Rehab Of You escrita por Ana_Lucky


Capítulo 6
Capítulo 6


Notas iniciais do capítulo

Inicio do ano 2007...



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Inicio do ano 2007

Acordei sobressaltada e passei insistentemente a minha mão pelo outro lado da cama e com tristeza constatei que estava vazio. A custo sentei-me na cama e olhei através da janela. A claridade de um novo dia que acabava de nascer já se começava a fazer notar e ele ainda não havia chegado. De forma involuntária as lágrimas acumularam-se nos meus olhos e automaticamente a minha garganta começou a arranhar com a força que tive que fazer para evitar chorar. Não faço ideia de onde conseguem surgir tantas lágrimas.

Ele não amanheceu ao meu lado mas na minha cabeça ecoa o som mágico da sua voz, como se o sentisse sussurrar-me ao ouvido “Nós somos perfeitos Elena…” De facto nós somos perfeitos, ou melhor, nós fomos perfeitos…

Não faço ideia em que momento nos deixamos afundar. Por vezes dou por mim a gastar longas horas apenas a meditar, a recordar, a tentar apenas descobrir aquele exacto minuto em que as coisas começaram a mudar. Mas não sou capaz, realmente não sou.

            Passei os meus olhos em redor do espaço que me envolve. O nosso apartamento é pequeno mas muito acolhedor. É um espaço só nosso, que um dia foi muito desejado. Parece que foi ontem que deixei a casa da Jenna para vir morar para cá com o Damon. Posso reviver com clareza o que senti no meu primeiro dia nesta casa, era um sonho tornado realidade. A nossa felicidade foi inigualável enquanto desencaixotávamos o que trazíamos da nossa antiga vida para uma nova que começávamos a construir a dois.

            Gostava de saber agora qual o paradeiro dessa Elena e desse Damon, queria mais que tudo saber o foi feito de nós. Por vezes parece que tudo o que sobrou foi um enorme buraco aberto no meu peito e uma angústia que me arruína, ameaçando engolir-me. Nós consumimo-nos por completo. Não sobrou um dia de paz no meio do caos em que a nossa vida se tornou. Parece que não restou nada senão as noites em claro e as intermináveis discussões. Mas é mentira, ficou ainda o amor que sinto por ele, um amor com o qual eu não sei lidar e jamais saberei.

            Ouvimos todos os dias falar de relações destruidoras que não conseguimos entender. Relações que não fazem ninguém feliz, mas das quais os intervenientes não se conseguem libertar. Pensamos que acontece apenas aos outros. Eu nunca pensei que me aconteceria a mim. Duas pessoas que se amam mas só se conseguem magoar mutuamente, é nisso que acabamos por nos tornar.

            Levantei-me, abri a porta do armário e fiz correr a gaveta onde estava guardada a roupa dele. Agarrei na primeira t-shirt que vi e olhei a peça de roupa com pesar. A t-shirt é preta como a grande maioria das suas roupas. O preto é a cor predilecta dele, a que melhor lhe assenta sob a pela clara, a que condiz com o seu negro cabelo e que faz sobressair o azul dos seus olhos. Encostei a peça de roupa ao meu rosto e inspirei fundo sentindo o seu perfume entranhado no tecido.

            Despi a camisa de dormir e fiz deslizar a t-shirt dele pela minha pele nua. Voltei para cama e envolvi-me num abraço, encolhida sobre mim mesma, quieta e serena.

            Tenho consciência que o estorvo, que ele quer mais para si que esta vidinha pacata na cidade natal, do que este casamento fingido tão precoce. Sei que gostaria de perseguir o seu sonho de viver bem longe daqui e tirar o seu curso de fotográfica ao invés do emprego de barman que arranjou como sustento. Ele permaneceu aqui por mim, porque eu ainda não havia terminado o meu curso, porque o Jeremy andava com problemas e por uma série de situações que se foram acumulando às quais não fui capaz de voltar as costas. Sou um estorvo na vida dele como sempre fui, algo que as pessoas nunca entenderam. Vi desde o inicio da nossa relação a forma como me olhavam, como não compreendiam o que ele vira em mim. Agora é tarde demais.

Nunca vou esquecer o olhar de ódio que me lançou quando lhe contei que estava grávida. Aquele olhar severo e cruel sobre mim como se eu tivesse culpa. Também não quis nada disto, nunca quis que acontecesse. As coisas entre nós já se estavam a deteriorar a cada dia que passava, agora só ficaram ainda piores com esta notícia que apanhou a ambos de surpresa.

