Eu nunca havia presenciado o poder do Senhor Titã Cronos pessoalmente, embora soubesse que ele o estava usando. Seus lábios se retorceram em um ângulo estranho, quase como um sorriso.

O tempo desacelerou. Percy parou de correr repentinamente e começou a se mover mais lerdo do que um telquine com dor de barriga. Eu mesma senti minha respiração ficar mais pesada, como se estivesse me afogando em uma piscina de bolinhas tamanho família. Cronos levantou sua foice em velocidade normal, esperando a chegada de Percy.

Os poderes de Percy de controlar a água do oceano também pareciam funcionar mais devagar, enquanto ele dava um passo à frente. Os monstros uivavam, sibilavam e zombavam cada um do seu jeito enquanto riam da velocidade em que Percy se movia.

De repente, o navio adernou, derrubando quase todos que estavam no convés. Litros e litros de água salgada invadiram a parte superior, erguendo-se da piscina e dando um banho em Cronos e nos monstros. Percy também pareceu acordar, mas ainda foi lento demais.

Cronos abaixou sua foice e repeliu o golpe de Contracorrente. Percy saltou  no mesmo momento em que a lamina maligna cortou o chão a menos de um centímetro de seus pés. Ele chutou a armadura de Cronos e, mesmo sendo mais pesado do que Luke, o titã cambaleou para trás.

Ele desferiuo utro golpe e Percy o desviou com a espada. Foi aí que tudo deu errado.

A lamina da foice cortou de leve a manga da blusa de Percy e arranhou seu braço direito. Não era um ferimento muito sério, mas eu sabia que ao menor toque a lâmina separava a alma do corpo de uma pessoa.

Percy gritou de dor. Ele recuou e passou Contracorrente para o braço esquerdo, investindo contra Cronos mais uma vez. A espada acertou em cheio a barriga do titã um golpe que deveria tê-lo matado, mas ao que pareceu não causou dano algum. Apenas ricocheteou como se tivesse atingido metal sólido.

Cronos deu uma gargalhada que estremeceu o Princesa
Andrômeda.

- Que desempenho fraco com a espada, Percy Jackson. Luke me diz que você nunca foi páreo para ele com a espada.

Opa. “Luke me diz que você nunca foi páreo”, constatara Cronos. Por que ele usaria um verbo no presente se ele próprio matou e consumiu o corpo de Luke? Poderia realmente haver uma forma de ele estar vivo, apenas sobre o comando de Cronos!

Minha animação se foi quando olhei para Percy. Seu ombro sangrava, mas era possível ver que não era apenas sangue que ele perdia, mas sim sua energia, sua força. Não haveria muito tempo até que sua alma não pertencesse ao seu corpo.

- Luke deixava que qualquer vitóriazinha lhe subisse a cabeça.- Percy conseguiu dizer com a voz que ainda lhe restava. –Mas pelo menos a cabeça era dele.

- É uma pena matá-lo agora – replicou Cronos -, antes que o plano final se revele. Eu adoraria ver o terror em seus olhos quando soubesse que vou destruir o Olimpo...

- Você nunca vai chegar com este navio a Manhattan.

 - E por que não? – Havia um certo desafio em seu tom de voz. – Você estaria contando com seu amigo dos explosivos? – Nakamura!

No meio da multidão de monstros um menino vestindo armadura grega completa se distacou. Um de seus olhos estava coberto por um tapa-olho preto, o que o fazia parecer uma criança brincando de pirata. Eu o reconheci do Labirinto, quando nós salvamos a vida dele. Se juntando ao inimigo era um belo jeito de retribuir o favor.

– Sucesso meu senhor! – gritou Ethan Nakamura, filho da deusa da vingança e do equilíbrio Nêmesis. – Nós o encontramos, exatamente como nos informaram.

Ele bateu palmas e dois gigantes vieram arrastando uma figura quase inconsciente. Charles Beckendorf tinha cortes e arranhões pelo rosto e pelo braço e um de seus olhos estava roxo e inchado. Sua camisa estava rasgada e ele estava sem armadura. Senti que havia parado de respirar até Percy gritar:

– Não!

