Um Crepúsculo Diferente escrita por Fash


Capítulo 10
Histórias de Terror




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Eu gostaria que você fosse feliz ao invés disso.

Pov. Bella

Corri para o banheiro tomei um banho, vesti um biquíni, peguei tudo, entrei na minha Ferrari e acelerei com tudo.

A loja Olympic Outfitters, dos Newton, ficava no norte da cidade. Eu tinha visto a loja, mas nunca parara ali – não tinha muita necessidade de equipamentos para ficar ao ar livre por um longo período de tempo. No estacionamento, reconheci o Suburban de Mike e o Sentra de Tyler.

Enquanto eu estacionava perto daqueles carros, pude ver o grupo parado na frente do Suburban. Eric estava lá, junto com outros dois meninos que eram da minha turma; eu me lembrava vagamente de que os nomes eram Ben e Conner. Jess estava ali, ladeada por Angela e Lauren. Outras três meninas estavam junto delas, inclusive uma que eu me lembrava de ter derrubado na educação física na quinta-feira. Essa me lançou um olhar de nojo quando eu saía do meu carro e cochichou alguma coisa com Lauren que sacudiu a cabeça de barba de milho e me olhou com desprezo.

Então este ia ser um dia daqueles.

Pelo menos Mike ficou feliz em me ver.

— Você veio! – gritou ele, contentíssimo. – E eu disse que hoje ia fazer sol, não disse? E você está linda. - ele completou me olhando de cima abaixo.

— Falei que viria – eu lembrei a ele.

— Só estamos esperando Lee e Samantha… A não ser que você tenha convidado alguém – acrescentou Mike.

— Não – eu digo sorrindo

Mike pareceu satisfeito.

— Quer ir no meu carro? É nele ou na minivan da mãe de Lee.

— Claro.

Ele sorriu de alegria. Era tão fácil deixar Mike feliz.

— Pode sentar na frente – prometeu ele. Escondi meu pesar. Não era tão simples assim fazer Mike e Jessica felizes ao mesmo tempo. Eu podia ver Jessica se aproximando de nós carrancuda.

Mas os números estavam ao meu favor. Lee trouxe mais duas pessoas e de repente cada espaço no carro era necessário. Consegui espremer Jessica entre Mike e eu no banco da frente do Suburban. Mike pode ter ficado menos alegre com isso, mas pelo menos Jessica parecia satisfeita.

Eram só 24 quilômetros de Forks a La Push, com as florestas verdes, densas e lindas margeando a estrada na maior parte do caminho e o largo rio Quillayute serpenteando embaixo. Fiquei feliz por me sentar junto à janela. Baixamos os vidros – o Suburban era meio claustrofóbico com nove pessoas lá dentro – e tentei absorver o máximo de sol que pude.

Eu já estive muitas vezes nas praias de La Push durante meus poucos verões com Jonathas.Mas ainda era de tirar o fôlego. A água era verde-escura, mesmo ao sol, com cristas brancas, e quebrava na praia cinzenta e rochosa. As ilhas surgiam das águas com escarpas empinadas, alcançando cumes desiguais, e coroadas por abertos austeros e elevados. A praia só tinha uma lasca de areia na beira da água; depois disso se alargava em milhões de pedras grandes e lisas que pareciam uniformemente cinzentas à distância, mas de perto tinham todos os tons que uma pedra deveria ter: terracota, verde-marinho, lavanda, cinza-azulada, dourado fosco. A linha da maré era tomada de enormes troncos trazidos pelo mar, embranquecidos pelas ondas salgadas, feito ossos, alguns em pilhas na beira da floresta, outros deitados solitários, fora do alcance das ondas.

Havia um vento fresco vindo das ondas, frio e salgado. Pelicanos flutuavam na sondas enquanto gaivotas e uma águia solitária rodavam acima deles. As nuvens ainda circundavam o céu, ameaçando invadir a qualquer momento, mas por enquanto o sol brilhava corajosamente em seu halo de céu azul.

Pegamos o caminho para a praia. Mike na frente, até um anel de troncos que obviamente tinha sido usados para festas como a nossa. Já havia um círculo de fogueira no lugar, cheio de cinzas escuras. Eric e o menino que pensei se chamar Ben juntaram galhos quebrados das pilhas mais secas junto à floresta, e logo havia uma construção no formado de uma tenda indígena no alto do carvão antigo.

— Já viu uma fogueira de madeira de praia? – perguntou-me Mike. Eu estava sentada em um dos galhos cor de osso; as outras meninas se agruparam, fofocando animadas, do outro lado. Mike se ajoelhou junto à fogueira, acendendo um dos gravetos menores com um isqueiro.

— Não – eu disse enquanto ele colocava o graveto aceso cuidadosamente na tenda.

— Então vai gostar dessa… Olhe só as cores. – Ele acendeu outro galho e o colocou junto ao primeiro. As chamas começaram a lamber rapidamente a madeira seca.

— É azul – eu disse surpresa.

— É por causa do sal. É lindo, né? – Ele acendeu mais um galho, colocado onde a fogueira não tinha pegado, e depois veio se sentar do meu lado. Felizmente, Jess estava do outro lado de Mike. Ela se virou para ele e reivindicou sua atenção. Fiquei olhando as estranhas chamas azuis e verdes estalarem para o céu.

Depois de meia hora de bate-papo, alguns meninos queriam andar até as piscinas da maré baixa próximas. Foi um dilema. Por um lado, eu adorava aquelas piscinas de maré. Elas me fascinavam desde que era criança; era uma das poucas coisas que queria ver quando tinha que vir para Forks. Por outro lado, eu também já caí muito nelas. Não é grande coisa quando se tem 7 anos e você está com seu pai. Isso me lembrou do pedido de Edward – de que eu não caísse no mar.

Foi Lauren quem decidiu por mim. Ela não queria fazer caminhada nenhuma e estava com os sapatos errados para isso. A maioria das outras meninas ao lado de Angela e Jessica também decidiu ficar na praia. Esperei até que Tyler e Eric decidissem continuar com elas antes de me levantar rapidamente para me juntar ao grupo pró-caminhada. Mike me abriu um sorriso enorme quando viu que eu ia com eles.

A caminhada não era muito longa, embora eu odiasse perder o céu no bosque. Estranhamente, a luz verde da floresta não combinava com o riso adolescente, era obscura e agourenta demais para se harmonizar com as brincadeiras leves em volta de mim.

Por fim atravessei os confins esmeralda da floresta e reencontrei a praia rochosa. A maré estava baixa, e um rio de maré passava por nós a caminho do mar.

Tive o máximo de cuidado para não me inclinar demais na beira das piscinas marinhas. Os outros não tinham medo, pulando nas pedras, empoleirando-se precariamente na beira. Achei uma pedra que parecia muito instável na margem de uma das maiores piscinas e me sentei ali com cautela, fascinada com o aquário natural abaixo de mim. Os buquês de anêmonas de cores vivas ondulavam sem parar na correnteza invisível, conchas retorcidas corriam pelas margens, escondendo os caranguejos dentro delas, estrelas-do-mar prendiam-se imóveis nas rochas e em outras estrelas, enquanto uma pequena enguia preta de listras brancas ondulava pelas algas verde-claras, esperando pelo retorno do mar.

Por fim os meninos ficaram com fome e eu me levantei rígida, para segui-los de volta. Quando voltamos para primeira praia, o grupo que deixamos tinha se multiplicado. À medida que nos aproximávamos, pude ver o cabelo preto liso e reluzente e a pele acobreada dos adolescentes recém-chegados da reserva que apareceram para fazer uma social. A comida já estava sendo distribuída, e os meninos correram para reivindicar uma parte enquanto Eric nos apresentava à medida que cada um de nós entrava na roda da fogueira.

Angela e eu fomos às últimas a chegar e, enquanto Eric dizia nossos nomes, vi um menino mais novo sentado nas pedras perto da fogueira, olhando para mim com interesse. Senti ao lado de Angela, e Mike nos trouxe sanduíches e uma seleção de refrigerantes para que escolhêssemos, enquanto um menino que parecia ser o mais velho dos visitantes tagarelava o nome dos outros sete que estavam com ele. Só o que captei foi que uma das meninas também se chamava Jessica, e o menino que notou minha presença se chamava Jacob.

Foi relaxante ficar sentada ali com Angela; era o tipo de pessoa sossegada – não sentia necessidade de preencher cada silêncio com tagarelice. Me deixava livre para pensar enquanto comíamos, sem ser perturbada. E eu estava pensando em como o tempo parecia fluir de forma desconexa em Forks, às vezes pensando indiscretamente, com cada imagem se destacando de forma mais clara do que outras. E depois, em outras ocasiões, cada segundo era significativo, grudado em minha mente. Eu sabia exatamente o que provocava a diferença e isso me perturbava.

Durante o almoço as nuvens começavam a avançar furtivamente pelo céu azul, disparando por um momento na frente do sol. Enquanto terminavam de comer, as pessoas começaram a se afastar em grupos de dois ou três. Algumas desceram para a beira da praia, tentando jogar pedras pela superfície agitada. Outras se reuniram numa segunda expedição às piscinas da maré baixa. Mike – com Jessica como uma sombra – seguiu para uma das lojas do vilarejo. Algumas crianças do lugar se espalharam, fiquei sentada sozinha em meu tronco na praia, com Lauren e Tyler se ocupando de um CD player que alguém pensara em trazer, e três adolescentes da reserva empoleirados em volta da roda, inclusive o menino chamado Jacob e o mais velho que tinha agido como porta-voz.

Alguns minutos depois de Angela sair com os andarilhos, Jacob veio sentar-se ao meu lado. Parecia ter 14 anos, talvez 15, e tinha cabelos pretos brilhantes e compridos, presos com elástico num rabo-de-cavalo na nuca. Sua pele era linda, sedosa e castanho-avermelhada; os olhos eram escuros e fundos sobre as maçãs altas do rosto. Ele ainda tinha um arredondamento infantil no queixo. Um rosto muito bonito ao todo. Mas minha opinião indiscutível sobre sua aparência foi prejudicada pelas primeiras palavras que saíram de sua boca.

— Você é Isabella Switt não é?

Foi como se o primeiro dia de aula estivesse se repetindo.

— Bella – suspirei.

— Meu nome é Jacob Black. – Ele estendeu a mão num gesto de amizade.

— Ah – eu disse, aliviada, apertando sua mão macia. – Você é filho do Billy. Eu devia me lembrar de você.

— Não, eu sou o mais novo da família… Você só se lembra de minhas irmãs mais velhas.

— Rachel e Rebecca – lembrei-me de repente.

— Elas estão aqui? – Examinei as meninas na beira do mar, perguntando-me se as reconheceria agora.

— Não. – Jacob sacudiu a cabeça. – Rachel ganhou uma bolsa de estudos para um colégio interno em Washington, e Rebecca se casou com um surfista samoano… Agora mora no Havaí.

— Casada. Caramba. – Eu estava pasma. As gêmeas só eram um pouco mais velhas do que eu.

Ele me contou que adorava monta carros.

— Então você monta carros? – perguntei, impressionada.

— Quando tenho tempo, e se tiver peças. Por acaso você não sabe onde posso conseguir um cilindro mestre de um Volkswagen Rabbit 1986? – perguntou ele de brincadeira. Ele tinha uma voz rouca e agradável.

— Não, desculpe – eu ri. – Não vi nenhum ultimamente, mas vou ficar de olho para você.

Ele abriu um sorriso brilhante, olhando para mim de um jeito que aprendi a reconhecer, avaliando-me. E eu não fui a única a perceber.

— Conhece a Bella, Jacob? – perguntou Lauren, no que concluí ser um tom insolente, do outro lado da fogueira.

— A gente se conhece praticamente desde que eu nasci – ele riu, sorrindo para mim de novo.

— Que legal.

Ela não parecia achar que era legal, e seus olhos claros e impertinentes se estreitaram.

— Bella – disse ela novamente, olhando atentamente meu rosto –, eu estava dizendo ao Tyler que é uma pena que nenhum dos Cullen tenha vindo aqui hoje. Ninguém pensou em convidá-los? – Sua expressão de preocupação não era nada convincente.

— Quer dizer a família do Dr. Carlisle Cullen? – perguntou o menino mais velho antes que eu pudesse responder, para irritação de Lauren. Ele estava mais para um homem do que um menino e sua voz era muito grave.

— É você conhece? – perguntou ela de um jeito condescendente, virando-se um pouco para ele.

