Capítulo 111 - Para que servem os amigos?

Passadas três semanas desde a difícil batalha pela propriedade da Academia Wong, Lien e André voltaram para suas vidas normais. Isso incluía ir à escola e treinar normalmente à tarde, embora André ainda não estivesse totalmente recuperado.

- Ai, meu ombro ainda dói um pouco - reclamou ele, enquanto caminhava para a Academia Wong acompanhado da namorada.

- Ah, é normal - disse Lien - Mas o importante é que deu tudo certo, né? Espero que o vovô nunca mais meta a gente nesse tipo de situação.

- Pois é - concordou André - Foi um treino duro. Mas pelo menos agora me sinto mais forte.

- Com certeza - concordou a namorada - Você já deve estar mais forte do que eu.

- Também não é pra tanto - disse André - Ainda preciso comer muito arroz com feijão.

- Ei, cadê o Alex? - estranhou Lien - Ele tá sempre segurando vela.

- Ah, hoje ele disse que precisava visitar uma tia - disse André - Não estava muito a fim de ir, mas...essas coisas de família, sabe como é, né?

- Entendo - disse Lien - Bom, então acho que hoje somos só nós dois. É raro a gente ter um tempo assim, né?

- Pois é - falou André, abraçando a namorada em um breve momento de intimidade. Breve mesmo, já que não demorou muito para que uma voz conhecida interrompesse os dois.

- André! Lien! Que bom! Achei vocês! - disse Astolfo, nada menos que um amigo não muito discreto do casal, correndo do portão da escola até o casal.

- Ah, e aí, Astolfo? - cumprimentou André, enquanto o rapaz se recuperava da corrida.

"Como eu disse...é muito raro ficar sozinha com ele", pensou Lien.

- Eu tô bem, cara. Sempre na paz. Hehe. Quer dizer...na verdade...tem só uma coisinha.

- Que coisinha? - perguntou André.

- É que...esse fim de semana...é o Encontro Anual de Colecionadores de Calendário.

- Encontro o quê? - perguntou Lien.

- Encontro Anual de Colecionadores de Calendário - respondeu Astolfo - Vocês sabem que existem os mais diversos tipos de calendários por aí, não é? Eu, especialmente, gosto muito daqueles que possuem imagens de paisagens orientais. Teremos palestras com confeccionadores e uma exposição com pessoas que confeccionam seus próprios calendários! Isso sem contar no debate sobre a melhor maneira de expressar as fases da Lua no seu calendário.

- Não sabia que calendários eram um assunto tão sério - comentou André.

- Muito sério. Comecei nesse hobby ano passado. Nem eu imaginava que tinha tantos fãs assim. Já conseguiram unir mais de cem pessoas no evento!

"Existem cem pessoas que se interessam por isso?", pensou Lien.

- E qual o problema? - perguntou André.

- É que...justo nesse fim de semana...minha tia resolveu me deixar com o meu priminho de dez anos, o Clayton - falou Astolfo - O único jeito de eu conseguir ir no encontro...é se eu conseguisse deixar o Clayton com pessoas de confiança.

- E essas pessoas seriam? - Lien já parecia adivinhar o que Astolfo iria pedir.

- Só por uma tarde...esse sábado - falou Astolfo - Eu imploro! Por favor!

- Infelizmente, Astolfo...esse sábado nós precisamos treinar e..

- Não tem problema! O Clayton adora artes marciais - falou Astolfo - Ele vai adorar assistir o treinamento de vocês.

- Mas... - Lien tentava pensar em outra desculpa, mas André já era bem mais bonzinho.

- Acho que não tem problema passarmos uma tarde com o seu primo - falou André - Nós nos responsabilizamos por ele.

- André! - reclamou Lien.

- O que foi? Vai ser bom aprendermos um pouco como lidar com crianças, não? Cedo ou tarde teremos que fazer isso. Além disso, Astolfo nos ajudou na luta contra a Liga. Devemos um favor para ele.

- Tsc...tá, tá bom. Mas só por uma tarde, tá legal? Pode trazer ele na Academia antes de sair? - falou Lien.

- Tá combinado! - disse Astolfo - Tenho certeza de que vocês vão conseguir cuida dele, afinal, vocês são bem fortes.

- Bem fortes? Epa, peraí...como é esse moleque?

