É Segredo escrita por Phallas


Capítulo 10
Capítulo 10 - Competição




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               "Competição deve existir e você deve vencer."

                                       - Edward Gibbon

Não presto mais atenção no que acontece à minha volta. Blake saca. Ela sempre faz questão de ser primeira a sacar, e acho que nunca vou entender o por quê.

A bola vem na minha direção. Mando para a levantadora, que levanta para mim e eu ataco, mas a bola fica no bloqueio.

Elas pulam de felicidade.

Enquanto elas pegam a bola para sacar de novo, olho para a arquibancada mais uma vez. Ele voltou. Está lá. Não era uma miragem, afinal de contas.

Fico desconfortável quando percebo seus olhos em mim. Sinto que ele também evita olhar Blake. Qual é a desses dois?

- A bola está do lado do West High agora - a voz de Steve narra - ela está com Blake Carmichael, meu Deus, eu casaria com essa menina ontem...

-Steve! - a diretora uma mulher com sessenta e poucos anos, baixinha e de cabelos enormes e brancos, que ela prende no alto da cabeça, a senhora Mckingdon, grita.

- Desculpe, senhora Mckingdon. - Steve responde, para continuar - Blake corta para o outro lado, Jesus, essa deve ter doído... a levantadora passa para Tensy Cartwright agora. Já me dispensou umas três vezes, essa garota. Fiquei sentidinho.

A diretora manda um olhar de repreensão a ele.

- Desculpe, saiu. - ele sussurra. - o ataque da arrasa-corações foi bem, pelo menos. A bola está com... não sei o nome daquela menina, alguém pode me dizer? Não sei, mas ela tem pernas bonitas...

- Steve Puttyn!

- Essa foi sem querer, senhora Mckingdon, eu juro. Tá, agora a bola está com o nosso colégio. Vai Bellie, vai Bellie! Isso, garota! Elas pegam. Não é possível. Blake vai atacar de novo. Só tem ela no time, pelo que eu vejo, né? Não que eu não goste de ver essa menina pulando, mas...

- Steve! Isso é um absurdo!

- Eu sei, diretora, eu sei. Concordo totalmente, como assim, o juiz deu bola fora? Alô, tem algum médico no recinto? O juiz ficou cego!

- S-t-e-v-e.

- O quê? Eu falo mesmo, comigo não tem isso, não. Aaai, ponto delas. A senhora está me desconcentrando diretora, dá licença. Ainda está na minha frente, dá uma viradinha. Isso, aí tá bom.

Tento me desligar das besteiras que o idiota do Puttyn fala. Está vinte a onze. Peter pede tempo.

Ele está comentando do jogo das outras, mas é como se eu não conseguisse ouví-lo. Meus olhos estão colados no garoto na arquibancada. O garoto que venho olhando continua ouvindo música, mas parece estar consciente do que acontece no jogo. Não consigo desviar minha atenção dele.

- Ouviu, Harper?

- Hã? - respondo, atordoada.

- Se concentre no jogo. - ele disse, e deu uma olhadinha sugestiva na direção do garoto.

As outras meninas riram. Eu coro de vergonha.

Tenho que manter a minha cabeça no jogo.

Voltamos à quadra e passo a prestar mais atenção no jogo, e dá certo. Por um instante, está 24 a 23. Mas alguém do time adversário ataca e a bola para a milímetros da linha de fundo.

- E elas ganham o primeiro set. - anuncia Steve, como se aquilo já não fosse óbvio, pelo jeito como as meninas gritam.

Meu time está desmoronando. Todas arriam os ombros e saem da quadra cabisbaixas. Temos um intervalo de quinze minutos antes do próximo set.

Pego uma garrafa de água gelada que Peter me oferece e jogo água em cima do meu rosto também.

- Jogou bem, Harper. - ele comenta.

Não respondo. Estou com tanta raiva que poderia deixar alguém em coma. Não quero que esse alguém seja o meu treinador.

Chamo todas as meninas. Elas formam uma rodinha em torno de mim.

- Tudo bem, perdemos um set. - começo - mas não perdemos o jogo. Pensem em quanto nós treinamos para estarmos aqui hoje e o que sentimos quando deixamos de ser o time da cidade. - completo, olhando para Megan. Ela me encara por um décimo de segundo, depois abaixa a cabeça. - Quero me prometam que vão entrar naquela quadra e dar tudo o que vocês têm.

