The Last Secret escrita por The Escapist


Capítulo 7
06




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/136064/chapter/7

UM GAROTO de aproximadamente seis anos andava tranquilamente pelas ruas de Nova Iorque, segurava firmemente na mão enluvada da mãe, e olhava de vez em quando para o seu rosto emoldurado por cachos de cabelos castanhos, como se quisesse ter certeza que ela continuava ali ao seu lado. Ele sentiu um leve puxão no braço e quando olhou, ela sorriu, segurando-o para que não avançasse o sinal que acabara de abrir.

— Verde, os carros passam, lembra? — disse-lhe a mãe, afagando com a mão livre seus cabelos. O garoto apontou com sua mãozinha gorducha um dos taxis amarelos que passava, e depois, quando o sinal fechou novamente, sua atenção se concentrou no enorme carro preto que parara quase em cima da faixa.

— Papai — disse o garoto apontando a limusine.

— Não é o papai, querido — a mão falou, e atravessou a rua com o filho, que continuava olhando para o carro. — O papai está esperando por nós em casa. E ele não pode saber que nós fomos ao museu, está bem? — O garoto assentiu, não entendia por que, mas sabia que o pai ficava chateado quando a mamãe saía de casa, principalmente quando ela saía sem a companhia dos seguranças; ele não contaria nada, porque adorava passear com a mãe e também porque não queria ver o pai chateado, ele sempre ficava bravo quando estava chateado.

Mas quando voltaram para casa, felizes e exaustos, encontraram o pai esperando na grande escada da frente; o sorriso no rosto da mãe foi se apagando devagar; o papai estava bravo, era possível ver pelo jeito como as narinas dele pareciam maiores.

— Vá para o seu quarto, Scott — disse ele com aquela voz fria e autoritária. Embora assustado Scott apertou ainda mais a mão da mamãe. — Você ouviu o que eu falei, Scott? — O menino balançou a cabeça. — Anda, vai logo para o seu quarto, eu e a sua mãe precisamos conversar. — Ele não ia conversar, e Scott sabia, e uma coragem surgiu no coraçãozinho do garoto.

— Não vou deixar que você brigue com a mamãe — disse ele, o pai deu uma risada, entretanto, ele não parecia estar se divertindo, seus olhos pareciam irados.

— Ninguém vai brigar com ninguém, Scott. Agora, obedeça ao seu pai.

— Não.

— Scott, querido, obedeça ao seu pai — a mãe pediu, e o garoto viu que seus olhos já estavam rasos d’água, ela também sabia que ele não queria conversar.

— Não, não vou deixar você machucar a minha mãe.

— Pare já com essa bobagem, moleque. — O pai de Scott o agarrou pelo braço, apertando com força; o menino fez uma careta de dor, mas se recusou a deixar que as lágrimas caíssem.

— Solta, tá me machucando.

— Você está merecendo uma boa lição — o pai falou, e havia uma fúria assustadora nos seus olhos enquanto ele olhava diretamente para a mãe de Scott.

— Nicholas, não, por favor.

— Foi você quem causou isso, querida, você não educou o nosso filho da maneira certa, você criou um moleque atrevido e desobediente — Nicholas falava enquanto apertava ainda mais o braço do filho, Scott não aguentou mais conter as lagrimas.

— Para, por favor, Nicholas, por favor. — A mãe pedia, implorava, mas Nicholas arrastou o garoto para o quarto e trancou a porta.

Enquanto sentia as profundas dores do cinto do pai batendo em suas pequenas costas, Scott ouvia o choro da mãe no lado de fora e as batidas na porta.

Scott Summers acordou. Percebeu que mordia o travesseiro e tinha feito xixi na calça. Mesmo depois de todo o dinheiro que o pai gastara com os melhores psicólogos aquele pesadelo continuava a assombrá-lo; ele deveria saber que algo daquele tipo ficava para sempre na cabeça de uma criança, não importava quantos anos tivessem passado.

Ele levantou, pegou outro pijama no armário, e foi ao banheiro se trocar; acordar molhado por outros motivos poderia ser compreensível, mesmo para ele, mas mijar nas calças seria a ruína total para sua reputação. Scott Summers, o gostosão de Harvard faz xixi na cama, pensou, imaginando o que seus amigos diriam se soubessem, o que as garotas que corriam atrás dele diriam se o vissem com o pijama molhado. Não importa, o Scott que eles conheciam não era aquele mesmo, eles conheciam o Scott Summers, bonito, inteligente, conquistador e esnobe, aquele de quem seu pai sentia orgulho, alguém em quem o pequeno Scott tinha se transformado.

