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O sol sempre raiava nos chamando para trabalhar. Não é porque estamos tão perto das alturas, que somos desempregados. Minha tarefa nesse dia seria de acordar os pássaros. Até ai, tudo corria bem. Bem demais.

Eu voltava, passeando por um caminho estreito e florido, com os raios fortes de um sol vívido. Cumprimentei alguns colegas e fui em direção para meu local de descanso. Muitos pensam que cuidar de pássaros é fácil. Sim, fácil é falar, fazer é bem diferente.

Já estava quase chegando quando notei algo errado. Tudo a minha volta parecia muito calmo. Calmo demais. Foi então que aconteceu.

Minhas vistas ficaram escuras, e não tinha controle de minhas asas. Elas pareciam não ter forças. Eu estava em queda livre, sem nenhum motivo aparente. Minha cabeça rodava enquanto sombras disformes passavam em frente aos meus olhos numa velocidade não muito bem calculada por mim.

Meus ouvidos pareciam estar sendo feridos com tantos gritos e choro. Estava tudo confuso. Eu não estava mais no paraíso, era obvio que não estava em um lugar de boa conotação para nós.

Continuei caindo por alguns segundos até sentir o chão duro e frio embaixo de mim. Tentei forçar minhas asas para mover-se, sem obter muito sucesso. Tentei descobrir onde eu estava mais o escuro e a confusão que estavam em minha cabeça não ajudavam muito.

Tateei o chão procurando a parede como apoio. Minhas mãos tocaram algo frio e metálico. Apoiei-me nele e me levantei. Meus pensamentos passavam como um turbilhão por dentro de meus olhos fechados. Eu não poderia estar ali. Não havia feito nada de errado para estar ali... Ou tinha?

Tentei me concentrar para repassar algo antes daquilo, mas as imagens estavam se borrando e misturavam - se umas com as outras sem formar nada coerente. Voltei meu rosto para cima, e pude ver as estrelas que às vezes me faziam companhia enquanto repousava, e agora elas estavam acima da minha cabeça.

Eu havia caído, e sem alguma razão aparente. Eu estava na terra. Mas, eu não poderia estar na terra. Não tinha permissão para isso, não tinha chegado nem ao posto de anjo da guarda ainda. Então como seria possível?

Sabia que tinha alguém olhando por algum humano não muito longe dali. Sempre havia um de nós cuidando de um Humano. Canalizei minhas ultimas forças para achar alguma mente que combinasse com a minha. Demorou mais achei.

“- Ezequiel? Ajude-me! Por favor! Não sei como vim parar aqui!”

“- Mel? O que você está fazendo aqui?”

“– Não faço ideia. Um minuto eu estava lá em cima, e no outro estava aqui. Ajude-me, por favor. Estou com medo, e aqui é muito escuro e frio.”

“– Eu sei querida. Aqui tudo é diferente. As sensações são mais intensas. Espere um pouco que já lhe ajudo!”

“- Não demore, por favor!”

Ezequiel me deixou sozinha por poucos minutos. Cinco minutos se transformaram em quase vinte naquele lugar – que descobri ser um beco – escuro e mal cheiroso. Ouvi um barulho não muito longe de mim. Encolhi-me ao lado da grande estrutura metálica e esperei. Os passos se aproximaram rápido e firme me deixando ainda mais receosa.

Os passos pararam não muito longe de mim. Pareciam procurar alguma coisa ou alguém.

– Mel?

Escutei alguém chamar meu nome. Mais ninguém ali me conhecia, então... Ezequiel conseguira ajuda para mim. Ele havia mandado alguém pra me ajudar. A voz me chamou novamente:

– Mel?

Saí de meu esconderijo e fui em direção à voz. Uma mulher magra, de cabelos um pouco grisalhos que refletiam a luz escassa, estendia uma mão para mim. Fiquei parada em meu lugar sem saber se segurava ou não. “Confie nela. Ela vai ajudar você!”. A voz de Ezequiel soou alta e clara em minha mente, me dando coragem para ir em frente. Segurei a mão que me era estendida, com um pouco de receio.

E deveria ter confiado em mim mesma. Assim que segurei a mão da tal moça, minha cabeça começou a girar e meus olhos ficaram ainda mais escuros do que já estavam. Não era para ser assim ou era?

Parecia um sono profundo e sem sonhos, agora sim parecia que teria paz.

Alguns

semanas

depois...