Aira Snape - A Comensal escrita por Ma Argilero


Capítulo 35
Semelhanças


Notas iniciais do capítulo

Capítulo novo. Eu planejava escrever mais rápido, mas não sabia o que colocar. Esse é um dos capítulos mais importantes dessa reta final.



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Parecia uma daquelas cenas de filmes em que uma pessoa descontrolada quer revidar na outra e sorria psicoticamente. A não se pela peculiaridade de que ela estava mais assustada que psicótica

– Parkinson, por que está apontando a varinha para mim?

– Achei que fosse o Zabine.

Não fazia a mínima idéia por que ela iria querer amaldiçoar Zabine com um feitiço certeiro – pois se fosse ele que aparecesse ali não haveria escapatória – Achei melhor não fazer perguntas e fui para minha cama, onde me enrolei e peguei no sono quase que imediatamente.

•••

Eu não encarava Fred desde aquela noite. Já havia se passado uma semana desde que me deitei com ele. Eu me sentia mal toda vez que o via, mas não podia fazer nada para diminuir meu remorso. Eu fiz minha escolha e não voltaria atrás. Ketlen poderia me chamar de estúpida – se pelo menos ela soubesse do ocorrido -, mas simplesmente era o que eu podia fazer não só por ele, mas para todos.

Era véspera de férias de inverno. Eu nem tinha começado a arrumar minhas malas. Não era legal ficar perto da Parkinson, mas ultimamente ela estava calada e afastada. Desde o dia em que me assustei com ela apontando-me a varinha, estava estranha; mais do que o normal. Preferia-a afastada de mim, já que eu não sabia o que poderia fazer e nem entendia sua mente.

Ketlen estava resmungando alguma coisa com uma de suas colegas de quarto. Eu a observava, sem tocar em meu prato. Apenas havia bebido o suco. Não estava sentindo fome. Todos estavam em suas vidas normais; até as outras casas. Nem parecia que estavam presos e que voltariam à liberdade em breve. Talvez fosse essa a euforia – de ir embora, mesmo que por pouco tempo – que deixava a atmosfera menos fria.

A euforia não durou muito tempo. Um brilho prateado adentrou o salão e saltou sobre a mesa da Sonserina. Ele derrubava os pratos fazendo as pessoas gritarem e pularem dos bancos. Era um leão, que se aproximava cada vez de onde eu estava. Adiantando-me, levantei-me. O leão saltou no ponto em frente a mim e virou-se para me olhar.

– Aira... – o leão falara. Eu congelei. Aquela voz, eu a conhecia.

– Mãe? – o leão rugiu e sumiu em um brilho prata. Olhei para Ketlen ao meu lado e depois ao meu pai. Ele já saia da mesa e ia para a porta traseira. – Ketlen! – peguei o braço dela e a puxei com força para onde ele estava indo.

Eu sabia o que estava acontecendo, mas esperava que estivesse errada. Alcancei meu pai em uma saleta que eu nem sabia que existia. Ele estava parado ao lado da lareira segurando pó de Flu.

– Por que o Patrono da mamãe falou com nós? – Ketlen sabia. Ela devia ter visto-a o conjurar uma vez.

– Entre na lareira – meu pai não pediu com rigidez, mas sua expressão era de autoridade.

O seguimos dentro da lareira. E segundos depois, e cheia de cinza e pó, estávamos na sala de nossa casa. A primeira coisa que vi foi a mancha de sangue ao pé da escada, que se arrastava até o segundo andar. Minha mente começou a trabalhar em milhões de motivos para a escadaria estar manchada e não eram nenhumas boas.

Subia a escada correndo com os dois logo atrás. Adentrei o primeiro quarto, que eram dos meus pais, onde as manchas de sangue continuavam. Vi minha mãe sentada sobre uma poça de sangue, encostada à cama e segurava um embrulho pequeno manchado. As mãos dela estavam vermelhas, como se tivesse mergulhado dentro de um balde de tinta.

