A Terra Onde Há Dragões escrita por moonfall
Eles voaram até anoitecer. O vento era quente, porém Helena sentia frio, o ar rarefeito a fazia ficar tonta. Estava com as mãos na cela de couro escuro se segurando em finas tiras para esse fim. Não conseguia dormir apesar de se sentir cansada, o medo de cair era maior.
– Chegamos.
Helena desviou o olhar da sela e olhou para baixo. Estavam voando sobre montanhas altas porém não ao ponto de possuírem neve, elas eram pontiagudas e de rochas negras, quase nuas. Matos ressequidos cresciam entre as pedras, porém à luz da lua tudo parece morto.
A cadeia de montanhas tinha um formato circular, com algo semelhante a um planalto em seu centro. Onde o planalto se chocava com as montanhas crescia uma densa floresta que era cortada por um rio não muito largo com seus afluentes, mais para o centro havia uma grande clareira com amontoados de casas fracamente iluminadas.
As montanhas começaram a se iluminar, como pequenos vagalumes alaranjados começaram a brilhar por breves instantes, os pequenos pontos luminosos estavam ficando cada vez mais numerosos, pequenos grunhidos ecoados chegavam entrecortados aos ouvidos de Helena.
– O que são essas coisas?
– Dragões.
– Nossa, eles são... Muitos. – disse Helena pensativa
Goblin inclinou o corpo para o lado voando em espirais cada vez menores, cada vez mais perto do solo. Ele deixou o corpo em uma posição ereta batendo suas enormes asas para manter o equilíbrio, então tocou as patas traseiras no chão depois as outras. O pouso foi grosseiro para Helena que sem apoios suficientes quase tombou para trás, porém para um dragão enorme e pesado como Goblin, o pouso foi extremamente suave e silencioso.
As nuvens de poeira que o potente vento que as asas do dragão levantaram, estavam assentando. Alguns moradores estavam nas ruas se aproximaram para ver quem havia chegado, alguns os olharam e voltaram aos seus afazeres e alguns poucos se aproximaram para os receber, mas a maior parte dos habitantes locais já estavam em suas casas. Uma menina alta, de cabelos loiros undulados que brilhavam na luz das tochas deu uns passos à frente e se apresentou:
– Olá, meu nome é Alice, você deve ser a novata que tanto falam aqui.
Helena hesitou em falar, a moça parecia se esforçar para parecer amigável, porém Helena notou que ela não era do tipo social.
– Oi, meu nome é Helena... Como sabiam de mim? – disse a garota pausadamente
– Nós estávamos ansiosos para a sua chegada afinal... - então parou abruptamente
– O que foi?
– Ah, Nada assunto secreto... Sinto muito por não poder lhe contar. - Alice estava aparentemente nervosa, suando frio
– Vá com ela Helena - disse o mestre tirando a sela de Goblin
Alice a conduziu entre as ruas largas que serpenteavam como a um labirinto e entraram em um pequeno chalé. Ele tinha sua estrutura de pedra mas sua parede era forrado de um material semelhante ao barro, porém mais resistente e bonito. Helena passou pela porta de madeira e cobre, seus pés sentiram uma mudança de piso, este era feito de largas tábuas de madeira com tapetes distribuídos aleatoriamente. Alice lhe mostrou o caminho para a pequena cozinha a garota ofereceu uma cadeira à Helena que sentou nela, suas pernas estavam dormentes devido ao tempo que ficou montada no dragão verde.
– Helena, você gostaria de beber, comer alguma coisa?
– Sim, por favor.
Alice pegou um copo de vidro laranja em uma prateleira e derramou nele um líquido esverdeado, fatiou um bolo e colocou-o em um pratinho.
– Ah, obrigada. - Helena pegou o copo e o prato
– De nada, esta bebida vai lhe esquentar e repor suas energias. Vou te contar o que quiser saber sobre esse lugar. Bom, é só perguntar.
Helena bebeu o líquido viscoso e se sentiu muito melhor mas muito sonolenta. Pegou a fatia e mordeu-a ansiosa, estava morrendo de fome. Após terminada a refeição, olhou para a outra e disse:
– Alice, desculpe, mas estou cansada e minhas pernas um pouco doloridas...
– Um pouco?! Você está caindo, desculpe, é que estou ansiosa para saber mais de você... Venha comigo.
Então Alice a conduziu a um pequeno quarto, com uma escrivaninha de madeira escura com três gavetas no canto direito com papéis, pena, tinta, alguns livros e um abajur sobre ela, um estreito guarda-roupa com dois ganchos do lado de fora para prender cassacos, em fins, uma cama aparentemente macia com um criado mudo disposto ao seu lado e sobre ele outro abajur, uma janela grande virada para o que seria os fundos da casa mas que tinha na verdade um pequeno gramado que subitamente se transformava em uma floresta pouco densa e aos fundos conseguia ouvir o som de água corrente, do seu lado direito havia uma poltrona de tecido vermelho e do lado esquerdo uma estante amontoada de livros que ia até o teto.