            Pouco tempo depois ouvi a porta da entrada ranger, automaticamente me pus a pé para ir ao seu encontro.

            - Onde é que estiveste? – Perguntei severamente, mas a minha vontade era gritar-lhe sem parar, despejar nele toda a raiva que sentia. Quase não consegui olha-lo no olhos – Duas noites sem vir a casa, sem dar noticias de vida… com quem é que estiveste?

            Damon trespassou-me com um olhar vazio e cruel. Olhou-me assim fixamente durante longos segundos, fazendo-me estremecer. Praticamente não o reconheci, parecia uma nova pessoa diante de mim.

            - Como é que tu te atreves? – Gritou impiedoso caminhando na minha direcção.

            Recuei alguns passos, sendo apanhada completamente desprevenida. As minhas pernas amaçaram ceder com pressão.

            Nada me poderia ter preparado para aquela situação. Ele amarrou-me nos braços e exercendo sobre mim uma força repentina empurrou-me violentamente contra a parede. Senti um enorme abalo sobre o meu corpo devido ao brusco embate.

            - Por quanto tempo pensavas que me conseguias enganar? – Berrou ao meu ouvido.

            - De que é que tu estás a falar? – Questionei-o tremulamente completamente confusa com a situação, com tudo o que se estava a passar e principalmente com a agressividade que me dirigia. 

            - Massacras-me constantemente com os teus ciúmes insuportáveis. Vasculhas a minha vida, cheiras a minha roupa… na verdade apenas para esconderes aquilo que tu andas a fazer… como é que foste capaz? - Continuou ao berros ao pé do descontrole.

            A mão dele continuava cravada sobre o meu braço que me doía imenso. Parecia que ele o agarrava com toda a sua força. Pela primeira vez senti medo daquele homem.

            - Achavas mesmo que eu não ia descobrir os teus encontros nocturnos com esse tal de Mason? – Gritou novamente aos meus ouvidos – Sua falsa…

            Fiquei aterrorizada e incrédula quando o ouvi pronunciar o nome de Mason. Não faço ideia como é que ele possa ter descoberto. Embora na verdade não houvesse coisa alguma para descobrir. Mason para mim era apenas um amigo que conheci recentemente e embora ele já tivesse demonstrado outras intenções, nunca aconteceu em momento algum entre nós nada mais do que um flert e conversas amimadas entre duas pessoas que se dão bem. Ele tem sido o meu refúgio para o inferno constante em que a minha vida se transformou. Sou completamente apaixonada pelo Damon e em nenhum momento me passaria pela cabeça traí-lo, permitir-me a estar com outro homem que não fosse ele. Mas debaixo de todas aquelas acusações senti-me fora do controle. Não quis negar, nem por um momento as desconfianças dele. Fui tomada por uma vontade repentina de fazê-lo sentir como ele me faz sentir sempre… apreensiva, insegura, desconfiada…. Quis provocá-lo e vê-lo humilhado como eu tantas vezes me senti.

            - O que te fez pensar que eras o único capaz de trair? – Perguntei em alto tom cinicamente, desenvencilhando-me por fim das suas mãos e afastando-me dele – Que tal é o sabor do teu próprio veneno? – Gritei em desespero.

            As lágrimas pulsaram dos meus olhos descontroladas e não consegui conter o riso nervoso que me provocou esta triste e vergonhosa cena digna de um filme de terror.

            - Eu nunca te traí Elena… nunca… eu não traio a pessoa que mais amo no mundo…

            Não sabia porque motivo mas não fui capaz de acreditar em nenhum momento nas suas palavras. Nunca consegui acreditar.

            - Nunca me traíste? Não tem problema algum… – Continuando com o meu escárnio – Agora que sabes o quanto magoa também nunca o farás não é? – Perguntei com brusquidão com completa inconsciência das consequências que teriam as minhas acções. Não parecia a minha habitual forma de agir, estava fora de toda e qualquer razão, Damon sempre teve este poder sobre mim.

Não pude processar o que aconteceu a seguir, ele aproximou-se de mim repentinamente. Senti uma dor profunda e aguda na face ao ser atingida violentamente, pela mão dele no meu rosto. O impacto fez-me cambalear e instintivamente recuei alguns passos.

O meu corpo tropeçou nos degraus atrás e mim fui derrubada de rompante para o chão. Vi tudo girar velozmente em meu redor até que tudo ficou completamente preto.

