Giuliet Volturi - Dark Side Of The Earth escrita por G_bookreader


Capítulo 35
Allan e Amy




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-Ai, Fátima! Quer me matar avisa logo! – Reclamei enquanto ela tentava fazer um curativo descente no meu ombro.

Quando chegamos em casa, fui direto tomar um banho, o que não foi muito fácil. Mas, mesmo com dificuldade, só saí de lá quando não havia uma partícula de lama no meu corpo. Agora eu estava sentada na minha cama, com as costas apoiadas na cabeceira, enquanto Andreas e Fátima me ajudavam com o ombro, enquanto Christopher passava pelo mesmo processo com Lizzie e Giacomo em outro quarto. Não estava sendo a tarefa mais fácil do mundo, Fátima estava bem indelicada.

Ela botou as mãos na cintura, impaciente, e bufou, me encarando com cara de brava.

-Giuliet, você sabe muito bem que tem que juntar isso. – Ela disse, bufando. – Da última vez você não reclamou que nem uma velha desse jeito. Andreas, a culpa é sua.

-Minha? – Ele perguntou, sem entender nada, olhando para ela confuso.

-Sua sim, senhor! Ela fica fresca quando está perto de você. – Revirei os olhos com isso.

-Termina logo com isso, vai. – Apressei, já trincando os dentes.

-Se você colaborar. – Ela resmungou, se aproximando novamente.

Ela pressionou o meu ombro contra o meu corpo, forçando as duas partes a se unirem. Com a outra mão apertei a mão de Andreas, com força, e sufoquei um grunhido de dor. Eu devia estar enforcando a mão dele, mas não conseguia controlar, doía demais. Quando ela achou que estava junto o suficiente, sinalizou para Andreas, que passou um rolo enorme de gaze para ela. Juntos eles enrolaram aquilo em mim, passando por debaixo do meu outro braço, de modo que me prenderia, facilitando a cicatrização. Quando acharam que eu já estava enrolada o suficiente, Fátima partiu a gaze e a colou com esparadrapos. Ficou perfeito. Eles me ajudaram a vestir a blusa e a me levantar. Eu estava me sentindo uma incapaz, mas não havia muita coisa que eu pudesse fazer.

Fomos saindo do quarto e Fátima resolveu ajudar com Christopher. Lizzie não era a pessoa mais habilidosa do mundo quando se tratava de curativos, pelo que ela mesma admitiu. Eu e Andreas continuamos nosso caminho para a sala, que estava, aparentemente, vazia. Quando chegamos na escada, ele me abraçou pela cintura com um braço e me levantou, me carregando até lá em baixo, me libertando apenas quando já estávamos fora da escada.

-Eu vou ficar mal acostumada desse jeito. – Brinquei, sorrindo para ele. Ele deu de ombros.

-Por mim tudo bem. – Ele respondeu, indiferente.

-Você não sabe o que está causando para si mesmo. – Avisei, rindo e ele revirou os olhos, sorrindo. Olhei ao redor, procurando meu celular. – Preciso ligar para La Push, ver como Beta está.

Comecei a andar na direção da mesa de centro, onde meu celular estava apoiado.

-Você se preocupa com ela bastante. – Ele comentou, enquanto íamos na direção.

-Claro que me preocupo, ela é minha filha. Pode não ser de sangue, mas é.

-Ainda não me acostumei com algumas coisas. – Ele respondeu, sorrindo sarcasticamente.

-É tão difícil assim? – Perguntei, curiosa.

-Dê um desconto, você mudou um pouco desde que fui pego.

-Mudei? – Parei para encará-lo, agora muito curiosa.

-Claro que mudou, Giuliet, e eu não esperava o contrário. Mas fica tranqüila, foi para melhor. – Ele respondeu, sorrindo e dando de ombros.

-Dá para explicar? – Ele estava cansado de saber que não era legal me deixar curiosa.

-É, nem tudo mudou. – Ele deu uma risada, para então continuar. – Você está mais velha, só isso.

-Óbvio que eu estou mais velha, passaram-se alguns séculos, ó ser de inteligência superior. – Eu respondi, rindo. Ele bufou e revirou os olhos.

-Não foi isso que eu quis dizer. Óbvio que você está mais velha nesse sentido. Eu quis dizer mentalmente. Antes você tinha quase que duzentos anos, mas na maioria do tempo parecia ter dezenove. Não me incomodava, de forma nenhuma, mas era assim que você agia. Mas agora não. Agora você adota o meu nome, é líder de uma espécie e, o que eu nunca poderia ter imaginado mesmo, mãe. – Ele riu da última parte. – Antes você se parecia com uma garota, agora com uma mulher.