— Os Cullen não vem aqui – disse ele num tom de voz que encerrava o assunto, ignorando a pergunta.

Tyler, tentando recuperar a atenção de Lauren, pediu a opinião dela sobre um CD que ele segurava. Ela estava distraída. Olhei o menino de voz grave, surpresa, mas ele estava olhando para a floresta escura atrás de nós. Ele disse que os Cullen não vinham aqui, mas o tom de voz implicava mais alguma coisa que eles não tinham permissão para isso; eram proibidos de vir. Suas maneiras deixaram uma estranha impressão em mim e tentei ignorá-las, sem sucesso.

Jacob interrompeu minhas reflexões.

— Então, Forks ainda não pirou você?

— Ah, eu diria que este é um jeito suave de dizer a verdade. – Eu fiz uma careta. Ele também sorriu de um modo afetado, compreendendo tudo.

Eu ainda estava perturbada por causa do breve comentário sobre os Cullen, será que Jacob sabe, bom eu vou ver agora.

— Quer ir até a praia comigo? – perguntei sorrindo sedutoramente.

Num salto Jacob se colocou de pé, cheio de disposição.

Enquanto seguíamos para o norte pelas pedras multicoloridas até o quebra-mar de troncos, as nuvens finalmente cerraram fileira no céu, escurecendo o mar e fazendo a temperatura cair. Enfiei as mãos nos bolsos do casaco.

— E aí, você, o quê, uns 17 anos? – perguntei. Homens sempre gostam de parecer mais velho.

— Acabei de fazer 15 – confessou ele, lisonjeado.

— É mesmo? – Minha cara estava cheia de uma falsa surpresa. – Eu achava que você era mais velho.

— Sou alto para a minha idade – explicou ele.

— Você sabe contar uma história – eu o elogiei, ainda olhando as ondas.

— É muito louco, não é? Não surpreende que meu pai não queira que a gente fale sobre isso com ninguém.

Não consegui controlar minha expressão o suficiente para olhar para ele.

— Não se preocupe, não vou falar nada.

— Acho que acabo de violar o trato – ele riu.

— Vou levar isso para o túmulo – prometi, e depois estremeci.

— Mas, sério, não conte nada ao Jonathas. Ele ficou muito chateado com meu pai quando soube que alguns de nós deixaram de ir ao hospital desde que o Dr. Cullen começou a trabalhar lá.

— Não vou, claro que não.

— Então, acha que somos um bando de nativos superticiosos ou o quê? – perguntou num tom de brincadeira, mas com um toque de preocupação. Eu não havia tirado os olhos do mar.

Eu me virei e sorri para ele com a maior naturalidade que pude.

— Não. Acho que você conta histórias de terror muito bem. Ainda estou arrepiada, está vendo? – Ergui o braço.

— Legal. – Ele sorriu.

E depois o som de pedras se chocando da praia nos alertou de que alguém se aproximava. Nossas cabeças se viraram ao mesmo tempo e vimos Mike e Jessica a uns cinqüenta metros de distância, andando na nossa direção.

— Aí está você, Bella – gritou Mike aliviado, acenando o braço acima da cabeça.

— Esse é seu namorado? – perguntou Jacob, alertado pela pontada de ciúme na voz de Mike. Fiquei surpresa por ter sido tão óbvio.

— Não, claro que não – sussurrei. Eu estava tremendamente grata a Jacob e ansiosa para que ele ficasse o mais feliz possível. Pisquei para ele, desviando-me cuidadosamente de Mike ao fazer isso. Ele sorriu, orgulhoso de minha paquera.

— E aí, quando eu conseguir minha carteira… – começou ele.

— Deve me procurar em Forks. A gente pode sair um dia desses. – Eu me senti culpada ao dizer isso, sabendo que o havia usado. Mas na verdade eu gostava de Jacob. Ele era alguém de quem eu podia ser amiga.

Mike nos alcançou, e Jessica ainda estava alguns passos atrás. Pude ver os olhos dele avaliando Jacob, e ele parecia satisfeito com sua evidente juventude.

— Aonde você foi? – perguntou Mike, embora a respostas estivesse bem diante dele.

— Jacob estava me contando algumas histórias do lugar – eu me antecipei. – Foi bem interessante.

Sorri calorosamente para Jacob e ele retribuiu o sorriso.

— Bom – Mike fez uma pausa, reavaliando com cuidado a situação enquanto observava nossa camaradagem. – Estamos indo embora… – Parece que vai chover logo.

Todos olharam aborrecidos para o céu. Certamente parecia chuvoso.

— Tudo bem. – Eu me levantei. – Estou indo.

— Foi bom ver você de novo – disse Jacob, e eu sabia que ele estava sacaneando um pouco o Mike.

— Foi mesmo. Da próxima vez que Jonathas vier ver o Billy, eu também venho – prometi. Ele sorriu de orelha a orelha.

— Isso seria legal.

— E obrigada – acrescentei com seriedade.

Algumas gotas começavam a cair, criando manchas escuras nas pedras em que pousavam. Quando chegamos ao Suburban, os outros já estavam guardando tudo nos carros. Eu me arrastei para o banco traseiro ao lado de Angela e Tyler, anunciando que já tinha decidido não sentar na frente. Angela ficou olhando pela janela a tempestade que se formava, e Lauren se contorcia ao meio do banco para ocupar a atenção de Tyler, então eu podia simplesmente recostar a cabeça, fechar os olhos e me esforçar muito para não pensar.

Eu disse a Jonathas que tinha muito dever de casa para fazer e que não ia querer comer nada. Havia um jogo de basquete que o estava empolgando, embora, é claro, eu não fizesse a mínima idéia de que existia de especial nisso, então ele não percebeu nada incomum no meu rosto ou na minha voz.

No meu quarto, tranquei a porta. Peguei meu ipod me deitei e comecei a escutar as musicas. Para não pensar em nada. Fechei os olhos, mas a luz ainda os invadia, então coloquei um travesseiro na cara.

Eu me concentrei com muito cuidado na música, tentando entender a letra, desvendar o padrão complicado da bateria. Já estava escutando a terceira vez eu sabia pelo menos toda a letra dos refrões. Fiquei surpresa em descobrir que eu afinal de contas gostava da banda, depois de conseguir passar pelo barulho ensurdecedor.

E deu certo; graças à batida de rachar, foi impossível pensar – e era este o propósito do exercício. Ouvi a musica repetidas vezes, até que estava cantando todas as músicas e até que, finalmente, dormi.

Sonho on

Abri os olhos para um lugar familiar. Percebia em algum canto de minha consciência que estava sonhando, reconheci a luz verde da floresta. Eu podia ouvir as ondas quebrando nas pedras em alguma lugar por perto. Sabia que, se achasse o mar, poderia ver o sol. Tentava seguir o som, mas então Jacob Black estava ali, dando puxões na minha cabeça, arrastando-me para a parte mais escura da floresta.

— Jacob? Qual é o problema? – perguntei. O rosto dele estava assustado enquanto ele me puxava com toda a força e eu resistia. Eu não queria ir para a escuridão.

— Corre, Bella, você tem que correr! – sussurrou ele, apavorado.

— Por aqui, Bella! – Reconheci a voz de Mike gritando do meio sombrio das árvores, mas não conseguia vê-lo.

— Por que – perguntei ainda tentando me libertar de Jacob, desesperada para encontrar o sol.

Mas Jacob soltou minha mão e gritou, tremendo de repente, caindo no chão escuro da floresta. Ele se contorceu no chão enquanto eu olhava com pavor.

— Jacob? – gritei. Mas ele se fora. No lugar dele havia um lobo grande e castanho-avermelhado de olhos negros. O lobo desviou os olhos de mim, apontando o focinho para a praia, o pêlo eriçado nos ombros, emitindo grunhidos baixos por entre as presas à mostra.

— Corre Bella! – gritou Mike novamente de trás de mim. Mas não me virei. Estava vendo uma luz que vinha da praia na minha direção.

E depois Edward saiu das árvores, a pele brilhando um pouco, os olhos escuros e perigosos. Ergueu uma das mãos e acenou para que eu fosse com ele. O lobo grunhiu a meus pés. Dei um passo à frente, para Edward. Ele sorriu e seus dentes eram afiados e pontudos.

— Confie em mim – sussurrou ele. Dei outro passo.O lobo se atirou no espaço entre mim e o vampiro, as presas mirando a jugular dele.

— Não! – gritei, erguendo-me estabanada da cama.

Sonho off

Devia a meu movimento súbito, puxei os fones e coloquei meu ipod no chão.

— Você vai muito a Forks? – perguntei meio cínica, como se esperasse por um sim.

— Não muito – admitiu-o com a testa franzida. – Mas quando terminar meu carro posso ir lá sempre que você quiser… Depois que tiver minha carteira – emendou-se ele.

— Quem era o outro menino com quem Lauren estava conversando? Ele parecia meio velho para sair com a gente. – Eu fiquei com os mais novos intencionalmente, tentando deixar claro que preferia Jacob.

— É o Sam… Ele tem 19 – informou-me ele.

— O que é que ele estava dizendo sobre a família do médico? – perguntei inocentemente.

— Os Cullen? Ah, eles não podem vir à reserva. – Ele desviou os olhos, para a ilha James, enquanto confirmava o que eu pensava ter ouvido na voz de Sam.

— E por que não?

Ele olhou novamente para mim, mordendo o lábio.

— Epa. Não posso falar nada sobre isso.

— Ah, eu não vou contar a ninguém, é só curiosidade minha. –Continuei com meu sorriso sedutor.

Ele também sorriu, parecendo fascinado. Depois ergueu uma sobrancelha e sua voz ficou ainda mais rouca do que antes.

— Gosta de histórias de terror? – perguntou ele de modo agourento.

— Adoro – eu me entusiasmei, fazendo esforço para reprimir meus sentimentos.

Jacob andou até um tronco caído ali perto, com raízes que se projetavam para fora como as pernas enfraquecidas de uma aranha enorme e branca. Ele se empoleirou de leve em uma das raízes retorcidas enquanto eu me sentava abaixo dele no tronco. Ele olhou para as pedras, um sorriso pairando nas extremidades dos lábios grossos. Eu podia ver que ele ia tentar dar o máximo de si. Concentrei-me em manter o interesse que senti emanar de meus olhos.

— Conhece alguma de nossas histórias antigas, sobre de onde viemos… quer dizer, dos quileutes? – começou ele.

— Na verdade não – admiti.

— Bom, são um monte de lendas, e dizem que algumas datam da grande inundação… Ao que parecem, os antigos quileutes amarraram as canoas no topo das árvores mais altas da montanha para sobreviver como Noé e a arca. – Ele sorriu, para me mostrar como dava pouco crédito a essas histórias. – Outra lenda diz que descendemos de lobos… E que os lobos ainda são nossos irmãos. É contra a lei da tribo matá-los. E há as histórias sobre os frios. – A voz dele ficou um pouco mais baixa.

— Os frios? – perguntei, agora sem fingir estar intrigada.

— É. Há histórias dos frios tão antigas quanto as lendas dos lobos, e algumas são mais recentes. De acordo com a lenda, meu bisavô conheceu alguns. Foi ele quem fez o acordo que os manteve longe de nossas terras. – Ele revirou os olhos.

— Seu bisavô? – eu o estimulei.

— Ele era um ancião da tribo, como meu pai. Olhe só, os frios são inimigos naturais do lobo… Bom, não do lobo, mas dos lobos que se transformam em homens, como nossos ancestrais. Você pode chamar de lobisomens.

— Os lobisomens tem inimigos?

— Só um.

Olhei para ele com seriedade, esperando disfarçar minha impaciência como admiração.

— Então veja você – continuou Jacob –, por tradição, os frios são nossos inimigos. Mas aquele bando que veio para o nosso território na época do meu bisavô era diferente. Eles não machucavam as pessoas como os outros da espécie deles faziam… Não deviam ser perigosos para a tribo. Então meu bisavô fez um trégua com eles. Se eles prometessem ficar longe de nossas terras, nós não os revelaríamos aos caras-pálidas. – Ele deu uma piscadela para mim.

— Se eles não eram perigosos, então por quê…? – Tentei entender, lutando para que ele não visse como eu estava levando a sério essa história de fantasma.

— Sempre há um risco para os seres humanos que ficam perto dos frios, mesmo que eles sejam civilizados, como este clã. Nunca se sabe quando podem ficar famintos demais para resistir. – Ele deliberadamente assumiu um tom de ameaça.

— Como assim, "civilizados"?

