É Segredo escrita por Phallas


Capítulo 9
Capítulo 9 - Três, dois, um, valendo




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"Um atleta não pode chegar à competição muito motivado 

                        se nunca foi posto à prova"

                                     - Séneca

                   

Minha adrenalina está subindo. Eu e Tensy estamos treinando alguns ataques e defesas. Steve está lendo a história do voleibol em ambos os colégios, e sei que ele está perfeitamente ciente de que ninguém presta atenção no que ele lê, mas ainda assim ele o faz em todos os jogos.

Megan acaba de chegar. Percebo, assim como as outras, que ela pintou os fios negros e brilhantes de loiro. Na verdade, ela sempre muda o cabelo perto dos jogos, e depois volta para o original e ninguém entende o porquê. Bem, eu entendo.

Reparo que as meninas dos times não estão treinando. Estão olhando algo na arquibancada. Tem alguma coisa errada. As meninas estão comentando com as outras. Estou prestando tanta atenção nas outras que quase levo um ataque de Tensy na barriga. Eu coloco a mão na frente tão rápido que a bola voa para atrás de mim, perto da arquibancada. Eu saio correndo para pegar a bola.

As meninas continuam comentando, dando gritinhos e sorrisinhos. O que raios está acontecendo? Apenas duas meninas não olham para a arquibancada. Blake Carmichael, que parece evitá-la em particular, fitando o outro lado e fingindo estar muito preocupada analisando sua cutícula. Tensy também não olha. Ela está me encarando, e parece saber exatamente o que está acontecendo.

Pego a bola e quando levanto, entendo o que moveu tanto a curiosidade do público feminino.

Não é possível. Isso não pode estar acontecendo. Não faz sentido.

Se bem que aquela cabeleira cor de chocolate é inconfundível. Abro mais os olhos para ver melhor o rosto do menino no qual estive pensando desde semanas atrás.

O cabelo, liso, brilhante e volumoso está meio bagunçado no estilo Robert Pattinson, de modo que alguns fios grossos caem sobre um dos olhos azuis-céu, e ele parece não ligar. Está esparramado na cadeira, uma das mãos nos bolsos da bermuda jeans, um casaco vermelho com capuz de marca, um tênis Nike que por mim pertenceria a qualquer ator de Hollywood. Está com fones de ouvido e parece prestar muito mais atenção na música que vem deles do que em qualquer uma das meninas que passa por ele, depois passa de novo para vê-lo melhor, depois suspira, e comenta com as amigas.

Agora eu meio que sei porque o rosto do Ian Somerhalder vinha na minha cabeça quando tentava pensar nele. Mas, pensando bem, ele ainda é mais bonito que o Ian. Reparo que os lábios dele (a única parte do corpo daquele menino que conheci melhor e me lembro perfeitamente) são cheios e rosados, o que me faz querer beijá-lo de novo. Percebo que na mão que não está no bolso da bermuda, ele carrega uma folha de papel. Acompanhando o ritmo da música, ele bate na própria coxa e vejo o outro lado da folha.

Eu conheço aquela folha.

É a folha de transferência. Congelo quando percebo que talvez ele possa estar vindo estudar aqui. É isso. Por isso ele está aqui. Ele veio pegar a folha e acabou ficando para o jogo. Não consigo me mexer.

Finalmente, ele parece ter dado conta da movimentação ao seu redor e levanta os olhos. Quando ele encara as menininhas da quinta série que ficavam rodeando-o, elas gritam excitadas e coram.

O garoto olha para o outro lado achando que elas são loucas e percebe todas as outras jogadoras fitando-o. Com isso, ele parece deliciado. Então ele dá mais uma olhada no lugar até que seu olhar pousa em mim, e eu não consigo me movimentar. Seus olhos azuis se arregalam de surpresa e eu reuno todas as minhas forças para conseguir dar-lhe as costas lentamente. Porém um lampejo de memória me mostra que foi uma má ideia.

"Já te contei que jogo vôlei? - lembro de ter dito a ele aquela noite, para em seguida dar uma gargalhada de bêbada - Mas eu só jogo com o número 12. Só gosto de números pares e acima de dez. Lembro de uma vez que me deram para jogar o número 2, e eu não podia trocar. Então pintei o um na frente do dois, pra formar o doze. Eu me fiz de inocente e Peter deixou o time todo de castigo por nunca ter descoberto quem foi que estragou o uniforme." Lembro-me que ambos gargalhamos depois disso.

Meu Deus, o que mais eu contei pra ele?