-Se você preferir, eu posso voltar a ser uma garota inconseqüente e idiota que eu era antes. – Provoquei, pegando meu celular na mesa.

-Eu prefiro agora. – Ele respondeu rapidamente, o que me fez rir de novo. Até eu olhar a tela do celular.

Havia vinte e sete ligações do contato “Roberta”. Meu dedo quase que massacraram o aparelho enquanto eu retornava a ligação. Andreas ficou me encarando com um semblante preocupado, mas não falei nada. Minha concentração estava toda no chamar do telefone. Pareceram que se passaram minutos até que alguém atendesse do outro lado.

-Alô? – Ela atendeu, do outro lado. Ouvir sua voz me fez me sentir aliviada.

-Beta, ainda bem que você atendeu. Aconteceu alguma coisa? – Silêncio do outro lado da linha. Isso não era um bom sinal.

-Melhor você vir até aqui. Vai ser mais fácil explicar do que por telefone. – Ela estava um pouco nervosa, e me deixando do mesmo jeito.

-Chego aí em um minuto. – Eu disse, desligando e me dirigindo até a escada, mas sem subir. – Matt, vamos para La Push, aconteceu alguma coisa lá! – Chamei e, no segundo seguinte, ele estava do meu lado.

-Eu vou com vocês. – Andreas disse, enquanto andávamos para o lado de fora e seguíamos para a garagem.

Entramos no meu carro, Matt dirigindo, eu no banco do carona e Andreas atrás, inclinado para a frente, ficando com o rosto entre nós dois. Matt partiu com o carro e saiu utilizando toda a potência do motor, fazendo curvas perigosas e parecendo muito com uma perseguição policial.

-Aconteceu alguma coisa com Karine? – Ele perguntou, apertando de leve o volante.

-Eu não sei, Beta não quis me explicar nada por telefone.

-Mas o que aconteceu? – Ele insistiu.

-Não sei, Matt, ela não explicou? Vou ter que desenhar isso para você? – Perdi a paciência, eu também estava preocupada, inferno.

Ele não falou mais nada e o carro chegou na velocidade máxima quando entramos na estrada. La Push parecia ter ficado uns cinqüenta quilômetros mais longe do que o normal. A distância não parecia diminuir nunca, mesmo com as ultrapassagens arriscadas que Matt fazia, algumas quase que milimetricamente calculadas. Finalmente vimos a placa da reserva e socamos o carro na estradinha esburacada. Eu não estava dando a mínima para o carro daquela vez. Não enquanto eu não soubesse exatamente o que tinha acontecido.

Mal o carro parou na frente da casa de Camily e eu saí, me arrependendo do movimento abrupto pela dor que ele causou. Quando me aproximei da casa, senti cheiro de sangue, e não era humano. Talvez minha razão estivesse abalada, mas eu não consegui identificar de quem era o cheiro. Andei o mais rápido que pude, com os outros dois logo perto de mim. Entramos na casa em um rompante, Camily aparecendo no mesmo instante na sala. Ela ia falar alguma coisa, mas eu não dei a ela muito tempo.

-Cadê a Beta? – Perguntei, a ansiedade na voz.

-Oi, mãe. – Ouvi a voz dela, enquanto ela vinha da cozinha.

Quando a olhei, levei um susto, dos grandes. Sua roupa jaqueta, assim como a blusa branca que estava por baixo, estavam totalmente sujas e encharcadas de sangue, arruinadas. Havia um pequeno corte na sua testa e um roxo no pescoço, em formato de dedos. Eu fiquei sem reação em um primeiro instante, ela parecia bem e despreocupada. Aquele sangue todo era dela?

-Não surta, esse sangue não é meu. – Ela disse, antes que eu pudesse fazer exatamente isso. Isso me fez ficar bem mais aliviada.

-O que aconteceu? – Perguntei tentando manter minha voz mais controlada.

-Eles foram atacados pelos dois irmãos de Jones enquanto lutávamos. – Camily explicou, tendo a delicadeza de não dizer “seus irmãos”.

-O cara atacou Benjamin e ficou o distraindo enquanto a mulher entrou pelos fundos, por uma janela. – Beta começou a contar, recostando-se no batente da porta. – Eu e Jones estávamos mais perto e ouvimos um barulho, era ela com uma faca estilo “Rambo”. Tudo bem, não tão grande assim, mas era grande pra caramba. Então Jones se atracou com ela enquanto eu catava Karine rápido e corria com ela para os fundos da casa, era a única rota de fuga. Só que a maluca conseguiu se desvencilhar de Jones e nos alcançou. Aí eu tive que lutar com ela.