— Diziam que eles não machucavam seres humanos. Supostamente, de algum modo, conseguiam caçar só animais.

Minha voz despreocupada.

— E o que é que isso tem a ver com os Cullen? Eles são iguais aos frios que seu bisavô conheceu?

— Não. – Ele fez uma pausa dramática. – Eles são os mesmos.

Ele deve ter pensado que a expressão de medo no meu rosto era inspirada por sua história. Jacob sorriu, satisfeito, e continuou.

— Agora há mais deles, têm uma fêmea nova e um macho novo, mas os outros são os mesmos. Na época do meu bisavô, já conheciam o líder,Carlisle. Ele esteve aqui e se foi antes que o seu povo tivesse chegado. – Ele reprimia um sorriso.

— E o que eles são? – perguntei por fim. – O que são os frios?

Ele sorriu de um jeito sombrio.

— Bebedores de sangue – respondeu ele numa voz de dar calafrios. – O seu povo os chama de vampiros.

Olhei a arrebentação eriçada depois que eles respondeu, sem ter certeza do que minha expressão demonstrava.

— Você está arrepiada – ele riu, satisfeito.

Minha luz ainda estava acesa e eu estava sentada ainda com o biquíni.Olhei, desorientada, o relógio na cômoda. Eram cinco e meia da manhã.

Gemi, caí de costas e me virei de bruços.

Mas estava desconfortável demais para conseguir dormir. Rolei na cama e desabotoei o jeans. Puxei o travesseiro para cima dos olhos.

É claro que foi inútil. Meu subconsciente procurava exatamente as imagens que eu tentava evitar com tanto desespero. Teria que encará-las agora.

Eu me sentei e minha cabeça girou por um minuto enquanto o sangue fluía para baixo. Vamos começar pelo início, pensei comigo mesma, feliz por poder adiar tudo pelo tempo que fosse possível.

Fui tomar banho, fiz minha higiene, sequei meu cabelo. Sai só de toalha.Peguei um pijama.

Liguei meu notebook, mas eu estava com fome, desci pra a cozinha. E não tinha ninguém.

Peguei o cereal, leite e uma tigela, coloquei dentro comi, lavei e guardei. Subi lentamente para o meu quarto. Acho que eu estava com medo de aquilo ser verdade.

Por fim entrei na minha ferramenta de busca preferida. E digitei uma palavra.

Vampiro.

Quando os resultados apareceram, havia muita coisa para ver tudo, de filmes a programas de TV a RPG, underground metal e empresas de cosméticos góticos.

E então encontrei um site promissor Vampiros de A-Z.Esperei impaciente que carregasse, clicando rapidamente para fechar cada propaganda que aparecia na tela. Por fim a tela estava concluída – um fundo branco simples com o texto em preto, de aparência acadêmica. Duas citações me receberam na home page:

Em todo o vasto mundo das sombras de fantasmas e demônios, não há figura tão terrível, nenhum personagem tão medonho e abominado, e no entanto transvertido de tal fascínio temeroso, como o vampiro, que não é nem fantasma nem demônio, mas participa da natureza das sombras e possui as qualidades misteriosas e terríveis de ambos. -Rev. Montague Summers.

Se há neste mundo um relato bem documentado é o dos vampiros. Nada falta ali: relatórios oficiais, atestados de pessoas reputadas, de médicos, de padres, de magistrados; a prova judicial é a mais completa. E com tudo isso, quem há que acredite em vampiros? -Rousseau

O resto do site era uma lista em ordem alfabética de todos os diferentes mitos de vampiros que existem em todo o mundo. O primeiro em que cliquei, o Danag, era um vampiro filipino supostamente responsável pelo cultivo de inhame nas ilhas há muito tempo. Dizia o mito que o Danag trabalhou com seres humanos por muitos anos, mas um dia a parceria terminou, quando uma mulher cortou o dedo e um Danag chupou a ferida, desfrutando tanto do sabor que drenou totalmente o sangue de seu corpo. Li atentamente as descrições, procurando por alguma coisa que parecesse familiar, sem mencionar plausível. Parecia que a maioria dos mitos de vampiros tinha mulheres bonitas como demônios e crianças como vítimas; também pareciam criados para explicar o alto índice de mortalidade de crianças novas e dar aos homens uma desculpa para a infidelidade. Muitas histórias envolviam espíritos incorpóreos e alertas contra enterros inadequados. Não havia muito que se parecesse com os filmes que eu vira, e só alguns, como o Estrie hebraico e o Upier polonês, ainda se preocupavam em beber sangue.

Só três entradas realmente prendem minha atenção: o romeno Veracolaci, um morto-vivo poderoso que podia aparecer como um ser humano bonito de pele clara; o eslovaco Nelapsi, uma criatura tão forte e tão rápida que podia massacrar uma aldeia inteira na primeira hora depois da meia-noite; e outro, chamado Stregoni benefici. Sobre este último, só havia uma frase curta.

Strangoni benefici: vampiro italiano que diz-se estar do lado do bem e é inimigo mortal de todos os vampiros do mal.

Foi um alívio que nesta pequena entrada, existissem centenas de mitos, um que afirmava a existência de vampiros do bem. Entretanto, no geral, pouco havia que coincidisse com as histórias de Jacob ou minhas próprias observações. Fiz um pequeno catálogo em minha mente enquanto lia e o comparei cuidadosamente com cada mito. Velocidade, força, beleza, pele clara, olhos que mudam de cor; e depois os critérios de Jacob: bebedores de sangue, inimigos do lobisomem, pele fria, e imortal. Havia poucos mitos que combinassem ao menos com um dos fatores.

E depois outro problema, uma questão de que eu me lembrava do pequeno número de filmes de terror que vira e era sustentada pela leitura de hoje – os vampiros não podia sair à luz do dia, o sol os queimava até que virassem cinzas. Eles dormiam em caixões o dia todo e só saíam à noite.

Exagerada fechei com força a tela do notebook. Em minha irritação, senti um constrangimento dominador. Era tudo tão idiota. Eu estava sentada no meu quarto, pesquisando vampiros. O que havia de errado comigo? Conclui que metade de culpa cabia à cidade de Forks – aliás, a toda a encharcada península de Olympic.

Precisava sair de casa, mas não havia aonde eu quisesse ir que não envolvesse uma viagem de três dias. Calcei as botas assim mesmo, sem ter certeza de para onde ir, e desci o primeiro andar. Vesti a capa de chuva sem olhar o tempo e disparei porta afora.

Estava nublado, mas ainda não chovia. Ignorei meu carro e parti para o leste a pé, atravessando na diagonal o jardim de Charlie em direção à floresta que invadia o terreno continuamente. Pouco tempo depois eu havia avançado bastante, a casa e a rua estavam invisíveis e os únicos sons eram o esmagar da terra molhada debaixo de meus pés e o grito súbito dos gaios.

Havia ali uma trilha estreita que levava para o interior da floresta, meu senso de orientação era ótimo. A trilha entrava cada vez mais fundo na floresta, principalmente para o leste, pelo que eu podia perceber. Serpenteava pelos espruces e as cicutas, os teixos e bordos. Só conhecia vagamente os nomes das árvores em volta de mim, e tudo o que eu sabia se devia ao fato de Jonathas apontá-las da janela do carro na minha infância. Havia muitas que eu não conhecia e outras sobre as quais não podia ter certeza porque estavam cobertas demais de parasitas verdes.

Segui a trilha pelo tempo que a raiva que sentia por mim mesma me impeliu. Quando a raiva começou a amainar, diminuí o passo. Algumas gotas de água escorriam do dossel verde acima de mim, mas eu não podia ter certeza se estava começando a chover ou se eram simplesmente gotas que restaram de ontem, presas nas folhas no alto, caindo devagar na terra. Uma árvore recém-caída – eu sabia que era recente porque não estava totalmente atapetada de musgo – pousava no tronco de uma de suas irmãs, criando um pequeno banco abrigado e uma distância segura da trilha. Passei por cima das samambaias e me sentei com cuidado, assegurando-me de que meu casaco estivesse entre o assento molhado e minhas roupas onde quer que se tocassem, e encostei a cabeça na árvore viva.

Este era o lugar errado para ir. Eu devia saber disso, mas para onde mais iria? A floresta era de um verde imenso e parecida demais com a cena sonho da noite passada para que eu tivesse paz de espírito. Agora que não havia mais o som de meus passos ensopados, o silêncio era penetrante. As aves também estavam quietas, a freqüência das gotas aumentava, então devia estar chovendo no alto. Agora que eu estava sentada as samambaias eram mais altas que minha cabeça, e eu sabia que alguém podia andar pela trilha a um metro de distância, e não me ver.

Aqui, nas árvores, era muito mais fácil acreditar nos absurdos que me constrangiam entre quatro paredes. Nada mudara nesta floresta há milhares de anos e todos os mitos e lendas de cem terras diferentes pareciam muito mais prováveis neste névoa verde do que me meu quarto claro. Obriguei a mim mesma a me concentrar nas duas questões mais fundamentais que eu precisa responder, mas o fiz sem muita vontade. Primeira, eu tinha de decidir se era possível que o que Jacob dissera sobre os Cullen fosse verdade.

Minha mente reagiu imediatamente com uma negativa retumbante. Era tolice e morbidez acolher essas idéias ridículas. Mas o quê, então?, perguntei a mim mesma. Não havia explicação racional para eu estar viva neste momento. Relacionei novamente me minha cabeça as coisas que observei: a velocidade e a força impossíveis, a cor dos olhos mudando de preto para o dourado e voltando ao preto, a beleza inumana, a pele branca e gélida. E mais – coisinhas que entraram na minha cabeça aos poucos –, eles nunca pareciam comer, e havia a elegância perturbadora com que cada um deles se movimentava. E o modo como ele falava às vezes, com uma cadência desconhecida e expressões do século XXI. Ele tinha matado aula naquele dia em que fizemos tipagem sangüínea. Ele parecia saber o que todos por perto dele pensavam… A não ser eu. Ele me dissera que era o vilão, perigoso…

Será que os Cullen eram vampiros?

Bom, eles eram alguma coisa. Algo fora da possibilidade de justificativa racional acontecia diante de meus olhos incrédulos. Fossem os frios de Jacob ou minha teoria de super-herói, Edward Cullen não era… humano. Era algo mais. Então – talvez. Esta teria que ser minha resposta por enquanto. E havia a questão mais importante de todas. O que eu ia fazer se fosse verdade?

Se Edward fosse um vampiro eu mal conseguia me obrigar a pensar nas palavras então, o que eu deveria fazer? Definitivamente estava fora de cogitação envolver outra pessoa. Eu nem conseguia acreditar em mim mesma; qualquer um me internaria. Apenas duas opções pareciam práticas. A primeira era aceitar o conselho dele: ser inteligente e evitá-lo ao máximo. Cancelar nossos planos voltar a ignorá-lo da melhor maneira que eu pudesse. Fingir que havia um vidro grosso e impenetrável entre nós em uma aula onde éramos obrigados a sentar juntos. Dizer a ele para me deixar em paz – e falar sério desta vez.

Fui tomada por uma angústia repentina e desesperada ao considerar essa alternativa. Minha mente rejeitou a dor, pulando rapidamente para a opção seguinte.

Eu não podia fazer nada diferente. Afinal, se ele era uma coisa… sinistra, até agora não tinha feito nada para me machucar. Na verdade, eu seria um vestígio da pancada no pára-lama do cerro de Tyler se ele não tivesse agido com tanta rapidez. Tão rápido, argumentei comigo mesma, que podia ter sido por mero reflexo. Mas se foi um reflexo para salvar uma vida, como ele poderia ser mau, retruquei. Minha cabeça girava sem respostas.

Havia algo de que eu tenha certeza, se é que tinha certeza de alguma coisa. O Edward sombrio de meu sonho da noite passada era um reflexo do medo que senti pelo que Jacob havia dito, e não do próprio Edward. Mesmo assim, quando gritei de pavor com o ataque do lobisomem, não foi o medo do lobisomem que levou o grito "não" a meus lábios. Foi o medo de que ele fosse ferido – mesmo que ele tivesse me chamado com suas presas afiadas, eu temia por ele.

E eu sabia que havia uma resposta aí. Não sabia se havia uma alternativa. Eu já mergulhara fundo demais. Agora que eu sabia – se é que sabia –, nada podia fazer com meu segredo assustador. Porque, ao pensar nele, na voz dele, em seus olhos hipnóticos, na força magnética de sua personalidade, o que eu mais queria era estar com ele agora. Mesmo que… Mas eu não podia pensar nisso. Não aqui, sozinha na floresta que escurecia. Não enquanto a chuva a tornava sombria como um crepúsculo sob as árvores e tamborilava como passos no chão de terra emaranhado. Eu tremi e me levantei rapidamente de meu esconderijo.