Ela levantou a cabeça à nossa entrada e sorriu de leve. Ajeitou o embrulho no braço e eu pude ver que era um bebê. Meu irmão recém nascido. Meu pai foi o primeiro a se mover. Ele abaixou-se perto dela e acariciou o rosto dela e depois deu atenção ao bebê, mexendo na manta com cuidado.

– Ele se parece com você – disse mamãe. Eu me aproximei e vi como ele era pequeno. Não dava para perceber semelhança com meu pai, mas ele teria cabelo escuro assim como ele eu. Seus olhos eram de um azul intenso. Pareciam duas bolas de gudes no rosto delicado e sonolento dele.

Meu pai apenas concordou com um “Sim” sussurrado. Eu queria saber o nome dele, mas isso podia esperar. Eu me abaixei ao lado de minha mãe e coloquei minhas mãos sobre o bebê. Ela entendeu o que eu queria fazer e deixou-me pegá-lo. O vendo em meus braços parecia uma boneca de tão pequeno, mas era pesado e quente. Ainda tinha algumas manchas vermelhas por causa do sangue.

Snape pegou minha mãe no colo e deitou-a sobre a cama.

– Saiam vocês duas.

Não esperei que ele repetisse. Esperei Ketlen sair e fui atrás, fechando a porta. Ketlen encostou-se na parede. Pela primeira vez vi que ela estava pálida. Quase na mesma intensidade que minha mãe se encontrava.

– O que houve?

Ela colocou a mão sobre a testa e respirou fundo.

– Não gosto de ver sangue.

Fobia de sangue era normal, mas achei que ela não iria se sentir desconfortável perto de sangue. Ela era filha de uma medibruxa.

– Está tudo bem?

Ela balançou a cabeça em negativo.

– Nunca vi tanto sangue. Acho... – ela passou a mão pelo cabelo – acho que preciso descansar.

Eu olhei para a porta e não havia barulho e nem sinal de que meu pai voltaria. Eu não queria retornar para Hogwarts e voltar no dia seguinte. Queria ficar ali e ajudar na recuperação de minha mãe e a cuidar do meu irmão. Eu entreguei o bebê para a Ketlen e ela me olhou surpresa.

– Leve ele para o banheiro. O limpe com toalha úmida pelo menos ou o lave na pia. Será mais fácil – minhas leituras e conversas de minha mãe adotiva com a vovó Olivia resultaria em algo. – Depois o ponha para dormir de lado – ela olhou-me como se eu fosse um extraterrestre. – Eu volto logo. Só vou pegar nossas malas.

Não seria tão rápido. Eu ainda tinha de arrumar a minha, mas daria um jeito de fazer tudo ser rápido. Voltei pela lareira e quando sai da sala, direto para o Salão Principal, não havia quase ninguém ali, exceto alguns que não haviam terminado o jantar.

Passei pelas mesas com olhos cravados em minhas costas. A mala de Ketlen era enganadora. Parecia ser leve, mas era pesada como se tivesse chumbo ali dentro. Eu deixei a mala na escada e parti para meu quarto. Arranquei o malão do lugar e o abri. Minhas roupas estavam ali, mas havia objetos sobre minha cama, algumas peças de roupa sobre a cadeira e pendurada no dossel da cama. Minha parte do quarto era uma tremenda zona. Arranquei tudo e soquei dentro do malão. Depois meus livros e coisas facilmente quebráveis como frascos e maquiagem.

Não demorou muito e eu já estava arrastando o meu malão leve e o chumbo de Ketlen. Eu não devia satisfação para ninguém que me perguntassem. Meu pai era o diretor e não me puniria por querer ajudar minha mãe. Sorte que eu morava na masmorra e era perto do Salão Principal. Eu não iria subir até o gabinete do diretor para usar a lareira.

Quando estava saindo da masmorra, alcançando o alto da escada, vi Draco de braços cruzados e olhando-me. Passei por ele sem olhar para trás. Não me importaria se ele queria manter distância para fingir que foi atingido pela minha “traição”, mas eu não fiaria correndo atrás de amizades quebradas.

Em casa, deixei as malas no quarto de cada dono e fui ver como Ketlen estava se saindo. No quarto do bebê, ela estava debruçada sobre o berço. Quando me aproximei, ela estava cantando baixinho uma canção de ninar. Ele dormia serenamente e estava limpo e de roupa.

