Um Lugar para Nós escrita por Jessy Rodrigues


Capítulo 8
Um Novo Amigo


Notas iniciais do capítulo

Então, já está tarde e eu preciso dormir, mas gostaria de deixar um "breve" recado. Algumas leitoras, muito queridas por mim, me mandaram MP e muitos reviews. Eu estava com um bloqueio e só agora comecei a melhorar. Gostaria de agradecê-las pelo apoio, por insistirem na continuação dessa e de outras histórias.
Quando li as mensagens fiquei realmente sem saber o que fazer. Fiquei com cara de tonta, sorrindo para o note e com a fala perdida. As palavras de incentivo, o carinho demonstrado, os elogios... Tudo me deixou extremamente feliz e, mesmo agora, não sei o que falar nem como agradecer.
Aqui deixo meus simples e sinceros agradecimentos a Liz Urcha e Mew San, que tanto insistiram em mim. Mas também para todas as outras leitoras que mandaram reviews e me pediram, mais de uma vez, pela continuação.
Obrigada, queridas, de verdade. Espero que possam ter sentindo minha emoção e minha gratidão pelo que fizeram. Vocês podem não saber, mas foram seus pedidos que me fizeram aceitar algo que eu queria há muito tempo: serei escritora.
Agora vamos para a fic!



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                No dia seguinte, acordou cedo de novo e refez o procedimento da manhã anterior. Toma banho, escova cabelo, cauda e orelhas, enrola fita no corpo, põe uniforme, prende o cabelo com fitas vermelhas e coloca a boina. Nada de maquiagem ou algo que a fizesse chamar a atenção. Sempre o mais discreta possível, não tinha porque tentar apaixonar alguém por ela mesmo, não poderia viver um romance com aquele seu problema...

-Querida, café!

-Não, obrigada. – Bebeu um copo de água e saiu pela porta, agora com uma mochila cinza, já que começariam a usar material.

                Os pais tiveram tempo apenas para suspirar antes dela desaparecer.

                Tentou andar o mais rápido para a escola, assim teria menos chance de ser pega. Quando entrou na sala, estava vazia. Na verdade, a escola ainda estava vazia. Sentou, cruzou os braços e deitou a cabeça. Passou algum tempo até ouvir passos na sala. Suas orelhas de gato se agitaram escondidas pela boina.

-Você chegou cedo mesmo! – Comentou. Zoey não se mexeu. – Oh, você está dormindo? Desculpa.

-Tudo bem, eu não tava dormindo. – Ela respondeu levantando a cabeça e sorrindo minimamente.

-Então não se importa de conversar um pouco?

-Não. – Ela disse dando um suspiro.

-Você vai assistir ao treino de kendô hoje? Normalmente todas as garotas vão.

-Eu nem sabia que aqui tinha kendô! Você vai assistir?

-Na verdade ele pratica, e é o melhor! – Disse um garoto. Provavelmente era amigo e praticava com o moreno.

-Aliás, eu ainda não sei o seu nome.

-Zoey. E o seu?

-Mark. Prazer, Zoey. Então, você vai assistir o treino?

                Ele queria que ela o visse treinando? Era isso que parecia.

-É bem provável que eu vá, mas não dou certeza.

                Mais alunos começaram a entrar na sala e Zoey novamente abaixou a cabeça. Mark estranhou aquele comportamento vindo de uma garota. Nunca tinha visto uma pessoa tão fechada como Zoey. Naquele dia, Zoey não apareceu no treino.

                Os dias passaram rápidos para a felicidade de Zoey. Infelizmente, graças ao seu comportamento estranho, as pessoas na sala começaram a zoá-la. Logo toda a escola estava rindo dela. E esse foi só o começo de seu problema. Um dia, numa aula de educação física, ela entregou o atestado falso para o professor, alegando ter problemas cardíacos.

-Você deveria tentar praticar alguma coisa, está gorda como um elefante!

-E você está magra como um rabo de rato! – Respondeu Zoey à loira do primeiro dia. Como ela era famosa pela escola, mesmo só tendo um pouco mais idade que Zoey, descobriu que seu nome era Berry White Snow. A menina se irritou com isso e passou a atormentar Zoey, sempre falando de como era feia e que estava acima do peso.

                Em casa, Zoey começou a vomitar tudo que comia. Claro, tentava a todo custo que seus pais não descobrissem isso. Ela já não comia e ainda vomitava, seus pais enlouqueceriam. Ela começou a ficar pálida e com aspecto de doente.