-Giuliet, ela foi incrível! – Disse Karine, aparecendo do nada de um dos quartos. Matt foi na direção dela e a abraçou, meio que conferindo se ela estava bem. Ela praticamente o ignorou e se sentou no sofá, empolgada. – Sério, você tinha que ter visto! Nós estávamos lá atrás, aí a vampira, ou seja lá o que ela for, sem ofensas Beta, e começou a atacá-la. Eu não consegui enxergar muita coisa, mas a faca voou da mão daquela louca lá e foi para bem longe. Elas ficaram se batendo lá até que Jones apareceu todo cortado e arremessou para Beta um ferro pontudo. – Ela abriu os braços para dar a dimensão do ferro. Devia ter meio metro. – Aí Beta pegou aquilo no ar e se esquivou do chute da outra, de forma que quando ela levantou, a vampira estava em cima dela. Beta não pensou duas vezes, tipo, foi muito automático o que ela fez! Ela pegou o ferro e enfiou como se fosse uma estaca no meio da barriga, jorrou sangue para tudo quanto é lado. Foi demais! – Eu nunca tinha visto uma humana tão feliz em ver violência. Se Matt não a transformasse, eu faria isso pessoalmente. Ela em um campo de batalha seria pura destruição. – Aí ela ficou lá toda morrendo, meio que caiu em cima de Beta, por isso ela está toda suja desse jeito.

-É, foi mais ou menos isso. – Beta disse, sem graça.

O que aconteceu ali fazia muito sentido. Jason estava convicto de sua vitória e não poderia deixar que nada meu restasse no mundo, nem um ideal, nem nada. Na cabeça dele, ela era um problema potencial para o futuro, poderia tentar armar uma rebelião para se vingar, para retomar o poder. Mandou as duas abominações dele para fazerem o serviço. E havia falhado. Todo aquele discurso de como eu havia errado ao criar minha filha para o mundo, e que ele estava certo, havia caído por terra. Aparentemente eu havia vencido no quesito filha também. Eu quase não cabia dentro de mim por isso. Queria poder esfregar isso na cara dele, mas estava feliz com ele morto.

Encarei Beta com um sorriso que eu sabia que soava bobo no rosto. Ela desviou os olhos, meio vermelha de vergonha. Isso seria o suficiente para ela entender o que eu achava. Agora era hora de ficar séria de novo.

-Como estão Benjamin e Jones? – Perguntei.

-Ben está com alguns cortes superficiais, arranhões só, vai se curar rápido. Os cortes de Jones eram mais sérios, mas não muito também. Já fiz curativos neles e ele vai sobreviver a isso. – Respondeu Camily. – Os dois estão lá nos fundos vigiando os corpos.

Comecei a ir na direção indicada, e todos me seguiram. Era final de tarde e em breve choveria novamente. Os dois estavam parados próximos a dois corpos deitados. Benjamin estava sério e pensativo, Jones parecia enojado e incomodado. Não prestei muita atenção nos dois, me dirigindo diretamente aos corpos. Ambos estavam deitados de barriga para cima, meio que jogados, um ao lado do outro.

Eu nunca havia visto Allan. Ele era da mesma altura de Jason e levava alguns traços, mas não era exatamente igual. Cabelos castanhos, mas meio que para o ruivo, cacheados e as feições menos refinadas. Tinha uma mordida profunda de lobisomem no pescoço e sangue saindo de lá. Provavelmente perfurou a garganta e ele morreu afogado no próprio sangue, pela quantidade de sangue que havia vazado pela boca.

E ao lado, Amy. Parecia que agora, morta e com a pele pálida, era ainda mais parecida comigo. Por um momento, foi como se eu me visse deitada ali. Os olhos muito azuis, iguais aos que eu costumava ter, porém sem vida, encaravam o vazio do céu com uma expressão de dor e agonia. Suas mãos ainda estavam fechadas em torno do ferro, que jazia preso em sua barriga. Ao redor do ferimento havia sangue, assim como um filete vermelho que escorreu pela boca. Os cabelos castanhos e ondulados estavam sujos de terra e molhados pela chuva. Não era uma cena muito bonita de se ver, eu queria acabar logo com aquilo.

-Temos que sumir com os corpos deles. – Comecei a falar. – Eles quiseram ser totalmente vampiros durante toda a sua vida, então acho que podemos dar isso a eles agora. Mas eles ainda são humanos, e, no fundo, não tem culpa do que se tornaram. Tudo isso é culpa de Jason, eles são fruto de uma mente psicopata. Vamos queimá-los e enterrar o que sobrar disso. Eles não devem virar pó com a mesma facilidade.

