A Deusa do amor não acreditou no que tinha acabado de ouvir.

Afrodite continuou imóvel na moto de Ares por alguns minutos, só olhando a cara de desespero de cada um dos três, até que por fim, hesitante, ela desceu da moto devagar, mas não se afastou do veículo.

- O que vocês disseram? – Perguntou ela.

- Nós sentimos muito, muito mesmo! – Repetiu Apolo. Por ser o Deus das artes (incluindo o teatro) ele agiu de modo um tanto teatral, porém honesto, e se pôs de joelhos no chão – Por favor, por favor, por favor, perdoa a gente!

Afrodite não sabia o que dizer diante daquilo. Ela duvidava no fundo de que estivessem realmente falando a verdade, mas parte dela estava um tanto comovida.

- Afrodite, eu sinto muito por ter implicado com você, e com os seus filhos, e com tudo que tenha a ver com os seus gostos, mas por favor, deixa isso para lá e volta com a gente! – Pediu Hermes sentindo-se culpado – Nós não devíamos ter agido do jeito que agimos. Eu não devia ter agido do jeito que agi.

- Hermes, eu não... – A voz de Afrodite falhou no momento em que tentou parecer séria.

- O que você quer? Que eu peça de joelhos também? – Perguntou ele tenso. Hermes se pôs de joelhos ao lado de Apolo – Pronto. Viu? Estou de joelhos! Agora, por favor, perdoa a gente e volta para o Olimpo!

Afrodite estava convencida. Ela podia largar aquela moto ali mesmo e voltar para o Olimpo com eles, já que pediram desculpas de um modo tão desesperado. Ela se sentiu querida novamente. Como se sua importância fosse finalmente reconhecida.

Mas esse sentimento sumiu assim que ela notou a presença de Ares ao lado deles. Era o único em pé, que parecia estar completamente rígido.

A Deusa do amor cruzou os braços e olhou para ele com um ar superior e pouco convencido.

- Todos vocês sentem muito? – Perguntou lançando a indireta – E quanto á você, Ares? Também vai me pedir perdão?

Ares engoliu em seco.

Ele era o Deus da guerra. O Todo poderoso Ares, que não devia nada a ninguém, muito menos um pedido de desculpas. Mas ao olhar para Afrodite e notar a falta que ela faria no Olimpo, ele respirou fundo e assentiu.

- Eu... Não agi certo também, não é? – Perguntou ele já sabendo a resposta.

- Não, não agiu. – Respondeu ela ofendida.

- Eu... E-Eu... – Apolo e Hermes pararam para olhar para ele como que dizendo “Fala logo!” silenciosamente – Eu sinto muito.

- Acha que isso resolve as coisas? Um “sinto muito” basta para eu deixar tudo isso para lá? – Perguntou Afrodite dando um passo na direção deles - Ares, você voltaria se estivesse no meu lugar?

Ele olhou para ela, enquanto tentava mentir, mas a resposta escapou de sua boca.

- Não. Não voltaria. – Negou ele – Nem mesmo se pedissem de joelhos.

Afrodite não disse nada. Ela só assentiu em silêncio e foi de volta para a moto. Apolo e Hermes arregalaram os olhos cheios de preocupação, pensando que a Deusa iria embora para sempre. E eles tinham razão.

Se não fosse por Ares abrir a boca novamente...

- Mas você me conhece, eu sou um tanto... – Ares deu alguns passos na direção dela, e Afrodite virou-se para olhá-lo.

- Um tanto o que? – Quis saber.

- Um tanto... Ahm... Como posso dizer? – Perguntou ele coçando a nuca.

- Cabeça dura? – Sugeriu Hermes.

- Teimoso? Idiota? Convencido? Arrogante? – Sugeriu Apolo.

- Quem pediu a porcaria da ajuda de vocês?! – Berrou ele revoltado, mas depois olhou para Afrodite sem graça – Tá... Talvez eu seja tudo isso aí, e esse seria o motivo pelo qual eu não voltaria se estivesse no seu lugar. Mas... Afrodite...

- O que? – Perguntou ela esperando.