- Valeu, Lien. Sábado eu levo o garoto lá! - disse Astolfo, caindo fora o quanto antes. Essa conversa acontece numa quinta e, na sexta, Astolfo só disse que seu primo é uma criança bem saudável. Lien estava mais preocupada, já André apenas via o lado bom da situação. Era mesmo um namorado bem tranquilo. Enfim, sábado chegou logo e Astolfo com seu primo também.

- E aí? - disse Astolfo, chegando na Academia Wong acompanhado de um garoto de dez anos, usando um boné vermelho e camiseta com estampa de alguma marca desconhecida - Esse aqui é o meu primo, o Clayton.

- Oi - falou Clayton, ainda meio tímido.

- Opa. E aí? - cumprimentou André, ainda usando suas roupas de treino. Lien estava logo atrás dele.

- Oi - cumprimentou ela, enquanto pensava "Malandro é o Alex, que tratou de dar uma desculpa para não aparecer aqui no sábado. Tsc. Eu e o André vamos ter que aguentar esse rojão sozinho"

- Obrigado mesmo, galera - falou Astolfo - Não sei o que eu faria sem vocês.

- Relaxa. Para que servem os amigos, não é? - falou André.

- Querem que eu traga alguma coisa do evento para vocês? Estão precisando de um calendário? Tem vários modelos com dragões chineses e..

- Não precisa. Vai nessa - disse Lien.

- Tem certeza? Tem vários calendários lá e..

- De boa, Astolfo. Pode ir - insistiu a garota.

- Ah, sim. Qualquer coisa, é só ligar no meu celular, ok? Mas tenho certeza de que vocês vão se dar bem com o Clayton - falou Astolfo - Ah, sim, ele pode comer qualquer coisa, mas não exagerem muito nos doces. E...bom, boa sorte. Já tô atrasado. Falou!

E Astolfo deixou o moleque aos cuidados de André e Lien.

- Bom...e aí, Clayton, né? O que quer fazer? - perguntou André, abaixando-se um pouco para falar com o menino.

- Você luta mesmo? - perguntou o garoto.

- Bom, estou treinando - disse André, mantendo o sorriso.

- Iaaah! - disse o garoto, mandando um soco na barriga de André, que, desprevenindo, apenas foi atingido.

- Ai! O que foi isso?! - André estava espantado.

- Achei que você lutasse!

- E como eu podia saber que você ia atacar? - perguntou André.

- O inimigo não vai te avisar quando você ataca - falou Clayton - Meu primo sempre falou isso.

- É, André. Tem que ficar sempre em guarda - disse Lien.

- Yaaah! - gritou Clayton de novo, agora tentando atacar Lien, mas a menina bloqueia o soco na mesma hora.

- Comigo o buraco é mais embaixo - falou Lien - É melhor se comportar direitinho, tá legal?

- Eu me comporto - falou Clayton - E aí? Vocês vão me ensinar algum golpe? Heim? Heim?

- Olha, artes marciais não são brincadeira - disse Lien - Você precisa ser responsável antes de aprender coisas desse tipo.

- Ei, esse é o garoto que vocês falaram? - disse Mestre Wong, ao se aproximar do grupo - Como vai?

- Ah, bom dia - falou Clayton - O senhor que é o mestre aqui?

- Bem, é como costumam me chamar?

- O senhor pode me mostrar alguns golpes? Heim? Heim? Por favor...eles não querem me ensinar!

- Não querem? Bom, artes marciais são uma responsabilidade, você sabe e...

- Aqui é uma academia de kung fu, né? Vocês tem aquelas armas legais? Tipo uns nunchakus?

- Bom, sim, mas...

- Legal! - disse Clayton, antes que o Mestre terminasse de falar - Estão lá dentro? Deixa eu ver!

E o garoto já foi entrando na Academia sem nenhuma cerimônia.

- Ele é parente do Astolfo mesmo - comentou André.

Não demorou muitos segundos desde que Clayton entrou na Academia para Mestre Wong ouvir alguma coisa se quebrando.

- Ai, não. Espero que não tenha quebrado nada de importante! - reclamou o velho mestre, correndo para ver o que havia ocorrido.

- "Para que servem os amigos", não é, André? - reclamou Lien.

- Calma. Ele é só, como posso dizer, hiper ativo, né? - disse André, tentando mudar o olhar de brava da sua namorada - Além disso, é só uma tarde.

- Acho que essa tarde será bem longa... - lamentou Lien. Quem disse que bancar a babá é fácil?