– Em espaço ele não é muito grande... – começou a garota loira
– Que lindo! Eu adorei! – Os olhos da garota brilharam ao ver o quarto, sentia-se feliz, e como nunca na vida sentia que aquele era o seu lugar
– Ah esqueci que você nunca teve um quarto só seu... Ele é todo, só para você.
– Obrigada, em sei como lhe agradecer! – então o cansaço veio à tona, sentiu seu corpo fraquejar e suas pálpebras ficarem cansadas – Desculpe, mas estou com tanto sono, obrigada por tudo. – disse a morena entre bocejos
Alice acendeu um lampião e deixou no canto do quarto.
– Qualquer coisa é só chamar... – a garota girou, fazendo seus cachos se erguerem no ar e com delicadeza fechou a porta.
Helena olhava maravilhada ao redor, aquele cômodo lhe dava a sensação de aconchego, nunca se sentira tão grata.
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A garota acordou de manhã com as pernas extremamente doloridas, e Alice a chamou para o café da manhã. Cambaleou pela casa até achar a cozinha, lá encontrou a mesa já servida, dois pratos com ovos, bacon e pão com dois copos de suco de laranja.
– Se eu fosse você não demorava no banho e me arrumava depressa.
– Por quê?
– Para irmos a escola, lógico!
– O que é uma escola? – Helena nunca ouvira esse termo
– Santa ignorância, vá se arrumar logo! – Alice estava claramente com pouca paciência
Helena se banhou e vestiu sua mais confortável calça de algodão, sua blusa e sua sandália, depois deixaram a chalé caminhando pelas ruas tortuosas traçando um caminho para o centro do vilarejo.
– Você também usa calça? - perguntou Helena olhando para a calça preta de tecido leve e muito resistente
– Nosso trabalho deve ser feito com calças, o vestido nos atrapalharia e íamos tropeçar nele.
– Quantos anos você tem Alice?
– Dezesseis... E estamos atrasadas! Você não pode se atrasar para seu primeiro dia de aula!
As duas começaram a percorrer o vilarejo com rapidez. As ruas, calçadas de pedras e eram bem largas, apenas alguma ruelas eram estreitas, o chão tinha marcas de garras e durante todo o percurso passaram por vários dragões acompanhados e desacompanhados, alguns com celas outros com armaduras e uns poucos com algumas tiras presas no tronco com várias bolsinhas e lugares para prender equipamento, seja para trabalho ou seja para treinamento.
Diminuíram o passo ao chegar a uma construção de dois andares enorme, do tamanho do abrigo de Helena. Ao longe era possível ouvir rugidos de dragões e ao olhar pra cima, o céu azul estava com pingos pretos que se moviam em alta velocidade, mais dragões.
– Que bom não estamos atrasadas! – disse a garota com alívio
– Que lugar é esse? - perguntou Helena
– A escola, bobinha.
– E... O que fazemos ai dentro?
– Temos aulas, lógico!
Um sino tocou, o som era penetrante vibrava no crânio da garota. Muitos adolescentes correram para a porta da entrada, mas esses “muitos” era um valor relativo.
– Helena a sua sala fica no segundo andar, terceira porta a direita! – disse Alice
Alice entrou em uma sala grande e deixou Helena sozinha no corredor, seguindo as instruções de Alice, ela subiu a escada e entrou na terceira porta à direita. Dentro da sala havia várias mesinhas de madeira de dois lugares e elas estavam postas em filas. Numa parede tinha uma mesa maior com uma cadeira e a parede era de pedra, haviam 11 mesas no todo, sobre da mesa maior haviam várias pedras ovais polidas coloridas dispostas em fila.
Um homem entrou na sala e sentou na mesa maior perto da parede. Quase todos os lugares estavam ocupados apenas dois estavam livres, um do lado de um menino que conversava com todos e outro do lado de uma menina que sorria para outra, a ruiva correu para o lugar da menina sorridente. Helena sentou ao lado do menino que parecia simpático. O garoto se virou e disse:
– Oi meu nome é Thales, e o seu?
– Olá, sou a Helena - respondeu Helena com a voz fraca
O sorriso desapareceu do rosto do garoto.
– Ah...
– Turma, silêncio por favor. - Começou o homem - Hoje vocês vão aprender como cuidar de seu ovo para ele eclodir bem. Mas para isso vocês tem que recebê-lo, aqui tem mais ovos do que alunos, mas não tem problema, esses são fresquinhos. Agora gostaria que vocês fizessem uma fila na minha frente. – disseram que o homem era o professor
Os dez alunos fizeram uma fila muito torta, todos inclinavam o corpo para ver melhor as pedras que segundo o homem, eram ovos. A primeira da fila era a garota sorridente.