- Nós temos sorte de você ser diferente. – Continuou ele um tanto envergonhado por estar falando de modo tão aberto com Hermes e Apolo olhando – Precisamos de você, por que... Quem mais ia unir as pessoas? Sem você lá, vamos todos pular um no pescoço dos outros.

Afrodite ficou surpresa ao ouvir aquilo, mas não demonstrou. A Deusa estava com óculos escuros, por isso ninguém podia ver seus olhos úmidos. Ela não sorria, mas quando Hermes quebrou o silêncio...

- Se bem que seria muito engraçado ver Hades e Poseidon pulando no pescoço de Zeus. – Comentou o Deus das corridas – E imagina ver Héstia pulando no pescoço de alguém? Seria realmente uma loucura.

- Passaria até TV Hesfesto. – Comentou Apolo rindo um pouco – Eu acho que gravaria a cena, e repetiria várias vezes.

Afrodite deixou escapar um riso, o que fez os Deuses sorrirem também. Quanto tempo eles haviam passado sem ouvir aquela risada angelical? Podiam ter sido só alguns dias, mas pareciam meses.

A Deusa do amor olhou para Hermes e Apolo, e depois para Ares. Ela sorriu e limpou as lágrimas por debaixo dos óculos escuros.

- Ah, garotos... – Suspirou ela comovida. Ela abraçou Ares com vontade, e ele retribuiu. Apolo se levantou com um sorriso e correu até eles.

- Abraço em grupo! – Exclamou ele animado.

- O que?! Não vem não, seu...! Ah! – Exclamou Ares ao sentir Apolo jogando-se contra os dois e os abraçando. Hermes correu e fez a mesma coisa, e logo depois Héstia e Hefesto fizeram o mesmo.

- Ooown, eu amo vocês! Todos vocês, seus lindinhos! – Exclamou Afrodite no meio de todos eles.

- Vamos voltar agora, certo? Acho que Zeus também vai querer pedir desculpas. – Comentou Hefesto largando a todos. Eles desfizeram o abraço e foram a caminho do Olimpo.

Várias pessoas estavam praticamente se matando em uma pequena praça do Olimpo. Atena olhava a situação tensa, enquanto roia as unhas de nervoso.

- O que foi, Atena? Ficou preocupada agora? – Perguntou Éris com um sorriso satisfeito – Pensei que tinha fé que seu irmão voltaria com a Afrodite.

- Ele vai voltar. – Insistiu ela insegura – Ele... Deve estar vindo.

- Acorda, Atena. Afrodite nunca mais vai voltar, e eu estou mais que feliz por isso. – Éris respirou fundo feliz – Sinta o doce cheiro da discórdia no ar. Com a princesinha cor de rosa longe daqui eu estou livre para poder assistir e provocar brigas como essa todos os dias.

- Ah, mas é aí que você se engana, meu bem. – Disse uma voz charmosa se aproximando. Atena olhou para o lado junto de Éris e viu...

- Afrodite! – Exclamou ela aliviada – Graças á Zeus você está de volta!

- Graças á Ares. Obrigado. – Corrigiu Ares aparecendo também, e lançando uma careta para a irmã, que retribuiu do mesmo jeito.

- Tsc. Então você voltou mesmo sabendo que é completamente inútil? – Perguntou Éris cruzando os braços – Se bem que isso não me impressiona. Você sempre foi a sem-cérebro daqui mesmo.

- Há Há. E você sempre foi a excluída daqui. – Rebateu Afrodite se aproximando de Éris – Mas acho que o meu cérebro é bom o suficiente para ver que o seu tempo de diversão aqui acabou, querida.

Afrodite olhou para as pessoas brigando e mexeu seus dedos de um modo suave. Uma brisa leve bateu no lugar, e todos pararam a briga. Casais foram se formando e olhando um para o outro com rostos sonhadores e sorrisos apaixonados.

Todos saíram de dois em dois, e de mãos dadas felizes. Éris rangeu os dentes de raiva, e Afrodite deu um risinho triunfante.