Todas levantam o olhar e fitam umas as outras.

- Eu prometo. - diz Megan, por fim, colocando uma das mãos no centro da roda.

Eu sorrio para ela e coloco a minha mão em cima da dela.

- Eu prometo. - digo.

Todas repetem o gesto e entramos em quadra. Os quinze minutos passaram muito rápido.

Enquanto entramos, vejo que o garoto da festa se levantou e está arrumando o cabelo, e Blake esbarra de leve nele. Eles se encaram por um tempo que me pareceu longo demais e então ela revira os olhos e sai. Qual é o problema desse dois um com o outro? Meu corpo inteiro gela quando percebo que eles devem ser ex-namorados. É claro, como não pensei nisso antes? Mas faz sentido, afinal, os dois parecem estrelas de cinema. Me sinto um pouco pior agora.

- Uau. Sinto energia nova nesse time, hein? - Puttyn, diz, ao microfone - Vamos ganhar esse, né? Porque de perder já tá bom... epa, o que foi isso? Plateia, elas me deram o dedo do meio? Com quem vocês aprenderam isso, menininhas? É feio, é muito feio.

- Cala a boca, Puttyn. - digo, e ele imediatamente fecha a boca e se concentra em narrar o que acontece.

O resultado é um pouco suado, mas sai. Fica 25 a 20, para nós.

No intervalo seguinte, Peter é só elogios a nós. Quando o tempo acaba, Peter me puxa de lado e diz, no meu ouvido:

- Parabéns, Harper. Fiz bem em te colocar como capitã.

Eu dou um sorriso a ele, ficando vermelha.

Nós entramos em quadra renovadas, mas a alegria dura pouco. Agora estamos perdendo de dezesseis a onze. O saque é meu. Vou até o final da quadra com a bola na mão. Rezando o caminho todo.

O juiz apita. Olho para a bola e para a arquibancada, os olhos dele estão fixos em mim.

Tremendo, jogo a bola para cima, faço as passadas, pulo e bato na bola. Sou uma das poucas que saca pulando, além de Megan e Blake. Percebo, aterrorizada, que coloquei muita força na bola e ela foi para fora. West High comemora.

Dezessete a onze. A diferença é gigantesca. Agora temos que fazer ponto a qualquer custo.

Volto para meu lugar. Uma menina do outro time saca, mas eu não consigo ver o rosto dela. Também não ouço a voz de Steve, que deve estar dando uma de Galvão Bueno de novo. Não escuto os burburinhos da torcida, nem ligo que tenha dois deuses gregos olhando para mim esperando que eu faça alguma coisa. Um que me treina e o outro que, bem, ainda não sei dizer o que faz comigo.

O saque vem em mim e mando para a levantadora com uma manchete. Ela devolve para mim, mas o levantamente sai errado, muito na rede. As garotas do outro time sobem em um bloqueio triplo, mas eu não vou deixar. Essa bola tem que passar. Essa bola vai passar.

Estico meu braço para cortar, mas elas são tão rápidas quanto eu, e nossas mãos se chocam. São seis mãos contra somente a minha, e uma delas pegou o meu pulso e o forçou, inconscientemente. A bola cai atrás delas no final, e o ponto é nosso.

Meu time grita de felicidade, mas eu não posso fazer o mesmo. Minha mão está doendo demais. É uma dor que eu nunca senti antes, como se meu pulso tivesse partido em milhões de pedacinhos que furam minha pele, querendo sair e eu nunca mais vou conseguir juntá-los de novo. Aperto a minha mão e reprimo um grito de dor. Está latejando. Não é possível que eu tenha quebrado a porcaria do meu pulso.

- Bellie - Tensy me chama - você está bem?

Tenho receio em responder a ela. Se eu abrir minha boca, sei que vou gritar.

- Estou. - falo, em uma voz sufocada que me contradiz totalmente.

- Harper. - Peter diz. As garotas pararam de comemorar e prestam atenção em mim. - saia da quadra e me deixe olhar isso.

Olho nos olhos azuis dele. Agora não causam nenhum efeito em mim, como normalmente.

- Não. - respondo, numa voz decidida. - eu vou jogar.

- Não vai se tiver quebrado isso. Me deixe ver.

- Não, Peter. Estou bem. Quero jogar.

