Shinji Ikari está sozinho.

O vestiário masculino completamente vazio exceto por ele, costas nuas contra a parede fria, enquanto tira os braços de dentro do estranho uniforme emborrachado que vestiu para entrar na Unidade 01. Com os dois braços livres, ele ensaia retirar as pernas do resto do uniforme mais desiste entes passar da cintura. Com a parte superior do uniforme pendurada na cintura, ele para olhando um ponto fixo no chão que não contem nada mais extraordinário que a junção de dois azulejos. No olho de sua mente, porém, Shinji vê muitas coisas.

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Algumas horas antes. 

-Não vou entrar nesta... nesta coisa! É só para isto que ele me chamou? Ele não sente saudades? Não... Ele não quer me ver! Tudo que ele quer é que eu faça alguma coisa. Não! Eu vou embora. Me leve embora.

Misato olha para o menino, estática, sem esboçar qualquer reação. Shinji, do seu lado, tem os punhos fechados e treme. Seu pai não está lá, seu pai se quer se deu ao trabalho de vir vê-lo. Tudo que seu pai quer é usar Shinji como um soldadinho. 

-Me leve embora.

Ele repete, sem a mesma energia. Suas mãos se abrem sem a força para se manterem imoveis. Misato continua encarando ele sem qualquer reação ou emoção. 

-Só me leve embora

Ele fala, virando o rosto para não encarar mais a mulher em sua frente. ele dá dois passos para trás, precisando de mais distância entre ele e aquela mulher que mal o conhece e já deve acha-lo patético. 

-Tragam a primeira criança. 

Misato fala para um soldado, que corre para fazer cumprir a ordem. Ela se volta para Shinji mais uma vez.

-Você se lembra do Segundo Impacto, Shinji?

Com um certo esforço, Shinji se obriga a olhar nos olhos de Misato novamente. Ele encontra um olhar distante, de quem revive antigas memorias.

-É como é chamado o dia em que um meteoro que se chocou contra a terra no ano 2000. Só continuamos aqui por que o ponto de impacto foi a Antártida, o que evitou a nuvem de poeira que um impacto daquela proporção causaria em terra seca. Ao invés disto, todo o gelo derreteu e o mar avan--

-Não sou sua professora, isto não é um exame de história. Eu perguntei se você se lembra do Segundo Impacto.

-Eu... Eu não era nascido. 

-Eu lembro. Eu estava lá, na Antártida.

Shinji olha espantado para a Tenente-Coronel, que até agora nada mais era além de uma subordinada de seu pai. Shinji nasceu depois do Segundo Impacto, e nunca pensou muito sobre a vida antes do Impacto. Sempre que alguém falava sobre a vida antes do Impacto, era como se falassem de um conto de fadas. Mas desta vez ele estava diante de alguém que diz ser testemunha do Impacto em si. 

-Não foi um meteoro que nos atingiu, Shinji. Não foi um acaso infeliz de estarmos na rota de um meteoro. Nós fomos atacados. 

-Atacados?

-Sim. Por uma criatura como esta. Nós os chamamos de Anjos. 

-Anjos?

-Sim. Tocando as trombetas e anunciando o fim. Eles vem para causar o Terceiro Impacto. Da ultima vez que conseguiram, mataram metade da população humana, Shinji. Se não os impedirmos, quantos de nós você acha que sobreviverão?

O menino se vira e encara o robô, pensativo. Enquanto isto, dois enfermeiros trazem numa maca uma garota da idade de Shinji. Ela está toda enfaixada, mal parece estar consciente. Shinji se vira e olha para ela enquanto a maca é levada para entre ele e a Tenente-Coronel Misato Katsuragi. 

-Ayanami.

-Sim -- responde a garota na maca.

-A Terceira Criança não vai pilotar a Unidade 01. Precisamos de você.

-Ok.

A garota tem um dos olhos tapado por esparadrapos e curativos. O outro olho tem uma cor vermelho-vinho. O cabelo é curto e azul. Shinji não esconde um certo estranhamento. Ele observa enquanto a garota tenta se por em pé. O sofrimento dela é obvio, mas ela parece determinada a conseguir. Misato, porém, olha para Shinji enquanto Ayanami tenta em vão se por em pé. 

-Ela não tem condições de fazer isto! -- Finalmente, Shinji reage. Ayanami parece perceber a presença dele no hangar pela primeira vez. -- Você não pode obriga-la a fazer isto! Está maluca? Não vê que ela está ferida?