                O pêlo da orelha e do rabo, que antes eram brilhantes e sedosos devido aos cuidados da menina, começaram a ficar opacos e feios. Mas ninguém veria aquilo mesmo. Com o tempo, Zoey não queria mais usar a saia do uniforme, saias combinavam com pernas bonitas, e as suas eram horríveis.

                Um dia, quando entrava na sala um garoto gritou algo sobre os gambitos feios, mas não falou nada sobre serem magros. Ela apenas apertou o passo e se escondeu em sua carteira.

-Zoey, você está bem? Me parece doente. – Mark perguntou.

-É que eu estive gripada. É melhor você nem ficar perto de mim, não quero que fique gripado também.

                Mark percebeu que ela não queria conversar e se afastou. Todos se perguntavam como um garoto bonito e popular como ele poderia conversar e querer saber de uma garota estranha como ela.

                O professor de história estava de licença, portanto teriam que ficar na aula de geografia junto com uma outra sala de alunos mais velhos que eles. Mark estava feliz, pois poderia ficar com os amigos.

                O professor de geografia ia passar um vídeo para os alunos de sua sala, e os mais novos iriam junto.

-Certo, sentem-se direito. Tentem, por favor, não conversar durante o filme, é importe e cairá na prova.

                Mark sentou no fundo junto com um loiro, uma garota de cabelo roxo longo e um de cabelo roxo acinzentado. Zoey também estava no fundo, porque era só ali que ainda tinha lugar. Havia uma cadeira entre Zoey e Mark.

-Sabe essa garota aqui? – Mark apontou disfarçadamente para Zoey.

-O que tem ela?

-Adivinha quem é.

-Zoey Hanson. Salvei ela dos caçadores outro dia. – Disse o loiro.

-Espere, ela não falou nada sobre isso.

-Ela nem lembra da gente.

-Por que não contou que tinha encontrado ela? – Perguntou a de cabelo roxo.

-Porque primeiramente achei que estivesse enganado, que ela não fosse a Zoey que conhecemos. Mas então eu descobri que ela apenas não lembra da gente, embora eu ainda não tenha descoberto como isso é possível.

-Ela é muito fechada na sala, não fala com ninguém, está sofrendo bullying e nem conta para o diretor da escola. Ela ta sofrendo calada, devíamos tentar ajudar.

-Ela tem medo que descubram o segredo dela, por isso não faz amizade com ninguém. – O outro garoto se pronunciou pela primeira vez.

-E se falássemos para ela quem somos? – Perguntou o moreno.

-Ela ia achar que é uma brincadeira nossa. Mas tem que haver algum jeito. – Disse a de longos cabelos.

-Hey, vocês aí no fundo, todos para fora, estão atrapalhando quem quer assistir o vídeo!

                Zoey não se levantou, ela não tinha feito nada mesmo.

-Mocinha, vamos, você também.

-Mas, senhor, eu não estava conversando.

-Não quero saber de desculpas, vá se explicar com a conselheira.

                Sem escolha, ela saiu da sala aos tropeços por colocarem os pés para ela cair. Os quatro estavam parados no lado de fora da porta. Mark tinha um sorriso de lamento no rosto, o roxo acinzentado estava de cara amarrada, a roxa estava impassível e o loiro tinha um sorriso feliz. Todos andaram em direção ao escritório da conselheira.

                Quando chegaram lá, dois garotos estavam brincando de pedra-papel-tesoura com expressões de tédio. Um de cabelo verde virou.

-Sardon? O que o irmão exemplo faz na conselheira... E olha, você trouxe seus amiguinhos junto!

-Estávamos conversando enquanto o professor de geografia passava um vídeo. E vocês? – Sardon tinha a expressão de um touro furioso.

-Briga.

-Os dois? – Quase gritou.

-Qual é? Você é o exemplo da nossa família, mas isso não significa que seguimos você...

-Dren, não provoca ele, não quero apanhar mais. – Pediu um de cabelos castanhos amarrados em marias-chiquinhas espetadas. – Ela é uma amiga nova? Nunca vi ela andando com vocês.

-Não sou amiga deles, o professor achou que eu também estava conversando. – Ela disse rude.

-Nossa, você é tão mal-humorada que parece velha!

                Zoey não estava de bom humor naquele dia, nem para ignorar uma criança de dez anos.

-Anão!

-Eu não sou um anão, sua velha.

-Eu não sou velha! – Ela quase gritou.

-Mas age como uma, o que é praticamente a mesma coisa!

                Zoey sentiu o sangue subir a cabeça e avançou para ele. Dren revirou os olhos para a bagunça.

