Speranza escrita por Hikaru_S_River


Capítulo 3
O retorno da esperança.


Notas iniciais do capítulo

Lavi x Hikaru.

Hikaru - By Hikaru S. River.



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O retorno da esperança.

Lavi x Hikaru.

Não entendia muito bem para onde o Allen havia sumido e tão pouco para onde a Ayami havia fugido. Talvez ela estivesse com vergonha de se encontrar com o Bak-san depois de tudo que acontecera ou apenas quisesse se excluir como eu e deixar a dor aparecer um pouco para enfim se aliviar de toda a tensão que ela nos causava. Como eu queria que aquilo fosse fácil.

                Os corredores da Ordem estavam desertos e os barulhos da festa se tornavam fracos a medida que eu me afastava daquela atmosfera feliz e gritante. Não conseguia sorrir sinceramente enquanto meu coração chorava miseravelmente dentro de mim, sentindo a dor e a solidão que só pareciam ter evoluído com o passar daqueles malditos anos. Infernos, por que eu não conseguia me fazer de forte e me tornar forte o suficiente para seguir com a cabeça em frente, olhando o horizonte com segurança e firmeza?

                Não adiantaria nada me perguntar aquilo e no fundo saber que tudo parecia ter sido em vão. Com um suspiro derrotado passei a me concentrar apenas nos passos que ecoavam nos corredores esquecidos da nova Sede, deixando para trás todos os meus fantasmas e ilusões, ou pelo menos tentando. Durante meu caminho resolvi pensar no nada ou em qualquer coisa que não fosse um ruivo de tapa-olho com um lindo olho verde me olhando. Já estava entrando em crise quando precisei parar bruscamente antes que batesse com a cara na porta de madeira. Levantei o olhar e vi o letreiro em dourado escrito: ‘BIBLIOTECA’. Nossa, muito bom. Estava tentando me esquecer dele e o local para o qual eu ia simplesmente era o que mais me fazia lembrar dele.

“Raios!”, gemi irritada, abrindo a porta com força.

                As luzes estavam acesas, mas não parecia haver ninguém ali dentro. Suspirei mais aliviada, pois por mais que aquilo me doesse o peito, eu sabia que era um dos poucos lugares que me fazia sentir próxima dele. Lembranças da antiga Sede vieram em minha cabeça como as que em diversas vezes enquanto ia procurar alguns arquivos na biblioteca, o encontrava deitado no sofá dormindo com o livro aberto e repousando em cima do peito, me fazendo cobri-lo para não se resfriar ou até acordá-lo quando já era muito tarde.

                Caminhei lentamente até uma das mesas e vi os diversos livros espalhados e abertos, esquecidos ali talvez por um tempo. Sorri de leve ao perceber que era daquela forma que Lavi deixava a maioria dos livros quando os estava estudando. Lentamente guiei os dedos da minha mão direita em direção ao livro maior tocando sua página e sentindo sua textura irregular a medida que deslizava pelas palavras, percebendo que era ocasionada pela concentração de tinta das letras, assim como sua temperatura quente por conta da lâmpada há muito acesa.

                Não adiantava. Por mais raiva e ódio que eu nutrisse, mais amor e carinho eu sentia por aquele rapaz que deveria estar um homem agora. Permitir-me perder em pensamentos por um tempo indeterminado e talvez continuaria assim se não tivesse sentindo a presença de alguém próximo a mim. Vir-me-ei e permaneci em alerta, olhando para todos os lados possíveis.

 “Quem está aí?”, perguntei deixando o eco soar pelo cômodo.

                Nada. Ninguém além do silêncio gélido e cruel me respondera. Senti os dedos das mãos e dos pés formigarem levemente pela tensão que aquela maldita sensação de estar sendo observada me fazia ter. Pouco me importei com a respiração acelerada e o frio que me corroia o estomago, ou com o leve tremor que minhas pernas adquiriram. Não. Não poderíamos estar sendo atacados, não quando todos estavam felizes e se divertindo pela volta do Allen. Puxei a respiração com força e procurei me acalmar aos poucos ou tudo sairia por água abaixo.

