O que mais Temia escrita por MiraftMaryFH


Capítulo 23
Bloqueio Nostálgico


Notas iniciais do capítulo

Continua sendo o ponto de vista do Josh, genteee ;DEspero que gostem do capítulo :)Vou já avisando que é muito tenso... desde o acidente da Brea que os momentos cómicos dimuiram xD... eles voltam em breve... quando ela acordar... upsss é melhor não dizer mais nada, né?? aahahahahahah :D



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Sabem aquela sensação de que podemos ver tudo à nossa volta? Avistar tudo o que se está a passar? Mas não puder fazer absolutamente nada? Sim, eu sei o que é essa sensação e não é de agora…

Quando tinha 11 anos, numa das muitas festas que os meus pais organizavam, eu tinha acabado de comer. Vocês devem saber… que quando somos crianças e ainda mais com a idade que eu tinha, ficar quieto e ouvir conversas sobre filiais, graus de independência do poder político, corrupção, inflação era algo que não me interessava de longe e que continha palavras que iam muito além do meu vocabulário de Mattel CD “Liga da Justiça” do Super-Homem, a minha colecção mais interessante aos olhos dos que fingiam importar-se. Então, sendo uma criança como todas as outras, irrequieta e muito agitada, decidi ir para a piscina. É claro que quando temos 11 anos também não ouvimos, ou pelo menos não prestamos atenção quando falam sobre indigestão ou congestão estomacal, por isso o facto de ter acabado de comer, não me preocupou nada. No entanto, é incrível como tudo pode mudar em questão de segundos, minutos… Eu apenas sei que estava a nadar… ou, bem … se não era nadar, era algo muito parecido, mas que, como o médico viria a explicar futuramente, estava a exigir esforço e movimentos dos músculos o que me fez entrar numa espécie de “paragem corporal”, que é mais conhecida por indigestão. Tudo o que aconteceu, eu não me lembro, só vos posso dizer que num minuto estava a boiar na superfície, movendo os braços e as pernas e no outro momento, estava submerso na água, com os olhos abertos, sem conseguir voltar acima, e com o meu corpo totalmente petrificado… é como se tivéssemos levado um choque, mas nós nem sentimos dor ou algum alerta que signifique isto. De qualquer modo, se não fossem os gritos desesperados da minha mãe, ao ver-me paralisado na piscina, provavelmente não estaria aqui hoje, a passar pelo mesmo, pela segunda vez. É claro, que agora não estou numa piscina; consigo respirar muito bem; e não estou a sofrer nenhuma indigestão… mas é algo o suficientemente parecido para me sentir tão ou mais aflito do que quando tinha 11 anos. Neste momento, os meus braços ainda estão esticados, como se eu ainda tivesse aquele corpo neles, e ainda me encontro sentado no duro alcatrão manchado com o sangue dela. Alguns chamar-me-iam cobarde; os machões, mariquinhas; os românticos dir-me-iam que talvez me entendam… mas, na verdade, nem eu sei o que pensar. É como a indigestão, parece que cada parte do nosso corpo está bloqueada para o nosso controlo… até ao momento, é claro, que alguém surge para nos salvar; quando tinha 11 anos senti um puxão para a superfície… hoje, senti alguém amarrar-me nos ombros e abanar-me, à espera de alguma reacção…

- Menino Josh… - o Rony, tentava me incentivar a tomar alguma iniciativa – vamos para casa?

Olhei-o como se fosse o mais estranho ser humano de todo este imenso planeta… Como é que ele podia pensar em ir para casa? Como é que ele podia, sequer cogitar na ideia de eu me ir embora sem ela comigo? Em pequenos segundos, fui ainda capaz de ver a ambulância partir, à minha frente, bastante rápida, a fazer bastante barulho para que lhe dessem passagem, o que significava urgência… mas mesmo esses “bastantes”, para mim não eram suficientes.

- Não, Rony. Vamos para o hospital… - Ainda vi o Rony experimentar uma cara de incredulidade, espanto e surpresa, seguida de incerteza… se isso era mesmo o certo… Mas para mim, não havia nenhuma espécie de incerteza, eu estava suficientemente determinado para mover mundos e fundos, só para puder estar ao lado dela, e acreditem… disso ninguém me iria impedir. – Agora- E mal pronunciei estas palavras, levantei-me tão acelerado, o suficiente para me causar uma tontura incrível, e dirigi-me para o carro em passo rápido, com o Rony no meu encalço. – Para que hospital, Rony? – Perguntei. Eu havia estado tão submerso em pensamentos, lembranças e esperanças, que nem sequer sabia ainda para onde ela tinha ido… mas fosse onde fosse, eu iria ter com ela.

- O que o leva a pensar que eu sei qual é o hospital? – Olhei para o Rony, sem nenhuma paciência para charadas ou incertezas. – Desculpe, menino Josh, mas não sei se é o certo…

- Rony, eu sei o que é o certo para mim… E eu tenho a certeza de que se eu não estiver ao lado da Brea nos próximos 10 minutos, não vou querer estar em mais lado algum. – Disse tão determinado no inicio que as últimas palavras pareciam trémulos sussurros, devido ao meu medo.

