Descobrindo Londres escrita por lillylowre


Capítulo 5
Capítulo 5 - O Livro estranho




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- Eu juro que vou matar aquela doida, sério – dizia Lauren, se referindo à Sra.Toore, sua professora de matemática que lhes passara quase três folhas de dever.

Eles estavam na biblioteca da escola e a ruiva apoiava a cabeça na mão acima dos livros. Na mesa de madeira escura – como todos os outros móveis da biblioteca – onde os seis se encontravam haviam espalhados livros, cadernos e canetas aleatórias. Zick estava literalmente de quatro embaixo da mesa procurando sua borracha, Stephanie citava alguma coisa para Diego copiar, Chad lia furiosamente um livro que parecia ser complicado demais para se entender e Lilly se levantava para ir até a estante, atrás de qualquer coisa que pudesse lhe ajudar com o dever de biologia. Era de tarde e eles haviam combinado de ficar na escola e estudar.

Foi passando a ponta dos dedos pelas lombadas dos livros, um ao lado do outro, sem realmente prestar atenção. Foi se afastando cada vez mais do grupo, indo na curva que o corredor entre as estantes fazia. Aquela biblioteca era tudo menos normal: tinha estantes perfeitamente circulares e outras curvas em volta, e algumas mesas aqui e ali.

Quando voltou a prestar atenção nos títulos que tocava – e a essas alturas já não enxergava a sua mesa – percebeu que os livros ali eram diferentes, mais gastos, como se fossem livros velhos que ninguém mais usava. Puxou um especialmente grosso e o abriu à sua frente, fitando as páginas amarelas que eram – para seu total espanto – escritas à mão. A caligrafia era tão fina e inclinada que mal se podia ler.

As páginas estavam manchadas, borradas, mas ainda assim Lilly pôde ler seu título: Encantamentos e Poções medicinais, da autoria de Hellen Dnerz. Não havia data, não havia sumário, apenas as tais poções e encantamentos. As poções continham ingredientes curiosos, partes de plantas e animais dos quais Lilly nunca havia ouvido falar, enquanto os encantamentos eram explicados com passo a passo para fazer com as mãos, com os nomes e desenhos de cada movimento, assim como havia escrito o invocamento a ser feito.

Lilly deu risada, meio alta, meio nervosa. Aquilo só podia ser algum tipo de brincadeira. Continuou folheando o curioso livro até que algo lhe chamou a atenção: o desenho de um homem enfermo, parecido demais com o seu pai, ao lado do qual havia escrito: Poção anti – Grefenimento.

Lilly ficou parada encarando o desenho. Era parecido demais com o seu pai, ela se arriscaria a dizer que estava com a mesma posição na maca. Talvez aquilo fosse uma brincadeira de mau gosto... não,, não era possível, o livro era antigo.

Com a testa enrugada ela desceu os olhos e o indicador pela página, lendo o texto em tinta preta:

Poção anti-Grefenimento

A doença de Grefen existe desde o primeiro milênio e atinge os Kaftras apenas. Alguns acreditavam ser uma praga do demônio nos primórdios dos tempos, até que um Kaftra se ofereceu para lhe estudarem a doença. Desde então sabem-se os sintomas, embora a causa ainda não tenha sido descoberta. Segundo as anotações do Grande Registro, apenas Kaftras com mais de quatro décadas tiveram a doença de Grefen. O nome da doença vem de sua primeira vítima, Grefen Sturgs, primo do Rei Julian do primeiro milênio. Conforme relatos de doentes, não há nada diferente em suas rotinas antes de serem atingidos, e nenhuma substância anormal fora encontrada em seus corpos, bem como nenhuma energia desconhecida. Os sintomas são muito claros: falta de ar, calor intenso, e o indivíduo não consegue mais fazer as mesmas coisas de antes, como se fosse uma velhice, ele fica indisposto e às vezes sem nem vontade de tentar levantar.

