Abril escrita por Nebbia


Capítulo 1
One-Shot




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 Nevasca.

 Sua roupa para o local não era uma das melhores. Na verdade, não era nada recomendável. Trajava suas roupas normais, com característica jaqueta militar marrom e botas de cano alto brancas. Tão brancas que confundiam-se com a neve. Neve que chegava quase aos seus joelhos, de tão grossa. Fazia suas botas literalmente se confundirem com a substância gelada.

 À sua frente, apenas mais paisagem albina. O contorno das montanhas e seus pinheiros verde-e-brancos. De cada um de seus lados, árvores menos resistentes ao clima cuja folhagem toda já morrera, restando apenas um tronco de madeira marrom escura, castigada pelos ventos gélidos.

 Não se via civilização.

 Que se danasse a civilização.

 No dia anterior, não saiu do quarto. Apenas de madrugada, quando todos dormiam, para comer alguma coisa. E ainda teve que evitar um dinamarquês bêbado no sofá. Queria que esquecessem de sua existência e que 14 de Abril nunca tivesse existido.

 Mas existiu.

 E o telefone também existia.

 E gente sem noção.

 Primeira bomba do dia: “ Lembre-se de não fumar hoje, Aisu!“ Autor: Dinamarca. Claro, sempre Dinamarca. E os outros, sem saberem o que fazer, ficaram apenas quietos. Todos. Porque, no fundo, também se mordiam de soltar algum comentário. E aquele tipo de silêncio, ele também não gostava.

 Segunda: Na verdade, foi uma bola de neve de bombas via a maravilhosa invenção de Graham Bell de nome telefone. Prússia: “ Liguei pra te agradecer, Ice!“

 “ É? Hvers vegna?“, sua voz saía monótona, querendo afugentar o maldito prussiano.

 “ Por sua causa, não pude ser forçado a visitar Rússia!“, e, com uma gargalhada, desligou.

 Colocou o telefone no gancho com brutalidade, irritado. Tocou logo depois.

 Espanha: “ Espero que não dê mais uma gafe hoje! Prometi a Romano que ia visitá-lo!“

 Belarus: “ Se você criar outra barreira de cinzas entre mim e meu Nii-chan, Ice....“

 Desligou na cara dela, com calafrios.

 Suíça: “ Eu devo me preocupar?!“

 “ Nei... “

 “ ÓTIMO!“, desligou.

 RÍÐA!

 Por isso, pegou a jaqueta e deu o fora de casa, sem falar nada à família. Andou afundado em pensamentos até se dar conta de que não sabia onde estava. E que uma nevasca forte ocorria. Mas não era importante; estava acostumado o bastante com o frio para não se incomodar com aquele.

 Acharia algum sinal de vida mais cedo ou mais tarde.

 Só queria que aquele dia acabasse...

 Parou. Olhou em volta.

 O caminho formado pelas árvores despidas pela estação abruptamente terminava em um paredão de mais troncos sem vida. Se quisesse continuar, teria que passar pelas árvores, no lugar onde, em dias mais quentes, era uma floresta.

 Olhou para trás, refletiu e adentrou o bosque.

 Por um momento, ouviu apenas o som dos próprios passos, seus pés afundando na neve fofa. Era algo até gostoso de se ouvir, um barulho tranquilizante...

 Até que este foi multiplicado por dois. A cada passo que dava, ouvia uma espécie de eco. Outro passo. E, quando parou, viu que este continuava por um momento até imitá-lo e parar também.

 Seu coração, este começou a bater forte. Ficou paralizado, congelado; corria, ficava...?

 Decidiu correr. Pelo estúpido instinto de sobrevivência, decidiu correr pela vida, ouvindo passos apressados atrás de si logo depois. Imaginou logo a imagem de um lobo negro do tamanho de Suécia afundando suas imensas patas na neve fofa enquanto perseguia sua presa . Fenrir. Igualzinho a Fenrir. E, uma vez fazendo essa conexão, começou a rezar mentalmente para que Týr percebesse que o demônio se libertara e fosse lá salvar sua vida. Esperava que ele tivesse grilhões reserva.

 “ Iceland-Kun!“

 ... Fenrir não falava. E, se falasse, duvidava que sua voz fosse algo parecido com aquilo.

 Virou-se, quase caindo de costas ao ver o russo tão perto.

 “ Priviet, Iceland-Kun!“, ele sorria.

 O islandês ficou um instante parado, sem saber o que fazer ou falar. De todos os lugares do mundo, não entendia como o destino pôde ser tão irônico a ponto de fazer ambos se encontrarem ALI.

 Não que não gostasse de Rússia. Do contrário, ele ajudou-o diversas vezes quando esteve doente ou com problemas financeiros. Não era aquele o motivo. Era o local e o dia. Estava estressado o bastante para soltar cobras e lagartos que o fizessem ativar seu lado... Estranho.

 “ Rússland...“, finalmente falou, “ O que... Faz... Aqui?“

 Evitava olhá-lo nos olhos. Sua felicidade era um tanto desconcertante, sempre foi. Mas, vez ou outra, olhava-o pelo canto do olho. Foi quando viu seu sorriso desaparecer por um breve momento.

