Céus de Agosto escrita por Blue Dammerung


Capítulo 1
Capítulo 1: Tarde de Agosto


Notas iniciais do capítulo

Ah, eu sei que o Canadá tem 1,77 de altura (TUDO ISSO?!) mas como aqui ele só tem 16 anos, façam de conta que ele tem 1,65, sim?

Toda linguagem, assim como os lugares, costumes, roupas, colégios e nomes são puramente ficcionais.

Boa leitura ~~



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Final de agosto, o clima estava quente, o que fazia com que gotas de suor corressem sobre sua nuca. Fim do verão, fim das férias. No dia seguinte começariam suas aulas, o que já era bastante para que uma tristeza muda se abatesse sobre ele.

Caminhava, em silêncio, como se estivesse sozinho e não atrás de seu irmão mais velho e dos amigos do mesmo, nas belas embora comuns ruas de uma cidade qualquer da Europa, nem velha nem nova nem grande nem pequena, uma cidade qualquer com habitantes sociáveis e gentis.

Mas o calor deixava tudo desagradável mesmo que o sol já estivesse se pondo naquele torturante céu de agosto infernal, a mochila de um dos amigos do seu irmão pesando nas suas costas. Por que tinha ido com eles mesmo? Ah, sim, sua mãe não queria que ficasse em casa sozinho (mesmo já sendo “quase” um rapaz) e sempre o mandava com seu irmão e sua gangue que, por sua vez, sempre o usavam como escravo.

Teria ainda pensado sobre sua pobre e dolorosa vida e ainda sobre o amanhã torturante que as aulas trariam, os alunos novos, começo de ano letivo, novos professores, matérias, livros e novas pessoas para lhe colocarem em situações constrangedoras. Teria ainda suspirado consigo mesmo se nesse mesmo momento não tivesse se esbarrado com seu irmão, que parara de andar de repente, apontando para o outro lado da rua.

-Olha só! Trocaram de guarda! Aquele velho de antes foi embora, ainda bem!-Exclamou Alfred, um sorriso de deboche no rosto.-É só um alemão, vejam só! Ele é um alemão, né? Nem deve conhecer nada daqui, que idiota. Matt, por que você não vai lá lhe dar as boas vindas?

-E-Eu n-não acho b-boa ideia...-Murmurou, fitando o chão, seu irmão lhe empurrando para a rua enquanto seus amigos riam do menor, obrigando Matthew a atravessar a mesma antes que algum carro viesse.

-Matt, você só precisa dar um tapinha nele! Molenga!-Exclamou Alfred, do outro lado da rua.

-Mas...

-Mas nada! Se você não fizer isso, vamos rasgar seus livros!

O menor engoliu em seco e acabou por se virar para frente, fitando o homem há alguns metros de si, o rosto fechado como se não tivesse ouvido nada, as mãos atrás das costas, um revólver na cintura e um cassetete do outro lado, o uniforme azul escuro imponente e desafiador.

Matthew engoliu em seco. Não queria estar ali, claro que não, mas não duvidava que seu irmão e a corja dos seus amigos rasgassem todos os seus livros. Engoliu em seco mais uma vez, o clima de agosto lhe fazendo suar ainda mais.

-Oi...-Murmurou, aproximando-se com passos pequenos até ficar de frente para o homem, sem nem sequer atrair seu olhar gelado.

Os guardas dessa cidade qualquer da Europa se assemelhavam muito com aqueles da Inglaterra e da Suécia, parados, em silêncio e inofensivos até você fazer alguma coisa errada ou que os ameace.

E Matthew sabia disso, por isso pigarreou, girou a ponta dos pés na calçada, entortou a barra da camisa e, com a voz quase inaudível, murmurou:

-Olha meu irmão quer que eu bata em você mas é bem de leve então se você não me bater de volta nem nada eu agradeceria porque eu preciso te bater senão meu irmão vai rasgar meus livros e eu gosto muito deles então me desculpe logo eu nem deveria ter vindo aqui por favor não me bata!-E levou a mão até o braço do outro, um semi-tapa de tão leve, pseudo-tapa, falso tapa, mais uma brisa do que um tapa, mas ainda assim, um tapa.

E por isso, antes que abrisse os olhos (porque os tinha fechado numa tentativa falha de amenizar a besteira que estava fazendo), sentiu uma mão forte e enluvada, quente naquele clima de final de agosto, agarrar-lhe o pulso, puxar-lhe, fazer coisas que não conseguiu perceber e antes que visse foi ao chão, um joelho então em suas costas, outro joelho ao seu lado na calçada, um de seus pulsos sob seu peito e o outro ainda sendo segurado pelo guarda que, se virasse o rosto para fitá-lo, tinha a feição completamente impassível e totalmente desprovida de emoção.

