2000 Miles Away. escrita por biamcr_


Capítulo 10
Fuga.


Notas iniciais do capítulo

Pronto, ta aí um capítulo maior pra compensar o de ontem hehe



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Os corredores brancos e limpos e a constante visão de médicos andando pra lá e pra cá já não era mais novidade para mim. O mesmo acontecia com as noites sem dormir, as refeições puladas e as aulas que eu faltava.

Eu mudei para Newark porque estava cansado dos outros lugares. Eu queria conhecer lugares novos e ser independente da minha família, vivendo só eu e os meus pensamentos. Eu estava muitíssimo bem daquele jeito.

Gerard me fez mudar.

Comecei a me relacionar mais com as pessoas e perceber que o mundo não está cheio de pessoas fodidas, afinal. Algumas ainda tem salvação. Mas a porra toda é que eu não sabia se queria mesmo viver no mundo das pessoas inteligentes e insensíveis. Digo, Gerard não demonstrava suas emoções e, caralho, eu nem sabia se ele as tinha. Gerard lidava bem com todas as malditas situações, ele sempre estava no controle. E, aliás, eu nem sabia se conseguiria viver nesse mundo.

Eu era sensível e fechado pra caralho. Eu nunca conseguiria sair para beber com alguém que acabei de conhecer, porque eu sabia que essa pessoa poderia ser um idiota que ficaria todo o tempo falando sobre meninas e jogos ridículos. Eu estava cheio desse tipo de gente. Quando eu me deparava com uma situação delicada como esta, eu enlouquecia. Sempre ficava trancado em um quarto, ouvindo música e tentando descobrir como eu me sentia sobre isso. Porque eu nunca sabia, afinal. Eu não sabia se estava feliz ou não, porque sempre que eu sabia que estava feliz, me sentia obrigado a fazer algo que tirasse esse sentimento de mim. Era quase que automático.

E eu já jurei nunca me apaixonar, casar e nem ter filhos. Eu não servia pra isso. Não queria acabar com uma garota retardada – ou um cara estúpido – que eu acabaria enjoando depois de alguns meses; não queria ficar trancado dentro de uma casa tendo uma vida chata e banal; e eu não queria correr o risco de colocar uma criança no mundo porque, porra, eu não conseguiria criá-la e eu não queria outra pessoa tão fodida quanto eu no mundo.

Mas isso aconteceu. Eu me apaixonei. Eu me apaixonei e minha mente mudou automáticamente, sem ao menos me pedir permissão. Isso era ridículo, isso não poderia acontecer. Anos e anos foram precisos para eu conseguir formar minha opinião sobre tudo que me cercava e sobre tudo que eu seria... E chega um cara e muda tudo assim. Foda, né?

– Oh, Michael, eu sinto muito, mas preciso ir. Meu avão sairá em poucos minutos. Fique bem e cuide do seu irmão, OK? – Foi a primeira coisa que ouvi ao adentrar o quarto em que Gerard encontrava-se. – Eu amo vocês dois.

Enquanto uma mulher dizia essas palavras, comecei a analisá-la... Era uma mulher já mais velha, com seus cinquenta e poucos anos, e usava roupas de tons cor-de-rosa. Seus cabelos loiros e enrolados, que já mostravam muitos fios brancos, caiam por seus ombros e ela sorria docemente. Era mãe deles... E passou por mim me ignorando totalmente.

– Frank! Que bom que você chegou. Recebeu minha mensagem? OK, isso não importa. Donald não pôde vir, mamãe acabou de sair e Gerard está de mau humor. – Dizia Mikey, bastante apressado e, aparentemente, cansado.

– Espere, você quer dizer que o Gerard...

– Gerard está acordado e entediado, sim. – Completou o próprio, retirando seus fones de ouvido e olhando-me. Ele vestia roupas pretas, é claro, não usava nenhuma maquiagem e tinha seu cabelo revirado.

– Mas isso não importa. – Disse Mikey. – OK, Gerard está acordado. Mas Michael está cansado e precisa de café... Então Frank irá cuidar de Gerard, OK? – E saiu, mesmo sem eu responder. Gerard riu.

– Coitado. – Comentei. – Gerard, olha o que você faz com seu irmão!

Eu esperava que ele risse outra vez, mas isso não aconteceu. Ele me olhava com um olhar divertido, sim, mas parecia que me julgava – e desaprovava.

Seus olhos pareciam mais maliciosos que antes.

– Está paralisado, criança? – Perguntou, levantando-se da cama.

– Não, hm, estou bem. E você?

– Estou ótimo. Só estou no hospital pois queria fazer uma visita aos médicos. – Respondeu, irônico, adentrando o banheiro.

– Eu agradeceria se você parasse com as ironias. – Disse eu.

Alguns minutos depois, ele reapareceu com sua maquiagem e jaqueta de couro de sempre. Não respondeu ao meu comentário, como eu já imaginava. Pegou uma mochila que estava jogada por um canto do quarto, e colocou todas as roupas e objetos que encontrou pela cama.

– O que está fazendo? – Perguntei, enquanto ele enfiava as coisas na mochila.

Ele não respondeu, de novo. Pegou alguns cigarros que estavam escondidos debaixo do travesseiro junto a um isqueiro e colocou no bolso. Meteu a cara para fora da porta e observou um pouco o corredor. Murmurou um "ótimo" e virou-se para mim.