Ninguém pareceu discutir, Benjamin começou a agir rapidamente e Matt o ajudou. Eu me retirei, não queria ver mais nenhuma fogueira com um corpo dentro. Cheguei sozinha na sala e me sentei no sofá, encarando o vazio. Por um momento me senti um pouco depressiva. Quantas mortes eu teria que assistir, eu teria que causar, até que eu fosse livre disso? Quantos rostos eu veria se tornarem nada? Lembrei de Kratos e de Ashley e me perguntei se valia a pena. Kratos havia vivido por quase três mil anos e virou pó do nada. Sua parceira foi logo depois. Não sobrava quase ninguém para lembrar do seu legado. Na pior das hipóteses, eu viraria uma estátua no salão de Eleazar, ao lado de grandes como Albion, Veuliah, Baltazar e qualquer um dos quatorze que vieram atrás de mim. Ou treze, visto que Andreas estava vivo. Eu deixaria um legado, ruim ou não para o mundo. Mas e essas pessoas? Essas pessoas que lutaram ao meu lado, que morreram ao meu lado? Quem se lembraria delas daqui há cem, duzentos anos? Eu sabia a resposta, ninguém. E, infelizmente, essa era uma das coisas que eu jamais poderia mudar. O que eu poderia fazer, então?

Eu também sabia a resposta para isso. A única coisa que eu poderia fazer por essas pessoas era continuar vivendo pelo que elas morreram. Eu faria com que o esforço daqueles que se sacrificaram não fosse em vão. Eu nunca me tornaria o que Jason se tornou, eu não poderia mudar. E era simplesmente isso.

Meus devaneios foram cortados por Andreas se sentando ao meu lado, em silêncio. O encarei e, sem falar nada, nós dois sabíamos que tínhamos uma decisão a tomar. Os últimos séculos haviam nos ensinado que tudo muda, nada permanece o mesmo. Como diria Heráclito, o antigo filósofo grego, um homem não se banhava no mesmo rio duas vezes. Nós dois entendíamos o perigo que era ter o poder dividido em dois. Se em alguns anos um de nós fosse por um caminho errado, eu nem queria pensar no resultado. Nós não teríamos força para entrar em guerra um com o outro. Mas não poderíamos, de forma alguma, descartar essa hipótese.

A pergunta era, quem?

-Tem que ser você. Tem muito mais percepção do que eu. – Falei logo, porém calma.

Ele me encarou e suspirou, balançando a cabeça negativamente. Arrumou-se no sofá, de modo que estava sentado de frente para mim e seu olhar adquiriu uma seriedade não muito usual quando falava comigo. Eu sabia que não deveria interrompê-lo até que terminasse.

-Giuliet, presta bastante atenção no que eu vou te falar e, principalmente, acredite nisso. – Sua voz era tão séria quanto sua expressão, e deixei que continuasse. – Houve duas razões para que eu me entregasse a Jason, sabendo que era a única maneira de você não morrer. A primeira, como você já sabe, é porque eu não conseguiria viver em um mundo ao preço da sua vida. E tem a segunda, que eu guardei até agora, porque estava esperando o momento certo.

-Qual razão?

-Na noite antes de me entregar, eu tive várias visões, como você sabe. Mas uma delas se destacou entre todas, porque era a mais para o futuro que eu tive. Para ser mais exato, a mais para o futuro que eu tive durante toda a minha vida. Ela foi embaçada e confusa, mas foi suficientemente clara para mim. Eu vi você, em meio a uma batalha, impedindo a luta e convencendo a todos de que aquilo era inútil. Eu consegui ouvir parte do discurso na época, você era simplesmente genial. Mais genial do que qualquer pessoa que eu conheço poderia ser. Não pelo que falava em si, mas pelo modo como falava. Era simplesmente impossível não acreditar em você, não confiar nas suas palavras.

-E quando isso vai acontecer? – Perguntei, confusa.

-Isso já aconteceu. Hoje, durante a batalha, não houve um vampiro que não te encarasse idiotizado.

-Haydée não foi muito na minha conversa. Não foi tão bom assim.

-Ela foi, mas ela percebeu o que estava acontecendo. Mas já era tarde demais para ela. Giuliet, eu juro. Eu que não recebo nenhuma influência da sua liderança me senti assim, imagine os outros.

-Pelo amor de Deus, Andreas, eu não sou nem metade do que você está descrevendo, vamos parar com o sensacionalismo. – Bufei, achando aquela conversa totalmente sem sentido.