Mas estava ali, segura e lúcida, sinuosa no labirinto verde gotejante. Eu a segui apressada, o capuz puxado para o rosto, surpreendendo-me, à medida que quase corria pelas árvores, como o ponto a que cheguei. Comecei a me perguntar se ia conseguir sair dali, ou se seguiria a trilha ainda mais para os confins da floresta. Mas antes que o pânico fosse demasiado, comecei a vislumbrar alguns espaços abertos pela teia de galhos. Depois pude ouvir um carro passando na rua, e eu estava livre, o gramado de Jonathas estendendo-se na minha frente, a casa me chamando, prometendo-me calor e meias secas.

Era quase meio-dia quando voltei para dentro. Fui para o segundo andar e me troquei.

Não precisei de muito esforço para me concentrar na tarefa do dia, um trabalho sobre MacBeth que devia entregar na quarta. Comecei a escrever um rascunho satisfeito, mais sereno do que me sentia desde… Bom, desde a tarde de quinta-feira, para ser franca.

Mas este sempre foi o meu jeito. Tomar decisões era a parte dolorosa para mim, a parte que me angustiava. Mas depois que a decisão era tomada, eu simplesmente seguia – em geral com alívio por ter decidido o que fazer. Às vezes o alívio era tingido de desespero, como minha resolução de vir para Forks. Mas ainda era melhor do que lutar com as alternativas. Era ridiculamente fácil conviver com esta decisão. Perigosamente fácil.

E assim o dia foi tranqüilo e produtivo – terminei o trabalho antes das oito. Jonathas chegou em casa com um bom resultado da pescaria.

Os arrepios que seguiam em minha espinha sempre que pensava nesta viagem não eram diferentes daqueles que senti antes de dar o passeio com Jacob Black. Deviam ser diferentes, pensei. Eu devia estar com medo – sabia que devia, mas não conseguia sentir esse tipo de medo.

Naquela noite, dormi um sono sem sonhos, exausta por ter começado o dia tão cedo depois de dormir tão mal na noite anterior. Acordei, pela segunda vez desde que cheguei a Forks, com a luz amarela de um dia de sol. Pulei para a janela, atordoada ao ver que quase não havia uma nuvem no céu e que aquelas que havia eram só floquinhos felpudos e brancos que não podiam trazer chuva nenhuma. Abri a janela – surpresa quando ela se moveu em silêncio, sem agarrar, pois não a abria há quem sabe quantos anos – e respirei o ar relativamente seco. Estava quase quente e praticamente não ventava. Meu sangue se eletrizou nas veias.

Tomei um banho, sequei meu cabelo e vesti uma roupa.

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Quando desci, Clara, Daniel e Jonathas estavam terminando o café-da-manhã quando eu desci eles perceberam meu estado de espírito de imediato. Mas só Jonathas comentou.

— Está um lindo dia – comentou.

— É – concordei com um sorriso.

Ele também sorriu os olhos enrugando-se nos cantos. Quando Jonathas sorria, era mais fácil entender por que ele e minha mãe tinham decidido se casar tão rapidamente. A maior parte do romantismo da juventude dele naquela época desaparecera antes que eu o conhecesse, à medida que seu cabelo castanho e ondulado, aos poucos revelando cada vez mais a pele brilhante da testa. Mas quando ele sorria, eu podia ver um pouco do homem que fugira com Laura quando ela era só dois anos mais velha do que eu.

Tomei meu café-da-manhã animada, vendo a poeira se agitar na luz do sol que jorrava pela janela dos fundos. Jonathas gritou um até logo e ouvi o carro saindo.

Fui pra garagem, Clara entrou no lado do carona e eu entrei e comecei a dirigir.

— Que se sentar comigo Bella?

— Não precisa Clarinha. - eu disse, usando o apelido que eu chamava ela quando tinha 5 anos.

Formos umas das primeiras a chegar na escola, tem bancos de piquenique quase sem uso no lado sul do refeitório. Os bancos ainda estavam meio molhados. Peguei um casaco que estava dentro do carro e então eu me sentei em cima dela, feliz por encontrar utilidade para ela. Meu dever de casa estava pronto – o produto de uma vida social pachorrenta, mas havia alguns problemas de trigonometria, que eu não tinha resolvido. Abri o livro com vontade, mas na metade da revisão do primeiro problema fiquei devaneando, vendo o sol brilhar nas árvores de casca vermelha.

Rabisquei desatenta nas margens de meu dever de casa. Depois de alguns minutos, de repente percebi que tinha desenhado cinco pares de olhos escuros me encarando da página. Passei a borracha neles.

— Bella! – ouvi alguém gritar, e parecia Mike. Olhei em volta e percebi que a escola tinha se povoado enquanto eu estava sentada ali, distraída.Mike vinha na minha direção de short cáqui e uma camiseta de rúgbi rasgada, acenando.

— Oi, Mike – respondi, acenando também, incapaz de ser indiferente numa manhã dessas.

Ele veio se sentar ao meu lado, o cabelo meticulosamente arrepiado brilhando dourado na luz, o sorriso se espalhando pelo rosto. Estava tão contente em me ver, que não consegui deixar de ficar satisfeita.

— Você está maravilhosa. - ele disse sorrindo

— Obrigada Mike. - eu disse sorrindo

— Eu não havia notado…Seus olhos são meio dourado. - ele disse admirado.

— Só no sol. - eu disse

Fiquei pouco à vontade enquanto ele colocava a mecha atrás da minha orelha.

— Um ótimo dia, né?

— Do jeito que eu gosto – concordei.

— O que você fez ontem? – O tom de voz dele era um tanto possessivo.

— Trabalhei no dever sobre MacBeth, principalmente. – Não acrescentei que tinha concluído não precisava parecer presunçosa.

Ele bateu a mão na testa.

— Ah, é… É para quinta, não é?

— Hmmm, para quarta, eu acho.

— Quarta? – Ele franziu o cenho. – Isso não é bom… O que está escrevendo no seu?

— Se o tratamento de Shakespeare das personagens femininas é misógino.

Ele me olhou como se eu tivesse acabado de falar em um latim

— Acho que vou ter que trabalhar nisso hoje à noite – disse ele, murcho. – Eu ia convidar você para sair.

— Ah. – Fui apanhada de guarda baixa. Por que eu não podia ter uma conversa agradável com Mike sem que ficasse estranho?

— Bom, a gente podia sair para jantar ou coisa assim… E eu podia fazer o trabalho depois. – Ele sorriu para mim, cheio de esperança.

— Mike… - Ótimo agora eu preciso ser verdadeira. – Não acho que seria uma boa idéia.

Ele ficou com a cara no chão.

— Por quê? – perguntou os olhos na defensiva. Meus pensamentos vacilara para Edward, perguntando-me se era o que Mike também estava pensando.

— É que eu acho… e, se um dia contar a alguém o que vou dizer agora, eu mato você com todo o prazer – ameacei –, mas acho que isso ia magoar Jessica.

Ele ficou confuso, obviamente sem ter pensado neste sentido.

— Jessica?

— Francamente, Mike, você é cego?Ele gosta de você.

— Homens. - essa parte eu sussurei só pra mim.

— Ah – ele suspirou, claramente confuso. Tirei proveito disso para conseguir fugir.

— Está na hora da aula e não posso me atrasar de novo. – Peguei meus livros e os enfiei na bolsa.

Andamos em silêncio para o prédio três e ele tinha uma expressão desligada. Eu esperava que os pensamentos em que estivesse imerso o levassem na direção correta.

Quando vi Jessica na aula de trigonometria, ela estava borbulhando de entusiasmo. Ela, Angela e Lauren iam a Port Angeles à noite para comprar roupas para o baile, e ela queria que eu fosse também, embora eu não precisasse de roupa nenhuma.Fiquei indecisa. Seria legal sair da cidade com umas amigas, mas Lauren estaria lá. E quem sabia o que eu podia estar fazendo à noite… Mas esse era definitivamente o caminho errado para deixar que minha mente vagasse. É claro que eu estava feliz com a luz do sol. Mas isso não era totalmente responsável pelo estado de espírito eufórico que eu sentia, nem chegava perto.

Então lhe respondi com um talvez, dizendo-lhe que eu teria que falar com Jonathas.

Ela só falava no baile a caminho da aula de espanhol continuando como se não tivesse interrompido quando a aula finalmente terminou e nós fomos almoçar. Eu estava perdida demais em meu frenesi de expectativa para perceber a maior parte do que ela dizia. Fiquei dolorosamente ansiosa para ver não só ele, mas todos os Cullen – para compará-los com as novas suspeitas que infestavam minha mente. Assim que passei pela soleira da porta do refeitório senti a primeira verdadeira pontada de medo descer por minha espinha e acomodar-se em meu estômago. Será que eles conseguiriam saber o que eu estava pensando? E depois uma sensação diferente me sacudiu – será que Edward estaria esperando para se sentar comigo de novo?

Como era minha rotina, olhei primeiro para a mesa dos Cullen. Um tremor de pânico atingiu meu estômago quando percebi que estava vazia. Será que eles são mesmo vampiros?Mas vampiros não existem.

Caminhei com firmeza ao lado de Jessica, sem me dar ao trabalho de fingir que ainda a ouvia.

Estávamos atrasadas o bastante para que todos já estivessem em nossa mesa. Evitei a cadeira vazia ao lado de Mike e fui para outra perto de Angela. Percebi vagamente que Mike afastou a cadeira educadamente para Jessica e que a cara dela se iluminou com isso.

Angela fez algumas perguntas em voz baixa sobre o trabalho de MacBeth, que respondi com a maior naturalidade possível enquanto caía numa espiral de infelicidade. Ela também me convidou para ir com elas esta noite e então eu concordei, prendendo-me a qualquer coisa que pudesse me distrair.

O resto do dia se passou lenta e melancolicamente. Na educação física, tivemos uma aula sobre as regras do badminton,ficamos ouvindo em vez de jogar.

Fiquei feliz por sair do campus, assim eu estaria livre para fazer meus beicinhos e me lamentar antes de sair à noite com Jessica e companhia. Mas logo depois de entrar pela porta da casa de Jonathas, meu celular tocou.Jessica ligou para cancelar nossos planos. Tentei ficar feliz com o fato de Mike tê-la convidado para jantar – eu estava mesmo aliviada por ele finalmente ter entendido –, mas meu entusiasmo parecia falso a meus próprios ouvidos. Ela reprogramou nossa viagem de compras para amanhã à noite.

Isso me deixou com poucas distrações.Passei uma meia hora concentrada no dever de casa, mas depois também o terminei.

Resolvi ir pra a piscina. Fui ver se Clara ia comigo.

— Clara? - eu chamo

— Sim? - ela diz, tirando os olhos de um trabalho de calculo.

— Piscina? - eu pergunto

— Vamos. Não aguento, mas isso. - ela diz e saio.

Pego um biquíni no meu quarto e visto.

Saio lá pra fora e Clara já está lá. Com um biquíni de babados.

— Clara você precisa de compras. - eu digo rindo

— Hum! Você e Alice. - ela diz. E se joga na água me dando um banho.

— Clara. - eu grito

— A Bella entra logo. - ela diz. Eu pulo delicadamente dentro da água, me fazia me sentir viva. Demoro um pouco embaixo da água e volto pra a superfície.

E sai da água. Clara olhou pra mim rindo.

— O que? - eu pergunto

— Você ainda mata o ... nada - ela diz me deixando confusa

Quando dei por mim, escutei um som de carro, olhei pra Clara peguei meu roupão e vesti. Só que com a sorte que eu tenho deslizei e bati com tudo no chão.

— Bella. - Clara gritou, e correu pro meu lado, eu me levantei e olhei o olhar preocupado dela.

— Não bati com força. - eu digo

— Bella você foi com tudo no chão, vamos pro hospital. - ela diz

— Serio? - perguntei

— É lógico. - ela diz

— Clara eu sofri tantos acidentes e estou viva, não se preocupe não estou sentido nada. - eu digo, ela anda na frente e eu massageio a cabeça que estava doendo.

Eu e Clara seguimos para a cozinha, e damos de cara com Jonathas e Daniel.