Não sei se ele tinha me reconhecido prontamente, mas com esse 12 monumental nas minhas costas, se ele não tinha certeza que eu sou eu, bem, agora tem.

Abro os braços e me dirijo a Tensy:

- Há quanto tempo sabia?

- Eu não tinha certeza. - ela morde o lábio.

Tento me concentrar no rosto dela. Estou cinco mil vezes mais nervosa agora.

- Esquece esse garoto. - ela me orienta. - Continua. - Tensy aponta para a bola em minhas mãos. Percebo então que a estou quase furando com as unhas.

Continuar. Só tenho que continuar.

Sinto uma mão em meu ombro que me faz tremer mais do que já estou tremendo.

- Harper, escute. - É Peter. Ele se abaixou para falar no meu ouvido. Quando me viro para ele, inevitavelmente olho de novo para o lugar onde aquele garoto estava. Ele ainda está lá, e me olha com curiosidade, principalmente agora, que Peter aperta meu ombro protetoramente e fala ainda mais baixo. - Conto com você pra levar esse time pra frente. Confio em você. Ganhe. - terminado, ele me passa a braçadeira de capitã.

Ótimo. Não estou nem um pouco pressionada. Penso, enquanto a coloco no meu braço direito. Megan passa e me manda um olhar de indignação por eu a estar vestindo. Na verdade, nós revezamos a braçadeira, mas ela dá muito mais valor a isso do que eu.

Os times deixam a quadra. Steve começa a ler os nomes das jogadoras, começando pelas do West High. Elas voltam à quadra quando seus nomes são chamados, dando pulinhos. Terminado este time, Steve passa a ler os nomes de nosso colégio.

- Tensy Cartwright de ponteira direita, Megan Parsons como meio de rede, Hannah Proffer e Helaina Meggeni de fundo, Trishia Levín levantando e a nossa capitã, jogando como ponteira esquerda, Isabelle Harper!

Entro na quadra trotando e bato nas mãos de todas as meninas em quadra, inclusive de Megan, que agora já sucumbiu à nossa trégua temporária e anti-Blake-Carmichael. O público aplaude.

Olho para a arquibancada. Ele está lá, me olhando parecendo impressionado, prestando muito mais atenção à quadra do que antes.

Os técnicos chamam as meninas de seus respectivos times para as últimas instruções anteriores. Peter está tagarelando algo sobre não deixar a bola cair a qualquer custo, joelheira é pra isso mesmo, que quer defesas na mão da levantadora, ataques fortes e firmes.

- E vocês - reforça, apontando para mim, Tensy e Megan e me tirando do transe. - Quero muito bloqueio. Pulem o mais alto que conseguirem pular.

Peter nos libera e todas voltamos a nos alongar, mesmo que já tenhamos feito isso. Estamos tão nervosas que precisamos de algo que nos distraia.

Arrumo meu cabelo enquanto tento lembrar o motivo pelo qual estou aqui.

Ah, é. Vôlei. Estou aqui pelo vôlei. E acabou. Vou me concentrar só no vôlei.

Acontece que isso não é tão fácil de fazer quando se tem um menino perfeito irradiando beleza olhando para você a metros de distância.

Steve apresenta os juízes. Eles se curvam para a plateia como cumprimento e também para os times. O juiz principal chama as capitãs das equipes.

Blake levanta uma das sobrancelhas douradas e, andando com superioridade, do jeito que ela sempre anda, se posta ao lado do juiz. Eu faço o mesmo.

- Harper. - Blake me cumprimenta.

- Carmichael. - devolvo.

- Cara ou coroa? - o juiz pergunta a mim, erguendo uma moeda pequena.

- Coroa. - respondo. É minha resposta sempre. Coroa me lembra majestade, reis, princesas, castelos...

Deu cara.

Blake se afasta sorrindo como se achasse que o fato de ter ganhado no cara-ou-coroa lhe dava por garantia o jogo inteiro.

Mas não é bem assim que funciona.

Me coloco na minha posição. As meninas já estão agachadas com as mãos nos joelhos.Todas me mandam um olhar interrogativo que interpreto facilmente.

- Elas começam. - respondo.

O time assume uma expressão mais preocupada. Achei que Megan fosse soltar alguma piadinha, mas os nervos dela estão sensíveis demais. Ela olha para Peter como se esperasse que ele a qualquer momento pudesse pular dentro da quadra e salvá-la de um desastre que ela pressente, mas não necessariamente vai acontecer.

O outro time já está com a bola na mão.

Começou, eu penso.

Furtivamente, arrisco um olhar à arquibancada.

Ele não está mais lá.


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