"Como bonecas russas que estão uma dentro da outra"

Capítulo 43 - Imersão

 Não, não acabou mesmo. Embora Monalisa não esperasse uma conquista fácil, imaginava ao menos que o objeto que procurava estaria sob o poder do Mestre dos Chaves, no caso, seu próprio pai, Fábio. Infelizmente, as coisas não saíram como o esperado. Se ela não estava sob a custódia dele, onde estava?

- Só pode estar brincando, não é? - diz Monalisa, ainda atônita com o que acabou de ouvir. Ela se senta na cadeira mais próxima, mas nem a brisa marítima e nem a linda visão da paisagem de praia à sua volta iria melhorar seu humor naquele momento - Você tem acesso à infinitas chaves que abrem portais para infinitas dimensões, mas justo a chave que eu preciso você não tem? Como isso?

- Por favor, não fique brava - fala Fábio, enquanto também arrumava uma cadeira para se sentar - Entenda que a chave que você procura simplesmente é capaz de desvelar o falso Labirinto e deixar as coisas completamente diferentes. Por isso ela deve estar guardada em um lugar bastante seguro.

- Lugar seguro? Se você que é o guardião das chaves não pode ficar com ela, que tipo de lugar pode ser ainda mais seguro? - pergunta Monalisa, ainda nervosa e sem entender muita coisa do que estava acontecendo, embora ela estivesse nessa situação desde que aceitou o desafio do Labirinto. Cinthia, a assistente do Mestre das Chaves, parecia achar bastante graça da situação, embora não desgrudasse os olhos de seu aparelho celular.

- Ela fica uma gracinha nervosa desse jeito, não acha?

- Não provoque mais, Cinthia - sugere Fábio - Por outro lado, ficar nervosa não adianta muito quando se está  no Labirinto. Você já devia saber disso.

 A garota suspira, impaciente. Mesmo sabendo disso, era difícil manter a calma em uma situação como aquela. Até quando seus planos iriam se atrasar até sair de toda aquela loucura? Mesmo nervosa, ela tenta escutar as orientações de seu pai (ou tutor, ela não sabia ao certo como deveria tratá-lo).

- É verdade que possuo a guarda de todas as chaves, capazes de abrir e fechar quaisquer portais dimensionais possíveis - prossegue Fábio - Porém, a chave mestra capaz de desvelar o Labirinto é uma chave de grande importância que estaria mais segura em um lugar que você nunca poderia encontrar.

- Um lugar onde eu nunca poderia encontrar? Eu....espere, por que eu?

- Porque você é o único motivo para escondermos a chave - intervém Cinthia - Não precisaríamos fazer nada disso se não tivesse escolhido tentar sair.

 Monalisa olha nervosa para a mulher, mas ela ainda se mantinha concentrada em seu aparelho. Fábio continua sua explicação.

- Seja como for...a chave da verdade que tira essa camada do Labirinto está bem escondida de você, mas isso não significa que você não seja capaz de pegá-la.

- Iria pegá-la mesmo que você não dissesse isso - respondeu Monalisa - Diga logo, o que devo fazer para conseguir a chave da verdade?

- Hmm, ela é bem impulsiva, né? - comenta Cinthia - De longe, você parece tão quietinha.

- Vou até as últimas consequências para conseguir o que quero - responde ela - E...quer parar de me encher? Essa conversa é entre meu pai e eu!

- Que mal criada - lamenta a amante - Esqueceu que eu auxilio o seu pai em organizar essas chaves? Sou mais próxima dele do que você

 E ela tinha razão. Na verdade, Monalisa não podia dizer que era próxima de ninguém.  Nunca fora. Era triste, porém verdadeiro.

- Que seja - diz a loirinha, ficando com mais raiva a cada segundo que passava - Diga, o que eu preciso fazer para conseguir essa chave? O senhor pelo menos sabe onde está, não sabe?

- Sei. Sei sim - responde ele - Embora devo admitir que esteja muito bem escondida.

- Não importa o quanto seja difícil de pegar eu vou dar um jeito. Imagino que exista pelo menos uma possibilidade de pegá-la, não?

- Claro que existe. Tudo só vai depender de você.

- Bem, da minha parte, estou pronta. Basta me dizer o que devo fazer.

- A primeira coisa a se fazer...

- Diga. O que é?

- É se despedir da sua guia.

