Eu estava quase dando pulinhos de felicidade no banco de trás da van alugada deles. Quer dizer, quais as chances de uma pessoa normal ser convidada a morar na ‘HellHouse’?

E agora eu estava indo para lá. Eu iria morar com os Guns.

Só notei que eu estava demonstrando demais a alegria (nunca fui boa em ocultar emoções) quando Duff me perguntou com um ar de deboche:

- Animada, princesa?

Sorri tão largamente que devo ter respondido a questão dele.

- Se a uns três dias tivessem me dito que eu iria parar na HellHouse em plenos anos 80, eu internaria a pessoa numa clinica de reabilitação... – respondi.

- Escuta Draffy, você não é realmente piradona certo? Esse negocio de futuro é muito... irreal para mim... – Steven, que dirigia, comentou.

- Eu suponho que não, Adler... – resmunguei confusa – Eu também acho tudo isso muito doido. Digo, era para mim estar em estado de decomposição no fundo daquele rio, junto com a minha moto...

Não pude evitar fungar nessa parte.

- Sua moto parecia ser bem especial, hum? – Duff continuou.

- Foi um presente. O melhor.

A van parou com um solavanco na frente do mini – apartamento, me jogando para frente.

- Merda! – soltei.

- Temos sorte do Steven dirigir hoje – Slash riu – Quando o Izzy dirigiu, quase morremos...

- Cala a boca, Slash – Izzy brigou saltando da van, com Axl logo atrás.

- Bem vinda a selva... – Steven sorriu irônico – As damas primeiro...

Revirei meus olhos tentando ao maximo parecer indiferente. Bom, não deu certo.

Assim que eles abriram a porta do apartamento eu quase tive uma sincope.

- Deus! É aqui onde vocês compõe as musicas? E fumam? E bebem? Slash, onde estão suas cobras? – tagarelei sem parar.

Eles me olharam com as sobrancelhas erguidas por um segundo.

- Ok, acho que... eu me empolguei. – reconheci.

- Como você sabe das minhas cobras?

- Eu sou do futuro, lembra-se? – fiz minha melhor cara de ‘dãh’.

- Olha, estas são chaves extras – Adler me mostrou – Geralmente elas ficam com o porteiro, para o caso de estarmos drogados o suficiente e ficarmos presos para fora...

Assenti.

- Você fica com elas, e pode entrar e sair quando bem quiser... Só não as perca. Nunca se sabe quando Slash vai ficar doido o bastante para trancar todos nós para fora. Seu trabalho é abrir a porta quando nos ouvir bater.

Cruzei meus braços.

- Meu trabalho?

- É... seu trabalho.

- Eu por acaso tenho cara de babá?

Ele apenas soltou a chave na minha mão.

Tentei protestar.

- Isso é abuso. Exploração. Preconceito. Machismo. PORQUE EU NÃO POSSO ME DROGAR TAMBÉM???

Pude ouvir um suspiro coletivo.

- No que nos metemos... – Duff reclamou.

- Querida... – Axl falou num tom de falsa paciência – Você não é parte da banda...

- E...

Ele suspirou novamente.

- Você mal tem 17 anos...

- Tenho dezoito.

- Porra. Quer se drogar? Se drogue. Não ligamos. Só não nos incomode tanto. Acha que consegue fazer isso?

- Vou ser tratada como igual perante a vocês? – exigi.

- Tanto faz...

- Então beleza, vou conhecer a vizinhaça. Tentem não se drogar ainda...- reclamei azeda – Afinal, a mamãe não vai estar aqui para abrir a porta...

Fiz questão de bater a maldita assim que sai.

POV. Duff:

Assim que nosso mais novo problema saiu, Axl soltou uma torrente de palavrões.

- Merda, Slash! Olha no que você nos meteu!

- Desculpe, Oh Deus do Rock, eu só achei ela bonita...

- Isso não quer dizer que ela seja flor que se cheire... – Izzy comentou.

- Olhe pelo lado bom... – brinquei – Agora você tem mais uma cobra, e ela se chama Dafne.

- A mais letal e venenosa de todas... – Steven acompanhou. Todos riram.