Resolveu parar de pensar naquilo, de alguma forma estava acostumado com a dupla personalidade. Em público era do orgulho do pai, fingia se interessar pelos negócios, fingia gostar das coisas que o pai considerava importante, era bom nos esportes e tratava mal as garotas; mas quando estava sozinho gostava de livros de arte e simbologia. Se sua vida tinha que ser assim, ele aceitava; gostaria de poder ir embora, mas não deixaria sua mãe naquela casa sozinha com o pai nem por um dia. Desde aquele dia do passeio ao museu, ele prometera proteger a mãe, e estava cumprindo essa promessa.

Desceu as escadas, e foi até a cozinha, esquentou um copo de leite e bebeu com achocolatado; deixou o copo sujo em cima da pia de aço inox e quando voltava para a sala, percebeu que havia vozes na biblioteca. Olhou para o grande relógio no alto da escada — era um relógio antigo, que fora trazido da Escócia, como tudo naquela casa, afinal, seu pai vivia na América há anos, mas os costumes continuavam britânicos —, marcava três horas da madrugada. Um pouco tarde para uma reunião, pensou Scott, ao mesmo tempo que a voz de Nicholas voltou a se alterar.

Contrariando o bom senso que lhe mandava voltar para o seu quarto e não se meter em assuntos do pai, Scott caminhou na ponta dos pés pelo corredor que dava acesso a biblioteca; a porta estava entreaberta, ele ficou escondido observando. Seu pai estava de pé, atrás da mesa de carvalho da era vitoriana, já estava de pijama e usava um robe por cima; pelo modo como tinha as narinas dilatadas, Scott sabia que ele estava muito irritado, e o alvo de sua irritação aparentemente eram os dois capangas que estavam de frente para ele, de costas para Scott, que os reconheceu mesmo assim: Davidson e Smith, que serviam à família desde que se mudaram de Nova Iorque para Boston.

— Uma coisa tão simples, e nem isso vocês conseguem fazer direito — esbravejava Nicholas. Davidson e Smith se entreolharam, como se cada um deles esperasse que o outro explicasse ao chefe o que não tinha sido bem feito; eles tentaram, mas o chefe disse que não queria que chamassem atenção, e a garota entrou numa casa antes que pudessem alcançá-la, mais uma vez. — Onde vocês disseram que a garota foi?

— A casa de... — os dois começaram ao mesmo tempo, e depois de uma indecisão, que claramente deixou o patrão um pouco mais irritado, Davidson continuou. — Nós fizemos exatamente como o senhor mandou, seguimos a garota, sem chamar a atenção, mas ela foi para a casa de um professor, senhor.

— Que professor?

— Robert Langdon.

— E não saiu mais de lá? — Davidson abanou a cabeça.

Scott se esgueirou para mais perto quando ouviu o nome do seu professor de Simbologia, ao fazer isso bateu na armadura de cavaleiro medieval que ficava na porta da biblioteca; nesse instante Nicholas levantou a cabeça, mas ao olhar para a porta não viu ninguém, a não ser Sniff, o velho cachorro de Scott entrando na biblioteca.

— Animal idiota — disse Nicholas com uma careta de nojo.

O animal de estimação de Scott tinha sido recomendação dos psicólogos quando ele era criança; Sniff farejou pela biblioteca, mas saiu logo, atraído, certamente pelo cheiro do dono. Nicholas fez um gesto com a cabeça e Smith foi imediatamente fechar a porta, embora não achasse que o cachorro pudesse ouvir alguma coisa; felizmente ele era um tapado, pensou Scott, encolhido atrás da armadura, torcendo para Sniff não voltar. Era ridículo agir daquela maneira na própria casa, mas apesar de há alguns anos ter superado em vários centímetros a altura do pai, tinha que ser honesto consigo mesmo, ainda temia a fúria daqueles olhos.

Depois que Smith fechou a porta, Scott não conseguiu ouvir mais que sussurros da voz do pai, sem entender nenhuma palavra. Nicholas demorou cerca de quinze minutos trancado na biblioteca com os dois seguranças. Ao ouvir os passos se aproximando, Scott se escondeu atrás da escada e esperou até que a casa voltasse a ficar silenciosa, então voltou ao escritório do pai.

A primeira vista não havia nada estranho, apenas aqueles documentos idiotas do trabalho, mas Scott ouvira o nome Robert Langdon, e certamente o professor de Simbologia não tinha nada a ver com os negócios do pai. Havia algo ali, pensava Scott ao mesmo tempo que olhava para o quadro de Christian Delacroix na parede.

— O cofre.

Onde estavam trancados os maiores segredos da família. Ao fazer dezesseis anos, Scott recebera do pai a senha para acessar o cofre, era uma tradição. Naquele mesmo dia, ouviu um sermão estúpido, quando seu pai lhe disse que ele poderia ter qualquer coisa que quisesse, desde que honrasse o nome da família. Entretanto ele nunca abrira o cofre, nem se interessava pelas coisas que seu pai julgava como mais importantes; até aquele momento os segredos dos Dickson não lhe interessavam, agora sentia uma curiosidade crescente, afinal qual segredo do seu pai poderia ter algo a ver com o professor de Simbologia?

