxergar o final do túnel com a pequena luz. Era um corredor enorme, como poderia já estar repleto assim de água?

Deu um passo para trás olhando suas pernas. Já estavam imersas até os joelhos. Era um milagre ter conseguido caminhar até ali sem desmaiar. Nigel abraçou-se e esfregou os próprios braços enquanto pensava no que fazer. Olhou para o lado e viu algo flutuando na correnteza. Clareou o objeto com a lanterna. Era uma pedra branca de gelo que se destacava no líquido escuro e lamacento. O ponto claro formado pelo bloco seguiu seu curso, passando graciosamente por entre as grades e deixando Nigel para trás. Ele viu o gelo flutuar sobre a água através de duas cortinas de metal, sentindo sua força e esperança irem-se junto com a pequena pedra.

Mas o bloco de repente parou. A pedra ficou presa logo depois, bem ao lado de... Arg! Se tivesse forças, Nigel vomitaria naquela hora. O assistente sentiu seu estômago revirar ao enxergar o que restava de Jonathan logo adiante. Parcialmente coberto de lama e água escura, o cadáver desfigurado preso ao chão pelas grades estava bloqueando a passagem do gelo que se desprendera das paredes. Foi por isso que o nível havia subido! O corpo e o gelo impediam o escoamento da espessa água, formando uma pequena barragem repulsivamente eficaz. O líquido escuro e frio não desceria se os blocos não fossem liberados dali.

O inglês olhou para trás. Retornar para a câmara estava fora de cogitação. Já havia sido extremamente difícil chegar até ali, caminhar contra uma correnteza tão forte seria impossível em seu estado atual. Ademais, não havia outras passagens na câmara, se pudesse chegar até lá tudo o que lhe restaria seria subir sobre uma rocha e aguardar a morte. Sua única alternativa era se livrar de toda a água do corredor.

Com as mãos trêmulas, o jovem apontou a lanterna para as lanças que o afastavam da barragem. Havia mais duas cortinas de metal para atravessar antes de chegar ao gelo acumulado e poder liberar o escoamento da água. Ele afastou quase sem êxito o desespero que havia surgido no fundo de sua mente. Não estava em suas pretensões congelar ali coberto de água imunda ao lado de Jonathan. Reuniu a pouca força que ainda tinha e começou a atravessar mais uma cortina com muitíssima dificuldade.

Depois de algumas tentativas, o inglês conseguiu passar sua cabeça pelo pequeno espaço. O jovem sentiu-se tomado por uma estranha euforia naquele momento, como se isso significasse que ele conseguiria superar todos os obstáculos e encontrar Sydney sã e salva do outro lado daquela escuridão. Seu corpo, contudo, não partilhou do mesmo entusiasmo. Suas pernas não o sustentaram ao passar pelas barras de metal, e Nigel mergulhou por completo na água lamacenta.

Nigel emergiu tossindo e tentando se levantar. Agarrou-se nas barras de metal à frente e obrigou as pernas desobedientes a o erguerem de novo. Todo o otimismo que sentira há pouco havia desaparecido. Estava molhado novamente, sentindo ainda mais frio enquanto seu corpo se contorcia, tentando ao máximo se encolher e respirar ao mesmo tempo

Escorou as costas na parede do túnel. Sua lanterna continuava presa a seu pulso. Ela era a única fonte de luz naquele local. O assistente não conseguia ver nada antes ou além da sua posição. Tudo o que escutava era a água jorrando da parede da câmara que deixara para trás. Balançou a lanterna e observou a barragem que ficava apenas a alguns centímetros e permanecia protegida pela grade da armadilha. Teria que alcançá-la, mas sentiu como se os centímetros houvessem se transformado em metros naquele momento.

Seu peito estava tão apertado. Todos os músculos se contraíam ao máximo tentando manter o calor no meio daquela correnteza gelada e não permitiam o precioso ar de entrar em seus pulmões. O frio lhe dava milhares de punhaladas de todas as direções, e não podia sequer levantar as pernas da água para tentar se aquecer. Nunca havia sentido tanta dor.

O som da correnteza pareceu estar se afastando. Nigel teve a impressão de que a luz da lanterna começou a falhar, mas eram seus olhos perdendo o foco. Seu organismo estava se desligando. Seu raciocínio estava tentando parar, como se sua mente estivesse prestes a se desprender de seu corpo. Sem perceber, fechou os olhos.

