-   Por quê faz isso comigo Branca?

           Ela preferiu não responder, já haviam tido aquela briga antes, sabia como ia acabar.

-  Acha sinceramente que posso ter orgulho de ser seu marido? Que gosto de brigar com você? De ter que dar sermões, como se você fosse uma criança tola? Eu me sinto como seu pai!

Branca suspira e vai até as enormes janelas, àquela hora os jardins estão calmos e escuros. Mas Branca não era a única com problemas...

-         Não vem para cama? Já está tarde...

-         Sabe, já sou bem grandinha, sei olhar a hora sozinha.

-         Eu só...

-         Deixe-me em paz, ok? Droga! Está vendo? Perdi a conta!

-         Não acho que você precisa escovar seu cabelo cinqüenta vezes por dia!

-         Cem! São cem vezes!- ela o encara – Você está me irritando sabia? Saia!

          Harry não precisou ouvir mais nada, deitou-se, mas não dormiu, ela já não era mais a mesma e aquilo o deixava com raiva, como uma pessoa podia mudar tanto? Como alguém podia se tornar tão irreconhecível? Não conseguiu dormir, então desceu, as escadas estavam escuras, mas havia barulho na cozinha, era seu mordomo Audrey.

-    Oh! É você senhor? Assustou-me! O que faz acordado? Está tarde!

-         É, eu sei...E... Desculpe pelo susto.

-         Tudo bem... Mas o que houve? Está sem sono?

-         Talvez eu ainda seja uma criatura da noite...

-         Não diga isso senhor! Não diga isso nem brincando! Deve esquecer aqueles maus tempos.

-         Fiz de sua vida um inferno...Desculpe.

-         Ora! Já disse que esqueça! Sabe, aqueles tempos em que fui um mero castiçal já passaram! Agora sou homem, graças a seu amor por Bela! E você? Ah! Tornou-se a pessoa bondosa que ajudei seus pais a criar! Agora aquilo é passado! Mas diga-me o que pode ser tão ruim para incomoda-lo mesmo com tamanha alegria?

-         Realmente sou muito tolo Audrey...

-         Não quis dizer isso senhor eu...

-         Não, eu quis dizer isso.

-         Não está bem Harry. Está amargurado e triste... Diga-me o que houve.

-         Ah, Audrey! Vou lhe contar...

Em um bar qualquer, numa aldeia próxima, um homem bêbado sai cantando uma música boêmia, ele é jovem e belo, veste verde, um elegante chapéu e em suas costas há um belo conjunto de arco e flechas. Ao ouvirem sua cantoria certas moças desavergonhadas saem de suas casas e vão ao seu encontro.

-         Diversão esta noite Robin?- diz uma das moças, aparentemente a líder das jovens.

Ele sorri e avalia cada uma.

-         Ah Meg! Não vai dar esta noite... Não tenho o que lhe oferecer!

-         Um gole dessa sua bebida e pode vir!

-         Tem certeza?

-         Ora! É uma diversão para nós também querido!

-         Eu adoro vocês meninas!

-         Está me ouvindo? Branca!

-         Eu estou lhe ouvindo...

Branca se desloca da janela para a cadeira do toucador e o encara. Ele nunca gostou disso... Era como se ela o desafiasse.

-         O que vai fazer?

-         O que eu...O que quer dizer?

-         O que vai fazer? O que vai fazer quanto a isso?

-         Eu... O que espera que eu faça?

-         Eu não sei!

-         Como espera que eu saiba?

-         Você está reclamando de como me comporto diante de seus convidados idiotas! De como me comporto na mesa! De como sente vergonha de mim.O que vai fazer quanto a isso?

-         Convidados idiotas? São amigos! Meus e seus. Branca... Quero que simplesmente mude!

-         A maioria são seus amigos! Os únicos amigos meus eram Bela e Fera! Mudar? Quando nos casamos era assim!

-         Casei com uma princesa!

-         Sim é verdade! Mas a princesa com a qual você se casou perdeu o pai jovem e ficou com uma madrasta má que a tratava como uma empregada! Não sei como uma princesa se comporta, desculpe! Casei-me com você assim!

-         Ainda há tempo de mudar! Branca... Se você me ama deve mudar!

-         O que?

-         Deve mudar por mim!

-         Por que você quer isso?

-         Para o seu próprio bem!

-         Meu bem?- ele a tinha deixado realmente irritada com aquilo -está ouvindo o que está dizendo?

-         Sim! É a verdade!

-         Não! Isso só é para o seu próprio bem! Para o seu ego! Meus amigos não se incomodam com meu jeito! Cometo erros pequenos! Bela disse! E sabe como Bela é com essas coisas! Se você me ama não deveria se importar!

-         Branca por favor...

-         Não! Eu já ouvi demais por hoje, ou melhor, por toda uma vida! Vou embora!

-         Não pode fazer isso! Isso não existe! Para onde você iria?

-         Tenho o meu castelo! E a cabana! Pronto! Vou para a cabana!

-         Cabana? Aquilo é uma casa de anões! Não pode está falando sério!

-         Estou falando mais sério do que você pensa!

E já ia saindo quando escutou:

-         Se você sair é melhor que não volte! Para seu próprio bem...

Branca voltou-se para ele, mas não para ficar, entregou a aliança de casamento.

-         Acho que nosso conto de fadas acabou.