-Shinji, só a fisiologia de uma criança pode aguentar a conexão com um Eva. E mesmo assim, apenas poucas crianças. Você é uma dessas crianças, e Ayanami é a única outra criança no Japão capaz de pilotar. Se você se recusa, ela é nossa única opção.

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Após aceitar pilotar a Unidade 01,  Shinji foi colocado em um uniforme emborrachado que potencializa a capacidade de sincronização entre ele e a Unidade 01. Colocam dois plugs estranhos na cabeça dele e finalmente ele é colocado na capsula de controle da Unidade 01.

Após um desagradável ardor nas narinas e pulmão quando ele 'respirou' o estranho liquido que encheu a capsula, ele recebe as instruções da Tenente-Coronel Katsuragi enquanto eles preparam para mandar a Unidade 01 para a superfície. 

As instruções que ele recebeu foram as melhores que a Tenente-Coronel poderia dar, mas ela nunca teve a experiência de pilotar um Eva. Shinji descobre rapidamente a diferença entre saber a teoria e a pratica. 

Lentamente, ele aprende a andar com o robô. Infelizmente, ele está exposto ao ar livre quando isto acontece, e o tal Anjo avança sem qualquer dificuldade na sua direção. Ele tenta erguer o braço do robô a tempo de aparar o ataque que o Anjo desfere contra ele mas o braço se quer se move antes do punho ossudo da criatura acertar-lhe em cheio. Shinji, que já tinha dificuldades antes, entra em pânico ao sentir a dor do murro.

-Aaaaaaaaah! Meu olho! Meu Olho!

-Calma Shinji, seu olho está bem, foi o robô que foi atacado. 

-Mas.. Mas está doendo! 

-Sim, é a ligação entre você e a Unidade 01 que permite movimentos tão precisos. Apenas ignore a dor, no fim da batalha você estará inteiro. 

-S--sim.

Tentando se recompor, Shinji tenta atacar o Anjo mas não é rápido o suficiente. O Anjo segura o braço da Unidade 01 e, com algum esforço, arranca-o fora. Desta vez a dor é demais para ser ignorada. Shinji segura o próprio braço tentando-se convencer de que aquele braço que foi arrancado não era o seu. A dor, porém, continua parecendo real na sua cabeça.

-Shinji! concentre-se Shinji! Você precisa lutar!

A voz de Misato soa distante aos ouvidos de Shinji. Ele pensa que vai desmaiar de dor a qualquer momento. E então escuta uma nova voz, desconhecida.

-Não tenha medo.

Ele sente o braço arrancado do robô se reconstruindo. Ele sente o outro braço buscando a faca embutida em suas costas. Nenhuma destas ações partiu dele.

Ele assiste, tanto quanto todos na Sala de Comando, enquanto a Unidade 01 ataca ferozmente o Anjo a sua frente. A batalha é brutal. A Unidade 01 arranca os braços do Anjo e corta aquilo que parece ser o rosto do Anjo repetidamente. Shinji está tão estarrecido com as ações que se desenrolam na sua frente que nem percebe a Tenente-Coronel Katsuragi gritando pelo rádio para ele atacar o "coração" da criatura. Por vontade própria e sem qualquer controle por parte do piloto, a Unidade 01 enfia a gigantesca faca do robô dentro da Esfera Vermelho protegida pelo que parecem ser costelas. O anjo solta um gemido estranho e triste e se enrosca na Unidade 001 segundos antes de explodir devido ao dano.

A unidade para de se mover completamente, congelada no meio de uma cratera aberta pela explosão. Shinji fica encarando a tela a sua frente e o novo braço do robô que simplesmente se reconstruiu parece coberto por um petróleo ou coisa similar ao Anjo que ele acabou de destruir.

-Shinji?

Uma tela de comunicação se abre entre Shinji e a Sala de Comando. 

-Pai?

-Bom trabalho, terceira criança.

Shinji sorri sem jeito. Enfim ele viu seu pai, e ainda recebeu um elogio.

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Sozinho no vestiário. Agora.

Ele não falou para ninguém. Só ele sabe, ninguém mais.

Ele não pilotou a Unidade 01 e ganhou. Não. Algo pilotou a Unidade 01 mas não foi ele. Algo que falou com ele. 

Mas seu pai o Elogiou.

Seu pai.

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Fim do Episodio 02