A imagem nítida de cabelos castanhos adornando um rosto delicado e feminino passou a sua frente. Que linda alucinação. Qualquer delírio que lhe permitisse ver Sydney antes de morrer seria a melhor forma de acabar. Viu os lábios da mulher sussurrarem algo. Nigel!

O inglês abriu os olhos. A fraca claridade da lanterna e o túnel escuro estavam de volta. Seu corpo ainda tremia sem controle e estava submergindo na água. Inspirou, forçando ar em seus pulmões. O rosto de Sydney o havia feito despertar. Ela chamou seu nome, lhe dizendo para não desistir. Obrigou-se a respirar de novo. Não iria desapontá-la. Apoiou-se mais na parede e ficou totalmente de pé.

Continuou respirando com dificuldade. Olhou para as grades a sua frente. Havia conseguido chegar até aqui, não poderia desistir agora. Não poderia deixar Sydney para trás. Precisava encontrá-la novamente. Ainda tinham assuntos a discutir, precisava saber o que ela faria agora que descobrira como se sente.

"PRESTON, PARADO!"

O homem ficou imóvel ao ouvir o grito da caçadora. Haviam acabado de abrir a passagem que encontraram na câmara e um túnel imenso se revelara. Com a pressa de salvar seu irmão, Preston não havia pensado duas vezes e já estava prestes a entrar corredor adentro para chegar à sala central da caverna, mas foi impedido pela mulher, que agora segurava seu ombro. "O que houve, Sydney?"

"Deve haver armadilhas neste caminho. Eu irei na frente!" Ordenou Sydney. A historiadora pegou a lanterna de Preston e parou na entrada do túnel. Analisou todas as paredes, o teto e o chão com as duas luzes. "Certo. Pise apenas aonde eu pisar!" Preston concordou com a cabeça enquanto ela devolvia sua lanterna.

O túnel era longo, devendo ter aproximadamente vinte metros, mas era bastante estreito. Os dois entraram no corredor e começaram a avançar lentamente enquanto Sydney procurava por quaisquer sinais de armadilhas. A caçadora estava tão nervosa e preocupada que se esquecera até do frio. Seu coração batia de forma acelerada e havia gotas de suor se formando em sua testa.

Ela queria se apressar, mas a escuridão não a ajudava. Suas pernas queriam correr, mas teve que forçá-las a darem passos minúsculos. Uma passada em falso e os dois poderiam acionar alguma armadilha e ficarem presos naquela caverna para sempre, sem poder ajudar Nigel.

Sydney balançou a cabeça e se obrigou a continuar, lentamente. Seus olhos treinados não deixavam escapar qualquer detalhe do caminho. Havia muitos gatilhos espalhados pelo chão. Preston continuou logo atrás, seguindo os passos da mulher com total atenção. Não poderia se dar ao luxo de cometer algum erro. Estamos indo, Podge!


Nigel segurou-se nas lanças e esticou o braço direito, tentando enfiá-lo pelo único espaço onde uma das barras não havia descido. Seu braço mal passava pelo vão. Fez força, esticando os dedos. Não alcançou. O gelo da barragem estava preso na altura de seus joelhos, se conseguisse liberar algumas pedras, o nível da água diminuiria e teria um pouco mais de tempo para encontrar uma saída.

O jovem viu que teria que se ajoelhar no chão para conseguir se aproximar mais de seu alvo. Cerrou os olhos e se permitiu submergir novamente na água até quase seu peito. Seu corpo se contraiu involuntariamente e teve que lutar para esticar novamente o braço por entre a grade. Seus dedos quase tocaram o gelo que se acumulava ao redor do corpo de Jonathan, mas ele ainda não conseguia alcançar os blocos. Nigel esforçou-se ainda mais, usando a lanterna que estava presa ao pulso. Droga! Ainda faltavam alguns centímetros.

O assistente ainda não havia desistido, mas a temperatura da água já estava mais que insuportável. Tinha que se levantar e tentar se aquecer um pouco, não estava conseguindo nem coordenar as mãos tremendo daquele jeito. Começou a recolher o braço com um pouco de dificuldade e sentiu um leve tremor. Mas este tremor era diferente, não provinha de seu corpo e sim das paredes. Ouviu um barulho no teto do túnel e por instinto puxou o braço da abertura antes de pensar em qualquer coisa.

A última lança da grade que estava presa se libertou do gelo e desceu do teto com toda a força por onde Nigel estava passando seu braço há menos de um segundo. A barra de metal zuniu em sua frente e enterrou a ponta no chão. Nigel ficou paralisado com o susto.