- Sinto muito, mas se me dá licença, eu tenho coisas mais importantes para fazer do que ficar aqui e perder meu tempo com a sua companhia. – Disse Afrodite indo em direção do salão principal. Éris e ela se odiavam, mas a Deusa da discórdia deixou a briga delas para depois e simplesmente sumiu.

- Bem... Estamos felizes por você finalmente ter voltado Afrodite. – Disse Zeus olhando discretamente para o lado, onde Hera estava sentada. A Deusa do casamento não retribuiu o olhar, mas ao menos não estava parecendo estar raiva dele.

- Ainda falta um pedido de desculpas. Na verdade, muitos, mas como você é o representante dos Deuses, acho que pode fazê-lo por todos. – Disse Afrodite olhando-o.

Zeus suspirou pesadamente. Ele odiava ter que pedir desculpas para os outros, mas quando notou a tosse forçada de Hera, resolveu falar logo.

- Afrodite, em nome de todos os olimpianos presentes nessa sala, e em todo o Olimpo, eu peço desculpas por menosprezá-la. – Anunciou ele.

Afrodite sorriu e cruzou as pernas de modo elegante.

- Obrigada. Eu aceito as desculpas. – Disse ela sorrindo de leve.

- Acho que agora podemos discutir o assunto do Acampamento, não é? – Perguntou Poseidon – Acho que poderíamos arrumar alguns ajudantes para Quíron, já que o número de semideuses está aumentando.

- É mesmo. Os meus filhos não conseguem treinar direito, por falta de instrutores. – Comentou Hades – Quíron não consegue dar conta de ajudar todos eles.

- E os meus filhos estão precisando de mais flechas também. – Comentou Apolo.

- Isso não é difícil de resolver. – Disse Zeus pensando no assunto – Tenho certeza que, como Dionísio é o responsável pelo Acampamento Meio-Sangue, ele pode resolver todos esses problemas.

- Quem disse que eu posso? – Perguntou Dionísio.

- Eu disse. – Respondeu Zeus.

- Quem disse que eu quero? – Perguntou ele cruzando os braços.

- Quem disse que nós nos importamos? – Rebateu Ares.

- Quem aprova a decisão? – Perguntou Zeus.

- Aprovado! – Anunciaram todos levantando as mãos.

Dionísio não gostou nada disso. Ninguém nunca parava para ouvir o que ele tinha á dizer. Ninguém nunca se importava com as suas reclamações. Afinal ele não era parte do conselho Olimpiano?! Ele não era um dos 12? Ele merecia mais respeito!

Ninguém nunca dava valor ao seu potencial, e isso o estava incomodando. Tinha que mostrar para eles qual era o seu valor como Deus do vinho e das festas. Não teria animação em lugar nenhum se não fosse por ele.

E se... E se ele fugisse? Para bem longe dali, em algum lugar distante? Tipo... As Bahamas? Ou o Havaí. Ou melhor... Ele podia ir para Las Vegas.

Se ele fizesse isso seria “Adeus diversão” para todo mundo ali. Ele podia até imaginar todos morrendo de tédio, e deprimidos, e tristonhos, e parados e...

- Isso nos leva ao próximo assunto... – Zeus foi interrompido.

- Esperem aí, todos vocês. – Disse Dionísio se levantando e atraindo o olhar de todos os olimpianos – Eu acho que não estou recebendo a atenção necessária e nem o crédito digno de um Deus tão bom quanto eu. Vocês não me dão valor, e se não se redimirem agora por me menosprezarem, eu vou fugir para bem longe e vocês nunca mais...!

- Pode esquecer! – Berraram todos juntos, e Dionísio arregalou os olhos, surpreso.

- Mas eu vou...! – Tentou ele novamente.

- Cala a boca e senta logo! – Exclamou Ares para ele.

Dionísio cruzou os braços e começou a resmungar. Quando finalmente se sentou, a sua raiva se transformou no mesmo tédio indiferente de sempre.

- Eu realmente amo vocês, família linda. – Comentou ele em sarcasmo.

- Não é lindo ver que o amor voltou ao Olimpo? – Comentou Hades.