Fleur VIII
Seletivo e ponto.

Acredite, leitor interessado e questionador, que, para Luke, a terceira série do curso médio fora o melhor de quase todos os períodos compreendidos desde o início até o final de sua vida acadêmica - não melhor do que a faculdade, a qual fora cursada na província imediata ao norte de Saint-Catherine em que vivia Luiza. Tendo se mudado para a cidade de Amandier ao sul da provincia citada (quase imediata à Greenville), a qual tinha o nome de Parnoir. A mudança fora motivada pelos estudos, mas, posto que Luke era tudo o que não fosse estudioso, fizera em Amandier tudo o que não fosse estudar.

Geralmente a terceira série é assim: por ser encarado pelos alunos como o último período de suas vidas em sala de aula, fatalmente os mesmos procuravam ter máximo aproveitamento das quatro estações que passavam estudando (embora nem todos a estudar) até o seu fim. Luke por certo pertencia ao conjunto citado, mas não fez valer suas intenções de forma plena.

Então, era Luke, em seu primeiro dia de aula na excitante Énergie High.

* * *

Como quando adentrara pela primeira vez Cien Fleur, observava. Sentou-se à uma carteira por ele aleatoriamente eleita e permanecia lá a direcionar olhares curiosos para todos os cantos ou não da sala em que se encontrava. Era avantajada. Não havia antes contemplado sala de aula tão ampla quanto aquela em toda a vida, mesmo as de Saint-Thomas de Morcerf sendo relativamente grandes (embora pequenas, se relacionadas às de Énergie) e densamente ocupadas.

Posta sua ansiedade, havia sido o primeiro a chegar ao colégio, e lá estava Luke, só, ao início da aurora e com os primeiros raios solares a penetrarem fracamente as escuras janelas da sala. Outros novos terceiranistas não tardaram a fazerem-se presentes. Todos distintos, mas com características comuns que explicitavam a harmonia que Luke poderia ou não ter com eles. Embora fosse seletivo com relação às amizades que cultivava – e aqui adianto que meu leitor pode vir a questionar a verossimilhança destes relatos; devido a interpretações de atitude ou adivinhações de pensamento talvez errôneas da parte do narrador –, Luke havia dado início ao dia com pensamentos expansivos. Sempre tivera dificuldades para se integrar a turmas novas, e na terceira série seria diferente. Faria amizade com todos, até com os professores e funcionários; tornar-se-ia uma lenda naquele colégio, lembrada até mesmo tempos depois de dele ter partido; e não menos importante, lembrar-se-ia com carinho, no futuro, dos tempos de terceiranista. E jurava esforçar-se ao máximo para tal.

Pelo que meu leitor já conheceu de Luke até aqui, por certo previu o fracasso total de tais idéias. Não seja precipitado! As idéias dele fracassaram, sim; mas os seus pensamentos animados e otimistas somados aos atos expansivos de quartos da primeira estação de aulas acabaram por determinar todo o resto da terceira série. Portanto, não se afirma aqui que o fracasso foi completo, mas sim que sua parcialidade fora conseqüência de uma característica não muito maleável da personalidade de Luke. Seletivo e ponto. Alguns podem até chamar isto de arrogância.

Sim, os primeiros momentos foram determinantes. As suas atitudes expansivas como tentar iniciar conversa com todo aquele que visse pela frente, cumprimentar a todos e fingir interesse em tudo o que lhe diziam o fizeram encontrar, entre tantos e tantos alunos, aqueles com quem se identificava mais, e com quem ficou até o fim; embora não sempre se sentisse bem no grupo.

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Sentado à carteira aleatoriamente eleita, Luke esperava pelo início de sua primeira aula em Énergie High. E avistou um vulto conhecido a rumar em sua direção.

- Olá, Luke! - Era Armand, estendendo-lhe a mão direita.

Luke a ele respondeu e à sua mesura correspondeu, apertando-lhe a mão de forma amigável e receptiva, tal qual seu amigo esperava. Também ele tinha esperanças de ter uma terceira série melhor do que foram os anos anteriores em Saint-Thomas de Morcerf.

- Luke, desgraçado! Você veio mesmo pra cá! – disse-lhe Juancarlo, ao aproximar-se rapidamente dos dois. Iam estudar juntos, os três, logo, nada mais natural e educado do que apresentar um ao outro e desejar que pudessem ser bons amigos durante e até após a terceira série do curso médio. Então, educadamente o fez Luke.

Seus dois amigos tinham personalidades completamente opostas, e este fato gerou discussões e rancor incomensuráveis entre eles; todos momentâneos, embora sérios e preocupantes, mas nada que tivesse acabado por torná-los inimigos ou mesmo rivais. Certos assuntos como religião e amor sempre os faziam ir quase às últimas conseqüências e alimentavam a raiva de um pelo outro. Raiva esta que, felizmente, em pouquíssimo tempo se dissipava sem deixar rastros.

A maior parte do tempo em aula fora passado com estes dois.

Os modos expansivos dos colegas já não mais existiam naquele colégio. Luke não pôde deixar de interpretar isto como falta de educação, pois frustrava-o o fato de que pessoas que o viam todos os dias e também aqueles com quem conversava com freqüência não correspondêssem às suas mesuras. Frustrava-o e enraivecia-o, ainda que a não correspondência delas não fosse proposital. Pouco a pouco passou a aderir também aos maus costumes de seus colegas, e com isto, a complementar a sua quase imutável seletividade. Ou arrogância. Não mais cumprimentava a quem não lhe cumprimentasse primeiro ou a quem ele não quisesse cumprimentar, embora amabilíssimo com aqueles que sabiam lhe corresponder.

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A terceira série também fora marcada por fatos externos, que serão narrados em momento oportuno.

Fica aqui apenas a deixa para que no capítulo nono se comece a falar do novo encontro alternativo de Cien Fleur – que é responsável por vários dos fatores a serem narrados –, cujo início coincidentemente aconteceu no primeiro dia de aula de Énergie High. O encontro gastronômico semanal de Cien Fleur, o Fleur Entrevue.