Coeur Faible escrita por NRamiro


Capítulo 3
Parte 2




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Passei a mão uma última vez pelos meus cabelos, deixando-a cair sobre o mármore escuro e gélido da pia. Com um suspiro pesado abri meus olhos e prestei atenção na imagem que o espelho refletia. Uma marca roxa clara já estava começando a aparecer por debaixo de meus olhos, minha pele estava mais pálida do que nunca. Eu precisava de uma longa noite de sono. Necessidade que eu não havia conseguido suprir há dias.

O pequeno pote com conteúdo rosa cor de pele estava perfeitamente guardado juntamente com outros cosméticos na pequena bolsa azul que eu sempre deixava na primeira gaveta do armário do banheiro. Peguei-o e comecei a espalhá-lo pelo meu rosto, retirando de uma só vez todos os sinais de fraqueza possíveis.

Com passos largos cheguei ao closet. Vesti-me rapidamente com uma calça de couro e uma blusa colada ao corpo, depois de colocar uma bota impecavelmente limpa e uma jaqueta do mesmo material de minha calça. Eu estava quase pronta. Todas as peças que cobriam meu corpo eram possuidoras da cor mais forte e bela – ao meu modo de ver –, o preto entrava em contraste com minha pele branca e tipicamente inglesa.

Ainda faltava o último detalhe para me completar. O detalhe mais importante para o meu ambiente de trabalho: O cinto onde havia o meu revólver OTs-38 e munições.

Particularmente, adorava aquele revólver. Pequeno o suficiente para não chamar muita atenção e com um excelente alcance. Diferente dos revolveres convencionais, o OTs-38 foi criado por russos que, com grande sucesso, conseguiram silenciar os sons do disparo.

Quando coloquei o cinto na minha cintura um largo sorriso preencheu meus lábios. Agora estava pronta. Cheguei rapidamente na garagem, pulando a porta do porsche prateado e olhando o relógio no meu pulso logo em seguida. Ainda tinha tempo. Uma coisa que aprendi desde meus primeiros anos de idade era ser pontual. Não seria agora que deixaria esse ensinamento para trás, principalmente com quem e ou o que eu estava lidando todos os dias.

As ruas londrinas, como sempre pela manhã não possuíam quase nenhum carro, mas isso mudava com o passar das horas. Algumas pessoas conversavam pelas calçadas, enquanto outras andavam calmamente de bicicletas. Incrível como seus semblantes demonstravam despreocupação, como se tudo possuísse a mais fácil resposta.

Em poucos minutos, depois de virar e cruzar algumas ruas, já estava no mercado de Camden Town. Deixei o carro estacionado no lugar mais próximo do Under Four Feet e saí do porsche, fechando-o cuidadosamente. Segui para o estabelecimento à minha frente. O Under Four Feet é um lugar onde ocorrem apresentações de bandas de rock, foi aberto há mais de setenta anos, mas nós apenas o utilizamos há quase cinqüenta.

Ao entrar vi que provavelmente alguma banda se apresentaria hoje pela noite. Quatro garotos com jeans surrados e blusas de cores diferentes ensaiavam uma música que eu conhecia muito bem a letra.

It’s been a hard day’s night...”

Atrás da porta tecnológica e perfeitamente escondida nos fundos do Under Four Feet, havia um novo mundo, metaforicamente falando. Eram poucos os que tinham acesso a aquele lugar e eu era grata por tê-lo. Por dentro da porta que dava acesso, podia-se ver o isolamento acústico que não deixava nenhum som fugir dali. As paredes possuíam uma coloração metálica, passando a impressão de um lugar futurístico. Impressionante.

Algumas pessoas passavam por mim e me cumprimentavam com um leve aceno. Eu apenas as olhava respondendo silenciosamente, apenas quando Henrie apareceu em meu campo de visão meus cumprimentos foram diferentes. Sorri e o abracei de leve.

– Você nem sabe das novas - Ele disse. Sua voz era grossa e o deixava ainda mais charmoso. Henrie McMahon com certeza era um homem com traços bem trabalhados, seu rosto era simétrico e seu cabelo escuro tinha um brilho invejável, o castanho mel de seus olhos o adicionava mais um belo detalhe.

– O que temos para hoje?

– The Beatles - Ele disse levantando suas sobrancelhas. - Sei que você gosta deles.

– O que isso tem haver com... nosso trabalho? Sei sobre Paul, mas... - Interrompi minha fala quando finalmente entendi o que McMahon estava tentando me dizer.

Paul McCartney, o canhoto baixista da mais famosa banda de todos os tempos, The Beatles. E é conhecido como o único Beatle vivo. Grande mentira. Seu sósia ainda vive e carrega o grande nome em suas costas.

