Me lembro como se fosse hoje a primeira vez que a vi. Tínhamos por volta dos dezoito anos e estudávamos na mesma faculdade. Eu fazia direito e ela relações públicas. Nossas salas ficavam no mesmo andar, mas não eram tão próximas.

Eu me matava como estagiário em um escritório de advocacia no centro da cidade e com o maravilhoso chefe que eu tinha, costumava chegar todos os dias atrasado, pois ele sempre me dava trabalho extra. Só trabalho!

Foi em um desses dias que cheguei atrasado, só para variar que falei com ela pela primeira vez.

Na minha sala de aula havia uma televisão e geralmente os outros cursos a utilizavam também, mas para isso tínhamos que trocar de sala. Eu sabia disso, mas cheguei tão apressado que nem me atentei ao aviso na porta de que minha turma estaria em outra sala. Entrei e me sentei no meu lugar de costume.

Estranhei primeiramente a sala. Estava mais cheia que o normal e o professor ainda não estava lá, mas mal olhei para as pessoas, o que queria mesmo era que as horas passasem rápido pra eu ir logo pra minha casa, tomar um banho e me jogar na cama.

Peguei um caderno e fiquei relendo a matéria enquanto o professor não chegava. Só aí notei que havia alguém na carteira da frente e acabara de se virar para falar comigo.

 - Oi, se transferiu de unidade ou de período?

 - Como? – perguntei sem entender nada.

 - Perguntei se você veio de outra unidade ou se veio de outro período. Nunca te vi aqui.

Aquela garota não devia estar falando coisa com coisa. Como nunca me viu lá? Eu chegava atrasado quase todos os dias, mas raramente faltava.

 - Acho que você está se confundindo, eu sempre fui dessa turma.

 - Não mesmo! Nunca te vi aqui e conheço todo mundo.

Ela já estava começando a me irritar com aquela conversa sem lógica, até que o professor entrou na sala. Só aí me dei conta de que estava no lugar errado.

 - Que curso é esse? – perguntei pra ela sem chamar a atenção dos demais alunos.

 - Relações públicas.

Eu não sabia onde enfiar a cara. Fechei o caderno e devo ter ficado tão vermelho quanto um tomate. Ela que agora não entendeu nada quando me viu sair da sala quase correndo.

Pra minha sorte como eu sempre chegava atrasado, ninguém da minha turma notou o meu engano.

Ao fim da aula eu fiquei um tempo mais na sala refazendo algumas questões que eu havia perdido. Mais uma vez percebi que alguém sentou na minha frente e parecia me encarar. Quando levantei a cabeça para ver quem era, lá estava ela. A tagarela de relações públicas.

 - Nossa não precisava ter saído daquele jeito. Não viu o aviso na porta dizendo que hoje as salas estariam trocadas?

Só aí reparei o quanto ela era bonita. Tinha os cabelos negros ondulados um pouco acima da cintura, a pele cor de pêssego e os olhos de um castanho brilhante.

 - Cheguei atrasado, nem notei aviso nenhum. – disse voltando a escrever.

 - Você é sempre assim?

 - Assim como?

 - Seco.

Ao ouvir aquilo olhei pra ela que me encarava. Parei de escrever e cruzei os braços.

 - Seco? – perguntei

 - Isso mesmo. Estou aqui tentando puxar assunto e você nem aí. Ao menos você poderia me dizer seu nome.

 - Diz o seu primeiro. – falei olhando pra ela com um riso torto.

 - Não, eu perguntei primeiro.

 - Você não perguntou nada, disse que eu poderia ter dito o meu nome, mas não perguntou qual era.

 - Que seja!  - disse ela parecendo nervosa, mas podia ver que era brincadeira.

 - Fábio. Feliz em saber?

 - Agora sim. – disse com um riso no rosto – Viu como é fácil?

 - Diz o seu agora.

 - Milena, muito prazer.

Ela me estendeu a mão e me deu dois beijos no rosto. A cada minuto tinha mais certeza de que aquela garota era doida.

 - Bom, só vim me apresentar e ver se você havia encontrado a sala certa. Nos vemos por aí qualquer dia. – disse ela ao sair.

Fiquei sem entender nada. Mas também nem me importei, voltei a fazer o que estava fazendo e assim fiquei até a aula recomeçar.

Graças a Deus aquela noite foi como eu havia desejado. As horas voaram e antes que eu percebesse já estava em casa pronto para dormir.

Cai na cama e dormi como uma pedra, porém isso não impediu que no dia seguinte ao me levantar para trabalhar tivesse um sorriso em meus lábios e um nome em minha mente. Milena.