                Dei alguns passos em direção a porta até que senti uma presença sombria atrás de mim, e por ato reflexo retornei a minha posição contrária, permanecendo de olhos atentos a figura a minha frente. Por um momento o arrependimento me acertou como uma flecha ao me encontrar com um rapaz coberto por um manto negro e uma roupa oriental preta com detalhes verdes e dourados. O jovem tinha ambos os olhos verdes e uma expressão fria de gelar a alma. Permaneci de olhos abertos e o queixo caído ao perceber quem era que estava a minha frente.

                Deak.

“Há quanto tempo.”, a voz fria soou e me cortou o coração sem piedade.

                Não consegui responder, talvez pela surpresa ou mais pelo choque de vê-lo a minha frente e tão mudado. Fiquei sem ação, permanecendo estática onde estava tentando processar tudo que havia acontecido até ali. Era impossível acreditar que o garoto que eu conhecia desde que nasci se encontrava a minha frente me olhando com tanta frieza e distancia. Por acaso eu tinha feito algo errado antes de ser deixada de lado? Por que ele estava me tratando daquela maneira? Aquele não era o Lavi que eu conhecia ou que já dissera que me amara.

“Pois é, há quanto tempo Bookman Jr.?”, respondi dando passos para trás e me mantendo firme.

                Se ele achava que eu ia entrar em prantos e reclamar do seu modo de agir como fazia, Lavi estava muito enganado. Já não era mais a adolescente que corria atrás dele e sim uma adulta que optara em tentar esquecê-lo, mesmo que sem muito sucesso. Por mais que o quisesse xingar, bater e gritar com ele internamente, precisava acima de tudo controlar meus impulsos assassinos e explosivos.

“Bookman, apenas.”, o escutei falar.

“O que disse?”, arqueei a sobrancelha e os braços. “Ah, aquela múmia te nomeou como Bookman oficial? Aleluia, hein?”, droga, o meu jeito sarcástico estava voltando e isso não era coisa legal. “Pelo menos você me trocou por alguma coisa que valha a pena, não é? Quer saber de uma coisa, Bookman?”, frisei a ultima palavra com desdém. “Volte logo para aquele dinossauro e aproveite a sua vida viajando pelo mundo. Passar bem.”, falei ríspida, dando-lhe as costas.

Eu precisava sair dali e para isso eu precisaria correr para bem longe antes que as lágrimas caíssem e a angustia me encontrasse. Ali estava a prova de que ele escolhera me abandonar para sempre e me trocar por um futuro de viagens e conhecimentos sobre povos, nações e guerras. Ele escolhera a história como esposa e eu já não mais significava algo para ele. Nada que valesse a pena lutar.

Queria fugir dele o mais depressa, precisava extravasar minha raiva, minha dor e minha magoa antes de ser engolida pelo vazio que me rodeava. Da primeira vez que ele me abandonara me senti apenas coberta de saudade, mas daquela vez eu me senti traída, trocada e esquecida pelo homem que mais amara e desejara. Ele por outro lado, optara me esquecer e viver a sua vida longe de mim. Talvez fosse melhor fazer o mesmo.

Continuei a andar, sem coragem de fitar-lhe os olhos, afinal, não podia olhá-lo e ver que aquele ruivo que se encontrava na minha frente não tinha mais o sorriso alegre e por vezes arteiro, ou as expressões meigas e sapecas. Que não parecia exibir nenhuma das expressões tão características dele como a de alegria, preocupação, raiva ou diversão que tanto brincava em sua face no decorrer dos dias que passamos juntos na Ordem ao lado de nossos amigos. Não havia mais nada além daquele rosto sem expressão que parecia ter adotado.

Precisei andar firmemente para não olhar para trás e sucumbir à fraqueza de correr para abraçá-lo e senti-lo perto de mim, dizendo que tudo ficaria bem. Não agüentava mais passar por todos os meus sentimentos, meus medos e meus desejos apenas para suprir os dele. Agora eu merecia sua atenção, e se ele não estava disposto para tal, então que me deixasse seguir em frente sem ele.

Ao chegar à porta fui pega de surpresa ao sentir sua mão quente envolver a minhas num agarro apertado e no momento seguinte me fazer virar para ele. Parei o olhando sem fala, sentindo minha respiração falhar e meu sangue gelar só de observá-lo com aquela expressão de dor. Não era possível, era? Não, por favor. Não me faça voltar atrás de uma decisão que custei a aceitar. Virei o rosto e fechei os olhos para não encará-lo e fraquejar novamente.

