Karminna encontrava-se sentada na biblioteca, lendo um livro. Tinha o cenho franzido, concentrada, e balançava os pés. Algumas pessoas dizem que balançar os pés é um mau agouro mas... Karminna ignorava. Não acreditava em supertições de qualquer tipo. O sol entrava pelas cortinas cor de creme das janelas, iluminando o rosto da garota - por isso mesmo ela franzia a testa. O sol a incomodava um pouco.

Alguns alunos encontravam-se sentados nos confortáveis sofázinhos cor de musgo que decoravam o aposento com bom gosto. Alguns ouviam música, jogavam videogames, conversavam e, em último caso, liam. Karminna às vezes os lançava olhares de desprezo, julgando-os.

Alguém puxou ruidosamente a cadeira a seu lado. Karminna não virou o rosto, apenas mirou a pessoa que se sentava com o canto dos olhos, entreabrindo a boca. Parecia muito presunçosa.

A próxima coisa que Karminna viu foram os olhos verdes muito brilhantes de Aishi, que afundavam nos seus. Os olhos dela não tinham brilho.

- O que está lendo? - perguntou ele, sorrindo. Karminna não gostava muito de responder a perguntas, principalmente enquanto lia, portanto ignorou. Tinha preguiça de prolongar conversas.

- O que você tinha na cabeça quando resolveu trocar o dia pela noite, ontem? - perguntou ela, apenas porque tinha achado aquilo interessante.

- Ah - Aishi suspirou e riu - Bem, eu geralmente não me sinto muito confortável de noite, quando não tem claridade. Eu me sinto bem apenas no Sol... Nada muito preocupante, apenas um desconforto. Mas ontem, além de escuro, estava muito nublado, e eu estava começando a ficar com febre também... portanto fiz aquilo. Não imaginei que as pessoas ficariam tão revoltadas. - ele balançou a cabeça, ainda sorrindo.

Karminna achava Aishi muito curioso. Mais do que curioso, ela o achava muito bonito. Ela não conseguia tirar os olhos dele, mesmo que sem brilho.

- Resumindo: você não tinha nada na cabeça. Sabe, as pessoas não acham normal quando tem sol às onze horas da noite. É pedir demais. Mas... como você conseguiu fazer aquilo?

- Sabe o Liyn?

- Não.

- Ah... Bem, ele é um garoto de cabelos brancos com mechas meio negras... Ele tem uma irmã muito gostosa chamada Lua. - Karminna arqueou as sobrancelhas. - Eles são filhos da Lua. E eu, pode-se dizer, sou filho do Sol... Acho que, por causa disso, eu consigo controlar o sol. Mas penso que a vida dos filhos da Lua é muito mais difícil...

- Difícil...? - Karminna deu de ombros. Não era muito fã de conversas, e Aishi, apesar de sua aparência encantadora e brilhante, parecia um pouco superficial, na opinião dela. Queria ler seu livro, que era muito bom, por sinal.

- Sim - ele continuou, para a impaciência de Karminna - Dizem que eles são muito infelizes.

Infelicidade... Karminna nunca havia parado para pensar o que era ser feliz e o que era ser infeliz. Para ela, não existia o ser feliz, ser infeliz. Apenas estar. Nada é eterno, nem a felicidade, nem a infelicidade. Karminna queria dizer que discordava mas... Ela baixou os olhos para a capa de seu livro. Quarto, estava escrito com letras coloridas que contrastavam com o fundo branco. Era uma história incrível.

Naquele momento, Brad entrou na biblioteca. Ficava muito atraente com aquele estilo meio colegial desleixado, com a gravata frouxa, a camisa social meio aberta, e o all star com os cadarços constantemente desamarrados. Usava ainda aqueles óculos anos 80 pretos, que combinavam muito com ele.

O garoto de cabelos negros caminhava os olhos pelo aposento, entre as estantes de livros, provavelmente procurando algo interessante para distraí-lo à tarde. Seu olhar parou em Karminna e Aishi.

Brad abaixou os ombros, olhando especificamente para Karminna, como se estivesse decepcionado. A garota entreabriu os lábios como se quisesse dizer algo, mas ficou calada. Aishi sorriu com o canto da boca e mirou a capa do livro da garota.

- Então... O que está lendo, afinal?