Fomos para dentro da grande sala de visitas, que tinha uma decoração perfeita, e sentamos no sofá.

Uma empregada veio nos servir chá, café, torradas, e eu aceitei um chá e algumas torradas. Lucy começou a gesticular com as mãos de leve, organizando as palavras.

–Vamos por partes...

–Ok...

–Eu sou francesa. Quando eu fiquei grávida de você, eu tinha 17 anos, a sua idade agora. Eu sei que eu aparento ser mais velha, por causa dos cabelos brancos, mas... É, eu não sou tão velha assim. – Ela disse rindo. –De qualquer forma... Eu morava com meus pais e eles me botaram pra fora de casa porque eu não quis... Abortar você. E o que eu era? Uma garota de 17 anos, grávida e sem lar, sem nada, pelas ruas de Paris. E então... A gravidez foi muito difícil, o seu pai, assim que soube que eu estava grávida, sumiu do mapa. E então, quando você finalmente nasceu, era quase inverno... Eu não tinha dinheiro, eu não tinha roupas de frio nem para mim mesma, nem para você. Então, eu conversei com uma freira sobre isso e ela trabalhava em um orfanato, e concordou em te levar pra lá, dizendo que seus pais haviam morrido.

Enquanto ela falava tudo aqui, eu a olhava sem demonstrar muita emoção.

–Eu arranjei um emprego depois de algum tempo e as coisas começaram a melhorar pra mim. Em pouco tempo, eu já pagava o aluguel de um apartamento minúsculo no centro de Paris. Eu voltei ao orfanato para te buscar, porém me disseram que você havia sido adotada e eu sabia que a possibilidade disso acontecer era grande, já que você era nova, muitos casais querem crianças novas. Eu consegui voltar para a escola e terminar meus estudos, logo depois entrei em uma faculdade de medicina, como bolsista. Me mudei para a Alemanha e aqui, comecei a trabalhar como neurocirurgiã. Com o passar dos anos, ganhei muito reconhecimento e acabei sendo considerada a melhor neurocirurgiã da região. Então, eu vou para muitos lugares para fazer operações de riscos. Eu fui para Paris fazer uma cirurgia muito delicada, no mesmo dia em que você sofreu o acidente de carro. Depois que terminei a cirurgia que eu tinha ido fazer, fui examinar o seu caso, só por examinar, não sei, algo me chamou até você. E... Uma garota que estudava na sua escola, estava contando algumas coisas sobre você, ela viu o acidente. Ela disse seu nome, sua idade e quando perguntaram sobre os seus parentes, ela apenas disse que você era órfã. Eu voltei ao antigo orfanato por onde você tinha passado todos esses anos, eles disseram que você foi adotada e devolvida algumas vezes durante todos esses anos e me deram o nome da última pessoa que tinha te adotado. Eu fui até a casa dela e levei ela até o hospital, ela me disse que realmente, você era a garota que ela tinha adotado, que ela não poderia pagar os gastos que você teria no hospital e eu conversei com ela. Ela me disse que vocês eram colegas no orfanato e tinham um acordo, ela tinha te adotado apenas para você sair do orfanato e você tralhava e ajudava ela com as despesas. Fizemos um acordo e ela não teve problemas em te deixar vir comigo, contanto que eu pagasse suas despesas no hospital. E... Bom, resumindo, é isso.

Durante o discurso dela, leves flashes passaram pela minha mente, talvez quase-memórias. Eu me lembro de um uniforme estranho, um lugar bem cinza, com várias outras crianças. Aquele devia ser o orfanato. Depois minha mente vagou por várias casas diferentes. Por fim, uma pequena casa, ajeitadinha até.

E me impressionava muito saber que Lucy saiu do nada e virou o que é hoje, se reergueu tão forte. Era impressionante tudo o que ela tinha conquistado, senti um pouco de orgulho por isso.

–Wow. – Era tudo o que eu tinha a dizer.

–Eu sei que eu errei em ter te deixado, mas entenda, eu...

–Não, está tudo bem, você não tinha como cuidar de mim. É que eu tive uns flashes agora, mas não foi nada de mais. Enfim... Minha vida foi uma bagunça, não foi? – Um sorriso se abriu nos lábios de Lucy.

–Sim, mas nós vamos mudar isso, eu prometo, Vanny. Eu vou te dar tudo o que eu não pude te dar antes, tudo o que você merecia ter tido.