Quando ainda jovem, numa noite gélida de janeiro de 1967, McCartney ao ir num famoso bar em Liverpool conheceu uma garota, conhecida como Lucy. Seus cabelos loiros e longos, olhos castanhos, e vestido azul claro com réplicas de pequenos diamantes, conquistaram o famoso baixista. Encontraram-se várias vezes, tendo sorte de não serem flagrados pela mídia sedenta de escândalos e manchetes sensacionalistas. Lucy sempre fora uma das protegidas da Coeur Faible, tinha seus segredos em seu relacionamento com Paul.

O interesse de Lucy em McCartney no começo foi só como uma refeição, uma necessidade. Repor suas energias, algo que precisava fazer freqüentemente. A bela succubus ao invadir os sonhos do baixista, se alimentou, mas se viu presa a ele depois. Algo que não conseguia explicar o porquê, só sabia que não podia e nem queria se afastar. O que começara com uma simples e insignificante necessidade se tornou uma paixão.

Doze de outubro de 1969. Uma noite chuvosa, as estradas estavam muito escorregadias e em um automóvel estavam os dois amantes numa viagem para Londres. Lucy sedenta por energia, continha-se. Precisavam chegar logo em seu destino. Aconteceu rápido, sem uma possível defesa. Um automóvel de coloração escura os atingiu, matando o famoso e importante Beatle. Lucy que já estava frágil pela falta de energia humana passou a ser uma das únicas que Coeur Faible não conseguira proteger.

Mas era só até esse ponto que sabíamos.

– Jesen é o nome dele. O motorista que causou o acidente.

– Suponho que é algo a ver com Lucy, certo? Nós sabemos quem ela era, e falhamos. Como descobriram o nome do motorista?

– Eu não sei - Suspirou. Apenas concordei murmurando algo. Já era de se imaginar que Henrie não saberia como. Nossa grandiosa organização era dividida em vários círculos. Os círculos mais elevados continham mais poder, mais segredos, mais autoridade. Muitas vezes quando eles querem que algo seja feito, apenas dão ordens sem uma explicação maior. Era o que estava acontecendo agora.

– Quem iremos matar dessa vez? Jesen ainda está vivo?

– Ele era novo quando causou o acidente, apenas vinte anos de idade. Agora com sessenta e dois tem uma bela casa em Manchester, e é para lá que estamos indo. Acertar as contas. Jesen tinha ordens para matar Lucy.

– Então ele faz parte dos nossos inimigos - Suspirei e mordi levemente o lábio inferior, concordando rapidamente logo em seguida. Esperei que Henrie pegasse sua bela Colt .45 ACP e sua jaqueta escura para podermos sair e começarmos nosso caminho até Manchester.

– Acho que você deveria passar em uma Starbucks para tomar um café - Ele sugeriu assim que entrou em meu carro.

– É, eu também acho.

Cinco minutos e estacionei perto do café. McMahon ficou me esperando no porsche enquanto eu, apressadamente, pedia um café forte e simples. Algo que ficasse pronto rápido. Ofereci um olhar gélido ao atendente ruivo que, sem sucesso, tentava de alguma forma começar uma conversa comigo. Eu apenas queria o meu café e ir embora dali. Quando finalmente recebi o copo com o conteúdo escuro e fumegante, comecei a bebê-lo, queimando meus lábios sensíveis algumas vezes.

Entre uma bebericada e outra lancei um olhar para o meu carro, vendo Henrie mexer em alguns de meus CDs. Ele simplesmente não conseguia ficar quieto. Entreguei o dinheiro para o atendente e com passos largos voltei para o carro, passando a mão pelos meus cabelos, ajeitando-os.

– Você tem vários CDs deles - Murmurou. - Coloque esse.

Entregou-me o Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band e logo após eu colocá-lo, Henrie pulou para a relaxante faixa Lucy in the Sky with Diamonds.

– Quão clichê essa faixa é na situação em que estamos? - Perguntei. Minha voz carregada de sarcasmo.

– Ainda não entendo porque Lennon escreveu essa música, e não McCartney.

Lucy in the Sky with Diamods é até hoje uma das canções mais polêmicas dos Beatles. Uns dizem que faz referência às drogas. Outros afirmam que era apenas uma garota que John Lennon gostava no colegial. Contada por Lennon, com sentimentos de McCartney, a música falava sobre a bela Lucy.

– Apesar de tudo, eles tinham uma relação muito forte - Comentei. - Lennon nos deu tantos problemas... Era o único Beatle que sabia de tudo

Todo o tempo que Paul dividia com Lucy, John estava ciente. Até quando Paul descobriu o misterioso segredo de sua amante, o amigo de banda teve conhecimento também.

Na noite da morte de McCartney, ele não aceitou a decisão que Coeur Faible tinha tomado: Deixar a morte do Beatle em segredo. Começou a colocar em músicas e nas capas dos CDs pequenas mensagens subliminares, fazendo com que a lenda da morte de Paul McCartney ganhasse aos poucos mais força.

– Você vai adorar apagar Jesen, suponho - Henrie comentou.

– Você não faz idéia.



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Notas finais do capítulo

Como está ficando? Próxima atualização só se tiver alguma review, é. xx