“Hikaru”

Não me chame. Não me puxe.

“Por favor...”

Não fale. Não peça. Não me dê esperança.

”Olhe para mim.”

Abri os olhos e permaneci alguns segundos parada olhando para a sua roupa, e o estado em que ela se encontrava, até criar coragem o suficiente para olhá-lo. Respirei fundo e levantei o olhar, ignorando a confusão de emoções que borbulhavam em meu peito. Nossos olhos se encontraram e após esse simples contato senti o ardor familiar, provocado pelas lágrimas, me tomar os olhos ao reparar que lá estava ele. O antigo Lavi. O meu Lavi.

“Por que você fez isso?”, perguntei sentindo os meus lábios tremerem.

“Me perdoe. Eu... tive que seguir em frente.”

“E eu, Lavi? Droga! E eu como fico nessa história toda? Deixada para trás. Esquecida como um brinquedo velho? Merda, Lavi! Eu sou sua irmã, droga!”

“Hika... Eu...”

“Você nada! Eu me sacrifiquei para te encontrar. Assinei um contrato com os Noahs acreditando que conseguiria te achar nesse mundo gigantesco em que vivemos. Me tornei uma Exorcista por você! Logo que você foi embora, quase fui condenada a pena de morte por isso e se não fosse o Komui eu estaria morta, sabia? MORTA!”, meu pranto já saía sem cerimônia, enquanto gritava para ele e talvez para o mundo todo o sofrimento que guardara por tanto tempo. “Onde você estava todos esses anos que passei fome e frio, procurando por você? Onde VOCÊ estava quando  vi que a única forma de te encontrar era fazendo um acordo com os NOAHS, Lavi?! Onde VOCÊ estava quando EU corri risco de vida?!”, me soltei bruscamente se seus braços, gesticulando em mil direções a cada entonação que fazia. Minha respiração estava acelerada e a dificuldade de falar já estava presente, mas continuei seguindo em frente. “Eu sei onde você estava, Lavi. Você estava seguindo em frente e me esquecendo completamente...”, as lágrimas já corriam desesperadas, uma atrás da outra. “E mais uma vez você está seguindo em frente, enquanto eu...”, ri em desespero, precisando engolir para não permitir que a garganta secasse. Levei uma das mãos aos meus cabelos, passando-a por eles. “Eu estou aqui parada no mesmo lugar e com mesmo objetivo infeliz. Te encontrar novamente...”

Ri de lado numa atitude impensada, agarrando-me ao meu próprio corpo e sem qualquer medo de mostrar o quão frágil eu já me encontrara ali, a sua frente. O silêncio deixara de existir apenas pelos infinitos soluços que escapavam de meus lábios.  Droga, não deveria estar chorando daquela forma patética ou fraquejando ali na frente dele como uma criança. Estava tão concentrada em tentar controlar o choro que não percebi quando ele se aproximara e logo em seguida me envolvera em seus braços num abraço apertado. Eu queria lutar contra aquele gesto, mas ao sentir seu calor e seu corpo grudado ao meu, todos os meus esforços se tornaram em vão.

“Hikaru, eu tive de ir embora depressa por que o velho estava doente. Não sabíamos o que era e há quanto tempo ele já tinha a doença alojada em seu corpo, por isso viajamos para a China em busca de remédios e de uma possível cura, mas não encontramos nada que servisse de cura para a sua tuberculose. Não havia nada que o pudesse salvá-lo.”, senti o corpo dele tremer colado ao meu e a angustia que vivia em sua voz. “O tempo foi passando e a saúde dele só foi piorando a cada dia. Eu já sabia que não havia mais nada o que fazer, mas continuamos avançando e procurando alguma coisa que o melhorasse. Infelizmente seu corpo já estava desgastado e debilitado pela idade e não suportaria muito a doença. Nossos últimos dias viajando foram carregados de um clima tenso e triste. Tive de aprender a lidar com todos os medos e pensamentos ruins que vinham me visitar a cada dia e noite que o vi demorar levantar da cama. Dias depois o velho Bookman morreu em meus braços, Hika...”

“Lavi...”, levantei meu olhar e observei sua expressão sofrida.