Mas mais preocupado do que fitar o guarda, estava em tentar erguer a face do chão quente e sujo da calçada, pedir ajuda ao seu irmão que do outro lado da rua agora ria como se visse os dois melhores palhaços do mundo para então sair andando com seus amigos como se não conhecesse nenhum daqueles palhaços, egoísta.

-Alfred!-Matthew até exclamou, mas seu irmão estava mais preocupado em conversar alguma coisa com Gilbert e Thomas, este tendo pego sua mochila de volta antes de Matthew atravessar a rua uma vez que este último a carregara por metade do caminho.-Alfred...

Respirou fundo mesmo que fosse difícil com todo aquele peso sobre si, querendo chorar como se já não soubesse que aquilo ia acontecer, inevitável desenrolar das coisas. Fungou sem querer, os olhos umedecendo.

Até o guarda deve ter percebido a dramaticidade das coisas porque se ergueu de cima do outro, as mãos novamente atrás, nas costas, o olhar impassível enquanto aos seus pés um canadense que tinha deixado seu país para morar com sua mãe se segurava para não chorar. Queria ir embora daquele lugar há muito tempo, voltar a morar com seu pai, mas estava difícil por uma série daquelas complicações políticas e judiciais.

Sentou-se na calçada e abraçou as pernas, limpando o rosto com as costas das mãos. Ser abandonado pelo irmão mais velho num momento de necessidade não é muito bom para a autoestima. Ergueu o olhar. Nem o guarda lhe fitava, os olhos azuis frios fitando apenas sua frente.

Era invisível a todos, então?

Soltou um som estranho, se pôs de pé, espalmou as roupas para tirar o pó e então mais um som estranho, um choro estrangulado.

-Me d-desculpe p-por atrapalhar o senhor!-Exclamou, sem fitar o guarda nos olhos, e saiu correndo dali. Se tivesse olhado para trás poderia quem sabe ver o guarda lhe acompanhar com os frios orbes azuis.

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Sua mão não estava em casa quando chegou, nem seu irmão. Na verdade, nem se importava muito, nunca tinham sido aquela família alegre, unida e feliz mesmo. Tirou os sapatos e subiu as escadas até seu quarto, trancando-se no mesmo e permitindo-se finalmente chorar. Ali ninguém o veria, ali ninguém veria o quanto estava sendo, além do normal e comum, fraco, mais fraco do que poderia ou deveria ser.

Abraçou as pernas e chorou, sozinho.

No dia seguinte saiu mais cedo de casa para não ter que ir com o irmão para o primeiro dia de aula, até porque Alfred iria para a faculdade ( casualmente vizinha ao seu colégio) e Matthew iria para o colégio ainda, 2° ano, 16 anos de idade, rosto infantil. O chaveiro de um urso polar tilintando na mochila surrada a cada passo.

O caminho da ida ao colégio era o mesmo da volta, por isso, viu o mesmo guarda ali, como se este último nem tivesse ido para casa dormir. As mãos nas costas, o olhar frio e azul, mas não era mais agosto, era setembro. Setembro era mais frio, portanto, aquele olhar que era frio se tornou mais frio ainda. O olhar do guarda não o seguiu quando o canadense caminhou na calçada do outro lado da rua, e Matthew subitamente sentiu falta da tarde quente de agosto porque pelo menos ali tinha uma explicação lógica e plausível para o calor que sentia.

No colégio, sentou-se o mais a frente possível. Não conversou e nem brincou, e durante o almoço comeu sozinho numa mesa afastada do refeitório. Com sorte, aproveitou o resto do tempo para ler um livro que um amigo do seu pai lhe recomendara, “O Ósculo Perdido”. Nome engraçado aquele, sorriu de lado, invisível.

Terminada a aula, não demorou a ser literalmente barrado na saída pelo seu irmão e sua corja de amigos, Gilbert falando alguma coisa que não entendia, o sotaque alemão carregado, e Thomas rindo do outro.

-Matt, como foi seu dia hoje?-Alfred perguntou, os olhos brilhando por detrás dos óculos repletos de arranhões.

-Foi... Bem, eu acho.-Matthew murmurou, encolhendo-se contra a parede enquanto Alfred metia-lhe a mão num dos bolsos e de dentro do mesmo tirava uma cédula pequena.

-Como eu suspeitei. Você sempre come o que há de mais chato e guarda dinheiro para gastar com livros, mas não desta vez, maninho!-Riu Alfred, chamando atenção dos outros dois.-Agora este dinheiro é meu, e ai de você se contar para a mamãe.

-Mas...

-Mas nada. Vamos embora.-E o mais velho empurrou Matthew para fora do colégio, agora este último tendo que carregar, além da sua mochila, a dos outros três. Até as costelas doíam na metade do caminho.