— Chegaram cedo? - Clara diz surpresa

— Eu queria pegar o placar do jogo, de qualquer forma. - Jonathas disse

— Pai – eu disse durante um intervalo – Jessica e Angela vão procurar vestidos para o baile amanhã à noite em Port Angeles, e elas queriam que eu ajudasse a escolher… Se importa se eu for com elas?

— Jessica Stanley? – perguntou ele.

— E Angela Weber. – Suspirei ao lhe dar os detalhes.

Ele ficou confuso

— Mas você não vai ao baile, não é?

— Não, pai, mas vou ajudar umas meninas a encontrar vestidos… Sabe como é para fazer uma crítica construtiva. – Eu não teria que explicar isso a uma mulher.

— Bom tudo bem. – Ele pareceu perceber que essas coisas de mulherzinha estavam além de sua compreensão. – Mas no dia seguinte tem aula.

— Vamos sair logo depois da escola, então podemos voltar cedo. - eu digo balançando seus cabelos, o fazendo rir.

A manhã foi ensolarada de novo. Acordei com uma esperança renovada que tentei reprimir com rigor. Tomei meu banho, sequei meu cabelo, vesti um vestido curto mais leve com um cinto e uma sapatilha.

E sai encontrado Clara dentro do meu carro me esperando.

Eu tinha planejado minha chegada à escola de modo que mal tivesse tempo para entrar na sala. Com o coração aos pulos, contornei o estacionamento cheio, procurando por uma vaga, ao mesmo tempo que também procurava pelo Volvo que claramente não estava ali. Estacionei na última fila e corri para a aula de inglês, chegando sem fôlego, mas controlada, antes que o sinal tocasse.

Foi igual à ontem – eu simplesmente não conseguia evitar que as sementes de esperanças brotassem na minha mente, para depois vê-las sendo esmagadas sem dó enquanto eu procurava em vão pelo refeitório e me sentava no lugar vazio na carteira de biologia.

O esquema de Port Angeles mudou de novo esta noite e ficou mais interessante pelo fato de que Lauren tinha outros compromissos. Fiquei ansiosa para sair da cidade, para que pudesse parar de olhar sobre o ombro, na esperança de vê-lo aparecer do nada, como ele sempre fazia. Jurei a mim mesma que estaria de bom humor à noite e não estragaria a diversão de Angela e Jessica na caça ao vestido. Talvez eu pudesse comprar algumas roupas também.

Depois da aula fui falar com Clara.

— Se bater meu carro, vou ser sua pior inimiga. - eu disse entregando a chave e indo ao encontro de Jessica e Angela.

Minha empolgação aumentava exponencialmente à medida que saíamos dos limites da cidade.

Jess dirigia mais rápido, mas não igual a mim, então partimos para Port Angeles às quatro horas. Havia algum tempo que eu não saía à noite com amigas minhas e o afluxo de estrogênio era revigorante. Ouvimos as baladas lamentosas de rock enquanto Jessica tagarelava sobre os meninos com quem saíamos. O jantar de Jessica com Mike tinha sido ótimo e ela esperava que no sábado à noite eles tivessem avançado para a fase do primeiro beijo. Sorri para mim mesma, satisfeita. Angela estava passivamente feliz por ir ao baile, mas na verdade não estava interessada em Eric. Jess tentou fazê-la confessar quem era o tipo dela, mas depois de um tempinho eu interrompi com uma pergunta sobre os vestidos, para poupá-la. Angela me lançou um olhar de gratidão.

Port Angeles era uma linda armadilha para turistas, muito mais refinada e singular do que Forks. Mas Jessica e Angela conheciam muito bem a cidade, então não pretendiam perder tempo no pitoresco calçadão junto à baia. Jess dirigiu direto para uma das grandes lojas de departamento da cidade, que ficava a algumas ruas da área da baía que agradava os visitantes. O traje do baile foi anunciado como passeio completo e não tínhamos muita certeza do que isso significava.Eu disse que não ia aos bailes em New York

— Você nunca namorou? - Jessica perguntou curiosa

— Claro que namorei, mas nós nunca saímos a um baile. - eu disse balançando meus cabelos.

— E por que não? – quis saber Jessica.

— Ninguém me convidava – respondi com sinceridade.

Agora estávamos na seção juvenil, olhando as araras em busca de roupas de noite.

— As pessoas te convidam para sair aqui – lembrou-me ela – e você diz não a elas.

— Bom, a não ser pelo Tyler – corrigiu Angela em voz baixa.

— Como é? – eu arfei. – O que foi que você disse?

— O Tyler contou a todo mundo que vai levar você ao baile dos alunos – informou-me Jessica com os olhos desconfiados.

— Ele disse isso? – Tive a impressão de que ia sufocar.

— Eu te falei que não era verdade – murmurou Angela para Jessica.

Fiquei em silêncio, ainda completamente em uma espécie de choque, que rapidamente estava virando irritação. Mas tínhamos achado as araras de vestidos e agora havia um trabalho a fazer.

— É por isso que Lauren não gosta de você – disse Jessica entre risos enquanto manuseávamos as roupas.

Trinquei os dentes.

— Você acha que se eu o atropelasse com o meu carro ele pararia de se sentir culpado pelo acidente? Que ele podia desistir de tentar compensar e nós estaríamos quites?

— Talvez – Jessica riu baixinho. – Se for por isso mesmo que ele está agindo assim.

As opções de vestidos não eram muitas, mas as duas acharam algumas coisas para experimentar. Fiquei sentada em uma cadeira baixa do lado de fora das cabines de prova, perto do espelho triplo, tentando controlar minha fúria.

Jess ficou dividida entre dois – um tomara-que-caia longo e preto bem básico e um azul elétrico na altura dos joelhos com alças finas. Eu a estimulei a ficar com o azul; por que não realçar os olhos? Angela escolheu um vestido rosa-claro que caiu muito bem em seu corpo alto e destacou os tons de mel do cabelo castanho-claro. Não economizei elogios e as ajudei a recolocar nas araras as roupas rejeitadas. Todo o processo foi muito mais curto e mais fácil do que as viagens semelhantes que eu fazia com Blair na minha cidade. Acho que havia vantagens nas opções limitadas.

Fomos procurar sapatos e acessórios. Enquanto elas experimentavam as coisas, eu apenas observava e criticava, sem humor nenhum para comprar algo para mim, embora precisasse de sapatos novos. O ponto alto da saída com as amigas desaparecia na esteira de minha irritação com Tyler, deixando espaço para a volta das trevas.

— Angela? – comecei hesitante, enquanto ela experimentava um par de sapatos de salto rosa com tiras – ela estava super feliz por sair com um cara com uma altura que lhe permitia usar salto alto. Jessica vagava na direção do balcão de bijuterias e estávamos sozinhas.

— Sim? – Ela levantou a perna, girando o tornozelo para ter uma visão melhor do sapato.

— Gostei desse.

— Acho que vou levar… Apesar de eles só combinarem com aquele vestido, e mais nada – refletiu ela.

— Compra sim, ficou lindo. - eu disse sorrindo

— Hmmm, Angela… – Ela olhou para mim, curiosa. – É normal para os Cullen – falei sem tirar os olhos dos sapatos – faltar muito às aulas? – disse indiferente.

— É, quando o clima está bom, eles acampam o tempo todo… Até o médico. Todos são loucos pela vida ao ar livre – disse-me ela baixinho, examinando os sapatos também. Ela não fez nenhuma pergunta, em lugar das centenas que Jessica teria desatado a fazer. Eu estava começando a gostar de verdade de Angela.

— Ah. – Abandonei o assunto enquanto Jessica voltava para mostrar a bijuteria de strass que encontrara para combinar com os sapatos prateados.

Pretendíamos jantar em um restaurante italiano no calçadão da orla, mas a compra dos vestidos não levou o tempo que esperávamos. Jess e Angela foram levar as roupas para o carro e depois desceram para a baía. Eu lhes disse que ia encontrá-las no restaurante em uma hora – queria procurar uma livraria. Elas estavam dispostas a ir comigo, mas eu as estimulei a se divertirem – elas não sabia como eu podia ficar pensativa quando estava cercada de livros; era uma coisa que eu preferia fazer sozinha. Elas se afastaram para o carro conversando animadas e eu fui à direção que Jess me apontara.

Não tive problemas para encontrar a livraria, mas não era o que eu procurava. As vitrines estavam cheias de cristais, filtros de sonho e livros sobre cura espiritual. Nem entrei. Pelo vidro, pude ver uma mulher de uns 50 anos com cabelo grisalho até as costas, metida num vestido dos anos 60, dando um sorriso de boas-vindas detrás do balcão. Concluí que era uma conversa que eu podia dispensar. Devia haver uma livraria mais normal na cidade.

Andei pelas ruas, repletas com o tráfego do final do dia de trabalho, e esperei estar seguindo para o centro. Não prestei muita atenção, como devia, na direção que tomava; eu lutava com meu desespero. Tentava fortemente não pensar nele e no que Angela dissera… E, mais do que qualquer outra coisa, tentava aquietar minhas esperanças para o sábado, temendo uma decepção mais dolorosa do que o resto, quando olhei para cima e vi um Volvo prata estacionado na rua. De repente a ficha caiu. Vampiro idiota e insuportável, pensei comigo mesma.

Segui para o sul a passos pesados, na direção de algumas lojas com fachada de vidro que pareciam promissoras. Mas quando cheguei lá, eram só uma loja de conserto de roupas e um espaço vago. Ainda tinha muito tempo para procurar por Jess e Angela, e precisava controlar meu estado de espírito antes de encontrar com elas. Passei os dedos pelos cabelos e respirei fundo algumas vezes antes de virar a esquina.

Ao atravessar outra rua, comecei a perceber que ia na direção errada. O tráfego reduzido de pedestres que eu vira ia para o norte e parecia que os prédios aqui eram principalmente armazéns. Decidi voltar para o leste na esquina seguinte, depois contornar após algumas quadras e tentar minha sorte numa rua diferente ao voltar para o calçadão.

Um grupo de quatro homens virava a esquina para onde eu ia, vestidos muito informalmente para estarem saindo do trabalho, mas sujos demais para serem turistas. À medida que se aproximavam de mim, percebi que não eram muitos anos mais velhos do que eu. Brincavam ruidosamente, rindo de forma estridente e empurrando o braço dos outros. Afastei-me mais para o canto da calçada a fim de lhes dar espaço, andando rapidamente, olhando para a esquina depois deles.

— Ei, e aí? – gritou um deles enquanto passavam, e ele tinha de estar falando comigo, uma vez que não havia mais ninguém na rua. Olhei automaticamente para ele. Dois tinham parado, os outros dois reduziam o passo. O mais próximo, um homem troncudo, de cabelo escuro, de vinte e poucos anos, parecia ser o cara que falou. Usava uma camisa de flanela aberta por cima de uma camiseta suja, bermuda jeans rasgada e sandálias. Ele deu um passo na minha direção.

— Oi – murmurei uma reação reflexa. Depois rapidamente desviei os olhos e andei mais rápido para a esquina. Pude ouvi-los rindo a todo volume atrás de mim.

— Ei, espera! – gritou um deles de novo, mas mantive a cabeça baixa e virei a esquina com um suspiro de alívio. Podia ouvi-los rindo lá atrás.

Eu me vi numa calçada nos fundos de vários armazéns de cores sombrias, cada um deles com portas largas para caminhões de carga, trancados a cadeado para a noite. O lado sul da rua não tinha calçada, só uma cerca de tela encimada por um arame farpado protegendo uma espécie de depósito de peças de motor. Eu vagava pela parte de Port Angeles que eu, como visitante, não devia ver. Estava escurecendo, percebi, as nuvens finalmente voltavam, acumulando-se no horizonte a oeste e criando um pôr-do-sol prematuro. O céu a leste ainda era claro, mas se acinzentava, tomado de faixas de rosa e laranja. Uma van passou por mim e depois a rua ficou vazia.

O céu de repente escureceu ainda mais e, enquanto eu olhava por sobre o ombro para a nuvem degradante, percebi chocada que dois homens andavam em silêncio uns cinco metros atrás de mim.

Eram do mesmo grupo pelo qual eu havia passado na esquina, mas nenhum deles era o de cabelo escuro que falara comigo. Virei imediatamente a cabeça para a frente, acelerando meu passo. Um arrepio que não tinha nada a ver com o clima me fez tremer de novo. Minha bolsa pendurada no ombro e atravessada pelo meu corpo, como usamos para não sermos surpreendidas.Uma vozinha assustada no fundo de minha mente me alertou que eles podiam ser coisa pior do que ladrões.