- Bellie. - sinto uma mão quente em meu ombro. É Hannah. - saia por um instante. O jogo está parado. Não vamos fazer nada sem você aqui. Deixe de ser teimosa e ouça Peter.

Saio andando contrariada da quadra e percebo surpresa que todas as meninas me acompanham.

- É... parece que vamos ter um intervalo. - diz Steve - Então, vão comprar uma coca, comer alguma coisa, fazer um xixizinho, porque agora está tudo perdido mesmo... com Bellie fora da jogada, ganhar vai ser impossível. Bom dia pra vocês.

 Ninguém parece ter ouvido o que ele diz.

A dor está latente. É como se tivesse subido pelo meu braço inteiro. Com muito esforço e ainda segurando meu pulso, que não tenho coragem de largar, olho ao redor dele para me certificar de que ele não está sangrando ou alguma coisa parecida - a gente nunca sabe. E não está mesmo.

- Me dê. - ordena Peter.

Eu faço o que ele me diz, porém ainda me agarro à pele do meu braço.

- Solte, Harper, vai bancar a criancinha?

Relutante, solto meu braço. Peter o pega com os dedos longos e frios. Eu teria adorado isso, se a dor não fosse tão forte. Ele vira meu braço um pouco, analisando-o com atenção. Sinto a tensão de todas as meninas do meu time, que fizeram uma roda em volta de nós.

- Está quebrado? - pergunta Helaina, preocupada.

Peter dá mais algumas olhadas antes de responder.

- Não, mas você conseguiu torcer feio o seu pulso, Harper.

- Ela ainda pode jogar, não pode, Peter? - indaga Trishia.

Todas esperam a resposta da pergunta que tinham medo de fazer. Estou contendo a vontade de chorar. Peter olha todos os rostos perto dele e diz:

- Não, é arriscado demais. E suponho que isso deva estar doendo como o inferno. Você vai para o banco, Harper.

- Ah, eu não vou mesmo, Peter.

- Não é você quem decide se vai jogar ou não. Sente-se. Vou pensar em alguém para o seu lugar.

- Peter, ela quer jogar. Deixe-a. - Megan parte em minha defesa.

- Não quero ouvir, Parsons. Eu sou o treinador e eu decido o que é melhor para o time, e as jogadoras dele. Por isso, Harper não vai jogar.

- Como pode ser melhor para nós se Bellie não jogar? - Tensy se indigna.

As outras meninas começam a falar todas ao mesmo tempo, de modo que o que falam se torna incompreensível.

Peter ignora todas nós e se volta para o banco de reservas:

- Vanndersar, você entra.

Uma garota alta de cabelos pretos do primeiro ano se levanta e anda até Peter.

- Levín, quero que passe a levantar para Vanndersar também. Agora vão. - ele fala, com voz decidida.

Patriccia Vanndersar se adianta, mas eu coloco a mão boa no ombro dela.

- Não, Peter, ela não vai jogar no meu lugar. Estou bem.

- Escute aqui, Harper. - ele diz baixinho, só para mim. - Você é a capitã, e não a dona do time. Você está machucada. Acho bom que ainda queira jogar e ajudar suas companheiras, mas deixe que outras pessoas joguem também. Sente-se, eu vou conseguir algum gelo para você, senão irá inchar demais, a pancada foi forte.

Estou tão brava que quase esqueço a dor que atinge meu braço. Mas continuo com vontade de chorar, pelo meu pulso torcido e por ter abandonado um dos jogos mais importantes do ano.

Alguém surge com gelo para mim, mas o coloco na pele até a pessoa ir embora, então o deixo de lado e entrego a braçadeira de capitã a Megan, que fica surpresa com o gesto

O público parece estar interessado em saber o que aconteceu com a capitã do time da casa.

- Parece que nosso colégio ainda está vivo. Bellie Harper, com o pulso brutalmente torcido pelas sem-coração do West High, foi substituída por Patriccia Vanndersar. - esclarece Steve. - E acho muito, muito bom que Patriccia jogue tanto quanto Bellie. Ah, esquece. Vamos perder de qualquer jeito.

- Steve, já chega, vou te tirar daí. - a diretora finalmente fala.

- Não, senhora Mckingon, de novo não! Prometo me comportar agora.

- Quero só ver.

O set de desempate começa.

Patriccia espera o saque, pulando no lugar que deveria ser meu.


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