- Tudo bem. – Não é que ele estivesse de acordo com o que eu tinha dito. Ele apenas sabia que não havia qualquer solução para além da que eu apresentava, porque eu até posso ser aquele menino mimado que tem tudo o que quer, mas isso levou-me a possuir uma qualidade, que pode ser suicida, ou seja, um defeito, de que quando quero algo, não desisto até o ter. Por outras palavras, o Rony bem que me podia ter deixado em casa, trancado num quarto e ter deitado a chave fora; mas ele sabe tão bem quanto qualquer um que me conheça, que eu esquematizaria uma maneira de sair pela janela e ir para o hospital, nem que fosse com os patins da Myriam ou a bicicleta da Marie.

O estabelecimento de saúde mais perto do local onde ocorreu o acidente era uma clínica privada; a clínica em que tanto o meu pai, quanto o pai da Brea são sócios. Não era longe, o que me fez ficar mais descansado, pois este facto somado à velocidade da ambulância, para além de me indicarem um mau factor, de possível estado grave, também me indicavam que ela seria tratada rapidamente.

Apesar de ser o local onde o meu pai trabalhava, só aqui vim quando precisava, como qualquer outra pessoa, ou seja, quando estava doente, ou ferido, ou lago do género. No entanto, a maior parte dos enfermeiros e, principalmente, médicos conheciam-me e para justificar a cara assombrada de cada um deles, eu poderia apostar que também conheciam a Brea.

- Josh… - O Gerald era um médico da mesma área que o meu pai - neurocirurgia - e, provavelmente, como eu vim a descobrir a apenas algumas semanas, da mesma área que o pai da Brea. – O que fazes por aqui?

- Eu… queria saber de uma pessoa… Ela acabou de sofrer um acidente e… - As palavras tremiam-me na boca e eu nem sei como o Gerald percebeu o que eu disse.

- Ahh, por acaso estamos a falar da filha do Leonardi, estou certo? – Ele parecia compreensivo, como se soubesse de tudo… - Senta-te meu rapaz… - Ele indicou uns sofás de veludo preto… eu queria gritar-lhe e mostra-lhe a gravidade da situação, de que a rapariga que eu amo está lá dentro, provavelmente em estado grave e eu estou aqui sem notícias e sem acção, mas dei por mim a sentar-me, desajeitadamente, devido à tremura de todo o meu corpo tenso. Acenei de resposta à sua pergunta e tentei murmurar algo para confirmar a sua suspeita, mas nem isso consegui. No entanto, acho que o aceno foi o suficiente para o Gerald entender. – Acalma-te Josh. Estás muito nervoso… eu sei que não deve ser fácil, mas precisas de te acalmar, senão não te posso dizer o que se passa.

Voltando às perguntas… sabem aquela sensação de que temos que fazer um esforço sobre-humano? Digo… como se fosse uma coisa que parece ser o suficientemente fácil para se fazer numa questão de segundos, no entanto é algo que nem sabemos como começar para o conseguir fazer, porque simplesmente há lágrimas que querem correr pelos meus olhos, uma aflição para saber do estado dela e uma ansiedade enorme de puder ouvi-la gritar: “O QUE É QUE ESTE IDIOTA ESTÁ AQUI A FAZER?”. Mas se tudo isto vai ajudar-me a saber sobre ela, é por ela que o faço…

Quando estou visivelmente mais calmo, o Gerald certifica-se de que estou mesmo bem, o que me faz voltar a ficar angustiado. – É algo grave? Porque se não fosse, não estarias tão preocupado em ver se eu estou calmo – Disse rapidamente. Queria poder olhar para a cara dele, para mostrar o quanto estou desconfiado da maneira como ele está a agir, mas tudo o que consigo fazer é sustentar o olhar nas minhas mãos, que só agora reparei… que estão com leves manchas de sangue…

- Acalma-te, Josh. Só quero que te acalmes, estavas muito nervoso.  – Ele continuou a dizer, mas ainda não disse nada que eu quisesse realmente ouvir, o que me interessava. Olhei para ele como se implorasse para parar de jogar e me dizer se ela estava bem. – Bom, não posso dizer muito porque quando chegou, ela foi logo encaminhada para a sala de cirurgia.

- Cirurgia? – Perguntei alarmado.

- Calma, sim? Sim, cirurgia. Aparentemente, ela sofreu uma lesão torácica e, por consequência, isso pode ter levado a alguma fractura, como na bacia, ou em arcos costais inferiores ou vértebras lombares, por exemplo. Mas é algo que eu não tenho a certeza, só especulações. Neste momento, os médicos já devem ter o relatório dela, mas posso dizer-te com certeza, que ela vai ter que passar por uma cirurgia abdominal.