Beckendorf ergueu os olhos  para Percy e depois baixou novamente para sua mão, como se tentasse dizer algo. Percebi o único acessório que ainda estava com ele: o relógio – aquele era o detonador. O Chalé de Hefesto trabalhou duro aquela semana para finalmente criar um dispositivo que se confundisse com uma coisa secundária, que não aparentasse importância alguma, e o uso de um relógio foi a idéia do próprio Chalé de Atena. Mas uma coisa ainda não estava clara: se Beckendorf continuava com o detonador, havia uma pequena chance de que os monstros não tivessem desarmado a sala de máquinas e as bombas estivessem prontas para explodir.

– Nós o encontramos na maia-nau – disse um dos gigantes –, tentando ir sorrateiramente para a sala das máquinas. Podemos comê-lo agora?

– Logo. – Em seguida Cronos olhou diretamente para Ethan Nakamura. – Tem certeza de que ele não armou os explosivos?

– Ele estava indo para a sala das máquinas, meu senhor.

– Como você sabe? –  Cronos perguntou com um tom
severo.

–  Hã... Ele estava indo naquela direção. – Ethan respondeu, se remexendo desconfortavelmente. –  E nos contou. Sua bolsa ainda está cheia de explosivos.

Então tudo começou a fazer sentido. Beckendorf não seria capaz de se entregar tão facilmente, contando todo o plano para o inimigo. Ele já havia preparado o fogo grego no convés do navio, e quando percebeu que seriam pegos deu meia-volta e fingiu estar indo armar os explosivos. E, como Ethan não é muito mais inteligente do que os dois gigantes que carregavam Beckendorf, nem se deu ao trabalho de ir verificar a sala de máquinas. Mas isso não era de muita ajuda, a menos que Percy e Beckendorf conseguissem sair do navio antes de apertar o botão do relógio.

– Abra a bolsa dele – Cronos ordenou.

Um dos gigantes arrancou a sacola do ombro de Beckendorf e hesitou antes de abrir cuidadosamente para espiar o que havia lá dentro. Claro que, se a bolsa estivesse mesmo cheia de explosivos, todos que estavam a bordo do Princesa Andrômeda estariam voando pelos ares,
no entanto as únicas coisas que caíram da sacola foram uma dúzia de latas de pêssego em calda. Os monstros recuaram e começaram a falar todos ao mesmo tempo, agitados. Era quase possível ouvir Cronos lutando contra sua raiva e tentando controlar sua respiração.

– Você, por acaso – disse ele – , capturou esse semideus perto da cozinha?

– Hã... – começou Ethan, sem ter chances de continuar.

– E, por acaso, mandou alguém de fato CHECAR   A  SALA 
DAS  MÁQUINAS?

Ethan empalideceu e deu um passo para trás, como se isso fosse o proteger da fúria de Cronos. Em seguida virou-se e correu, aterrorizado para tentar desarmar os detonadores, mesmo sendo tarde demais. Restavam apenas alguns minutos antes que as bombas estivessem completamente fora de uso.

Percy olhou novamente para Beckendorf e fez uma pergunta silenciosa: Quanto tempo?

Ele fez apenas um gesto com a mão, juntando os dedos com o polegar, formando um círculo. Zero. Não havia mais tempo,
se Beckendorf apertasse o botão do relógio todo o navio explodiria imediatamente,sem nenhum tempo de espera no timer.

Cronos virou-se para Percy com um sorriso torto.

– Você deve desculpar a incompetência de meu ajudante, Percy Jackson. Mas isso já não importa, agora temos você. Há semanas sabíamos que viria.

Ele estendeu a mão, deixando a vista um pequeno bracelete de prata com uma foice como
pingente – o símbolo do Senhor dos Titãs.

– Dispositivo de comunicação... – murmurou Percy, que já não tinha mais forças nem para falar. –, espião no acampamento.

Cronos deu uma pequena mas assustadora risada.

  – Não se pode contar com os amigos. Eles vão sempre desapontá-lo. Luke aprendeu essa lição da forma mais dura. Agora, largue a espada e entregue-se a mim, ou seu amigo morre.