Devorar-te-ei: Memórias póstumas de um amor escrita por Nayou Hoshino


Capítulo 19
Encontros Matinais




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— Argh Sebastian... feche um pouco essas cortinas... _ resmunguei, tentando proteger os olhos do sol que avançava pela vidraça da janela.
— B-bom dia, my lady... _ Meyre retribuiu, a voz um pouco esganiçada incomodando meus ouvidos. _ Sebastian pediu para que eu lhe acordasse esta manhã, ele está preparando o vosso desjejum.
— Hum... _ resmunguei simplesmente.
Seria possivel que meu mordomo estivesse se afastando de mim propositalmente? Desde que nos conhecemos ele nunca perdeu a chance de estar ao meu lado, e agora essa sequência de acontecimentos... Tenho certeza que tem haver com a marca do contrato, mas não entendo porque ele simplesmente não dribla isso. Seria possivel, que ontem a noite...
Puxei a gola da camisola com pressa, buscando o local que meu mordomo tinha tocado com tanto ardor anteriormente. A marca estava lá, ainda um pouco fraca, mas a corrente que a envolvia parecia ter desaparecido um pouco, a cor ainda estava ali, mas consideravelmente mais fraca. Ele tinha conseguido, estava se esforçando para nos unir novamente... Olhei para o lado e vi um envelope cuidadosamente colocado ao lado do meu copo com água, lembrei que com a confusão de ontem eu acabara esquecendo de ler o relatório de Sebastian. Peguei o envelope e abri com cuidado, assim que tirei o papel de dentro recebi um olhar repreensivo de Meyre.
—Alimente-se primeiro, senhorita. Não vai lhe fazer bem pular refeições para trabalhar...
—Isso só vai levar um minuto. _ignorei suas objeções, correndo os olhos pela caligrafia invejável de meu mordomo.
Os homens que entraram naquela sala ontem a noite estavam limpos. Não tinham envolvimento com SM's ou qualquer outra coisa potencialmente perigosa... Então eu não era um alvo comercial, poderia ser pessoal? Isso me lembra... a garota que estava se vestindo como eu ontem, ela estava acompanhando a senhorita Jones. Será que ela tinha sido capaz de armar contra mim e ainda sacrificar uma de suas companheiras pra isso? Não fazia sentido. O mundo não é movido apenas por prazer pessoal, e sim por objetivos e lucro. O meu mundo pelo menos era assim. Algo não se encaixa...
Desci um pouco mais os olhos e vi que a caligrafia de Sebastian mudou um pouco, estava mais pesada e intensa...
"...a senhorita estava adorável sob a luz da lua, a amante secreta dos demônios. Quantos segredos ela pode guardar?"
...
.....
Espera... Essas palavras...
Meu rosto corou abruptamente e eu apertei o papel com força enquanto relia a frase pra ter certeza de que não era minha culpa falando mais alto. Sebastian tinha nos visto ontem, eu sabia. Ele não deve ter visto o beijo pelo menos, se não ele não teria respondido por si, eu o conheço. Mesmo assim... ele deve ter deduzido que algo aconteceu, ele deve saber, é um demônio.
E ele também não tem direito sobre mim nesse ponto, não sou propriedade dele nem nada assim, é justamente ao contrário. Não, não somos donos nem subordinados, somos sócios. Estamos no mesmo nivel, por isso é tão importante que nossa ligação seja refeita, certo? Apenas por isso...
—M-my lady! _Marye olhava pela janela assustada
—O que houve? _dei um pulo da cama e fui para o lado dela curiosa
Um carro vinha descendo o caminho pra minha casa, eu não estava esperando ninguém ... logo vi um pequeno emblema dourado no capô : era a policia. O que a policia queria comigo? Tá, pessoas foram atacadas e mortas e as coisas estavam meio fora de controle, mas isso era parte do meu dia a dia como cão de caça da rainha. Nada fora do comum.
Peguei um robe e me enrolei nele, amarrando-o na cintura de forma que cobrisse minha camisola brega e me desse o minimo de dignidade em frente aos meus inimigos, já que meus encontros com a policia sempre são recheados de desprezo de ambas as partes. Escutei barulhos no hall de entrada, Sebastian já deve tê-los recebido, vou me adiantar também.
Fiz minhas necessidades matinais rapidamente e desci a passos lentos, demonstrando meu interesse na conversa que estava por vir.
