Anne Bergerac: As Portas Da Contradição escrita por Ana Barbieri


Capítulo 13
Capítulo 13




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Capítulo 13

  Como uma pessoa pode saber quando está sonhando, se às vezes é tão real? Me pego pensando nisso agora, sentada em um dos vagões de um trem para Plymouth. Ontem à noite, após nosso pequeno incidente na mansão Stanpleton descobrimos que nosso homem havia fugido. Nosso único problema era não saber para onde ele estaria indo. Todavia, Sherlock Holmes não aceita menos do que todos os fatos e como sugerimos, Charlotte Craiven mentiu e o avisou para que conseguisse escapar. Corremos para o bordel francês, onde ela estava arrumando suas coisas para deixar Londres.

              _ Pensando em fugir, senhorita Charlotte Craiven? – disse Lestrade usando seu tom mais sarcástico. A mulher nos olhou assustada e eu estava tão sedenta de vingança que não pensei nos meus atos seguintes. Andei até aquela mulher e virei seu braço contra suas costas, poderia tê-lo quebrado se quisesse.

              _ Pode estar acostumada com a gentileza de seus clientes. Contudo, eu não sou um deles. Não me importa que você seja uma mulher ou um verme, se não me disser o que eu quero saber... eu arranco seu lindo bracinho fora. – ameacei com uma voz fria e cortante. Charlotte me olhou com uma expressão de súplica, mas, eu estava tão cega de ódio que não me importei.

               _ Direi tudo o que quiser saber, por favor, apenas, solte meu braço. – implorou ela. Soltei, mesmo que a contragosto e voltei para o lado de Lestrade.

               _ Foi muito útil ao senhor Holmes entregando aquela lista senhorita. Poderia nos ceder mais um pouco do seu tempo e nos dizer para onde foi o seu companheiro. – continuou Lestrade, em tom imponente.

               _ Lestrade, se me permite, eu gostaria de saber, como tudo ocorreu. Será que pode nos contar como Lord Stanpleton matou a senhorita Gautier e por quê? – interferiu Holmes. Não sabia no que isso seria útil agora, pelo visto nem Watson ou Lestrade, mas também fiquei curiosa para ouvir a história.

               _ Fazia alguns meses que Hector vinha até o “Les Docces Filles”. Desde que chegou, demonstrou preferência por Roxanne, entre tantas outras prostitutas. – assim que ela começou a falar, senti sua voz começara a falhar. – Contudo, há quatro mês que... Stanpleton me pediu para colocar Bella Donna na bebida de Roxanne, uma pequena dose a cada manhã no chá. Uma noite em que esteve aqui, perguntei qual a razão de estar querendo mata-lá e ele me respondeu que... – a respiração foi diminuindo.

               _ Respire senhorita Craiven e continue. – incentivou Holmes.

               _ Que não era da minha conta. Ainda curiosa, dissuadi Roxanne a me contar sobre a relação dela com Lord Stanpleton. Descobri que Hector ofereceu casamento a ela e que esta havia aceitado, mas primeiro ele teria que matar a esposa. Contei a Stanpleton o que Gautier tinha me contado e ele confirmou, ainda acrescentando que do mesmo modo que mataria Roxanne, iria matar a esposa dele.

               _ Então o que havia na caixinha preta, era mesmo Bella Donna. – disse orgulhosa a Holmes. Ele ergueu os olhos para mim e sorriu, mas continuou a fitar nossa amiga.

               _ Na noite em que foi assassinada, já faziam exatamente três meses que Roxanne ingeria o veneno e finalmente percebi os efeitos agirem nela. Estava mais sonolenta, mais lenta, mais pálida do que de costume e não tinha mais a mesma alegria de antes. Pensei mesmo em voltar atrás com aquilo, mas Stanpleton disse que me mataria...

               _ Por que não procurou a polícia? – questionou Lestrade, apiedado.

               _ Tive medo. Aceitei fazer isso porque tinha inveja de Roxie. Sempre quis tudo o que ela tinha, não é bom ser ignorada quando se vive disso. É duro quando para a população, você só vale o que pagão por você. Queria ser famosa, queria brilhar... – ela parou de repente, respirou fundo e enxugou uma lágrima que caia. – Bem, naquela noite, quando Hector chegou, Roxanne subiu para o quarto com ele. Assim que todos estavam em seus quartos, apenas eu fiquei andando pelos corredores. De repente, ouvi a agitação vinda do quarto de Roxie e corri para lá.