– Marthine toque nos ovos se eles derem um estalo é por que o dragão lhe escolheu.
A garota estendeu sua mão suave e clara, tocou num ovo branco com tons de rosa, ele estalou com o calor da mão da garota.
– Isso Marthine, agora pegue esse ovo e leve com cuidado até sua carteira e sente-se.
Marthine obedeceu, e começou a alisar o ovo com a ponta dos dedos.
– Próximo!
Era o Thales, ele tocou receoso num ovo laranja, nada, depois tocou em um ovo verde, e nada, ao tocar no ovo preto e verde este deu um estalo que foi tão alto que Helena tremeu.
– Ótimo Thales, agora sente-se, por favor.
Todos tocaram nos ovos e eles estalaram. Helena era a última da fila e estava muito ansiosa, suas mãos tremiam. Logo chegou sua vez e haviam sobrado cinco ovos, ela tocou no primeiro que era vermelho e nada, no segundo que era azul e nada, tocou no verde e nada, tocou no roxo e nada, tocou no branco e nada. Helena estava ficando desesperada. Nenhum dragão a queria! Seus olhos começaram a se encher de lágrimas inexplicavelmente, ela se sentia assim quando algo dava errado apesar dessa coisa não ser tão importante, mas aquilo era.
– Vocês devem dar nome aos seus dragões, e Helena, amanhã trago mais ovos para você. disse o professor
– O meu vai se chamar Margareth - disse Marthine.
– E o meu vai ser Ônix - disse o Thales orgulhoso.
– Como você pode saber o sexo dele? Deixe de ser imbecil.
– Sei do mesmo jeito que você sabe o do seu. – retrucou o garoto calmamente
– Ah o meu é branco com rosa, é uma cor suave e leve, só pode ser menina!
– E o meu é preto e verde.
– Mas pode ter uma menina preta e verde!
– E pode ter um menino rosa e branco.
Helena podia ver, Thales estava se divertindo com tudo aquilo, não passava de uma brincadeira.
– Não pode não! - a garota estava ficando vermelha
– Parem vocês dois! Thales e Margareth se acalmem!
Helena longe de toda a confusão, num mundinho só dela pensava "E se nenhum dragão me escolher? O que será de mim?". O sino tocou novamente, durante todo o tempo de aula ela não conseguiu prestar atenção, estava preocupada demais. Ao sair da aula encontrou Alice do lado de fora do prédio.
– O que acontece se um ovo não escolhe alguém? – perguntou Helena ao se encontrar com Alice fora da escola
– Sempre tem um ovo que escolhe alguém quem passar no teste sempre tem um dragão que o escolhe. Falando nisso posso ver o seu ovo?
Helena desviou o olhar, não suportaria se Alice a visse chorar.
– Oh desculpe, é que eu estava pensando numa pessoa...
– Quem? – perguntou Helena apesar de não estar interessada
– Um menino da minha sala meio... Diferente, o nome dele é Leo. Mas ele me acha "estressada" ele que vá limpar o chiqueiro, aquele panaca, como ele pode me chamar de estressadinha? Que ridículo!
– Hum... Como se chama o seu dragão? – perguntou Helena tentando desviar do assunto
– O nome dele é Érion, nome estranho eu sei, mas ele gostou.
– Ele é de que tamanho?
– Enorme, e é bem forte, meio gordinho e carrancudo.
– Onde ele está?
– Acho que dormindo, o preguiçoso...
Helena comeu, estudou sobre como cuidar de um ovo e foi dormir. Seus sonhos estavam turvos, ouvia rugidos e vultos voando acima dela, jatos de vento quente vinham em sua direção e um vulto negro se destacou, seus olhos eram cor de âmbar.
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No dia seguinte ela se lavou (o que era um hábito dos domadores de dragão, tomar banho todo dia), comeu e foi para a escola. O professor a chamou mais cedo do que o resto da turma, ela foi para a sala e se sentou na primeira carteira, na mesa dele estavam oito ovos, um negro, um cinza azulado, dois dourados, um vermelho escuro, um marrom, um cor de areia e um azul claro.
– Achei este a sua cara - disse o professor apontando para o ovo cinza.
A garota receosa tocou levemente o ovo, ele era gélido ao toque o que fez seus pelos se eriçarem, mas nada de estalo. A tristeza novamente dominou o seu ser até que tocou novo preto, ele era extremamente liso e frio a garota se encolheu ao toque porém algo se apoderou dela uma felicidade que apenas aquele ovo preto com reflexos azuis poderiam proporcionar. Após um curto período de tempo o ovo estava morno por ter tomado parte do calor da garota e então um estalo vibrou pelo corpo todo de Helena, como uma descarga elétrica.
“É ele, finalmente ele chegou!”
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