—Senhorita Kyotsu, desculpe o incômodo tão cedo... _ o oficial mais cheinho se inclinou um pouco desajeitado, deveria ser um novato.
—Poderiamos conversar por um momento? _ o outro, um pouco mais alto que o primeiro, disse seco
—Claro, senhor... ? _tentei ser cordial ao receber o olhar sério de Sebastian, o assunto deveria ser importante.
—Holmes. E este é meu parceiro Watson. _ele gesticulou.
Ergui uma sobrancelha, aquilo tinha que ser piada. Era uma pegadinha, certo? Os dois homens se mantinham sérios, tive que me esforçar muito pra não soltar uma gargalhada na cara deles. A dupla dinâmica mais conhecida da ficção de Londres está na minha casa. Se o resto do dia for assim, tenho medo de quem será a próxima visita.
—Bom, os senhores terão de me acompanhar no meu café da manhã. Chegaram bem a tempo. _me contive em perguntar onde estava o cachimbo do Sr. Holmes, vai que eles não tem senso de humor?
Eles apenas assentiram e olharam para Sebastian, que os guiou até o jardim, onde eu tomaria meu café. Alguns minutos depois ele voltou e fez uma reverência.
—Perdoe-me por recebê-los sem suas ordens, my lady. Apenas achei prudente que depois de ontem a senhorita não despachasse a policia, poderiam nos atrapalhar.
—Achou certo Sebastian, a última coisa de que preciso nesse momento é de problemas com as autoridades daqui... _passei a mão pelo cabelo, ajeitando uma mecha que caíra do coque. _Tem ideia do que se trata?
—Creio que não têm provas de nada sobre ontem, mas devem querer saber porquê aquela jovem estava como uma sósia da senhorita.
É, era bem provável que se tratasse disso... A rainha não pode me proteger de tudo e não posso usar a verdade para me explicar para os policiais.
Segui Sebastian até o jardim, onde os policiais aguardavam sentados à mesa. O local era rodeado de roseiras e bem próximo da estufa, onde se podia ver ainda mais espécies pelo vidro. A mesa estava posta com um bule de chá e suas xícaras, algumas torradas com geleia de morango e bolinhos. A quantidade que tinha ali me fez pensar se Sebastian já não sabia que teríamos visitas.
—Sebastian, nossos convidados devem estar com sede... _resmunguei, juntando-me aos dois oficiais, que apenas recusaram em silêncio. _Ou não então .
—A senhorita foi vista na festa de ontem a noite.
—Sim, porque eu estava lá. _disse secamente enquanto passava um pouco de geleia numa torrada.
—E mais uma vez a sua presença foi acompanhada de caos. _Holmes cruzou os braços sobre o peito, um gesto bem rude, tenho que dizer. Mas acho que ele não estava preocupado com isso.
—Dessa vez, a verdadeira criminosa foi pega, certo? Então não entendo a razão da visita. _dei uma mordida na torrada, deixando que algumas migalhas caíssem de volta ao prato.
—A razão pela qual estamos aqui, é que ela estava vestida como você. E algumas amigas dela relataram um comportamento estranho da parte dela após terem cruzado com você no salão. _ele sorriu, vitorioso _Sabemos que seu primo já esteve envolvido em festas ilícitas, seria fácil ele lhe arrumar alguma substância.
—Seria ainda mais fácil eu aplicá-la na pobre coitada na presença de todas as suas companheiras e dos demais convidados, certo? _disse irônica, e o sorriso dele se desfez um pouco.
—Você poderia ter pedido a alguém para fazer esse serviço sujo, como todos os outros nobres.
—E então caímos na mesma questão. Como poderiam fazer algo com a jovem se ela estava acompanhada? _bufei, depositando a torrada meio mordida no prato. _Senhores, estão me causando uma indigestão a essa hora do dia e sequer têm um argumento completo. É uma boa hora para se retirarem.
—Eu ainda não ...
—Ou, tenho certeza de que Vossa Majestade vai adorar se juntar a nós para ouvir vossas opiniões sobre mim e sobre os demais nobres da Inglaterra. _ ergui uma sobrancelha, dando-lhes a deixa perfeita para se retirarem sem danos enquanto ainda podiam.
Os dois homens se levantaram e o mais alto me fuzilou com o olhar por um breve momento antes de Sebastian chamar sua atenção para mostrar-lhes a saída. Não perdi a chance de mandar um tchauzinho para ele enquanto saíam.
