World Of Chances escrita por Semi_Forever


Capítulo 10
Nothing Left To Lose


Notas iniciais do capítulo

Nothing Left To Lose - The Pretty Reckless
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Acordei sentindo o braço mais leve que o esperado, abrindo os olhos assustada para o estranho sentimento. Já havia uma semana que estava hospedada na grande casa Lovato, o que me fazia a vontade o bastante para um cochilo no sofá que daria a energia necessária para a noite em claro, outra.

Foquei os olhos ao meu lado não encontrando ninguém, apenas uma das provas encontradas que havia algo errado. Muito errado.

O pano que tinha amarrado apertado em meu pulso a toda essa uma semana estava frouxo demais para mais uma mão se esgueirar dentro e, como se isso não bastasse para a fuga, estava cortado irregularmente provavelmente pela tesoura jogada no chão pelo desespero.

Levantei em um pulo, os olhos estalados percorrendo todo o percurso da sala onde a Tv estava ligada para encobrir os possíveis sons.

- Demi? – chamei, a voz elevada e exaltando uma certa autoridade. – Demi apareça!

O silencio foi total quando apertei o botão vermelho do controle remoto, apontando para o grande aparelho na parede.

A resposta não veio e confirmei meu medo, correndo pela casa a sua procura.

Subi as escadas a passos largos, a preocupação evidente pelo jeito desordenado que respirava, já que na cozinha não havia sinal de vida.

Seu quarto estava limpo, o que me fez pensar na hipótese dela ter saído para comprar o determinado liquido tão desejado e implorado pela mesma nesse tempo.

Corri pelo corredor, esperando encontrá-la em alguma casa noturna pela região, mas algo me fez parar.

Encostei o ouvido na porta do banheiro percebendo gemidos baixos com fungadas suspeitas.

- Demi, abra agora! – bati na madeira, a voz firme. – Demetria, agora!

Coisas caíram, ecoando no chão frio do banheiro pelo barulho e nenhuma resposta veio.

- Demi... – interrompi-me sabendo que não seria de nenhuma utilidade insistir.

Tomei a distancia precisa e colidi o ombro contra o canto da maçaneta. O barulho da trinca quase cedendo foi o bastante para fazê-la se assustar.

- Não, Selena, não. – implorou, a voz confirmando o possível choro. – Não entre, não.

A porta estava quase arrombada diante de cinco choques corporais até ouvir um click no metal que prendia a tranca na parede e a porta abriu-se, sendo sustentada apenas por apenas uma dobradiça sobrevivente.

- Deus. – exclamei, observando a cena por dois longos segundos.

O sangue esparramado pelo chão já era o começo perfeito da cena chocante. A figura procurada estava em um canto no box onde pendia um chuveiro tão encolhida parecendo que as paredes a fechavam num quadrado apertado, os joelhos impressos contra o queixo, o olhar quase paranóico em seu pulso onde uma lamina de gilete dançava por sua pele em linhas continuas que iam desde a palma da mão até quase a articulação em movimentos rápidos, como se o serviço tivesse de ser terminado antes da minha entrada forçada.

- Pare, pare, Demi escude sou eu! – pedi, ajoelhando ao seu lado.

Prendi suas mãos nas minhas, fazendo um grito e insaciedade raspar fundo em sua garganta.

- Não, Selena eu preciso. – começou, a lamina ainda segura nos dedos. – Eu mereço.

- Não. O que combinamos sobre mutilação? – perguntei, tentando parar a hiperatividade da bipolaridade ativada.

- Eu sei, mas foi preciso. – chorou ainda tentando se livrar de minhas mãos já encharcadas de sangue. – Eu peguei a garrafa!

- Largue isso. – ordenei em meio a luta.

- Selena, é castigo! – gritou como se a frase fizesse-me parar.

- Não vou te castigar. – respondi e assisti os movimentos frenéticos pararem quando minha fala ecoava no piso quase espelhado.       

- Mas eu... – sussurrou fazendo-me pela primeira vez observar seus olhos castanhos em um desespero conhecido ao longo dessa semana.

Aquelas famosas dores de cabeça se tornaram cada vez mais constantes, cumprindo cada passo da lista de sintomas que juntei após de muita procura na internet sendo acompanhada por uma tontura ocasional. Tinha tudo sob controle, mesmo que ela achasse estar explodindo nossa situação.

A partir do quarto dia de abstinência alcoólica o passo do maníaco começou aflorar, como no papel impresso guardado embaixo de meu travesseiro explicava. Era doloroso vê-la nesse estado, mas tudo não era de todo ruim afinal ela esta sendo forte... até agora.

- Shhh. – pedi, sentando-me a seu lado dentando acalmar seus contínuos soluços.

Soltei seus pulsos lentamente quando ouvi o barulho agudo do metal em sua mão bater contra o chão de azulejo.

Senti seus dedos guiados para minha camiseta, agarrando a gola com força enquanto ocultava sua face mergulhada em meu pescoço.

- Desculpe, eu... – chorou, a voz pouco mais que um sussurro. – Eu prometi...

- Shhh. – insisti abraçando suas costas contra mim. – Eu sei.