-Eu não falaria isso se não fosse verdade. Eu entendo o quão complicado é esse fardo e, se eu pudesse, botaria tudo nas minhas costas, mas não há outra forma. Tem que ser você, sempre foi assim. Lembra-se da Capital, no dia que tomamos o castelo? Não fui eu quem incitou todos aqueles vampiros a partirem para o ataque. Foi você, com um discurso simples e direto, que convenceu a todos.

-Eu só fiz isso porque você estava tendo visões. – Ele estava com problemas, só podia.

-Eles não lutariam da mesma forma se fosse eu que falasse. Não sou nem metade bom nisso. E você disse que eu sou mais sensível, ótimo, eu estarei por perto para te auxiliar, sempre que precisar. Não vou sair do seu lado nunca.

-Andreas...

-Confia em mim, eu sei o que estou fazendo.

Suspirei e olhei para o chão, sem saber o que fazer para convencê-lo do contrário. Eu havia substituído ele, apenas. Eu só estava esquentando a cadeira para ele, eu não era isso tudo.

Ele pegou a minha mão direita e suspirou, parecia se concentrar. Eu só olhava para o chão, sem encará-lo. Os últimos raios de Sol começavam ficar fracos, a noite chegava. Andreas apertou a minha mão gentilmente e começou a falar as palavras necessárias para fazer a transição. E eu nem me movia.

-Quando estava na Capital, antes de você chegar, conhecia algumas pessoas que eram próximas de Hugh e conheciam todos esses detalhes sobre isso. Elas me ensinaram como se fazia isso. – Ele se concentrou novamente e começou, em aramaico. Eu sei que é ridículo, mas tinha que ser em aramaico, é uma das línguas mais antigas do mundo. Era a língua de Baltazar. – Eu, Andreas Volturi, décimo quarto líder da raça dos vampiros, entrego a você, Giuliet Volturi, todas as minhas forças, todas as minhas vontades, toda a minha sabedoria, para que, em meu lugar, guie nossa espécie rumo ao progresso. Juro solenemente seguí-la, respeitá-la e auxiliá-la sempre que necessário. Abro mão inteiramente de meus poderes e minhas influências para que seu legado se inicie. Viva com sabedoria. – Senti a mesma coisa que no dia que, juntos, matamos Hugh, só que agora como se me completasse. Era como se toda a minha força houvesse sido partida e agora eu juntava as duas peças. Fechei os olhos com a sensação, respirando fundo. Andreas inclinou-se e beijou meu rosto, voltando a falar em italiano. – Você será a melhor nisso, acredite.

Fiquei um tempo parada, me acostumando com a sensação. Aos poucos fui me sentindo normal novamente, abri os olhos e o encarei novamente, séria.

-Só espero que tenhamos tomado a decisão certa. – Quando eu falei, senti que ele ficou um pouco tenso, mas depois conseguiu voltar ao normal. – O que aconteceu?

-Agora você causa aquele efeito que Hugh causava em nós, em mim. Eu vou me acostumar, não ligue. – Ele deu de ombros, me dando um sorriso acolhedor.

-Eu também vou ter que me acostumar com a sensação inteira. É a mesma coisa que antes, só que multiplicado por dois. – Uma coisa me passou pela cabeça e eu senti o sorriso malicioso ir para o meu rosto. – Então quer dizer que agora eu posso mandar você fazer qualquer coisa que eu quiser? – Ele me deu um sorriso torto e meio sarcástico.

-Aparentemente sim. – Ele respondeu, a voz um pouco rouca.

-Isso vai ser interessante.

-Com certeza.

Alguém entrou na sala e voltamos a ficar sérios, como se nada houvesse acontecido. Era Beta, se aproximando de nós. Ela sentou do meu outro lado, perto do ombro machucado. Parecia cansada, ela precisava ir para casa dormir.

-Camily me falou que você machucou o ombro, está tudo bem? – Ela perguntou, a voz baixa.

-Eu vou ficar bem. Estou mais preocupada com essas marcas em você.

-É só um arranhão e um roxo. Ela agarrou meu pescoço uma hora com bastante força. – Ela disse, levando a mão até o pescoço.

-Você foi muito bem hoje, Beta. – Andreas disse.

-Foi mais a adrenalina do que eu mesma. – Ela disse, dando de ombros.

-Não, ele está certo, você foi incrível hoje. Salvou a vida do Jones e da Karine.

-Foi estranho como aconteceu. Eu nunca tinha matado ninguém e... e ela se parecia muito com você. – Ela disse, quase que sem voz dessa vez.