-O que vocês estão fazendo aqui... De novo? – Perguntou uma mulher loira de olhos azuis. Imediatamente Zoey parou de estrangular o menor.

-Problemas, mãe. Quero conversar com você primeiro do que os outros, posso?

-Claro.

                Os dois entraram na sala e o resto sentou nas cadeiras.

-O que houve, Elliot? – Perguntou preocupada – Aquela garota lá fora não é a Zoey?

-É, só que ela não lembra da gente!

-Não lembra? Isso é impossível...

-Não, não é, ela só passou três dias conosco e depois perdemos contato. Eu só queria pedir que você fingisse que não a conhece. As coisas estão ainda piores para nós do que para ela, Zoey não precisa se meter na confusão em que estamos metidos. Sem falar que logo vamos sumir daqui, isso faria mal a ela.

                Elliot ia saindo da sala.

-Ah, antes que eu esqueça, parece que Zoey tem sofrido bullying aqui na escola, mas não tenho certeza.

                Saiu da sala e sentou ao lado dos amigos. Quando faltava apenas Zoey, todos já tinham ido embora.

-Srta...

-Hanson. Sou Zoey Hanson, prazer.

-O que aconteceu?

-Meu professor faltou e nós ficamos com o professor de geografia e com uma sala de alunos mais velhos. Sentei no fundo porque não tinha mais cadeiras na frente, começaram a conversar e o professor achou que eu também estava.

-E você estava?

-Não.

                A moça suspirou.

-Você está muito pálida, tem se alimentado direito?

-Sim, sem problema nenhum. – Mentiu.

-Zoey, acho que você não conversa com as pessoas dessa escola, sempre que te vejo está sozinha.

-É que eu gosto de ficar sozinha, é mais calmo para pensar.

-Apenas tente não pensar muito. – Pediu a loira.

-Posso ir agora? – Perguntou educadamente.

-Sim, tenha um bom dia. Se precisar de alguma ajuda, venha até minha sala.

-Sim.

                “Até parece que eu volto naquele lugar.” – Pensou Zoey.

                Sua última aula já tinha começado, bateu timidamente na porta.

-Onde a senhorita estava? – Perguntou a professora nervosa. – Sabe que está atrapalhando minha aula?

-Eu estava na conselheira. – Falou baixo.

-Onde? Diga alto.

-Eu estava na conselheira! – Disse mais alto. Os alunos riram e começaram a fazer piadinhas sobre ela ser depressiva. Sentou na carteira e abriu o caderno para anotar o que estava na lousa.

                Ao final da manhã, ela estava recolhendo o material quando Mark chegou.

-Desculpa por hoje mais cedo, se quiser podemos explicar que você não estava conversando.

-Não, tudo bem, eu já conversei com a conselheira.

-Estamos indo para um café, você não quer ir?

-Eu adoraria, mas infelizmente eu não posso. – Ela respondeu surpresa de alguém convidá-la para algo.

                O olhar do moreno era pidão e Zoey quase mudou de idéia.

-É sério, fica para a próxima, hoje eu vou ficar na escola estudando. Mas valeu por me convidar.

                A ruiva saiu da sala e a maioria dos amigos do moreno esperava na porta. Desceu vários lances de escadas, já que a escola era enorme, e entrou na biblioteca. Aconchegou-se em uma cadeira e ficou horas lendo sobre matemática, matéria que ela não era muito boa.

                Quando olhou pela janela atrás de si, já estava escuro. Ela saiu da aula meio-dia, e já estava escuro? Foi até a entrada da biblioteca e olhou o horário, sete e cinqüenta e três. Hora de ir pra casa... Na verdade já tinha passado da hora. Pegou o celular na bolsa.

                “Treze chamadas não atendidas... Meus pais vão me matar.”

                Discou o número de casa e esperou que atendessem.

-Oi, mãe? Eu to bem, sim. Não... Calma, deixa eu falar... Eu fiquei estudando matemática e esqueci do horário, me desculpe. Ta, eu já to indo pra casa. É claro que eu to indo sozinha, com quem mais eu iria? Eu sei... Eles não vão me encontrar, relaxa. Ta, tchau.

                A mãe encheria seus ouvidos com perguntas e sermões, nem queria chegar em casa. Caminhou nem muito rápido nem muito devagar, mas de forma que demorasse mais a chegar. No caminho ouviu barulhos vindos de uma moita. Seu coração deu um salto e suas orelhas procuraram pelo som.