Deixei-a chorar concentrando todas minhas forças internas a impedir-me de praticar o mesmo ato, já que as externas a prensavam em meus braços. Ela precisava de alguém forte que dê o ombro para suas lagrimas, não uma companheira.

Foi uma longa tortura ouvindo seus soluços altos. Queria poder esclarecer tudo o que esta passando, falar que é tudo da fase presente, mas algo me impedia. Esse algo era tão egoísta que me sentia nojenta ao pensar sobre. Era um sentimento diferente de tudo, mas ao mesmo tempo conhecido, pois é o mesmo do dia inicial de minha guerra de família. Aquele curioso sentimento que juntou nossas mãos no dia que queimamos nosso primeiro maço de cigarros, fazendo o primeiro laço de confiança nascer entre nós.

De um certo modo era em beneficio dessas malditas sensações que não a fazia estudar o papel escondido em meu quarto. Todas as vezes que ela explodia, como agora, ela corria para meus braços. Não gostava da maldade que dizia de si muito menos dos constantes pedidos para automutilação cada vez mais desesperados, mas era aqui onde eu a queria. Ouvir sua respiração acamando após o choro era minha motivação para a conversa que se repetia em todos os ataques psicológicos como se fosse a primeira. Ver o sorriso ligeiramente torto nos lábios rosados após do “obrigada” de sempre era confortante, embora o motivo esteja me deixando loucamente curiosa.

- Desculpe. – disse finalmente, a voz já normalizada devido ao fim do choro. – Eu sei que prometi não tocar naquela garrafa na cozinha, mas não sei o que me deu eu só... só precisava.

- Tudo bem, eu te perdôo. – respondi, um sorriso não planejado formando em meus lábios quando apoiei meu queixo no topo da cabeça abaixo a mim. – Eu que não devia ter dormido.

- Como você sempre consegue incumbir a culpa a você sendo que eu fui a errada? – perguntou.

O sorriso se ampliou em meu rosto, sendo minimizado novamente pelo silencio.

- Fui fraca. – comentou, aconchegando-se em mim.

- Fraca? – comecei. – Demi, você é a pessoa mais forte que conheço. Olha sua situação.

- É, olhe minha situação. – referiu-se ao banheiro marcado de sangue.

- Faz uma semana e você não colocou uma gota de álcool na boca. – corrigi. – Porque, pelo que vi, a garrafa estava totalmente lacrada no balcão.

- Não pude... – respondeu, a voz expressando um certo orgulho. – Foi quando acordei e me vi com aquilo na mão levei um choque tão grande, mas não pude conter o impulso de me castigar por tentar jogar uma semana de trabalho no lixo.

- Se você não fizesse isso daí sim estaria preocupada, afinal, estamos tirando um peso de suas costas não fazendo uma lavagem cerebral. – terminei ouvindo uma risada baixa.

- Obrigada. – disse por fim, separando-se do abraço.

- Tem certeza que esta tudo bem? – perguntei, observando-a limpar as lagrimas secas do rosto.

- Sim. – sorriu sem jeito ao olhar para os braços machucados.

Já não sangrava por ter sido prensado contra minha blusa, dando-lhe manchas de sangue como presente.

- Droga. – xingou, novamente tratando-se com maldade.

- Tudo bem, vão cicatrizar logo. – auxiliei tirando o pano, antes amarrado no pulso, do bolso traseiro do mini sorte jeans. – Você sabe que...

- Não precisa falar nada, muito menos depois de toda essa cena. – disse ela, oferecendo o pulso ao lado do meu.

Trancei o pedaço rasgado de tecido em nossos membros, amarrando-os juntos como antes.

Essa era minha total garantia de sua segurança.

(...)

Foram em dias ruins que meu primeiro mês terminou, fazendo uma ligação desesperada de minha mãe completar falando da imensa falta que sentia de sua filha caçula. E foi com o coração partido que menti, dizendo que sentia o mesmo. Não leve a mal, amo minha mãe, mas sinceramente não trocaria esse sentimento, ainda persistente, por ela. Sim, aquele. Mas, mesmo com ele aqui não tinha muita atenção para da-lo, pois Demi anda cada vez mais dependente de uma rocha e mesmo que eu não sege uma preciso estar lá. Percebia sua melhora a cada dia, mas a bipolaridade atacada mediante a necessidade não mais tão comentada da bebida estava a levando quase a loucura total, me fazendo sempre em meio a seus gritos histéricos abraçá-la e assegurar um “tudo bem”.

Embora mostre-me tão forte ao dia, quando vejo que sua respiração diminui da cama ao meu lado eu chorava. Fazia um dos meus melhores serviços quando sentia a pressão sobre meus olhos, não deixando nenhuma marca facial de minha fraqueza ou até mesmo das lagrimas que fazia questão de não molhar os lençóis. Mas, em meio de todos esses cuidados sentia meu fracasso quando, ao amanhecer, ser eu a abraçada como o confortante “tudo bem” sussurrado ao pé do ouvido.


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Notas finais do capítulo

Obrigada pela atenção até o próximo post, amo vocêêêêêês !
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