A abracei, a trazendo para o meu ombro bom. Foi então que eu percebi o quão nervosa ela estava. Não era muito simples a primeira vez que você mata alguém, mas devia ser muito pior quando você não é um vampiro louco de sede que não pensa muito.

-Está tudo bem, vai ficar normal com o tempo. Você fez isso por um bem maior. – Falei suavemente e ela se afastou, aparente mais calma.

-Eu sei. É que foi estranho, só. – Ela sorriu fracamente.

-Vamos para casa daqui a pouco, você troca essa roupa e fica tudo certo.

-Eu trouxe umas roupas, mas eu não me senti segura para ir me limpar. Podia vir mais alguma coisa, nunca se sabe. Acho que preciso mesmo ir para casa.

Ficamos esperando mais um tempo na sala até que Matt apareceu, avisando que já haviam terminado e que haviam enterrado os restos mortais longe, no meio do nada. Decidimos que era hora de ir embora e, quando eles iam indo para o carro, falei para que fossem na frente, eu iria logo atrás. Ficaram para trás apenas Camily e Benjamin. Benjamin ia ficar em uma casa vazia da reserva, queria conhecer a tribo e tudo mais. Compreensível. 

-Eu queria agradecer, aos dois. Vocês não tinham a menor necessidade de se envolver nisso.

-Essa conversa de novo? – Camily disse, sorrindo e dando de ombros. – Por favor, Giuliet, chega disso.

-Além do mais, a gente não tinha muita escolha, tinha? – Disse Benjamin.

-Claro que tinham. Podiam ter ido arrancar meus pedaços enquanto eu dormia.

-Mas você não dorme! – Eles falaram em uníssono e eu tive que rir.

-Não se prendam aos detalhes. – Falei, enquanto ia direção à porta. – Bem, até mais então.

-Até mais. – Camily respondeu.

-Tchau. – Disse Benjamin.

Fui em direção ao carro, todos já me aguardavam. Entrei no banco de trás, Andreas e Matt estavam na frente. Eu, Beta, Karine e Jones nos apertamos no banco de trás e foi difícil encontrar uma posição que não me machucasse. Andreas se ofereceu para trocar de lugar comigo, mas eu disse que não. Se ele fosse no banco de trás, não ia ter lugar para quatro pessoas. Quando estávamos acomodados, Matt deu partida com o carro e começamos a voltar, calmamente.

-Isso, é bom que o senhor tenha cuidado com o meu carro agora, na ida foi dirigindo que nem um monstro. – Reclamei. – Sorte sua eu estar machucada.

-Por que eu não me sinto confortável para te dar a resposta que você merece? – Ele perguntou, e não era uma pergunta retórica.

-Surpresa! – Debochei e ele me olhou com uma cara enfezada, que me fez rir. – Relaxa, Matt, vai dar tudo certo.

Ele deu de ombros e continuamos a ir para casa, conversando normalmente e ouvindo músicas tranqüilas. Karine reclamou duas ou três vezes que a gente só ouvia música de velho, mas acho que ela percebeu que nós éramos velhos e não falou mais nada a respeito disso. O clima ia, aos poucos, ficando leve. A sensação de vitória começava a entrar, efetivamente, na minha mente. Eu estava feliz, apesar de tudo. Havíamos acabado com um inimigo de séculos, mesmo que fosse anônimo por muito tempo, e eu não havia perdido ninguém que eu não pudesse lidar com a perda. Passamos na casa de Karine antes, onde Matt a deixou, fingindo para os pais que havia ocorrido tudo bem no passeio que eles haviam tido, ela foi muito boa na mentira também. O pai nem questionou os óculos escuros de Matt com aquele tempo feio que fazia. Depois ele voltou para o carro e começamos a voltar.

-Matt, você sabe que não dá para esperar muito mais, não sabe? – Tive que começar aquele assunto, ele era necessário. Matt suspirou e recostou-se mais confortavelmente no banco.

-Eu sei. É perigoso para ela e para família que ela continue humana, eu sei disso. E ela quer que aconteça logo.

-E o que está esperando?

-Eu tenho medo de machucá-la. Se eu falhar, seu não conseguir parar, as opções são muitas.

-Você quer que ela viva fique bem, não quer? – Andreas perguntou.

-Quero, claro.

-Então vai dar certo. – Ele terminou e Matt ficou quieto, pensativo. Eu esperava que isso fosse suficiente para que desse certo, a garota era legal.