Tentei escutar atentamente seus passos silenciosos, que eram muito mais silenciosos quando comparados com o barulho tumultuado que fizeram antes, e não parecia que tinham acelerado, nem chegado mais perto de mim. Respire, lembrei a mim mesma. Você não sabe se estão te seguindo. Continuei a andar com a maior rapidez que pude sem correr, concentrando-me na curva à direita, que agora só estava a alguns metros de mim. Eu podia ouvi-los, ficando para trás, como antes. Um carro azul entrou na rua, vindo do sul, e passou rapidamente. Pensei em pular na frente, mas hesitei, inibida, sem saber se estavam mesmo me perseguindo, e aí era tarde demais.

Cheguei à esquina, mas um olhar rápido revelou que era só um beco sem saída nos fundos de outro prédio. Dei meia-volta, cheia de expectativa; tinha que corrigir esse erro apressadamente e disparar pelo caminho estreito, de volta à calçada. A rua terminava na esquina seguinte, onde havia uma placa de Pare. Concentrei-me nos passos fracos atrás de mim, decidindo se correria ou não. Mas eles pareciam mais distantes e eu sabia que, de qualquer forma, não podiam me alcançar. Eu tropeçaria e cairia estatelada se tentasse ir mais rápido. Os passos certamente estavam mais distantes. Arrisquei uma olhada rápida por sobre o ombro e agora talvez eles estivessem a uns dez metros de mim, como vi com alívio. mas os dois me encaravam.

Parecia que eu ia levar uma eternidade para chegar à esquina. Mantive o ritmo constante, os homens atrás de mim ficando um pouquinho mais para trás a cada passo. Talvez eles tivessem percebido que me assustaram e lamentassem por isso. Vi dois carros indo para o norte, passando pelo cruzamento para onde eu me dirigia, e respirei com alívio. Haveria mais gente lá quando eu saísse dessa rua deserta. Virei a esquina rapidamente com um suspiro de gratidão.

E fiquei paralisada.

A rua era cercada dos dois lados por paredes sem portas nem janelas. Eu podia ver a distância dois cruzamentos, postes, carros e mais pedestres, mas estavam todos longe demais. Porque encostados no prédio a oeste, a meio caminho para a rua, estavam outros dois homens do grupo, os dois olhando com sorrisos excitados enquanto eu ficava paralisada feito morta na calçada. Percebi então que não estava sendo seguida.

Estava sendo conduzida. Parei por um segundo, mas me pareceu muito tempo. Depois virei e disparei para o outro lado da rua. Tive a sensação desanimadora de que era perda de tempo. Os passos atrás de mim agora estavam mais altos.

— Você aí! – O estrondo da voz do homem atarracado de cabelo escuro abalou a quietude intensa e me fez pular. Na escuridão que aumentava, ele parecia olhar através de mim.

— É – gritou uma voz de trás, fazendo-me pular novamente enquanto eu tentava correr pela rua. – Pegamos um atalhozinho.

Meus passos agora tinham que se reduzir. Eu estava encurtando muito rapidamente a distância entre mim e o par que ria. Precisava dar um belo grito e puxei o ar, preparando-me para usá-lo, mas minha garganta estava tão seca que eu não sabia que volume poderia alcançar.

— Você sabia que não pode mexer com a filha do chefe da FBI. - eu disse fria e encarando eles

Mantenha a calma. eu disse pra mim mesma

— Não fique assim, docinho – gritou ele, e o riso rouco recomeçou atrás.

Isso me fez lembrar de Lucas.

Me virei e dei um soco bem dado não cara de um.Um deles tentou pegar meu braço, mas nessa hora.

De repente faróis apareceram na esquina, o carro quase batendo no atarracando, obrigando-o a pular para a calçada. Mergulhei na rua – este carro ia parar ou me atropelaria. Mas o carro inesperadamente deu uma guinada, cantando pneu, e parou com a porta do carona aberta a pouca distância de mim.

— Entra – ordenou uma voz furiosa.

Fiquei surpresa ao ver como o medo sufocante desapareceu subitamente, surpresa pela sensação de segurança me inundar de repente – mesmo antes que eu saísse da rua – assim que ouvi a voz dele. Pulei para dentro do carro, batendo a porta depois de entrar.

Estava escuro no carro, nenhuma luz entrara com a abertura da porta e eu mal conseguia ver o rosto dele no brilho do painel. Os pneus cantaram enquanto ele virava para o norte, acelerando rápido demais, desviando para os homens atordoados na rua. Vislumbrei um deles mergulhando na calçado enquanto o carro se alinhava e acelerava para o porto.

— Coloque o cinto de segurança – ordenou ele. Rapidamente obedeci; o estalo do fecho do cinto foi alto no escuro. Ele virou à esquerda, correndo, voando por várias placas de Pare sem se deter.

Mas eu me senti completamente segura e, no momento, totalmente despreocupada com nosso destino. Olhei o rosto dele com um profundo alívio, um alívio que ia além de minha libertação repentina. Analisei seus traços perfeitos na luz limitada, querendo que minha respiração voltasse ao normal, até que me ocorreu que a expressão dele era de uma raiva homicida.

— Você está bem? – perguntei surpresa ao constatar como minha voz estava rouca.

— Não – disse ele rispidamente, e seu tom de voz era furioso.

Fiquei sentada ali em silêncio, observando seu rosto enquanto os olhos em brasa olhavam para frente, até que o carro subitamente parou. Olhei em volta, mas estava escuro demais para ver alguma coisa além do contorno vago de árvores negras na lateral da rua. Não estávamos mais na cidade.

— Bella? – perguntou ele, a voz dura e controlada.

— Sim? – Minha voz já estava normal.

— Você está bem? – Ele ainda não olhava para mim, mas a fúria tomava todo o seu rosto.

— Estou – resmunguei suavemente.

— Me distraia, por favor – ordenou ele.

— Desculpe como é?

Ele suspirou com força.

— Tagarele sobre alguma coisa insignificante até que eu me acalme – esclareceu ele, fechando os olhos e apertando a ponte do nariz com o polegar e o indicador.

— Vou atropelar Tyler Crowley amanhã antes da aula.

Ele ainda estava de olhos bem fechados, mas o canto da boca se retorceu.

— Por quê?

— Ele está dizendo a todo mundo que vai me levar ao baile dos alunos… Ou ele é maluco, ou ainda está tentando compensar o fato de quase ter me matado na… Bem, você se lembra disso, e ele acha que o baile dos alunos é a forma correta de fazer isso. Então imagino que, se eu colocar a vida dele em risco, depois vamos ficar quites e ele pode parar de tentar compensar isso. Não preciso de inimigo nenhum e talvez Lauren recue se ele me deixar em paz. Mas pode ser que o Sentra dele tenha perda total. Se ele não tiver carona, não vai poder levar ninguém a baile nenhum… – tagarelei.

— Eu soube disso. – Ele parecia um pouco mais composto.

— Você soube? – perguntei descrente, minha irritação anterior cintilando. – Se ele ficar paralítico do pescoço para baixo, não vai poder ir ao baile dos alunos também – murmurei, refinando meus planos

Edward suspirou e por fim abriu os olhos.

— Melhor?

— Na verdade, não.

Esperei, mas ele não voltou a falar. Ele encostou a cabeça no banco, olhando o teto do carro. Seu rosto estava rígido.

— Qual é o problema? – Minha voz saiu em um sussurro.

— Às vezes tenho problemas com meu gênio, Bella. – Ele também estava sussurrando e, enquanto olhava pela janela, seus olhos estreitaram em fendas. – Mas não seria de utilidade nenhuma para mim voltar e caçar aqueles… – Ele não terminou a frase, desviando os olhos, lutando por um momento para controlar a raiva de novo. – Pelo menos – continuou ele – é do que estou tentando me convencer.

— É você não deve fazer isso. - eu disse

Ficamos sentados em silêncio de novo. Olhei o relógio do painel. Eram seis e meia.

— Jessica e Angela vão ficar preocupadas – murmurei. – Eu devia me encontrar com elas.

Ele ligou o motor sem dizer nada, virou silenciosamente e acelerou de volta à cidade. De repente estávamos debaixo dos postes de rua, ainda seguindo rápido de mais, costurando com facilidade os carros que passeavam lentamente junto ao calçadão. Estacionou paralelamente ao meio-fio em uma vaga que eu teria achado pequena demais para o Volvo, mas ele deslizou para o local sem esforço na primeira tentativa. Olhei pela janela e vi as luzes de La Bella Itália, e Jess e Angela acabavam de sair, andando ansiosas até nós.

— Como você sabia onde…? – comecei a dizer, mas depois só sacudi a cabeça. Ouvi a porta se abrir, virei-me e o vi saindo.

— O que está fazendo? – perguntei.

— Vou levar você para jantar. – Ele sorriu de leve, mas seus olhos eram duros. Ele saiu do carro e bateu a porta, sai também. Ele esperava por mim na calçada.

Ele falou antes que eu pudesse.

— Detenha Jessica e Angela antes que eu tenha que segui-las também. Não acho que vou poder me controlar se me deparar com seus outros amigos de novo.

Eu estremeci com a ameaça em sua voz.

— Jess! Angela! – gritei para elas, acenando quando se viraram. Elas correram para mim, o alívio acentuado no rosto das duas passando para a surpresa ao verem quem estava parado ao meu lado. Elas hesitaram a pouca distância de nós.

— Aonde você foi? – A voz de Jessica era desconfiada.

— Eu me perdi – admiti timidamente. – E depois encontrei o Edward – gesticulei para ele.

— Tudo bem se eu ficar com vocês? – perguntou ele com sua irresistível voz sedosa. Eu podia ver, pela expressão vacilante das duas, que ele nunca havia lançado seus talentos para elas.

— É… claro – sussurrou Jessica.

— Hmmm, na verdade, Bella, já comermos enquanto estávamos esperando… Desculpe – confessou Angela.

— Está tudo bem, eu não estou com fome. – Dei de ombros.

— Acho que devia comer alguma coisa. – A voz de Edward era baixa, mas cheia de autoridade. Ele olhou para Jessica e falou um pouco mais alto. – Importa-se se eu levar a Bella para casa esta noite? Assim vocês não terão que esperar enquanto ela come.

— Hmmm, tudo bem, eu acho… – Ela mordeu o lábio, tentando deduzir, pela minha expressão, se era o que eu queria. Dei uma piscadela para ela. Só o que eu queria era ficar sozinha com meu eterno salvador. Havia muitas perguntas que eu só podia despejar para cima dele quando estivéssemos sozinhos.

— Tudo bem. – Angela foi mais rápida do que Jessica. – A gente se vê amanhã, Bella… Edward. – Ela pegou a mão de Jessica e a puxou para o carro, que eu pude ver pouco além dali, estacionado do outro lado da First Street. Enquanto elas se afastavam, Jess se virou e acenou o rosto cheio de curiosidade. Retribuí o aceno, esperando que elas saíssem com o carro antes de me virar para encará-lo.

— Com toda a sinceridade, não estou com fome – insisti, tentando analisar seu rosto. A expressão dele era ilegível.

— Divirta-me.

Ele foi até a porta do restaurante e a manteve aberta com uma expressão obstinada. Obviamente, não haveria nenhuma discussão. Passei por ele e entrei no restaurante com um suspiro resignado.

Todos olharam pra mim e Edward. O restaurante não estava lotado – era a baixa temporada em Port Angeles. Fomos recebidos por uma mulher e entendi o olhar dela enquanto avaliava Edward. Ela o recebeu um pouco mais calorosamente do que o necessário. Fiquei surpresa por isso ter me incomodado tanto. Ela era vários centímetros mais alta do que eu e seu louro era artificial.

— Mesa para dois? – Sua voz era sedutora, quer fosse intencional ou não. Vi os olhos dela faiscarem para mim e depois se desviarem, satisfeitos com minha evidente banalidade e com o espaço cauteloso e sem contato que Edward mantinha entre nós. Ela nos levou a uma mesa suficiente para quatro no meio da área mais apinhada do salão.

— Quem sabe um lugar mais reservado? – insistiu ele em voz baixa para a hostess. Eu não tinha certeza, mas tive a impressão de que ele lhe passou furtivamente uma gorjeta. Nunca vi ninguém recusar uma mesa, a não ser nos filmes antigos.

— Claro. – Ela parecia tão surpresa quanto eu. Virou-se e nos levou por uma divisória a um pequeno círculo de bancos – todos eles vazios. – Que tal aqui?