– Fugindo. – Ele respondeu. – E você irá comigo, criança. Não vou ficar nesse lugar desprezível, sendo tratado como um inútil. Eu não preciso da ajuda de médicos idiotas que não me conhecem e acham que têm alguma moral para me dar conselhos sobre alcoolismo.

Ele saiu sorrateiramente do quarto, sem fazer barulho algum. Eu fui atrás.

– Me encontre no estacionamento. – Ele disse. – Desça normalmente e, se der de cara com Michael, diga a ele que vai para casa descansar.

Querendo ou não, isso me deu mais esperança. Digo, fugir com Gerard. A euforia ia tomando conta da minha mente enquanto eu caminhava pelo corredor em direção ao elevador, porque, caralho, eu ia fugir com Gerard. O fato era que ficar escondido em algum lugar com Gerard seria incrível. Isso me parecia uma oportunidade fantástica, porque eu queria passar mais tempo com ele. Eu queria conviver com ele, estar com ele. E, ao mesmo tempo, eu queria ser como ele, pois esse me parecia o único jeito de esquecer ele. Estranho e confuso, eu sei. Mas, para mim, fazia sentido. Ser como Gerard significava estar sempre no controle e não ser um imbecil apaixonado; significava que eu não jogaria mais meus sentimentos fora com pessoas que não os queriam. E também significava que eu teria algo dele comigo.

Ao chegar ao estacionamento, o carro de Gerard estava lá. Provavelmente este estava sendo usado por Mikey nos últimos dias, e Gerard tinha alguma chave do veículo consigo.

– Anda, criança, não tenho todo o tempo do mundo. – Disse ele, ao me ver entrando no carro.

– Aonde vamos? – Perguntei.

– Nós não vamos a lugar nenhum; eu vou. – Ele disse, ligando o carro.

– Espera, você disse que nós íamos fugir, não apenas você. Só precisava de mim para te ajudar a fugir, é isso?

– É engraçado o fato de que você me pede para parar de chamá-lo de criança, quando claramente comporta-se como uma. Fazer-se de vítima para conseguir as coisas não ajuda, Frank. – Disse, enquanto seguia caminho para fora do estacionamento. – E, aliás, você não me ajudou a fugir, só te tirei de lá pois poderia chamar meu irmão e mandá-lo me procurar.

– Então só vai me deixar em casa enquanto você vai sair fazer besteira? Eu me preocupo com você, caralho! – Gritei, me descontrolando.

– Acalme-se. Se quiser, eu te levo. Só acho que não vai gostar de ir.

A conversa acabou aí. Não respondi, não queria parecer um retardado que faria de tudo para estar com ele, mesmo que tivesse que ir a um lugar que eu não gostaria de estar. Deixei que ele decidisse se queria minha companhia ou não.

– Por que você fez aquilo? – Acabei perguntando, aproximadamente meia hora depois. Digo, beber pra caralho como você bebeu... Você não tem medo de morrer?

– Eu não tenho medo de morrer, criança. Porque, aliás, a maioria das pessoas que tem medo de morrer, também tem medo de viver. Elas acabam se prendendo a um mundinho ridículo de falsa felicidade, achando que isso é o suficiente. Às vezes, a felicidade não funciona, Frank. Às vezes, essa vidinha banal que a maioria das familías levam não é o suficiente. Somos seres humanos e temos desejos, e devemos correr atrás deles.

– Ainda não entendi porque fez aquilo. Você sempre me pareceu tão inteligente, Gerard, sempre me pareceu uma pessoa que consegue enfrentar os problemas tão bem, e acabou fazendo uma merda dessas e indo parar num hospital.

– Exatamente, criança. – Disse ele, me olhando como se olha para um adulto que finalmente entendeu que dois mais dois resulta em quatro. – Pessoas que conseguem enfrentar bem seus problemas, como eu faço, vivem tão ridiculamente quanto aquelas que fogem dos mesmos. Tente viver sem ter algum problema em sua vida, Frank. Você não conseguirá. Precisamos de problemas ou nossa vida será um tédio sem fim. Se eu pareço não ter problemas, eu os crio. A bebida é um ótimo meio de fazê-lo.

Ao terminar a frase, ele parou bruscamente o carro.

– Chegamos.

Gerard saiu do carro rapidamente, e eu o segui. Paramos em um lugar que parecia a entrada para alguma cidade vizinha. Algumas casinhas eram erguidas pelo local, e uma delas se destacava: era uma casa de dois pisos, de cor escura e muitos carros parados por perto. Ouvia-se uma música alta que vinha do lugar.

– Frank, venha. – Disse Gerard de longe, parado perto de uma árvore enquanto me esperava.

Quando cheguei perto, ele me puxou pela mão e me lançou para a árvore com um olhar malicioso. Aproximou-se de mim, olhando-me nos olhos. Meu coração batia forte pra caralho sem saber o que esperar. Porque, afinal, Gerard era imprevisívil, não?

Ele colou seu rosto no meu e nossas respirações misturaram-se. Seu sorriso malicioso ia se fechando enquanto ele chegava mais e mais perto dos meus lábios.

E então aconteceu.

O momento que eu estava esperando há meses. O momento que eu achei que nunca aconteceria. Um beijo apaixonado, e ao mesmo tempo cheio de intenções, fazia meu coração quase parar. Gerard era meu, finalmente. Nem que fosse por poucos segudos, ele era meu.


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Notas finais do capítulo

Só faltam uns dois capítulos ok