“Eu sei que você e o velho não se davam bem, mas a última coisa que ele disse para eu fazer foi voltar para você.”

Fiquei sem palavras. Mesmo depois de ser sempre testada pelo Bookman, ter certas coisas esfregadas na cara, ele falara aquelas palavras para o seu discípulo que mais considerava como um filho? E eu fazendo mau juízo dele durante tantos anos. Aquilo fez com que me sentisse péssima, para não dizer um monstro.

“Por mais que eu passasse por tudo aquilo, a única coisa que me dava paz era pensar em você, Hikaru. Lembrar de seu sorriso, de seu olhar e até as broncas que você dava em mim eram a energia e o vigor que precisava para conseguir seguir em frente. Eu só queria ter você de volta, mas antes tinha de cuidar do velho e de tudo mais. Depois que ele se foi, precisei ir até a sede central dos Bookmen para comunicar sua morte e foi aí que ganhei a alcunha de Bookman apenas.”

“Por que você voltou, então?”, eu não queria escutar aquilo.

“Eu precisava entregar a Innocence do velho para o Komui e também...”, o vi respirar profundamente e logo depois senti encostando seu queixo no topo de minha cabeça. “Precisava ver você.”

Agarrei suas vestes com força tentando mostrar que eu estava ali para ele e que sempre estaria. Ignorei minhas razões e pensamentos naquele instante, pois eu só queria ficar com ele e sentir que era realmente o Lavi que eu conhecia que estava ali. Consegui escutar seu choro baixo e no instante seguinte senti seus braços se fecharem ao redor do meu corpo.

“Me perdoe. Eu sei que você sofreu bastante por minha causa... Posso não ter real idéia do que você passou, mas eu só peço... Perdão, Hikaru.”

“Tudo bem. Esqueça isso por enquanto. Agora você precisa é descansar um pouco, vem.”, segurei em suas mãos com cuidado, abaixando seus braços e o puxando em direção ao sofá. “Pode deixar que sua dor saia agora, nii-san. Não precisa mais temer ou prendê-la. Eu já estou aqui com você.”

E ele fez. Toda a tristeza que guardava dentro de si por todo aquele tempo saíra. O ajudei a sentar e fiquei ao seu lado, acariciando suas costas com uma das mãos, enquanto a outra agarrava o seu braço forte. O vi abaixar a cabeça e as suas lágrimas rolarem uma atrás da outra em silêncio, enquanto seu semblante se mostrava sofrido e derrotado.

Lá estava o homem que eu conhecia como ser o meu irmão. Eram durante aqueles momentos que eu percebia o quanto só eu e ele nos entendíamos e podíamos nos mostrar realmente quem éramos um para o outro. Sem medo ou receio de expor nossas fraquezas e medos, ou angustias e desesperos. Ele era o único que conhecia a verdadeira Hikaru, e eu era a única que conhecia o verdadeiro Lavi.

Ficamos em silêncio, cada um imerso em seus pensamentos até que ele fora o primeiro a se manifestar. O senti me agarrar o pulso e me puxar para o seu corpo, nos fazendo cair sobre o sofá, e por fim me colocando deitada sobre o seu corpo. Preferi ignorar o leve ardor que senti em minha face e me pus sobre seu peito, sentindo o calor que ele emanava ao mesmo tempo em que escutava as doces batidas do seu coração. Aconchegei-me mais, me aninhando em seus braços e sentindo pela primeira vez após aqueles cinco anos, que finalmente eu estava em casa.

“Obrigado, Hikki.”

“Hum?”, levantei o rosto sentindo-o corar ainda mais após ele me chamar pelo apelido de infância.

“Por nunca ter perdido a esperança...”

Ele não me deu tempo para responder, afinal, no segundo seguinte seus lábios capturaram os meus num beijo intenso, fazendo-me sentir aquele gosto doce e o calor que tanto sentia falta mais uma vez. Não consegui conter a explosão de sentimentos que ocorria dentro de mim ao sentir todo o desejo e necessidade que estava impregnado naquele beijo e que nunca deixara de existir da parte dele. Eu estava feliz por perceber que ainda vivíamos um amor intenso e que poderia nos afogar naquele mar de desejo e saudade no qual mergulhávamos sem medo de continuar a ter a esperança.


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Notas finais do capítulo

Continua...



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