 Monalisa sente o coração acelerar. Despedir-se de Ariadne? O que ele quis dizer com isso? A loirinha olha para sua guia que apenas ouvia a conversa de forma indiferente. Mesmo após dizer aquilo, Ariadne não parecia se abalar nem um pouco. Pelo contrário, ela apenas confirma o que Fábio acabara de pronunciar.

- Entendo...então chegou mesmo essa hora, não é?

- Do que está falando? Do que ele está falando, Ariadne? Você disse que iria estar do meu lado, não disse? Você prometeu!

- E você prometeu confiar em mim - responde a ruivinha - Não se preocupe. Essa é uma missão que você deve realizar sozinha, mas você não vai precisar de mim lá.

- Lá? Lá onde?

- No esconderijo da chave. É uma dimensão interna ao Labirinto onde a chave que você procura está escondida.

- Dimensão...interna?

- O Labirinto possui várias camadas - completa Ariadne - Essa mesma é uma delas. Mas você pode ter dimensões internas dentro de dimensões internas que podem estar dentro de mais dimensões internas e assim sucessivamente. Como bonecas russas que estão uma dentro da outra.

- Isso quer dizer que...a invés de sair do Labirinto só vou entrar mais fundo nele? - diz a loirinha, se arrepiando.

- E não apenas isso. Você terá que procurar a chave sozinha.

- Sozinha, é? Não existe outro jeito?

- Temo que não - responde Fábio, de forma séria - Bem, claro que você pode deixar as coisas como estão e ignorar o Labirinto. Essa opção sempre existe. Aqui você nunca é obrigada a fazer nada.

- Porque o Labirinto é feito de escolhas. É. Eu sei. Mas eu já fiz a minha escolha.

- Oh - Fábio balbucia alguma coisa, mas Monalisa o interrompe.

- Minha escolha é descobrir a verdade, mesmo que eu tenha que ir às últimas consequências para isso. Estou pronta para qualquer dimensão que você me mandar. Pode ser um vulcão, uma tempestade de neve ou até mesmo o fundo de um oceano. Vou encontrar a chave nem que seja a última coisa que eu faça!

 Cinthia começa a rir, mesmo sem tirar os olhos de seu aparelho.

- Qual é a graça? - estranha Monalisa.

- Nada, nada. Mas a sua imaginação é mesmo surpreendente.

- Do que está falando?

- Eu é que pergunto o que você está pensando. A chave que você quer não é tão fácil assim de achar, como se estivesse no fundo de um oceano ou um vulcão.

- Como?

- Eu diria...que as chances de você encontrá-la podem ser quase nulas - continua Cinthia, com um sorriso malvado.

- Ora, como pode...

- Basta, Cinthia! Monalisa já fez sua escolha! - fala Fábio - Por outro lado, é verdade que encontrar a chave não é bem o que você está pensando, Monalisa.

- Então, como é?

- Bem...você terá que perceber uma coisa. Talvez demore dias, semanas ou até mesmo anos

- Anos? - repete Monalisa - E-Espere...afinal o que tenho que fazer?

- Por que está com medo? - pergunta Ariadne - Não disse que iria até as últimas consequências para sair do Labirinto?

- Mas nunca pensei que isso fosse demorar tanto! - retruca a loirinha - Afinal, o que eu preciso fazer?

- Você saberá logo - responde Ariadne - Mas não precisa se preocupar. Eu estarei segura e esperarei você o tempo que for preciso.

- Ariadne - balbucia Monalisa, ainda sem ter a menor ideia do destino que a aguardava. Seria um lugar tão terrível assim? Uma dimensão tão caótica que demoraria anos para encontrar uma simples chave? Será?

- Como disse, não é bem o que está pensando - diz Fábio, interrompendo os pensamentos dela - Dissemos anos, mas é algo que você pode perceber assim que chegar.

- Por que vocês nunca são claros?

- Bem, se conseguir a chave, conversaremos melhor. Por hora, vamos cuidar da sua viagem.

 Fábio pede a Cinthia a chave para o portal. A mulher abre a maleta imediatamente. O Mestre pega uma das infinitas chaves que guardava e olha para a filha de forma bastante séria.

- Se você conseguir perceber, Monalisa...só perceber o que você já sabe, encontrará a chave imediatamente. Agora..é com você!

- Espere...eu ainda tenho...

 Ela iria dizer que ainda tinha mais perguntas, mas o Mestre das Chaves ativa o evento que a leva direto a uma dimensão estranha e desconhecida. O que ela encontrará lá? Como será essa camada ainda mais profunda? Seria um sonho dentro de um sonho? As respostas viriam apenas quando Monalisa começa a recuperar sua consciência.