                Olhou furtivamente para os lados e para todas as moitas. Os barulhos de pequenos passos nas folhas continuavam. No entanto, os passos eram pequenos e fracos demais para um ser humano, concluiu com alivio. De repente, uma coisa pequena e cinza pula da moita tentando correr. Zoey foi mais rápida e pegou o animalzinho.

-Ora, mas você é só um gatinho! Por que me deu esse susto?

                O gato obviamente não respondeu.

-Nossa, como você está sujo, vou te levar pra casa e cuidar de você, estou mesmo precisando de um amigo.

                O gato começou a se debater e de sua boca saíam miados que vagamente Zoey entendeu como ‘me solta, me solta’.

-O que? Por quê? Será que nem você quer ficar perto de mim? Está bem, você já deve ter dono!

                Zoey soltou o gatinho que correu para um arbusto longe dela. A ruiva suspirou e continuou seu caminho, seria mesmo bom ter uma companhia diferente da dos pais...

-Querida, precisamos conversar! Tudo bem que ficou estudando até agora, mas devia ter atendido o seu celular e nos avisado. – Disse a mãe batendo pé quando ela fechou a porta.

-Mãe, não quero ser mal-educada, mas é que eu realmente to cansada. Minha vista ta ardendo de tanto ler e ainda assim não entendi nada. Se importa se conversarmos amanhã, por favor? – Zoey praticamente implorava.

-Você provavelmente não vai querer jantar, como na maioria das vezes. Zoey, você não tem se alimentado, vai ficar doente e sabe que não podemos nem sonhar em entrar num hospital.

-Eu sei, mas eu to bem, mãe.

                Deu boa noite aos pais e subiu as escadas para o segundo andar. Estava tirando a boina quando percebeu uma sombra em sua janela. Ouviu aquele famoso arranhado que dá arrepio na espinha só de pensar. Abriu o vidro, sentindo o vento gelado.

-Você veio atrás de mim? Que fofo. Vem, pode dormir comigo. – Pegou o gatinho no colo. – Hum, você se importa de tomar um banho?

                Sem trocar de roupa, esfregou bem o gatinho com o próprio xampu de aloe e vera. Ele ficou brilhando praticamente, seu pêlo cinza reluzia. Aqueles olhos azuis felinos dele, já os tinha visto em algum lugar...

-Vou tomar meu banho, volto logo.

                Zoey esfregou o cabelo com o mesmo xampu que usou no gatinho e saiu com a toalha felpuda que ia até abaixo do joelho. Sempre gostou de toalhas grandes.

                Sentou na penteadeira e escovou os cabelos calmamente, e mesmo assim eles continuaram molhados.

-Certo, vou me trocar, vire-se. – Brincou Zoey, mas o gato realmente o fez. – Nossa, você me assustou. Poderiam existir mais humanos como você, cavalheiros.

                Colocou uma calça e blusa rosa clara cheia de morangos. Deitou-se e o gato se aconchegou.

-Ah, você deve estar com fome. Vou buscar alguma coisa, já volto.

                Desceu as escadas pulando de dois em dois degraus.

-Que bom que resolveu comer.

-Vou levar pro quarto, ok? Amanhã eu trago o prato. Boa noite.

                Os pais nem tiveram tempo de responder, ela já tinha batido a porta do quarto.

-Bem, não é de hoje, mas é peixe. Gatos gostam de peixe, né? Eu acho que sim, porque eu sou metade gata e adoro! Também trouxe um pouco de leite para a comida não ficar tão seca, aproveita que ta tudo quente.

                Zoey resolveu que enquanto o gato comia, escovaria as orelhas e a cauda. Quando terminou, escovou os dentes e deitou novamente. Apagou a luz e o medo começou a se apoderar dela. Colocou as mãos nas orelhas e o gato lambeu seu rosto. Ela sentou no escuro.

-Sabe, eu tenho medo do escuro, desde que comecei a ter sonhos com uma creche e um menininho loiro. Antes eu não tinha medo, mas com o garotinho me sentia tão segura, que quando comecei a viver a realidade senti medo do escuro.

                O gato se esfregou nela, como que tentando passar carinho e coragem para ela. A menina deitou e o gato se aconchegou perto de sua barriga.

-Sabe, com você aqui, também me sinto segura, é a mesma sensação boa que tinha com o menininho. Espero que você nunca me deixe, como as crianças do meu sonho.

                Durante a noite, aquele gato se transformou em algo maior, uma pessoa.

-Zoey, sabia que iria te encontrar! Não se preocupe, eu não vou te deixar.

                Fez um carinho no rosto da menina e passou para as orelhas. Ela sorriu tendo sonhado com mais lembranças da creche.


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