 O russo sentou-se na neve, apoiando as costas em um dos troncos. Um tronco largo, provavelmente de décadas de idade. Quem sabe mais de cem.

 “ Passeio, da! Você está no meu território, não sabe?“

 Arregalou os olhos. Andara tanto que havia entrado em território russo e nem se deu conta disso.

 É, estava longe do mundo.

 “ ... Nei.“, sentou-se também, de frente para ele. Não haviam muitas árvores do seu lado, de modo que não conseguiu encostar as costas em nada. Cruzou as pernas para não precisar de apoio, pegou um galho e ficou a brincar com a neve.

 “ Iceland-kun, se quiser se apoiar em alguma coisa, venha do meu lado, da!“, Rússia jogou-lhe um olhar amigável. De fato, havia lugar o bastante no tronco daquela árvore para ambos.

 Levantou-se e desabou ao lado do russo. Acima de ambos, o céu adquiria uma coloração roxa, quase preta. Havia uma lua cheia alta que iluminava os arredores com ceu círculo prateado, que permitia que vissem melhor a cor que a rodeava. Realmente, um roxo quase preto. Quase.

 Ficaram um instante em silêncio, olhando para cima.

 De repente, Islândia sentiu o peso do olhar de Rússia sobre si.

 “ E hoje... É um dia especial para você, aha?“

 O albino assentiu com a cabeça.

 “ Como se sente?“

 “ Como alguém se sentiria sabendo que faz um ano que seu vulcão explodiu e espalhou suas cinzas pela Europa toda, parando o tráfico aéreo.“

 Silêncio.

 Rússia baixou o olhar.

 Repetinamente, Islândia lembrou-se de uma coisa. Que poderia ser também o motivo de encontrá-lo em um lugar tão estranho para uma “caminhada“.

 “ Você....!“

 O russo assentiu lentamente.

“ Dia 26. De abril. De 1986.“

 O albino mordeu o lábio inferior.

 E ele? Como se sentia? Como se sentia alguém que sabia que fazia 25 anos que sua usina nuclear explodiu e espalhou sua radioatividade pela Europa toda, matando milhares sem que pudesse fazer nada a respeito?

 Estava sendo estúpido se importando com um vulcão que nem matou ninguém.

 “ A... Afsakið mig...“

 Ele voltou a sorrir. Passou a mão pelas costas e braço do islandês de modo que pudesse apertá-lo de leve contra o próprio corpo. Não chegou a abraçar, mas foi o suficiente para deixar o albino estático. Por Odin, as mãos daquele russo pegavam seu ombro todo...!

 “ Não tem problema, Iceland-kun! Da...“

 Relaxou os músculos. Nunca havia problema algum com ele. Nunca se desentendera com Rússia. De certo modo, sentia-se confortável com sua companhia. Passavam pela mesma situação; ele não o irritava e ele não tinha vontade de mandá-lo pular no Hekla como fez com todos naquele dia.

 Olhou para o céu novamente.

 “ Rússia...!“, apontou para as cortinas de luzes de várias cores que se moviam tendo como fundo o céu repleto de estrelas, já imerso na negridão, “ Eu... Não sabia que você tinha.“

 O russo olhou para o céu. Para as auroras boreais.

 “ Eu tenho, da!“

 Ele não havia largado seu ombro ainda. Encostava na laretal de seu corpo e o islandês, dominado pelo cansaço, sentiu uma imensa vontade de apoiar-se nele e fechar os olhos.

 Não tinha a menor vontade de voltar para casa.

 Lembrou-se de quando era pequeno, no meio da noite, era acordado por Noruega e levado para fora de casa para assistir ao mesmo show de luzes. E o norueguês pressionava os ombros do menor contra seu corpo, exatamente como Rússia fazia naquele momento. Exatamente daquele jeito.

 “ Iceland-Kun....?“, o russo sentiu-o apoiar a cabeça em seu ombro.

 “ Hm...?“, respondeu o outro, semiconsciente.

 Rússia ajoelhou-se ao seu lado. Passou os braços por baixo de seu corpo e levantou-o, também levantando o próprio corpo. Islândia envolveu seu pescoço com os braços e apertou-o forte, assustado com o movimento brusco.

 “ O... O que é isso?! Me coloque no chão!“

 “Você vai dormir comigo, da!“, virou-se e começou a andar carregando o islandês que não parava de espernear.

 “ Não é engraçado, Rússia!“

 Ele ria em resposta, apertando o albino contra o peito, limitando seus movimentos.

 “ Quem sabe não para você, aha!“

 Haviam saído da floresta. O som do vento uivando ao redor de ambos e as pisadas na neve, tudo voltou a ser a música principal.

 Aos poucos, desistia de lutar contra o russo. Apoiava a cabeça em seu ombro e deixava que fosse carregado.

 Precisava visitá-lo no dia 26 de abril. Precisava retribuir seu favor e distraí-lo de alguma forma. E que se danasse o resto do mundo.

 Sim, a última coisa em que pensou antes de cair no sono era que o mundo podia se danar.


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Notas finais do capítulo

Aaaarr, então, é isso. Como eu disse, foi fraquinho. Eu avisei. Agora não vão deixar comentários dizendo que esperaram algo diferente!



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