Mundo dos Sonhos escrita por Trezee


Capítulo 42
Máquina


Notas iniciais do capítulo

=)



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               Se os minutos que me restavam até a prova começar eram muitos, eles praticamente voaram sem que eu percebesse. Quando me dei conta já estava sentada em uma carteira da sala 13, segurando minha caneta e olhando para o calhamaço de folhas que estava sobre minha carteira. Até então intocáveis.

               - Podem começar! – ecoou a voz da inspetora pela sala.

               Abri rapidamente minha prova e comecei a ler. Bem, era uma olimpíada, então julguei que seria bem difícil a prova. Eu estava até um pouco receosa, insegura talvez. Mas ao passo que meus olhos foram cortando as pequenas letras, cai na fútil realidade. A prova estava estranhamente fácil. Estranhamente muito mais fácil do que era para ser.

               Tudo bem que eu não acho Física muito difícil, mas aquilo era exagero comparado ao que deveria ser. Respirei fundo e busquei uma explicação óbvia, li atentamente os enunciados procurando por pegadinhas, conversões. Nada. Nada pelo menos que eu não tivesse conseguido resolver logo de cara, ao ler a pergunta. Esta era a parte esquisita.

                Eu me dei conta que eu sabia até o que eu não sabia, ou melhor, até o que eu achava que eu não sabia. Hidrostática, o que era aquilo? Não me lembrava de ter ouvido aquela palavra, mas logo me vi lendo um livro sobre o assunto e resolvendo um problema sobre pressão. Como eu sabia de algo sem lembrar que eu sabia?

                No momento eu tinha duas opções. Ou eu entrava em pânico por saber mais do que devia, ter um ataque e abandonar a prova, ou então – obviamente a coisa mais Melinda a se fazer – eu respiraria fundo, aproveitaria dessa repentina inteligência e depois avaliaria os fatos. Bem, a segunda opção se destacou na minha mente sem duvidas.

                Havia dez questões na minha frente. Dez questões que eu já havia lido e não encontrado muitas dificuldades para fazê-las. Fechei os olhos para cada uma e busquei na minha peculiar mente as fórmulas certas. E as fórmulas vieram quase em fila para serem usadas. Vinham na forma daquelas lembranças não vividas, apenas depois do branco e da memória instantânea que se formava e lá estava eu novamente lendo um grosso livro de Física. Era bizarro, talvez temeroso, mas na hora estava sendo muito útil.

               Como eu não me lembrava de ter presenciado essas minhas próprias cenas de estudo, resolvi apenas observar bem atentamente o pequeno filme que rodava na minha mente. Praticamente como se fosse uma memória fotográfica, com muitos detalhes e até alguns sons.

                Estava sendo bem simples. Parecia que eu tinha muitas memórias deste tipo. Era só eu ler um tema na prova, fechar os olhos e lá estava minha tele-aula mental. Acho que eu li o livro inteiro, pois nenhum assunto faltou.

               Tentei então me lembrar de uma aula de Física que tive no passado sobre velocidade. Pelo menos este assunto eu sabia que tinha aprendido e presenciado de verdade. Fechei os olhos e tentei trazer a lembrança do meu professor escrevendo várias coisas na lousa. Nada muito convincente.

               Era como se a lembrança que eu tentava buscar não se passasse de uma lembrança normal, como qualquer outra que fica na cabeça. Aquela típica que vem e vai, não muito nítida e muitas vezes a mercê do que os pensamentos querem pensar. Esta lembrança não era nada igual as outras lembranças mutantes que eu tinha sobre meus estudos.

                Fiz um beicinho, pois achei que todas as lembranças que eu teria a partir de então seriam tão nítidas quanto as lembranças estranhas. Não que eu me sinta a vontade tendo essas lembranças não vividas e tão reais, mas é que achei muito útil poder rebobinar meus pensamentos.

               Depois da pequena frustração, olhei para a última questão ainda não resolvida e desisti de buscar a resposta na lembrança vaga do ano passado. Concentrei-me em achar a resposta sem me importar como fosse e então forcei as lembranças a pipocarem na minha cabeça e então me foquei na que eu novamente estava lendo o livro de Física que tanto me ajudo naquela prova.

               O título da página era claríssimo “Movimento circular uniforme”. Pude ler minha lembrança como se o livro estivesse arquivado na minha cabeça. Todas as fórmulas, conversões, explicações necessárias estavam ali guardados para serem observados em um momento oportuno.

                Pena que eu só conseguia fazer isso com aquelas benditas lembranças de Física. Sempre no mesmo lugar, com o mesmo livro, folheando as matérias e estudando. Soava até engraçado eu me imaginar estudando tanto, logo eu que amo de paixão estudar que nem uma condenada.

                Parei de pensar quando meu relógio fez um barulhinho. Olhai para ele e só fazia uma hora que eu estava na sala e lá estava minha prova feita, jogada sobre a carteira esperando para ser entregue.

               Eu queria sair logo para pensar em paz, mas tinha um tempo mínimo de permanência na sala. Eu ainda tinha meia hora para ficar de castigo lá dentro.

               Passei a observar as pessoas sentadas ao meu redor, fiquei buscando alguém que eu conhecesse, mas nenhum rosto foi reconhecido pelos meus olhos. Fiquei observando então o nervosismo que pairava sobre alguns e a sede de escrever que rodeava outros e fiquei me questionando se seria justo eu fazer isso.

               Eu era uma boa aluna de Física, a melhor da sala, mas era só. Eu não era nenhum gênio ou coisa do tipo, somente uma pessoa que conseguia decifrar bem os enunciados.

               Era justo eu ir tão bem nessa prova pelo o que eu não sei? Ou melhor, por ter colado das minhas próprias lembranças? Afinal foi praticamente isso que eu fiz, colei de um arquivo particular que eu nunca aprendi. Era atordoante pensar dessa maneira, como se eu estivesse sendo a errada por minha mente estar caducando tão jovem. Talvez caducando não, porque senão eu estaria esquecendo e não criando lembranças, mas minha cabeça estava diferente, eu podia sentir isso. Eu estava diferente, como se faltasse algo que eu não sabia o que era.


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Notas finais do capítulo

Comentes^^