Tentei entreabrir os meus olhos embora com dificuldade mas foi em vão, fui completamente ofuscada pela claridade do local. A minha cabeça latejava insistentemente e o meu corpo doía imenso impossibilitando que me conseguisse mexer. Estava completamente confusa, sem fazer a mínima ideia do sítio em que me encontrava ou porque me sentia assim. 

            Balancei entre a realidade e a inconsciência. O peso que senti sobre os meus olhos foi tão grande que não pude afirmar com certeza se realmente estava acordada ou se tudo não passava apenas de um sonho confuso. Até porque a minha mente não parava de vagar entre memórias estranhas.

            Aos poucos os meus sentidos foram ficando um pouco mais apurados e comecei a perceber que não era apenas o silêncio que me envolvia. Comecei a conseguir distinguir duas vozes, embora estas me pareçam muito distantes e difusas. No entanto, passado pouco tempo, quando os meus ouvidos se começaram a habituar aqueles estranhos sons, as mesmas vozes foram-me soando cada vez mais claras e familiares.

            - Que é que tu estás aqui a fazer? – Perguntou Stefan austero.

            - Como assim o que estou aqui a fazer? Vim vê-la como é obvio… - Respondeu Damon num tom confuso.

            - Não me parece nada obvio… depois do que fizeste não devias nem aproximar-te dela.

            Um longo silêncio se seguiu, Damon não respondeu.

            - A que ponto tu chegaste? – Insurgiu-se Stefan novamente - Como foste capaz?

            - Não fales sobre aquilo que não compreendes…

            - O que eu não compreendo? O que tu merecias era que eu apresentasse queixa, era exactamente isso que eu devia fazer… Era o teu filho? O teu filho… – Continuou parecendo consternado - será que nem disso tens consciência?

            Era? Questionei-me… Como assim era? Que palavras eram aquela que eu escutava mas que não conseguia compreender? Só podem ser realmente fruto de um pesadelo porque não fui capaz de conceber que fossem reais.

            - Tu não prestas… - Falou novamente Stefan – Não vales nada… És um falso que toda a vida foi capaz de enganar todos em redor, os teus amigos que não sabem aquilo que realmente vales, a mãe que sempre bajulaste para teres toda a atenção e como se não bastasse agora a Elena também…

            - Tu és meu irmão e apenas por isso eu vou fazer um esforço para relevar aquilo que acabei de ouvir. Vou simplesmente agarrar-me há esperança de que aquilo que acabaste de dizer possa advir apenas de algum tipo de raiva momentânea e não daquilo em que verdadeiramente acreditas.

            - Eu acredito é que tu não a mereces…

            - Stefan tens que compreender de uma vez por todas que eu não sou o culpado dos teus problemas… O teu mal é nunca teres ouvido as verdades que sempre mereceste ouvir. Eu não tenho culpa se a mãe nunca te deu a atenção que tu quiseste nem mesmo quando lhe mostravas as tuas magnificas notas, não tenho culpa que não tenhas amigos, não tenho culpa que a Elena não te ame… Ou achas que nunca percebi o que realmente sentes por ela? – Disse, deixando-se levar pela sua característica impulsividade – Não tenho culpa que sejas um frustrado…

            - Desaparece daqui Damon… Desaparece antes que chegue ao ponto de eu dizer que não tenho mais irmão…

            Não ouvi mais a voz do Damon, apenas o som de uma porta que se abriu e de largos passos a afastarem-se.

Eles falaram sobre mim como se eu não estivesse presente e isso não me pareceu um bom. Na verdade eu não me sentia mesmo muito bem. Continuei completamente atordoada e incapaz de me mover. O que ouvi apenas me deixou pior ainda e uma enorme tristeza tomou conta de mim. Quando o silêncio me voltou a envolver senti-me novamente a mergulhar num diferente plano, repleto de escuridão, como se me afundasse num abismo profundo.

Pensativa, contemplei a chuva miúda a embater na vidraça da janela do apartamento que dentro de poucos dias deixará de ser meu. Á minha volta estão um sem número de caixas de cartão amontoadas, prontas para serem transportadas de volta para a casa da Jenna.

Tenho na minha mão um pequeno par de sapatos de bebe, eles foram a primeira coisa que comprei para o meu filho. Apesar de no inicio ter rejeitado por completo a ideia da gravidez também nunca coloquei a hipótese de a interromper voluntariamente. O que nunca pude imaginar é que agora, depois do aborto causado pela minha queda, a sensação de perda fosse tão grande e dolorosa. Já estava completamente familiarizada com a ideia de ser mãe, de alguma forma já desejava aquele filho.