Lilly levantou os olhos do livro rapidamente e olhou aflita o nada à sua frente: a doença descrevia seu pai perfeitamente. Contudo, aquilo tudo era muito estranho, a forma de linguagem, tudo parecia não fazer sentido. Lilly voltou correndo para a mesa com o livro nas mãos e o rosto tenso.

- Lauren! Zick! Steph! Digo! Chad! – veio gritando ela, chamando os amigos. Alguns alunos lhe fizeram “shhh”, mas ela não ligou. Cinco rostos a fitavam confusos quando ela largou o livro em cima do caderno de álgebra de Zick, e então se aproximaram.

- Vejam isso – disse ela, engolindo em seco.

Eles olharam a página que Lilly mostrava, fitaram curiosos o texto e examinaram o livro todo, Diego muito concentrado.

-Que é que tem? – Chad se atreveu a perguntar.

Lilly o olhou como se ele fosse retardado, mas então lembrou-se que eles não sabiam sobre seu pai. Voltou à página sobre a tal doença de Grefen.

- Ontem meu pai estava mal e não havia levantado pela manhã, e à tarde foi parar no hospital com falta de ar e suando muito. Os médicos não sabem o que é e nem lhe deram alta, ele está inconsciente e respirando com aparelhos. – ela parou um pouco para que os rostos surpresos à sua volta digerissem a mensagem, e então prosseguiu – e essa doença estranha aqui descreve exatamente isso. E o desenho é a cara do meu pai. E esse livro me dá medo, tem uma poção esquisita de cura aqui – terminou ela, com a voz falhando.

Sua pequena platéia fitou um ao outro por um instante, como se passassem uma batata-quente, que terminou em Stephanie.

- Lilly... você realmente leu isso? – perguntou ela, incerta.

- Sim, ué – respondeu ela, meio confusa. Era óbvio que lera, não?

- Como? – perguntou Zick – Lilly, isso é outro alfabeto! – disse ele, controlando-se para não gritar e apontando o livro, espantado.

- Não, isso é inglês, dá pra ler perfeitamente, escrito à mão!! Eu li, pensei que vocês também haviam lido. – disse Lilly, confusa.

- Não, nós não entendemos bulhufas disso aí – disse Lauren, sorrindo sem rir. – Olha só: - ela apontou para um pequeno “A” – tudo que a gente vê é...

E então ela desenhou uma forma estranha no canto do seu caderno, uma linha toda sinuosa que dava voltas e voltas, mas que ainda assim poderia ser apenas uma letra de alfabeto, contudo bem complicada. Lilly olhou para Diego e seu cenho franzido, ainda examinando o livro, e quando voltou a olhar para o canto do caderno, havia ali um “A”.

- Caralho – ela soltou num sopro. – Não é possível que vocês não vejam, é simplesmente um “a”!!

- Lilly, não é uma “a”. – Disse Stephanie, como se Lilly estivesse louca.

- Lil, leia essa linha – disse Diego, apontando-lhe uma página.

- “Poção anti-envenenamento por... Bacíquelas” – leu ela, alta e claramente. Estava simplesmente escrito ali, caramba.

- Não, é só um monte de risquinhos curvos – disse Zick, olhando por cima do ombro de Diego. Zick era baixinho e estava na ponta dos pés.

-Só você consegue ler isso, Lil. – disse Lauren, verbalizando o que todos já deviam ter percebido. Ela estava praticamente deitada por cima da mesa e Lilly percebeu que não era o único rosto perto do seu, pois todos os outros quatro a estavam observando seriamente.

Atreveu-se a olhar para Chad, logo à sua frente, em busca de apoio, mas ele também parecia atônito. Engoliu em seco e voltou a mexer no livro, voltando para a primeira página.

E então de repente palavras começaram a surgir ali, como se uma mão invisível as estivesse escrevendo.

“Olá, filha de Kaftra”, as palavras formaram.Lilly arregalou os olhos tanto quanto pôde. Pensou em escrever algo em resposta, mas assim que pensou num “oi” viu suas próprias palavras se formarem ali.