Chegamos em casa e saímos quando o carro estava estacionado. Beta e Jones correram para tomar um banho de uma vez. A sensação de sangue no corpo era horrível. Eu, Matt e Andreas fomos andando, devagar por minha causa. Aquilo tudo havia me deixado com dor, e eu precisava de sangue. Matt aparentemente perdeu a paciência no meio do caminho e foi mais rápido. Nós dois chegamos um pouco depois na sala, onde Fátima, Kronus, Hecate, Giacomo, Gabi e Anne tinham uma conversa descontraída. Meu clã ali, tudo reunido e se dando bem. Quando entramos, eles começaram a falar ao mesmo tempo, pelo que eu pude entender, perguntas a respeito de Beta e Jones. Sorri com a cena, eles não haviam aprendido a falar um de cada vez ainda. Acenei para que parassem, mas não adiantou muita coisa.

-Vocês podem me deixar entender o que vocês querem saber? – Pedi, rindo. Eles ficaram quietos com isso, me olhando estranho. Ok, eu tinha entendido. – Não me olhem com essa cara, vocês não tem mais dois líderes.

-Você passou a sua parte para ela? – Fátima perguntou, curiosa.

-Passei, apesar de não ter sido muito fácil convencê-la disso. – Andreas respondeu com um tom teatralmente cansado.

-E quem disse que você me convenceu de alguma coisa? Só não me deixou pensar rápido o suficiente para argumentar! – Rebati e ele revirou os olhos. Os outros riram e a gente acabou fazendo o mesmo.

-Agora, deixa um espaço para mim aí no sofá. – Falei, sem usar nenhum tipo de voz de liderança.

-Se você está mandando, dona Líder da Desgraça Toda, a gente chega para o lado. – Debochou Giacomo e fiz uma careta para ele, enquanto me sentava ao lado de Hecate.

-Então, o que a gente faz agora? – Perguntou Anne.

-Bem, acho que a gente vai precisar de uma casa maior. – Gabi disse, olhando ao redor. – Temos mais gente do que quarto.

-Gabi, só nós duas que continuamos encalhadas. Os outros quartos agora têm duas pessoas dentro. – Anne falou, dando de ombros. Eu dei uma risada, o jeito como ela falou, meio trágico, foi engraçado.

-Mas o número de pessoas que não dividem quarto também cresceu. – Eu falei, tentando defender elas mesmas. – Se Lizzie e Jones ficarem conosco, eles também precisam de um quarto só para eles.

-Isso se você estiver considerando o fato de que Jones vai ficar solteiro. – Gabi disse, aleatoriamente, e a olhei confusa.

-Como assim? – Ela só sorriu sarcasticamente. – Não vai me falar do que isso se trata, não é?

-Não. – Ela respondeu, dando de ombros. – Mas você vai acabar descobrindo. – Isso não era um bom sinal.

-De qualquer forma, vai ficar uma coisa suspeita um monte de jovem morando em uma mesma casa. – Hecate falou, e tinha razão. – Como a gente resolve isso?

-Talvez tenhamos que morar em casas separadas, para não dar sinal. – Giacomo sugeriu. Eu sabia muito bem porque ele queria uma casa separada, mas ignorei o que estava nas entrelinhas e pensei na parte prática.

-Quem concorda com isso? – Perguntei, tentando resolver a coisa de maneira democrática.  Todo mundo levantou a mão, menos Anne e Gabi, que disseram que tanto fazia. – Tudo bem, depois separamos os grupos. Agora vamos só não pensar em nada de útil por um bom tempo, que tal?

-Isso é uma boa idéia. – Giacomo comentou, se recostando.

Ficamos lá simplesmente conversando, até Lizzie descer. Ela parecia aliviada e feliz, e sentou-se no chão, do lado do sofá, conversando conosco.

-Então, o que você vai fazer agora? – Perguntei, quando o assunto anterior morreu.

-Não sei. Acho que tenho arrumar um lugar para ir.

-Pode ficar conosco se quiser. – Ofereci, esperando realmente que ela aceitasse.

-Posso? – Ela perguntou, não parecia esperar por aquilo. Ela achou o que, que eu iria largá-la no mundo?

-Mas é claro que pode, Lizzie. Você é minha irmã, eu não gostaria que fosse diferente.

-Mas... – Ela começou a questionar algo, que eu já sabia o que era.

-Sim, Christopher pode ficar também. – Falei, meu tom mudando para tédio. Ela sorriu ao ouvir isso.

-Tem Jones também. – Ela falou, lembrando-se. O garoto era o menor dos problemas.

-Ele é meu irmão também, no final das contas. Ele também pode ficar.

-Obrigada, sério.

-Não é nada demais, Lizzie, eu prefiro assim. Mas como está aquela coisa lá em cima?