— Hmmm. – ele diz

— Vocês serão atendidos logo. – Ela se afastou meio desequilibrada.

— Não devia fazer isso com as pessoas – critiquei. – É muito injusto.

— Fazer o quê?

— Deixá-las tonta desse jeito… Ela pode estar ofegando na cozinha agora mesmo.

Ele pareceu confuso.

— Ah, sem essa – disse eu, desconfiada. – Você deve saber o efeito que tem sobre as pessoas.

Ele inclinou a cabeça de lado e seus olhos eram curiosos.

— Eu deixo as pessoas tontas?

— Não percebeu?

Ele ignorou minhas perguntas.

— Eu deixo você tonta?

— Não como você gostaria.

E depois nossa garçonete chegou, a cara cheia de expectativa. A hostess com certeza tinha fofocado nos bastidores e esta garota nova não parecia decepcionada. Ela colocou uma mecha de cabelo preto atrás da orelha e sorriu com uma cortesia desnecessária.

— Oi. Meu nome é Amber e serei sua garçonete esta noite. O que posso trazer para beberem? – Não deixei de notar que ela falava só com ele.

Ele olhou para mim.

— Vou tomar uma Coca. – Pareceu mais uma pergunta.

— Duas Cocas – disse ele.

— Voltarei logo com elas – ela lhe assegurou com outro sorriso desnecessário. Mas ele não viu. Estava olhando para mim.

— Que foi? – perguntei quando ela saiu.

Seus olhos estavam fixos no meu rosto.

— Como está se sentindo?

— Bem – respondi surpresa com a intensidade dele.

— Não está tonta, enjoada, gelada…?

— Deveria?

Ele riu de meu tom enigmático.

— Bom, na verdade estou esperando que você entre em choque. – Seu rosto se enrugou naquele sorriso torto perfeito.

— Não acho que vá acontecer – eu disse. – Sempre fui muito boa para reprimir coisas desagradáveis.

— Mesmo assim, vou me sentir melhor quando você colocar algum açúcar e comida para dentro.

— Eu vou ficar gorda desse jeito. - eu disse baixo, mas parece que ele ouviu.

Bem na deixa, a garçonete apareceu com nossas bebidas e um cesto de pãezinhos. Ela ficou de costas para mim enquanto os colocava na mesa.

— Está pronta para pedir? – perguntou ela a Edward.

— Bella? – perguntou ele. Ela se virou sem a menor vontade para mim.

Escolhi a primeira coisa que vi no cardápio.

— Hmmm… Vou querer ravióli de cogumelos.

— E você? – Ela se virou para ele com um sorriso.

— Para mim, nada – disse ele. É claro que não.

— Me avise se mudar de idéia. – O sorriso tímido ainda estava ali, mas ele não a olhou e ela saiu insatisfeita.

— Beba – ordenou ele.

Beberiquei obediente o refrigerante e depois tomei um gole maior, surpresa com a sede que sentia. Percebi que tinha terminado tudo quando ele empurrou o copo dele para mim.

Minha garganta tava ardendo

— Obrigada – murmurei, ainda com sede. O frio do refrigerante gelado irradiou por meu peito e eu tremi. – Está com frio?

— Não. - eu digo olho pra outro lugar onde tinha um rapaz, ele olhou pra mim piscou e levantou sua bebida, olhei para trás pra ver se era comigo. Eu só sorrir.

— Não trouxe casaco? – A voz dele era desaprovadora.

— Não. Estava fazendo calor, como eu ia prever que o clima ia mudar. - eu digo sarcástica.

Edward estava tirando o casaco. De repente percebi que eu não via o que ele estava vestindo – não hoje à noite, mas sempre. Eu simplesmente não conseguia deixar de olhar para seu rosto. Agora me obriguei a olhar, concentrada. Ele estava tirando uma jaqueta de couro bege; por baixo, tinha um suéter marfim de gola rulê. Caía com perfeição nele, destacando seu peito musculoso. Edward me passou a jaqueta, interrompendo meu olhar cheio de cobiça.

Meu Deus, que calor.

— Obrigada – eu disse novamente, passando o braço pela jaqueta. Estava frio, como meu casaco quando o peguei de manhã, pendurado no hall de entrada com suas correntes de ar. Tremi de novo. O cheiro era maravilhoso. Inspirei, tentando identificar o aroma delicioso. Não tinha cheiro de colônia. As mangas eram compridas demais; puxei-as para trás para poder liberar minhas mãos.

— O azul fica ótimo em sua pele – disse ele, me olhando.

— Obrigada. - eu digo.

Ele empurrou o cesto de pão para mim.

— Na verdade, não vou entrar em choque – protestei.

— Devia… Uma pessoa normal entraria. Você nem parece abalada. – Ele parecia inquieto. Olhou nos meus olhos e vi como os olhos dele estavam claros, mais claros do que já vira, de um caramelo dourado.

— Eu me sinto muito segura com você – confessei

Situação complicada

Isso o desagradou; sua fisionomia de alabastro se franziu. Ele sacudiu a cabeça, carrancudo.

— Isto é mais complicado do que eu planejei – murmurou ele para si

— Dois. - eu disse emburrada. Empurrei a cesta de pão pra ele.

— Idiota. - mexia apenas o labios, mas não foi pra ele, foi pro rapaz ele agora estava piscando pra mim.

— Em geral você está num humor melhor quando seus olhos estão claros assim – comentei, tentando distraí-lo de qualquer pensamento que o tivesse feito ficar carrancudo e sombrio.

Ele me olhou, atônito.

— Como é?

Quando ia falar o cara que chamei de idiota veio até aqui.

— Com licença, você é Bella? – ele pergunta me fazendo ficar confusa.

— Depende do ponto de vista. – eu digo dando um sorriso

— Com toda certeza é você. – ele diz esticando sua mão. – Sou Lion

Se eu me lembrei dele.

— Lion como Leão. – eu digo fazendo a mesma piada do dia em que nos conhecemos.

— Perde o amigo, mas não perdi piada. – ele diz sorrindo

— Eu sou assim. – eu digo e aperto sua mão. – Como foi a viagem para Inglaterra?

— Foi ótima. – ele diz sorrindo. – Mas você já sabe. Seu namorado?

Olho pra Edward e vejo que seus olhos estavam, mas frio do que o normal.

— Apenas um colega. – eu digo voltando a olhar pra ele.

— Tenho que ir. – ele diz me dando um beijo no rosto

— Tchau. – eu digo acenando e volto pra Edward.

— Você sempre fica mais azedo quando seus olhos estão escuros… É o que eu espero então – continuei. – Tenho uma teoria para isso.

Ele semicerrou os olhos. – Mais teorias?

— Sim. - Balancei a cabeça

— Espero que desta vez seja mais criativa… Ou ainda está se inspirando nos quadrinhos? – Seu sorriso fraco era de zombaria; os olhos ainda estavam apertados

— Bom, não, não tirei nada de quadrinho nenhum, mas também não inventei nada sozinha – confessei.

Mas então a garçonete passou pela divisória com meu prato. Percebi que, inconscientemente, tínhamos nos inclinado na direção um do outro sobre a mesa, porque nós dois nos endireitamos quando ela se aproximou. Ela baixou o prato diante de mim – o cheiro me dexou enjoada – e se virou rapidamente para Edward.

— Mudou de idéia? – perguntou ela. – Não há nada que eu possa trazer para você? – Eu podia muito bem imaginar o duplo sentido das palavras dela.

— Não, obrigado, mas outro refrigerante seria bom. – Ele gesticulou com a mão longa e branca para os copos vazios na minha frente.

— Claro. – Ela retirou os copos e se afastou.

— O que estava dizendo? – perguntou ele. – Vou falar sobre isso no carro. Se… – eu parei.

— Há alguma condição? – Ele ergueu uma sobrancelha, a voz agourenta.

— Sim. - eu disse sorrindo.

— É claro.

A garçonete voltou com mais duas Cocas. Desta vez colocou-as na mesa sem dizer nada e saiu novamente.

— Bem, vá em frente – pressionou ele, a voz ainda dura.

Comecei do jeito menos exigente. Ou assim pensei eu.

— Por que está em Port Angeles?

Ele olhou para baixo, cruzando as mãos grandes lentamente sobre a mesa. Seus olhos lampejaram para mim por baixo das pestanas, uma sugestão de sorriso de escárnio no rosto.

— Próxima.

— Mas essa foi a mais fácil – objetei.

— Próxima. – repetiu ele.

— Tudo bem, então. – Eu o fitei e continuei devagar. – Digamos, é claro que hipoteticamente, que… alguém… pode saber o que as pessoas estão pensando, ler a mente delas, sabe como é… com algumas exceções.

— Só uma exceção – corrigiu ele –, hipoteticamente.

— Tudo bem, com uma exceção, então. – Fiquei emocionada que ele estivesse cooperando, mas tentei parecer despreocupada. – Como é que isso funciona? Quais são as limitações? Como… esse alguém… acharia outra pessoa exatamente na hora certa? Como ele saberia que ela estava numa encrenca? – Eu me perguntei se minhas perguntas convolutas faziam algum sentido.

— Hipoteticamente? – perguntou ele.

— Claro. – Bom, se… esse alguém…

— Vamos chamá-lo de “Joe” – sugeri.

Ele deu um sorriso torto.

— Joe, que seja. Se Joe estivesse prestando atenção, o senso de oportunidade não precisaria ser tão preciso. – Ele sacudiu a cabeça, revirando os olhos. – Só você pode se meter em encrenca em uma cidade tão pequena. Você teria acabado com as estatísticas de criminalidade por uma década, sabe disso.

— Estávamos falando de um caso hipotético – lembrei-lhe friamente.

Ele riu para mim, os olhos calorosos.

— Sim, estávamos – concordou ele. – Devo chamá-la de “Jane”?

— Como você sabia? – perguntei incapaz de reprimir minha intensidade. Percebi que estava me inclinando para ele de novo.

Ele pareceu oscilar, dividido por algum dilema íntimo. Seus olhos pararam nos meus e achei que, naquele momento, ele estava decidindo se simplesmente me contaria a verdade ou não.

— Sabe que pode confiar em mim – murmurei. Estendi a mão, sem pensar, para pegar suas mãos cruzadas, mas ele as afastou rapidamente e eu recuei.

— Não sei se ainda tenho alternativa. – A voz dele era quase um sussurro. – Eu estava errado… Você é muito mais observadora do que eu julgava.

— Achei que você sempre tivesse razão.

— Antigamente era assim. – Ele sacudiu a cabeça de novo. – Eu estava errado sobre você em outra coisa também. Você não é um imã para acidentes… Esta não é uma classificação muito ampla. Você é um imã para problemas. Se houver alguma coisa perigosa num raio de dez quilômetros, invariavelmente vai encontrar você.

— E você se coloca nesta categoria? – conjeturei. Seu rosto ficou frio, sem expressão. – Sem dúvida.

Estiquei a mão pela mesa de novo – ignorando-o quando ele puxou a dele mais uma vez – para tocar timidamente as costas de sua mão com a ponta dos dedos. Sua pele era fria e dura, como uma pedra.

— Obrigada. – Minha voz fervia de gratidão. – Agora são duas vezes.

Seu rosto se suavizou.

— Vamos tentar não ter a terceira, concorda?Fiz uma careta, mas assenti. Ele tirou a mão de baixo da minha, colocando as duas sob a mesa. Mas se inclinou para mim.

— Eu a segui a Port Angeles – admitiu-o, falando num jato. – Nunca tentei manter uma determinada pessoa viva, e é muito mais problemático do que eu acreditava. Mas deve ser assim porque é você. As pessoas comuns parecem passar o dia todo sem muitas catástrofes. – Ele parou. Eu me perguntei se devia me aborrecer por ele estar me seguindo; em vez disso, senti um surto estranho de prazer. Ele me encarava, talvez se indagando por que meus lábios se curvavam em um sorriso involuntário.

— Já pensou que talvez minha hora tivesse chegado naquela primeira vez, com a van, e você esteja interferindo no meu destino? – especulei, distraindo-me.

— Não foi à primeira vez – disse ele, e mal se ouvia sua voz. Eu o encarei, surpresa, mas ele olhava para baixo. – Sua hora chegou quando eu a conheci.

Senti um espasmo de medo com as palavras dele, e a lembrança abrupta de seu olhar sombrio e violento naquele primeiro dia… Mas a sensação dominadora de segurança que eu tinha em sua presença sufocou isso. Quando ele olhou para cima para ler meus olhos, não havia vestígio de medo neles.