“Oi, que está acontecendo? Quem é você?” ela se esforçou para escrever. De repente os rostos à sua volta haviam sumido, e eram só ela e o livro.

“Sou um livro, ora bolas, e estou lhe cumprimentando. Como me encontrou?”

“Na biblioteca de minha escola.”

Como me encontrou?”

“Não sei, eu só... encontrei. Estava procurando por algum livro que me ajudasse e me interessei pelo... seu aspecto antigo.”

“Então não era a mim que procurava, talvez. Queria ajuda em quê? Eu certamente posso lhe ajudar em muitas coisas, como já deve ter percebido.”

“Queria ajuda com o dever de biologia.”

“Sinto não poder ajudar-lhe. Tchau.”

“Espere!!”

Depois de certo tempo, o livro voltou a “falar”: “Sim?”

“Talvez possa me ajudar. Eu vi uma poção que talvez curasse meu pai, mas primeiro precisaria entender o que são Kaftras, quem foi Grefen e de que mundo você veio.”

“Menina esperta. Se fizer as perguntas certas, certamente poderei lhe ajudar. Pois bem, começarei pela terceira pergunta, que certamente tornara o resto mais fácil.”

E então de repente várias páginas viraram como se o livro tivesse sido atingido por uma rajada de vento, e estancou numa página com a foto de uma cachoeira enorme, dessas que formam um véu de água. Embaixo da imagem, lia-se o título: Reino de Nenffar.

Lilly leu o texto rapidamente. Ele contava de um reino do qual ela nunca havia ouvido falar, falava de suas árvores lendárias – espécies desconhecidas – e de todos os animais – espécies mais estranhas ainda – que mantinham o reino vivo, porque ele e seus sobreviventes eram uma coisa só. Falava de guardas na entrada do reino e de um castelo no meio da aldeia, onde morou o primeiro Rei: Xenon Kaftra. Falava de sua família, de seu “governo” e de toda a sua magia, contava a sucessão do trono e os grandes feitos de todos os cento e vinte reis. Lilly leu tudo, e já estava espantada quando começaram a falar do centésimo vigésimo primeiro rei: ele era rebelde e nunca se dera bem com a família, embora quisesse o trono – mas suas idéias eram malignas. Um dia foi pego pelos guardas enquanto vandalizava na floresta, matando àrvores, e, sem ser reconhecido como o príncipe, foi expulso do Reino com ordem do próprio pai, um engano terrível. Conta-se que o garoto ficara tão amargurado que resolvera nem voltar, o que acabaria por definhar o reino, que ficaria à mercê do Mal sem um líder, assim que seu pai morresse. O que o garoto preverá falhou: o Rei tivera outra filha, e ele morreu quando ela tinha apenas 16 anos e seu pretendente estava prestes a chegar, logo ela poderia governar. A garota, contudo, era estéril, e chegou ao seu leito de morte – aos 100 anos – sem um único herdeiro. Ela foi odiada pelo povo, que ela deixou sem proteção alguma, pois o anel de Kaftra havia sido enterrado junto de seu corpo. O anel de Kaftra era o objeto que realmente protegia o reino, se usado pela linha de sucessão do trono, e fora criado pelo próprio Xenon Kaftra no dia em que ele unira o reino: ele fez a pedra usando centelhas de cada parte do reino e havia tido o consentimento – e magia – de todo o povo, que acreditou nele para protegê-los do Mal. Dizia então, uma lenda inscrita por uma profetisa na lápide da última Rainha que um dia, uma filha de Kaftra descendente do príncipe que fugira, voltaria ao reino e o protegeria, pois com a ajuda de fiéis amigos encontraria o anel de Kaftra e o usaria ao trono.

Lilly estava sem ar. De alguma maneira – talvez pelo jeito como a livro a cumprimentara – sabia que ela própria era a filha de Kaftra a quem o texto se referia, herdeira do trono do reino de Nenffar.


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Notas finais do capítulo

E agora a história muda completamente, uhules >



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