Se tivesse esperado mais um segundo, não haveria restado nada de seu braço direito. Olhou para as costas da mão e viu o corte causado pela ponta da lança. Não parecia profundo, mas sangue surgiu imediatamente no machucado que formava uma linha do seu pulso até a junção de seu dedo médio.

Seu corpo estava incrivelmente imóvel, mas suas mãos continuavam tremendo. Finalmente tomou fôlego e começou a se levantar da água onde estava ajoelhado. Nigel quase desistiu, tamanho o esforço que estava fazendo, mas acabou conseguindo ficar de pé. Apontou a luz para o que estava a sua frente.

De repente, estava tremendo de novo e sua dificuldade para respirar havia triplicado. Algumas gotas de sangue escorreram por sua mão direita enquanto segurava a lanterna.

Nigel não notou o sangue em sua ferida, pois não conseguia desviar o olhar do caminho, agora totalmente bloqueado com lanças de ferro. Alguns segundos e sua voz ecoou pelo corredor sombrio. "Como eu vou sair daqui?" Perguntou no meio da escuridão, sem reconhecer o som grave e rouco que escapara de sua garganta.

Não obteve resposta. Tudo o que escutou foi a água brotando na câmara às suas costas e correndo pelo túnel, soando como uma risada cruel que zombava de todos os seus esforços.

Sydney e Preston levaram vários minutos atravessando o estreito corredor em silêncio. A caçadora estava com a impressão de terem se passado horas quando os dois conseguiram alcançar a outra extremidade do túnel. Ela pegou novamente a lanterna de Preston antes de sair do corredor e avaliou a sala onde haviam chegado. A escuridão continuava densa, mas havia um som diferente naquela sala.

Sydney analisou o chão a sua frente e as paredes. Não parecia haver armadilhas na sala. Devolveu a lanterna a Preston e saiu do túnel. Deu alguns passos e concentrou-se no que estava ouvindo. Era o barulho de água corrente. Os dois caminharam em direção ao centro da câmara e Sydney avistou um altar totalmente esculpido no mesmo tipo de rocha da caverna. Sobre ele uma urna ricamente ornamentada permanecia intocada.

"As cinzas! NÓS ENCONTRAMOS!" Gritaram Sydney e Preston ao mesmo tempo enquanto apontavam as lanternas para o altar. Os dois correram em direção à relíquia e pararam diante dela. Viraram as costas para a urna e direcionaram os feixes de luz para as paredes da câmara. A sala possuía várias passagens para túneis idênticos àquele que os dois haviam acabado de atravessar.

Preston e Sydney se separaram, caminhando em direções opostas. Começaram a verificar cada uma das passagens existentes. O lado de Sydney possuía três passagens além do túnel que haviam atravessado. As paredes da câmara central não possuíam nenhum gelo, facilitando sua busca.

Apontou a lanterna para dentro do primeiro corredor, tomando cuidado para não se aproximar demais. A luz não alcançou nada dentro do túnel. Sydney chamou por Nigel, mas não houve resposta. Ouviu Preston chamar pelo irmão do outro lado da sala. Olhou para ele. Preston estava conferindo um dos quatro túneis do seu lado da câmara e parecia estar tão aflito e nervoso quanto a caçadora ao não obter resposta do jovem inglês.

Sydney voltou-se novamente para o corredor e resolveu passar para o próximo túnel. Deu alguns passos e notou que o barulho de água corrente estava mais alto neste local. Pisou em uma poça d'água no chão e apontou a lanterna para baixo. Havia água e pequenos pedaços de gelo no piso da sala. Seguiu a umidade até um dos túneis.

A escuridão era quase impenetrável, mas a luz que ela direcionou para o corredor mostrou que havia inúmeras grades bloqueando o caminho. Sydney sentiu seu coração pular uma batida. Não estava tendo um bom pressentimento sobre isso. Apertou os olhos tentando enxergar além do que a lanterna conseguia clarear.

O chão do corredor estava repleto de água correndo em sua direção. Chamou por Nigel e esperou um momento, mas não ouviu nada. Aproximou-se mais das barras e esticou o braço túnel adentro, clareando em todas as direções do corredor. Mais adiante, havia alguma coisa no meio das grades de metal. Não. Não pode ser. Esforçou-se ainda mais para enxergar e então sentiu seu sangue congelar.

"NÃO!"


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