Mas ergueu o olhar, e do outro lado da calçada, lá estava o mesmo guarda, o olhar frio e azul sempre a frente. Fitou-o demoradamente, quase tropeçando enquanto andava. Se tivesse olhado para trás quando virou a esquina com seus “acompanhantes”, teria visto os mesmos orbes azuis fitarem-no com quem sabe pena ou um sentimento qualquer, mas não descaso.

Seguiu-se assim por duas semanas: Acordar cedo para ir só ao colégio, estudar e voltar com seu irmão abusivo e a corja de amigos dele. Mas sempre na ida e na volta, observar com curiosos olhos azuis, os seus olhos azuis, aquele guarda do outro lado da rua que sempre sem deixar que o outro percebesse, o fitava com frios e então também curiosos orbes azuis, fazendo mil e uma hipóteses em sua cabeça sobre quem seria e de onde viera, quem sabe apenas para passar o tempo ou quem sabe apenas por fazer.

Nos primeiro final de semana de setembro, o guarda não estava lá e quem estava era outro, normal, comum, não os frios orbes azuis e as mãos nas costas e a postura ereta, e Matthew suspirou. O guarda também não estava lá no final de semana, coisa que na verdade fazia sentido porque o guarda deveria ter uma família também, amigos e uma vida privada, e não só passar o dia todo de pé na calçada do outro lado da rua.

No começo da terceira semana de setembro, Matthew já tinha tantas tarefas e pesquisas e trabalhos que não sabia nem como respirar de tanta coisa na cabeça. Não poderia nem ir à biblioteca porque da última vez fora proibido terminantemente de entrar graças a Alfred e a sua corja de amigos, e estudar em casa não era uma opção.

E naquela segunda-feira especialmente, Alfred teria que ficar até mais tarde na faculdade, o que era bom. Matthew até considerou ir para casa mas logo se lembrou de sua mãe chegando e lhe mandando fazer mil e uma coisas. Suspirou. Precisava de um canto para estudar.

Ergueu o olhar e olhou em volta, encontrando então o guarda, o olhar frio e as mãos nas costas, do outro lado da rua. Por que não, então? Subitamente sentiu uma vontade de se sentar, então atravessou a rua e se sentou em plena calçada ao lado do guarda, tirando tudo o que precisava de dentro da mochila, subitamente feliz e subitamente animado, a cabeça mais leve.

Sentia-se protegido ali, perto do guarda alto de olhos frios, os cabelos loiros e postura imponente. Seria mesmo alemão? Nunca o tinha ouvido falar, mas deveria ter uma voz grossa, o maxilar acentuado. Tinha ouvido por aí que quanto mais acentuado o maxilar, mais hormônios sexuais masculinos e portanto uma voz mais grossa, seria assim? Matthew não tinha o maxilar acentuado nem a voz grossa, mas era um menino sim (mesmo que ás vezes o confundissem com uma menina quando de costas graças principalmente ao corte de cabelo, coisa que nem pensava em mudar porque era parecido com o corte de cabelo do seu pai).

Ergueu o olhar para o guarda, será que ele acharia ruim? Mas como pensou, seus orbes frios azuis estavam olhando para frente. Não queria atrapalhá-lo, mas como o guarda passava o dia todo imóvel ali, ficar sentado no chão ao seu lado não deveria incomodar.

Ficou ali então, o caderno no colo e o livro aberto no chão ao seu lado, fazendo as tarefas e pesquisando para trabalhos. Se tirasse os olhos do papel pelo menos uma vez, poderia ver os orbes azuis frios sobre si, não o tempo todo, mas de vez em quando, com uma frequência quase que estranha.

Quando terminou, suspirou. Não gostaria de ter que voltar para casa, não agora. Sua mãe chegaria do trabalho de mau humor, seu irmão pegaria no seu pé. Queria ir para sua casa com seu pai, ou então ficar ali até tarde.

Ergueu o olhar para o guarda, e solene, disse alguma coisa numa tentativa inútil de arranjar uma razão para que ficasse ali mais um pouco.

-Meu nome é Matthew Williams.-E abaixou o olhar, o céu ficando cada vez mais escuro, quase noite.-Não quero voltar para casa.


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Notas finais do capítulo

E AEW, REVIEWS? Siem, este casal nunca foi usado antes, mas eu gosto deles dois (amo o Alemanha, vou me casar com ele ainda, nem que seja em sonhos) porque um é o contraste do outro, de certa forma.

MAS ENFIEM, SE CÊ GOSTOU, CÊ PODE CLICAR AÍ EM BAIXO E MANDAR UMA REVIEW PARA ESTA AUTORA AQUI, KÉKICÊ ACHA?! Okay, chega de momento favela //apanha.

Obrigada por ter lido ♥

Mas, sério, REVIEWS??