Scott foi até a porta para certificar-se que nenhum dos seguranças estava rondando a biblioteca, trancou, e desligou o alarme antes de tirar o quadro da parede. Segurança máxima, pensou, enquanto digitava os dezesseis primeiros números no teclado touch screen; qualquer um errado disparava um alarme, e ele levaria um tiro antes que pudesse pensar no que tinha acontecido. Digitou o último número e teclou enter. A mensagem SENHA CORRETA. ACESSO PERMITIDO apareceu na tela de LCD. Scott teclou enter novamente e digitou a segunda senha. Oito dígitos, letras e números. E finalmente abriu o cofre.

Entre tantos documentos ele não sabia exatamente o que procurar, mas nem precisou ir longe, um envelope pardo despertou imediatamente seu interesse. Scott o apanhou, o nome escrito em letras de forma não lhe era de maneira nenhuma estranho. Havia aquela garota na faculdade, mas a já ouvira algumas vezes o nome Dashwood da boca do pai, e escória era a palavra preferida de Nicholas para se referir a eles.

XXX

Mary Kate acordou sentindo um cheiro surpreendentemente bom de café; percebeu que dormira tão bem que a lembrança dos dois homens lhe seguindo parecia ser de outra vida, talvez fosse por causa da sensação de proteção que sentia estando na casa de Robert. Ela se levantou e ajeitou um pouco os cabelos; o pijama emprestado por Robert ficara absurdamente grande e ela preferiu trocar-se e vestir suas próprias roupas antes de sair do quarto.

Quando desceu as escadas, foi levada pelo cheiro do café até a cozinha, onde encontrou Robert.

— Bom dia.

— Bom dia, Mary Kate. Dormiu bem?

— Como um anjo. — Mary Kate sentou numa das cadeiras de madeira e aceitou a caneca de café que Langdon lhe ofereceu; pensou em tomar um gole por educação, afinal, café não era uma de suas bebidas preferidas, mas o sabor a surpreendeu. — Hum, que delícia, Robert!

— O segredo está no modo como é preparado. — Robert apontou o moinho que usava para preparar os grãos manualmente, era um costume antigo que compensava pelo prazer de degustar um bom café. Sentou de frente para Mary Kate, tomando sua própria caneca.

— Acho que você pode ter razão, sobre aquela história de sequestro, você sabe, o meu avô vive insistindo que eu tenha um guarda costas. — Langdon assentiu; Mary Kate deu uma risadinha infantil. — Deus me livre de pagar um mico desses.

— Mary Kate, o seu avô sabe sobre mim? — Mary deu de ombros.

— Provavelmente não, minha mãe não teve tempo de contar, além disso, a relação deles não era das melhores, você sabe, o meu avô sempre quis um herdeiro, ele acabou se conformando comigo, mas no fundo, ainda não tinha perdoado a mamãe por, você sabe, ser mãe solteira.

— Lorde Dashwood é o seu guardião legal.

— Por pouco tempo, eu faço dezoito anos daqui a alguns meses. Mas o que tem isso, Robert?

— Acho que vamos precisar da autorização do seu avô para o teste de DNA.

— Teste de DNA?

— Para que eu possa reconhecer você como filha, Mary Kate. Oficialmente. — Langdon não sabia se a boca aberta de Mary Kate era de surpresa ou de emoção. — Desculpe, eu queria ter falado de outro modo, mas...

— Não, não, o modo foi ótimo, eu só não esperava por isso. Na verdade eu esperava, só não acreditava que pudesse acontecer, quer dizer, essa loucura de caras esquisitos me seguindo, e uma notícia tão boa.

— Você entende que o teste é necessário, não é?

— Entendo, claro, embora seja pouco provável que a minha mãe tenha mentido, é claro. O meu avô precisa saber. — Mary Kate fez uma careta e tomou um gole de café.

— Algum problema com o seu avô? — Mary Kate deu de ombros novamente.

— Eu só não gosto dele controlando a minha vida. — De repente ela deu outra de suas risadas infantis. — Imagina a cara dele quando souber que meu pai é americano! Quer dizer, ele odeia os Estados Unidos. Ah, com certeza ele vai encarar isso como um insulto a nobre linhagem dos Dashwood.

De repente ocorreu a Langdon que talvez aquele processo não fosse ser tão simples. Mary Kate era a única herdeira de uma das famílias mais ricas da Europa, com a mãe morta e um pai aparecendo de repente, a primeira coisa que o avô pensaria era que ele estava interessado no dinheiro. Mas isso aparentemente era algo que nem sequer passava pela cabeça da garota. Mary, agora recuperada do susto da noite passada, falava pelos cotovelos, e Langdon continuou tomando café da manhã ouvindo-a conversar, pensando ainda em como aquela situação era estranha.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "The Last Secret" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.