Se ela teve ajuda ou não, o trabalho foi bem feito. Melhor do que esperaria.

Eu encontrei meu pai na sala, sentando na poltrona e lendo alguma coisa. Não queria interrompê-lo, então desviei de seu caminho. Mas era inútil fazer essas coisas, pois ele sempre sabia o que eu queria. E naquele momento queria saber como minha mãe estava. Ele deixou o artigo de leitura sobre o braço da poltrona e me olhou.

– Ok – falei. – O que aconteceu? E quero uma resposta completa.

Sentei-me. Não esperava que ele fosse breve. Ele nunca foi. E essa seria mais complicada de se argumentar.

– Hayley nunca deveria ter engravidado – eu sabia das complicações que ela teria, mas não se podia fazer nada. E minha mãe estava feliz com a gravidez. – Eu insisti para que ela ficasse na casa de alguma amiga para o caso de isso acontecer...

– O que aconteceria? – perguntei tentando decifrá-lo. – Ela ter o bebê por conta própria? Não é como se ela não soubesse o que fazer...

– Não somente o bebê nascer quando eu não estava aqui, mas ao que aconteceu a ela. Hayley poderia ter morrido. Os dois poderiam estar mortos agora.

Eu entendia o medo que ele sentia. Eu suspirei, tentando colocar meus pensamentos em ordem. Desde o inicio a gravidez de minha mãe era de risco e qualquer coisa poderia complicar o restante da gestação. Foi muito cuidado e atenção de todos nós que nada acontecesse a ela.

– Está bem. Eu sei o que poderia ter ocorrido. Mas eles estão bem, não estão? – quando meu pai não respondeu achei que não estivesse tudo bem. – O que aconteceu com a mamãe?

– Ela está bem.

Não era o que parecia ao vê-lo reagir daquela forma. Não esperei mais e corri até o quarto de minha mãe. Ela estava deitada na cama; ainda com as mesmas roupas. Mas parecia melhor. Suas bochechar voltaram a ter o rubor natural. Era difícil imaginar que ela fizera o trabalho toda sozinha. Ainda não entendia porque esperara tanto tempo para nos chamar.

Decidi por fim ficar sozinha. Passei boa parte da noite arrumando meu armário e organizando meu quarto. Ele estava limpo. Não existia mais um hiatus de três meses para uma faxina. Com minha mãe fazendo a limpeza ficava mais agradável entrar em seu quarto e vê-lo limpo e sem poeira acumulada.

Durante a manhã, Ketlen e eu ficamos de fazer o café. Meu pai havia retornado a Hogwarts. Ele nem se importara em perceber que nós duas ficamos em casa. Não seriam minhas férias preferidas, mas talvez mudasse agora com a presença de Leonard – Eu descobri o nome através de meu pai. Ele estava conversando com o bebê, enquanto o segurava em frente ao berço. Era estranho, mas algo agradável de ver. Meu pai nunca demonstrou paternidade – a não ser quando achava necessário defender minha honra ou sabe-se o que.

Sinceramente, Ketlen era horrível em tarefas manuais. Ela foi criada com requinte e talvez por ter vivido papéis no cinema não a ajudara a criar uma boa imagem na cozinha. Não me importava. Muito provavelmente não conseguiria engolir nem metade do que teria em meu prato.

– Sei que não sou a melhor cozinheira do mundo, mas... – olhei para ela, que colocava as torradas sobre a mesa. – Mas acho que você deveria comer mais. – ela cruzou os braços sobre o peito e olhou-me. Se ela queria parecer durona, ainda faltava muito treino. Ninguém dá credito para uma garota loira e ainda por cima usando uma camisola azul e pantufas de algum personagem do país em que ela vivia.

– Se eu comer tudo que neste prato ai – apontei com a cesta de pão para o prato ao lado dela, que já estava praticamente cheio – eu colocaria tudo pra fora em questão de segundos.

Ela olhou para onde apontei e sorriu. Depois recolheu o prato e mordiscou a torrada.