Pouco depois senti o corpo dele embater contra o meu e o seu queixo a descansar sob o meu ombro. Os seus braços envolveram-me e eu entrelacei os meus dedos nos dele sentindo a fantástica textura da sua pele. Fechei os olhos e desfrutei da sensação incrível daquele abraço. Os nossos corpos encaixaram como sempre na perfeição como se tivessem nascido para colidir, feitos para ser um. Abri os olhos encarando o nosso reflexo no vidro e não consegui evitar que uma lágrima teimosa me escorresse pela face.

- Nós somos perfeitos – Sussurrou ao meu ouvido.

- Sim, nós somos – Murei, voltando-me e encarando lindo oceano azul dos seus olhos – Na verdade nós fomos perfeitos…

Procurei manter-me firme porque não me restava outra alternativa. Sei que bati em cheio no fundo do poço e nada mais me resta a não ser reconhecer que é chegado o final da linha.

- Elena…

- Não precisas dizer nada… - Murmurei tristemente – Percebo perfeitamente que tenhas que o fazer. Não deve existir nada que queiras mais que ir para bem longe daqui.

- Enganas-te… o que eu quero mais que tudo é ouvir-te dizer que somos capazes de ultrapassar tudo isto. Ouvir-te dizer essas palavras mágicas seria o suficiente para me fazer ficar.

- Não somos Damon, infelizmente não somos… - Proferi entre os soluços que procurei em vão abafar – O amor por vezes não chega!

Afastei-me dele e procurei a minha bolsa e uma pequena mala onde já tinha colocado algumas das principais coisas que ia precisar antes de deixar a casa livre por completo para entregar a chave ao senhorio e terminar definitivamente com as mudanças.

- Posso levar-te ao aeroporto amanhã? – Questionei-o.

- Estava a contar com isso… - Respondeu.

Voltei costas e abandonei o local. Teria que reunir todas as forças que ainda me restavam para o dia difícil que se antevinha. Por mais doloroso que pudesse ser, queria ser eu a acompanha-lo, não delegaria a tarefa a mais ninguém.

Embora estivesse rodeada de pessoas que corriam de um lado para o outro, com os seus passos acelerados e envolta num frenesim constante, ainda assim tive a sensação que conseguia ouvir claramente cada batida descompassada do meu coração. Foi difícil chegar aquele local mas agora que ali estava, fui paralisada pelo medo e a coragem ameaçou abandonar-me. O som ruidoso dos aviões que descolam no exterior assustou-me como nunca pude imaginar.

A caminhada que fiz ao lado dele até ao cais de embarque pareceu-me a mais longa e custosa até hoje.

Por momentos senti-me prestes a ceder à mais terrível tentação. A vontade de implorar que não fosse era devastadora. Quis dizer-lhe que eu estava errada, que juntos conseguiríamos vencer o que quer que fosse. Mas sabia também que isso não podia ser uma mentira maior. Juntos nós apenas conseguimos vencer-nos um ao outro e no entanto não sei como vou conseguir prosseguir com a minha vida sabendo que não o tenho mais por perto.

- Até um dia… - Murmurou ao chegarmos juntos da porta. Encarei-o directamente e o olhar que me devolveu deu-me algum alento. Pude constatar que aquele momento estava a ser tão custoso para ele como para mim. Não me senti capaz de articular uma única palavra tal era o nó que me fechava a garganta, sabia que se tentasse não ia conseguir controlar as lágrimas.

- Mesmo que não acredites, sei que nunca vou amar ninguém como te amo…

- Tal como eu nunca serei capaz de o fazer… - Confessei.

As nossas palavras pareceram pairar no ar soando continuamente com o tom de uma promessa mútua.

Foi penoso voltar as costas e regressar à vida real enquanto ele se afastou para embarcar. Aguardavam-me longos e dolorosos meses que a custo teria que enfrentar.


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Notas finais do capítulo

Gostaram do cap.? Se calhar não pensaram que fosse isto que se tivesse passado entre o Damon e a Elena... Espero não ter desiludido...

O que quero transmitir é que eles sempre gostaram um do outro mas que simplesmente não conseguiam fazer com que as coisas resultassem... conduzindo assim à inevitável e custosa separação...

Deixem-me reviews com as vossas opiniões e criticas para que eu possa melhorar...

Obrigada...
Beijinho

Ana



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