— Você lembra? – perguntou ele, o rosto angelical grave.

— Lembro. – Eu estava calma.

— E, no entanto aqui está você. – Havia um toque de descrença em sua voz; ele ergueu uma sobrancelha.

— É aqui estou eu graças a você. – Eu parei. – Porque de algum modo você sabia como me achar hoje? – incitei.

Ele apertou os lábios, encarando-me pelos olhos estreitos, decidindo novamente. Seus olhos faiscaram para meu prato e depois para mim.

— Você come, eu falo – ele propôs a barganha.

Ele acha que eu vou perder isso.

Rapidamente garfei outro ravióli e o coloquei na boca.

— É mais difícil do que deveria… rastrear você. Em geral posso encontrar uma pessoa com muita facilidade, depois de ter lido sua mente.

Ele olhou para mim com ansiedade e percebi que eu tinha me paralisado. Obriguei-me a engolir, depois espetei outro ravióli e o coloquei para dentro.

— Eu estava vigiando Jessica, sem cuidado nenhum… Como eu disse só você pode encontrar problemas em Port Angeles… E no início não percebi quando você saiu sozinha. Depois, quando notei que você não estava mais com ela, fui procurar por você na livraria que vi em sua cabeça. Eu sabia que você não tinha entrado e que não foi para o sul… E sabia que teria que voltar logo. Então eu só estava esperando você, procurando ao acaso pelos pensamentos das pessoas na rua… Para ver se alguém a notara e eu poderia saber onde você estava. Não tinha motivos para ficar preocupado… Mas estava estranhamente ansioso…

Ele estava perdido em pensamentos, olhando através de mim, vendo coisas que eu nem podia imaginar.

— Comecei a dirigir em círculos, ainda… escutando. O sol finalmente se punha e eu estava prestes a sair do carro e seguir você a pé. E então… – Ele parou, trincando os dentes numa fúria súbita. Fez um esforço para se acalmar.

— Então o quê? – sussurrei. Ele continuou a olhar por cima de minha cabeça.

— Ouvi o que eles estavam pensando – grunhiu ele, o lábio superior se virando um pouco para baixo por cima dos dentes. – Vi seu rosto na mente deles.

Ele de repente se recostou um cotovelo aparecendo na mesa, à mão cobrindo os olhos. O movimento foi tão rápido que me sobressaltou.

— Para mim, foi muito… difícil… nem pode imaginar como foi difícil… simplesmente tirar você dali e deixá-los… vivos. – Sua voz era abafada pelo braço. – Eu podia deixar você ir com Jessica e Angela, mas temia procurar por eles se você me deixasse sozinho – admitiu num sussurro.

Fiquei sentada em silêncio, meus pensamentos incoerentes. Minhas mãos estavam cruzadas no colo, e eu mal me recostava na cadeira. Ele ainda estava com o rosto nas mãos e tão imóvel que era como se tivesse sido entalhado na mesma pedra de sua mão.

Por fim ele olhou para cima, os olhos procurando os meus cheios de suas próprias perguntas.

— Pronta para ir para casa? – perguntou ele.

— Estou pronta para ir embora – habilitei-me abertamente grata por termos uma viagem de uma hora juntos. Não estava preparada para me despedir dele.

A garçonete apareceu como se tivesse sido chamada. Ou estivesse olhando.

— Como estamos? – perguntou ela a Edward.

— Estamos prontos para a conta, obrigado. – Sua voz era grave, mais rude, ainda refletindo a tensão de nossa conversa. Isso pareceu confundi-la. Ele olhou para ela, esperando.

— C-claro – gaguejou ela. – Aqui está. – Ela pegou uma pastinha de couro no bolso da frente do avental preto e entregou a ele. Já havia uma nota na mão dele. Ele a colocou dentro da pasta e a devolveu à garçonete.

— Não precisa de troco. – Ele sorriu. Depois se levantou e eu me coloquei de pé.

Ela sorriu convidativamente para ele de novo.

— Tenha uma boa noite.

Ele não tirou os olhos de mim enquanto agradecia a ela. Eu reprimi um sorriso.

Ele andou ao meu lado até a porta, ainda com o cuidado de não tocar em mim. Lembrei-me do que Jessica dissera sobre a relação dela com Mike, como eles quase chegaram à fase do primeiro beijo. Suspirei. Edward parecia me ouvir e olhava para baixo curiosamente. Olhei para a calçada, grata por ele aparentemente não ser capaz de saber o que eu estava pensando.

Ele abriu a porta do carona, segurando-a para mim enquanto eu entrava, fechando-a suavemente depois que entrei. Eu o observei andar pela frente do carro, maravilhada, novamente, com sua elegância. Eu devia ter me acostumado com isso agora, mas não me acostumara. Tinha a sensação de que Edward não era o tipo de pessoa com quem podemos nos acostumar.

Dentro do carro, ele deu a partida no motor e ligou o aquecedor no máximo. Tinha ficado muito frio e achei que o clima bom estava no fim.

Mas estava aquecida com a jaqueta dele.

Edward entrou no trânsito, aparentemente sem olhar, virando para pegar a via expressa.

— Agora – disse ele sugestivamente – é a sua vez.

— Posso fazer só mais uma pergunta? – pedi enquanto Edward acelerava rápido demais. Não parecia estar prestando atenção na estrada. Ele suspirou.

— Uma – concordou. Seus lábios se apertaram em uma linha cautelosa.

— Bom… Você disse que sabia que eu não tinha entrado na livraria e que fui para o sul. Estou aqui me perguntando como sabia disso.

Ele desviou os olhos, refletindo.

— Pensei que tínhamos deixado as evasivas para trás – murmurei. Ele quase sorriu.

— Tudo bem, então. Eu segui o seu cheiro. – Ele olhou a estrada, dando-me tempo para recompor minha expressão. Não conseguia pensar em uma resposta aceitável a isso, mas arquivei a questão cuidadosamente para análise posterior. Tentei me concentrar novamente. Não estava pronta para deixar que ele encerrasse o assunto, agora que ele finalmente explicava as coisas.

— E você não respondeu a uma de minhas perguntas… – protelei. Ele olhou para mim com desaprovação.

— Qual delas?

— Como é que isso funciona… O negócio de ler a mente? Pode ler a mente de qualquer um, em qualquer lugar? Como você faz isso? Toda a sua família pode…? –Eu sorri.

— É mais de uma – assinalou-o.

Fiz um biquinho

— Não, só eu. E não posso ouvir todo mundo, em qualquer lugar. Tenho que estar bem perto. Quanto mais conhecida for a… “voz” da pessoa, maior a distância em que posso ouvi-la. Mas ainda assim, só a poucos quilômetros. – Ele parou pensativamente. – É meio como estar em uma sala enorme cheia de gente, todos falando ao mesmo tempo. É como um zumbido… Uma buzina de vozes ao fundo. Até que me concentro em uma só voz, e depois o que ela está pensando fica claro.Na maior parte do tempo, fico fora de sintonia… Isso pode me distrair muito. E depois, assim é mais fácil parecer normal – ele franziu a testa quando disse a palavra – quando não estou respondendo por acidente aos pensamentos de alguém, em vez de às palavras.

— Por que acha que não pode me ouvir? – perguntei curiosa.

Ele olhou para mim, os olhos enigmáticos.

— Não sei – murmurou. – A única suposição que eu tenho é que talvez sua mente não funcione da mesma maneira que a mente dos outros. Como se seus pensamentos estivessem na freqüência AM e eu só pegasse FM. – Ele deu um sorriso duro para mim, divertindo-se de repente.

— Minha mente não funciona bem? Eu sou alguma aberração? – As palavras me incomodavam mais do que deviam, provavelmente porque a especulação dele acertara na mosca. Eu sempre suspeitei disso e me constrangia ver tudo confirmado.

— Ouço vozes em minha mente e está preocupada que você seja a aberração – ele riu. – Não se preocupe, é só uma teoria… – Sua face se enrijeceu. – O que nos leva de volta a você.

Suspirei. Como começar.

— Já não deixamos as evasivas para trás agora? – ele me lembrou delicadamente.

Desviei os olhos de seu rosto pela primeira vez.

Mordi o lábio. Ele olhou para mim, os olhos de mel inesperadamente gentis.

— Eu não vou rir – prometeu ele.

— Meu maior medo é que você fique com raiva de mim.

— É tão ruim assim?

— Muito ruim, sim.

Ele esperou. Eu olhava minhas mãos, então pude ver sua expressão.

— Continue. – Sua voz era calma.

— Não sei por onde começar – admiti.

— Por que não começa do início… Você disse que não inventou isso sozinha.

— Não.

— De onde tirou… De um livro? Um filme? – sondou ele.

— Não… Foi no sábado, na praia. – Arrisquei uma olhada para a cara dele. Ele parecia confuso. – Eu estive com um velho amigo da família… Jacob Black – continuei. – O pai dele e Jonathas são amigos

Ele ainda parecia confuso. – O pai dele é um dos anciãos quileutes. – Eu o observava com cuidado. Sua expressão confusa congelou ali. – Fomos dar uma caminhada… – Eu editava todo o meu esquema da história -… e ele me contou algumas lendas antigas… Acho que tentando me assustar. Ele me contou uma… – Eu hesitei.

— Continue – disse ele.

— Sobre vampiros. – Percebi que eu estava sussurrando. Não conseguia olhar a cara dele agora. Mas vi os nós de seus dedos se apertarem convulsivamente no volante.

— E imediatamente pensou em mim? – Ainda calmo.

— Não. Ele… falou na sua família

Ele ficou em silêncio, encarando a estrada. De repente fiquei alarmada, preocupada em proteger Jacob.

— Ele só achava que era uma superstição tola – eu disse rapidamente. – Não esperava que eu acreditasse nela. – Isso não parecia o suficiente; eu tinha que confessar. – A culpa foi minha, eu o obriguei a me contar.

— Por quê?

— Lauren disse uma coisa sobre você… Ela tentava me provocar. E um garoto mais velho da tribo disse que sua família não podia ir à reserva, só que deu a impressão de que queria dizer uma coisa diferente. Então consegui ficar sozinha com Jacob e arranquei dele – admiti, inclinando a cabeça.

Ele me surpreendeu, rindo. Olhei para ele. Estava rindo, mas os olhos eram ferozes, olhando direto para frente.

— Arrancou dele? – perguntou Edward.

— O paquerei. - eu disse

— Gostaria de ter visto isso. – Ele deu uma risadinha sombria. – E você me acusou de deixar as pessoas tontas… Coitado do Jacob Black.

Eu corei e olhei para a noite pela minha janela.

— O que você fez depois? – perguntou ele após um minuto.

— Pesquisei um pouco na Internet.

— E isso a convenceu? – Sua voz não demonstrava interesse. Mas as mãos estavam agarradas no volante.

— Não. Nada se encaixava. A maior parte era meio boba. E então… – eu parei.

— O quê?

— Concluí que não importava – sussurrei.

— Não importava? – Seu tom de voz me fez olhar – eu finalmente tinha rompido sua máscara cuidadosamente composta. A expressão dele era incrédula, com um toque de raiva que eu temia.

— Não – eu disse suavemente. – Não importa para mim o que você é.

Um tom ríspido de escárnio penetrou sua voz. – Você não liga que eu seja um monstro? Que eu não seja humano?

— Não.

Ele ficou em silêncio, olhando para frente de novo. Seu rosto era vazio e frio.

— Você está com raiva – suspirei. – Eu não devia ter dito nada.

— Não – disse ele, mas sua voz era tão dura quanto o rosto. – Queria mesmo saber o que você estava pensando… Mesmo que o que pense seja loucura.

— Então estou errada de novo? – eu o desafiei.

— Não é a isso que estou me referindo. “Não importa”! – o citou, trincando os dentes.

— Eu estou certa? – ofeguei.

— Isso importa?

— Na verdade, não – parei. – Mas estou curiosa. – Minha voz, enfim, estava composta.

Ele de repente se resignou. – Está curiosa com o quê?

— Quantos anos você tem?

— Dezessete – respondeu ele prontamente.

— E há quanto tempo tem 17 anos?

Seus lábios se retorceram enquanto ele olhava a estrada.

— Há algum tempo – o admitiu por fim.

— Tudo bem. – Eu sorri, satisfeita que ele ainda estivesse sendo sincero comigo. Ele me olhou de um jeito cauteloso, como fizera antes, quando se preocupou que eu entrasse em choque. Dei um sorriso largo de estímulo e ele franziu a testa. – Não ria… Mas como pode sair durante o dia?

 


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