Yoru no Hikari † Munashii Inochi ~ 空しい 命 †

Nascimento 

Àquela noite, recostava-me sobre o parapeito de uma janela qualquer daquele prédio abandonado, enquanto contemplava o líquido negro no qual se embebia minha frígida lata aberta de Coca-cola. Refletia sobre minha vida, o que tenho feito com ela, por que o faço e o que farei de agora em diante.

A conclusão atingida subordinava-se a deprimente. Não havia nada que me instigasse a tencionar-lhe ao meu futuro e minhas memórias passadas apenas expunham um vasto e fútil desperdício. O que fazer? Deveria, alguém como eu, deixar este mundo vagando minha posição na teia capital-alimentar para que seja melhor usufruída por outrem? Esta opção foi cogitada e não por apenas uma vez. Mas, não é como se eu a abominasse completamente... Apesar de não interessar-me por minha própria vida, o vasto campo de expectativas mostrava-se cativante.

Atraía-me observar as significativas mudanças ao passar dos tempos e explorar a mente de cada responsável ou afetado por elas. Este humilde passatempo me suportara a sanidade durante minha cavalgada neste labirinto torturante ao qual todos fomos submetidos. A mente alheia pode ser complexa, mas, é sempre tão cega a tudo... Por capacidade ou opção, parecia como se eu fosse o único a enxergar através de tudo e, portanto, apreciar esta observação.

Abruptamente, como se apenas para despedaçar minha meditação, tudo ficou estranhamente silencioso a ponto de não ser possível escutar mesmo o pulsar do próprio coração. Assim como meus fones de ouvido, todo o ambiente havia sido silenciado como se para, na ausência da audição, aguçar minha visão que, ao fundo do display de meu aparelho de mp3, despia minha mente dissolvendo meus pensamentos funéreos e sufocando-me na cena mais, profundamente, exuberante que pudera. Seus cabelos dourados entornavam-se sobre outra criatura da qual eu praticamente não tomei conhecimento e o líquido vermelho que jorrava mortalmente por sua mandíbula convidava meu sangue a juntar-se a ele.

Meu corpo se moveu independentemente da minha vontade, que, caso consultada, seguiria o mesmo caminho. Saltei de meu seguro e inevitavelmente tedioso abrigo em direção àquele delicioso aroma, atraindo a atenção daquele belo ser para mim.

Entretanto, o entrecruzar de olhares não foi o bastante para atenuar minha sede e o réquiem que se iniciara parecia intensificar cada sentimento do meu corpo tornando-me mais e mais sedento por aquele fascinante anjo das trevas adornado por sangue.

Erguendo-se em direção a mim, a encantadora luz anil, que, emanada por seus olhos, ligava-os aos meus, parecia cada vez mais vívida e seus fios dourados cessavam sua graciosa dança pelo ar e fluíam lentamente por sobre seus ombros. "Ousadia..." aquela doce melodia encontrou meus ouvidos, invadindo minha alma e preenchendo-os com um êxtase divino.

Suas mãos terrivelmente gélidas, que, ironicamente, faziam-me queimar a cada átomo do meu corpo, levemente embebidas em sangue, tocaram meus olhos e deslizaram até meus lábios selando-os enquanto ele balbuciava em meus ouvidos: "...Dame".

E, ao reabri-los, deparei-me com a habitual solidão, agora, decorada com uma angústia suavemente entorpecida por uma ligeira falta de ar e impregnada com o odor do sangue.