- O que ela deve estar fazendo agora? Matando os vizinhos da frente? – Izzy comentou.

- Hum... não – Steven falou – Ela esta sentada na beirada da piscina conversando com a vizinha gostosa.

- Ótimo, talvez ela seja útil e atraia a mulher pra gente – Axl resmungou.

- Não era você que estava reclamando dela agora a pouco? – Izzy debochou.

- Mas cara, ela pode sim ser útil... – Slash olhou para nós com aquela cara que ele faz quando tem planos ‘brilhantes’.

- Oh não... – murmurei.

- Oh sim... – ele continuou – Sabe, ela é jovem, bonita e rebelde. Isso é uma imagem e tanto para a banda e...

- Você quer coloca-la na banda? – deduzi.

- Não – ele fez um gesto de descaso com a mão – Por hora. Mas podemos usa-la nos clipes, hum?

- Não é uma má idéia... – Izzy ponderou – Mas a questão é: Ela vai aceitar?

- Sei lá – Slash deu os ombros acendendo um cigarro – Podíamos tentar...

POV. Draffy:

Desci as escadas do lugar (o elevador estava quebrado) fumegando de raiva. O que eles achavam que eu era? Uma babá de deliquentes? Ah, eu ia deixar bem claro quem era o delinqüente juvenil ali, e com certeza não era nenhum deles.

Cheguei ao térreo onde encontrei uma piscina. ‘Bom, ao menos temos uma piscina’ pensei mal – humorada.

Tirei minhas botas e mergulhei ao estilo bola de canhão nela, de roupa e tudo. Só depois, fui refletir que não fora uma idéia muito inteligente, já que estas eram as únicas roupas que eu tinha aqui.

Emergi pronta para sair e me secar ao sol, mas a cara azeda de uma mulher me parou. O chapéu de palha encharcado lhe caia sob o rosto, mas não ocultando a maquiagem colorida – e agora borrada – ou mesmo sua expressão de ante gosto.

- Você – ela acusou apontando sua unha carmim e bem – feita para o meu rosto – Me molhou inteirinha!

Que belo modo de conhecer a vizinhança, Dafne...

- Desculpe – sai da água torcendo meu cabelo -          Não te vi aí.

- Humpf – ela resmungou pondo os óculos de sol e se esticando numa espécie de cadeira de praia.

Ficamos num silencio constrangedor, abafado apenas pelos pingos caídos de mim e pelas paginas da revista da moça, sendo viradas.

- É nova aqui? – ela perguntou me tirando dos devaneios.

- Sim, vim de... New Jersey – menti.

Ela assentiu.

- Sou Ramona Platen, mas todos me chamam de ‘Glister’ – ela se apresentou.

- Dafne. Ou só Draffy.

- Onde é seu apê, Draffy?

- Estou no 39. – respondi vagamente.

Os óculos vermelhos desceram pelo seu nariz fino, deixando os olhos chocados a mostra.

- Você está falando sério?

- Estou – dei os ombros. A essa altura nem eu me importava mais com isso.

- Deus! – ela prendeu a respiração – Que show!

- Não é tanto – retruquei amarga – Eles acham que eu sou uma espécie de babá deles e...

- Mas como você parar logo aqui? – ela me cortou – Você não é uma...

- Não. Sou sobrinha do empresário deles – continuei inventando – Fugi de casa recentemente e achei que meu tio me abrigaria, mas eu estava enganada...

- Eles se ofereceram para ficar com você?

- Sim.

Ela me encarou fascinada, como se eu fosse o ultimo sapato Dior do deserto.

Eu, ainda molhada, tremia involuntariamente. Ela notou.

- Com frio?

- Um pouco. Eu não devia ter pulado na piscina...

- Por que não pegou um biquíni.

- Eu não tenho um. Esqueci minhas coisas em casa.

- Pobrezinha! Venha querida, vou te emprestar roupas quentes, e amanhã, vamos às compras!

Arregalei meus olhos. Só a possibilidade de fazer compras me aterrorizava. Mas ela me carregou pelo corredor apesar dos meus protestos.

Cara, onde eu me meti.