                _ O veneno ainda não havia a afetado totalmente. Stanpleton ficou impaciente e colocou uma grande dose na bebida dela, mas acho que ela já havia percebido porque não aceitava tomar de jeito nenhum. Assim que me viu, ele pediu para que buscasse uma arma. Não há revolveres aqui, então corri até o fundo para buscar o machado e subi novamente. Roxanne me olhou surpresa e começou a tentar se apoiar nas paredes para sair dali e Stanpleton a puxou com toda força pelo braço e a jogou na cama. Forçou-me a segurá-la e a acertou. – completou ela. Eu deixei escapar uma lágrima. Imaginar aquela cena... uma mulher vulnerável sendo machadada e segurada por alguém que um dia chamara de amiga, morta pelo homem que acreditou amá-la.

                 _ O motivo de matar a senhorita Gautier então, foi apenas para descumprir com a palavra? – pronunciou-se Watson, pela primeira vez desde que entrara no quarto.

                 _ Não exatamente. – agora ela olhava diretamente para mim. – Segundo o que Stanpleton me contou, quando confirmou as palavras de Roxanne, ele havia se apaixonado pela filha de um policial há alguns anos. Contudo, os pais dela não permitiram que ele a cortejasse por saberem demais sobre o passado de Stanpleton, durante uma de suas temporadas em Paris. Matou os pais dela, a fim de tirá-los do caminho e casar-se com a órfã. Porém, esta órfã fora deixada sob a proteção de Sherlock Holmes, mesmo sem que ela soubesse. Stanpleton não queria envolver seu nome com a polícia uma segunda vez e resolveu apenas observá-la de longe.

                 _ Tentou esquecê-la com Roxanne. Planejou a morte da esposa para casar-se com ela. Doses muito menores do que as de Roxie de Bella Donna, para parecer que havia sido morte natural. Contudo, por um momento o sentimento pela filha do policial começou a aflorar novamente. Queria tomá-la, nem que fosse para satisfazer a curiosidade. Mas esta já estava há tanto tempo com o senhor Holmes, que segundo as fontes de Stanpleton se apaixonou por ele. Hector ficou furioso e o desejo de morte foi mais forte. Continuou a envenenar a esposa e planejou a morte de Roxanne para não ter mais que cumprir a promessa e ficar livre das ameaças dela quanto à mesma. Por fim, a morte da filha do policial, já que segundo ele, se não pudesse tê-la, ninguém mais teria.

                 Todos olharam para mim, inclusive Sherlock Holmes. Naquele momento, eu não sabia o que era pior. Descobrir o motivo da morte de meus pais ou que agora, Holmes saberia que eu o amava. Sim, com certeza era a segunda opção. Por que tinha que ser daquela maneira? Se eu confessasse, seria no aconchego de Baker Street e não em uma sala de bordel, com Lestrade e Watson a escuta. Corri para fora dali, parando ao lado de um poste na esquina, me segurando a ele e chorando. Céus... por que tudo na minha vida ter que ser tão difícil como um mistério sem solução? De repente, senti uma mão no meu ombro e era Watson. Ele não disse nada. Sequer riu. Apenas me guiou de volta para a carruagem. Voltaríamos para Baker Street para arrumar nossas malas rumo a Plymouth.

                  Não fiquei no quarto, para saber onde Stanpleton havia ido. Craiven contou depois que sai. Naquela noite, enquanto dormia, sonhei com meu pai. Era a primeira vez desde a morte dele. Estava andando por uma rua de Londres, quando ouviu o barulho de passos em poças d’água e parou de súbito. Ao se virar, se deparou com Lord Stanpleton apontando a arma para ele, mas não se mexeu.

                 _ Apenas me entregue sua filha e eu o deixo livre Bergerac. – dizia ele, segurando filhe o gatilho.

                 _ Jamais deixaria um covarde como você chegar perto de minha Anne. – disse meu pai calmamente e meu amor por ele cresceu naquele momento. – Já matou minha mulher. Mas nem em sonho, tocará na minha filha.

                 _ Eu a terei de um jeito ou de outro, não importa como você esteja. Porém, convenhamos... será tão mais fácil... se você estiver morto. – e atirou. O grito de horror que eu dei, jamais seria ouvido, afinal era somente um sonho. Contudo, volto a me questionar. Como posso ter sonhado, se pareceu tão real?  



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Notas finais do capítulo

O que a senhorita Bergerac fará agora? Eu não sei... se fosse ela... tascava logo um beijo no senhor Holmes.



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