As palavras pareciam soltas, de uma frase sem sentido, como um daqueles puzzles de 1000 peças, muito pequenas, que nunca mais acabam… todas espalhadas, e eu não sei por onde começar para juntar tudo na mesma frase. A informação vai, então sendo processada e eu vou assimilando as coisas. Cirurgia; possíveis fracturas; abdominal; lesão…

- É grave? – Perguntei, depois de alguns minutos.

- Lamento tanto… - Ele disse lentamente, não sei se estava a sussurrar para si ou se estava a responder à minha pergunta – Nem sei como dizer ao Leonardi…

- Não será melhor esperar até ter o diagnóstico confirmado? – Perguntei, mesmo sei notar.

- Posso esperar, mas não posso evitar. Mais tarde ou mais cedo, ele terá que saber, com ou sem confirmação de diagnóstico. – Dizendo isso, o Gerald levantou-se e foi buscar café.

O Rony apenas me deixou na clínica e seguiu para casa, para avisar os meus pais. Mas haviam muitas mais pessoas envolvidas nisto do que os meus pais, que nem tinham tanta ligação, talvez o suficiente para ficarem abalados e angustiados com a notícia, mas não em tão profundo choque como o irmão da Brea.

- Vou ligar ao irmão dela… - Eu disse ao Gerald, e pela segunda vez naquele dia, alguém me cedeu, mesmo que sem concordar muito com a ideia… mas sendo a percepção mais acertada, não poderia fazer mais nada.

Esperei aqueles sucessivos “bips” que me sinalizavam que estava a chamar, mas não consegui falar com o John. Nem na primeira… nem na segunda e nem na terceira tentativa, mas era urgente e eu sabia que ele estava a ouvir o telemóvel, pois ele tocava até chegar à caixa postal. Mas eu iria continuar a ligar, até que ele atendesse… até porque eu não tinha nada mais para fazer naquele hospital, a não ser desfrutar da companhia silenciosa de alguns médicos que estavam fora de serviço e que conheciam a Brea e o Dr. Leonardi. Já estava a desistir da quinta ou sexta… não sei, já perdi a conta das vezes que liguei para o John, quando uma voz de choque, abalada e frustrada por alguém, no caso eu, ter estragado o seu momento de reedificação e paz interior, soou do outro lado da linha… Por momentos, cheguei a interrogar-me se ele já sabia do que se tinha passado, porque o tom de voz dele estava trémulo, mas logo descartei essa ridícula hipótese, porque caso ele soubesse, estaria a espancar algum enfermeiro ou médico para saber alguma informação da Brea. Porque por mais que ele discuta com a irmã, eu sei que a ama, caso contrário eu não teria ganho um olho roxo… mas não é esse o ponto. Na verdade, nada desta conversa interior do meu pensamento é o ponto. A questão é como dizer ao John que a sua única irmã teve um acidente grave e que neste momento está numa sala de cirurgia… As palavras não me saiam e quando eu pensei que tinha dito alguma coisa, reparei que mantinha a minha boca fechada…

- Josh, sinceramente, se me ligaste para ficar calado, vou pedir-te para não o fazeres mais. Neste momento tenho que encontrar a minha irmã e estou a passar por um momento complicado e… bem, se não vais dizer nada, vou desligar.

Em pequenas fracções de segundo, fui assimilando as palavras, outra vez. Momento complicado… Eu queria dizer-lhe que sabia onde estava a Brea, sabia o que tinha acontecido com ela e tudo mais, porém mais uma vez naquele dia, encontrei-me bloqueado pelos músculos do meu corpo… Mas, eu precisava arranjar forças, sabe-se Deus onde… mas necessitava disso… e no último segundo da chamada, fui a tempo de sussurrar… - John… eu…

Mas as forças ainda não eram suficientes para que eu forçasse palavras a sair… Na verdade, não entendo… depois de todo este tempo à espera que o John atendesse, ouvindo os sucessivos “bips” da chamada, eu tive tempo para pensar no que iria dizer e como o ia fazer, mas agora falando com ele… não estava, sinceramente, a conseguir.

- Tu o quê, Josh? Sabes dela? Aconteceu alguma coisa? – Subitamente, à tristeza e frustração do John, juntou-se um alerta puxado de uma preocupação extrema, que eu reconheci na sua voz…

Ele estava à espera… e eu precisava falar agora, antes que ele desligasse. – Eu… e ela… nós estamos no hospital. – Sussurrei por fim, muito trémulo, num só fôlego e tão baixo que eu duvidei muito que o John tivesse ouvido… mas ele ouviu. E no pequeno instante a seguir, tudo o que pude ouvir foi a continuação do pequeno som, que já começava a ser irritante, mas que me tinha acompanhado desde que tomara a iniciativa de ligar ao John. Neste momento, encontrava-me, de novo, no sofá de veludo preto, novamente bloqueado, com o telemóvel ainda na minha orelha, como se ainda pudesse fala com alguém, a ouvir os sucessivos bips que indicavam que a chamada estava terminada.


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