Voltei minha atenção para a mesa e encarei minha torrada meio comida. Aquele assunto tinha tirado mesmo meu apetite. Pior que isso, sabia que eles voltariam a me incomodar. Aparentemente não tem casos criminosos o suficiente para a policia se manter ocupada ao invés de cuidar da minha vida. A xícara de chá que Sebastian tinha me servido já estava um pouco morna, mas dei uma golada mesmo assim só pra ajudar tudo aquilo a descer pela minha garganta.
De repente, meus olhos foram cobertos por um par de mãos quentes, o que me fez arrepiar num primeiro momento e me preparar para torcer os pulsos de seu dono no momento seguinte.
—Bom dia...
Aquela voz... O que ele está fazendo aqui?
—Ciel? _puxei as mãos pra baixo e olhei pra cima, dando de cara com o rosto sorridente dele. _O que você ... ou melhor, como você ...
—Eu precisava te ver. Desde ontem a noite eu... _ele se inclinou, de forma que seus lábios ficassem na altura da minha orelha esquerda _...não paro de pensar na senhorita.
Aquilo provocou um arrepio na minha nuca, e eu insitintivamente me afastei um pouco. Olhei-o nos olhos e vi o mesmo azul da noite anterior, cheio de amor e diversão. Senti meu rosto corar de imediato e desviei o olhar ao sentir meu corpo formigar com a lembrança dos lábios dele.
—Desculpe por ontem. _dissemos ao mesmo tempo, o que me fez virar de volta pra ele e ver que ele sorria.
—Você não precisa se desculpar. Você é uma dama comprometida, eu deveria ter controlado melhor meus sentimentos. _ele pegou a mecha de cabelo que tinha se soltado de novo e colocou atras da minha orelha. Seus dedos demorando-se um pouquinho demais na minha pele. _Eu levei um susto ao ver o caos que se tornou a festa, por um segundo eu pensei que fosse você lá e... eu precisava te ver.
—Escuta Ciel... _minha voz estava presa na minha garganta, ele mexia comigo, isso era certo. Meu falecido noivo nunca causou tais sensações em mim só com um toque casual assim. Mas não era certo deixar isso seguir adiante... as pessoas iam comentar e... eu acabaria o colocando em perigo também.
—Eu não quero que você me afaste de novo, por isso entrei escondido aqui. Seu mordomo certamente teria me barrado assim que eu desse as caras no portão. _ele revirou um pouco os bolsos da calça e puxou um pequeno pedaço de papel, colocando-o na palma da minha mão e a fechando em torno dele. _Para que não se esqueça de mim.
Senti meu rosto corar e o coração já quase pulava do peito. Olhei para baixo e dei de cara com meu robe, eu estava de camisola na frente do Ciel. Quantas regras acabei de quebrar?! Se meus pais me vissem, era bem capaz de levar uma surra... uma dama nunca deve trajar tais roupas na frente de um homem, ainda mais ela sendo comprometida com outro e sendo nobre como eu. Dei um tapa na minha testa e soltei um suspiro, agora a besteira já tinha sido feita.
—Ciel, acho melhor você ir... _foi o que consegui dizer.
—Eu sei, seu mordomo já deve estar voltando... _ele se ajeitou , olhando em volta. _Quero te encontrar de novo, precisamos conversar...
—P-precisamos? _ Será que ele teria a audácia de me propor em compromisso depois de ontem? Ou ele queria manter um caso em segredo da sociedade? Não podia permitir nenhuma das duas opções ... mas meu corpo me implorava o contrário, meus olhos não conseguiam desviar de seus lábios...
— Sou dono das empresas Funtom, talvez receba uma proposta de parceria e possamos ter uma conversa de negócios a sós ... _ ele sorriu sedutoramente, acariciando meu rosto com as mãos enquanto fitava meus lábios.
Ele se aproximou um pouco e eu cheguei a abrir os lábios sem perceber, mas ele apenas sorriu e se afastou, desaparecendo pelas árvores ao redor do jardim. Toquei meus lábios e corei, eu era mesmo uma oferecida agindo desse jeito. Mal me reconheci.
Voltei a olhar para frente e vi que Sebastian estava ali, olhando para as árvores. Essa não ...
— está tudo bem, my lady? _ ele ergueu uma sobrancelha
—A-ah... _ me atrapalhei, mas logo me recompus _Claro. Só estranhei a audácia daqueles dois em vir me visitar... traga-me um bolo de chocolate por favor, já tomei meu desjejum.
—Sim, my lady...


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