– Isso é para a mamãe – ela recolheu uma bandeja sobre o balcão e colocou o prato entre outras coisas. – Lembro que vi em algum lugar que depois de um parto, a mulher precisa repor energia. E acho que nada melhor que isso.

Ketlen estava se exibindo. Eu não a culparia. Sempre me gabava de saber das coisas na frente dos outros, agora era a vez dela. Apenas terminei de por a mesa e sentei-me, preparando-me para meu desjejum.

Ela não estava errada, mas acho que torrada não era algo muito agradável de comer depois de dar a luz. O ideal seria algo macio e cheio de caloria. Um bolo, por exemplo, ou a receita da idade média: rabanada. Minha irmã estava tentando ao máximo deixar de se parecer com a figura que todos estipulavam nela. Eu mesma fui uma dessas e ainda sou, mas não se pode fazer nada quando já se conhece sua irmã quinze anos depois.

– Não entendo – Ketlen adentrou a cozinha, trazendo a bandeja intocada – Mamãe disse que não quer comer.

Eu sorri e entreguei para ela um prato com um pedaço de bolo mais que suficiente.

– Ela não vai comer farinha enriquecida agora. Ela precisa de gordura mais eficiente – entreguei o prato em sua mão. – Tente o chocolate. Deve funcionar.

– Como pode ter tanta certeza?

Peguei um pedaço do bolo e contemplei a textura e seu gosto. Normalmente há milhares de sobremesas em Hogwarts, mas sentia falta de algo caseiro e com seus erros – como na medida da farinha, leite e até o chocolate. Eram dessas coisas que eu sentia falta quando estava na escola.

– Você não estava errada. Mulheres nesse estado precisam de comidas calóricas, mas quem come torrada quando se está cansado? Bolo é mais atrativo.

Ketlen bufou e depois sorriu.

– Não acredito que me fez subir lá com uma badeja – ela retirou tudo e colocou o bolo e uma xícara. – Café é bom?

Balancei a cabeça em afirmativo.

– Café é bom, se quiser que ela fique acordada. Dê leite quente. Ela precisa descansar.

– Como sabe de todas essas coisas?

Movi o garfo pelo prato, formando uma trilha de migalhas. Só havia mordiscado um pouco.

– Sabe os livros que ando lendo? Minhas fugas para a biblioteca? Estava lendo sobre medicina – ela fez expressão de surpresa. Era tão difícil acreditar que medicina para mim era interessante? - Medicina bruxa e trouxa não são tão diferentes. Estudam anatomia. A única diferença é que em uma se usa feitiços e em outro, objetos cortantes.

– Você me lembra a mamãe.

Eu não esperava por essa. Ketlen era a única pessoa que não falava que eu e a mamãe éramos parecidas. Todos que viam minha mãe e a mim, falavam da semelhança. Não era legal viver a sombra de uma pessoa. Eu já vivia na do meu pai e agora na de minha mãe não era a coisa mais esperada por mim

Ketlen deve ter percebido minha reação, que logo continuou:

– Não estou falando aparência. Você já deve estar cansada de ouvir que é parecida com ela. Estou querendo dizer que é a forma como age. Sua personalidade para ser mais exata – não estava entendo e duvidava que fosse entender. – Sabia que a mamãe estudava as disciplinas bruxas em Lafoise e também fazia faculdade de medicina?

– Uau!

– Uau mesmo – Ketlen sabia mais de minha mãe que eu. – Foi mais fácil para ela tornar-se uma medibruxa depois de formada em medicina trouxa. Ela batalhou muito. E acho que é por isso que você me lembra tanto a ela.

– Ketlen, não sei...

– Apenas escute – ela me interrompeu. Não deveria ficar ofendida, mas não queria que continuasse esse assunto. – Desde que eu me lembre à mamãe batalha. Nunca vi fraquejar em nada e nem voltar atrás em decisão alguma, mas com você ela mudou.

Ketlen pegou a bandeja e sorriu para mim, virou-se e saiu da cozinha. Como ela podia me deixar depois dessa conversa? Hayley Thompson mudou como?


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Notas finais do capítulo

Sinto que escrevo para fantasmas...



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