-Ele está bem, e não precisa tratá-lo como coisa. – Ela disse, mas rindo. – Ele vai ficar legal, a perna já está curando. E o seu ombro?

-Vai ficar bem, eu sobrevivo a isso. – Respondi.

Duas semanas passaram até que meu ombro estivesse totalmente curado. Os movimentos voltaram a ser como eram antes, mas deixou uma linha como cicatriz, somando com a que já havia lá. Não havia problema, desde que ele se movimentasse bem, e estava se movendo quase que perfeitamente, então tudo ótimo. Christopher já conseguia andar também, mancando, mas conseguia andar. Não tínhamos conversado ainda, eu não tinha a menor pressa. Mas eu sabia que esse diálogo teria que acontecer em algum momento, pelo menos por Lizzie. Por isso que, na manhã depois de meu ombro ficar totalmente bom, fui até ele, que estava sentado na varanda, sozinho.

-Acho que a gente precisa conversar. – Eu disse, parada há alguns metros dele.

-Parece que sim. – Ele disse, sério.

Apoiei na proteção da varanda, ficando mais ou menos de frente para ele, cruzando os braços.

-Como está a perna?

-Bem, vai ficar boa em alguns dias. – Ele disse, parecia meio indiferente. Seu modo arrogante de agir não tinha mudado muito. O nosso desconforto perto um do outro era totalmente óbvio. Eu ia começar a falar algo, mas ele não deixou. – Giuliet, eu acho que te devo desculpas. Eu ajudei Jason em tudo que eu podia. Eu torturei aquele seu vampiro quantas vezes eu pude, por pura diversão. Estava certo de que eu estava fazendo o que eu era melhor para mim, eu fui muito egoísta, mas... – Ele parou para suspirar. – Lizzie quase perdeu aquela luta, antes de você chegar. Naqueles instantes que eu repensei toda a minha vida, tudo que eu havia feito. Eu não queria ser aquele monstro mais. Eu me senti mais humano naquela hora do que eu já me senti, mesmo quando era humano de verdade. E, bem, acho que eu nunca vou conseguir me redimir por isso, mas pelo menos eu posso tentar pedir desculpas. Então, desculpa.

Ele não estava muito feliz em ter que falar aquilo, mas sabia que tinha que conviver comigo. E parecia ser verdade, mesmo sendo falada com má vontade.

-Eu não vou mentir para você, não me sinto nada confortável com você por perto. Mas nós dois temos um ponto em comum, que é Lizzie, e eu não quero perder o contato com ela. Portanto, se você não pretende mais me matar e quer o bem dela, tudo bem para mim.

-Então tudo bem.

-Excelente. – É, precisávamos de um trabalho social sério naquela situação.

Saí de lá, deixando-o sozinho. Voltei para a sala, onde encontrei Andreas sentado, lendo. Ou aparentemente estava, porque quando cheguei perto ele levantou o rosto com uma cara não muito satisfeita. Sentei ao seu lado e ele continuou me encarando.

-O que ele queria com você? – Ele perguntou, sério.

-Eu que queria com ele. Fui tentar manter um diálogo, não deu muito certo.

-Não fica falando muito com ele. Eu não tenho palavras para expressão o quanto eu o odeio. – Ele falou, olhando para a porta com um fogo atrás dos olhos.

-Ele está sob controle, Andreas, e ao primeiro erro que cometer, podemos cuidar dele. – O tranqüilizei, sabendo que ele não podia ficar com muita raiva. – Eu não esqueci que foi ele quem te torturou na prisão, meu amor. E nem vou esquecer. – Me estiquei e beijei seu rosto, só então parando para prestar atenção em seu livro. – O que está lendo?

-Fala sobre a Itália. Tenho vontade de ver como está agora. – Ele disse, um pouco mais descontraído. Algo passou pela minha mente e sorri com isso.

-Já sei para onde vamos quando cada um for morar em uma casa. – Falei, encarando o livro.


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Notas finais do capítulo

Com isso só teremos o último capítulo, finalmente.
Então, eu tenho planos para próximas fics, dois planos, para ser mais exata. Um deles é a continuação dessa aqui, uma segunda temporada, que se chamaria "Giuliet Volturi II - Shadows". Não tenho certeza se vou escrever ainda, não quero desgastar a história, nem forçá-la, então não estou certa ainda.
O outro plano seria uma original, chamada "D.N.A", que é bem diferente dessa aqui, não tem nada de vampiros, mas tem uns "humanos" bem interessantes.
E não sei o que decidir. Então, se alguém tiver alguma preferência, eu gostaria de opiniões agora. xD
E aguardem o último capítulo, que eu pretendo fazer com carinho especial. xD



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