Karma. escrita por Alien
A viagem foi longa. Minhas costas doíam cada vez que eu tentava me acomodar confortavelmente no banco do passageiro. Frank e eu revezávamos o volante de vez em quando, permitindo assim, pelo menos algumas horas de sono para ambos.
Quando o vilarejo estava próximo, pedi para assumir a direção. Frank não dormia há mais de oito horas.
- Charlotte. – chamou ele, com a voz um pouco sonolenta.
- Sim? – respondi, checando rapidamente um mapa.
- O que nós vamos fazer quando chegarmos lá?
Engoli em seco. Não fazia a mínima idéia. O dinheiro que tínhamos era pouco e a comida que havíamos pego já estava se esgotando. Resolvi falar a verdade.
- Não sei, Frank. Desculpe.
Ele riu, sem humor. – O que seria de você sem minha super inteligência, hã?
Franzi o cenho, sem entender absolutamente nada.
Frank apenas pegou o mapa que repousava no meu colo e, apontando para determinado local, explicou:
- Aqui está localizada uma pensão. Não é grande coisa, mas a diária é barata e eles não exigem documentos. Eu me informei.
- Tá. Usaremos nomes falsos por enquanto, ok?
- Foi exatamente por isso que escolhi esse ponto para nos hospedarmos. – explicou ele, encostando-se ao banco do passageiro e fechando os olhos. Dei a conversa por encerrada.
Eram quase três horas naquele percurso quando avistei, ao longe, silhuetas esguias e escuras. Espremi os olhos na tentativa de identificar o que eram. Sorri, aliviada. Havíamos chegado ao vilarejo. As silhuetas foram ficando mais nítidas à medida que nos aproximávamos. Eram postes de eletricidade. Mais a frente, identifiquei o que deveria ser um arco de boas vindas. Estava enferrujado e quase não se tornava possível ler as palavras ‘Bem-Vindo’.
O lugar era um pouco maior do que eu havia imaginado. Passavam das três da madrugada, pelo que as ruas estavam desertas.
Cutuquei Frank, o acordando para que ele ficasse responsável por localizar a pensão.
- Acorde! – sussurrei, empurrando o mapa na sua direção enquanto ele tentava abrir os olhos. – Preciso que me diga onde fica a hospedaria.
Frank me deu as instruções sobre quais ruas pegar e em menos de vinte minutos já estávamos estacionando na frente do local.
Segui para dentro do estabelecimento, deixando Frank responsável pelas malas.
- Boa noite. Precisamos de uma suíte. – informei à mulher que estava no balcão. Com exceção de uma verruga enorme na bochecha, ela era normal.
- Quarto para casal? – disse ela, ao ver Frank parando ao meu lado com uma pilha de malas nos braços.
- Não, para solteiros. – respondi.
- Nomes, por favor.
Ignorando completamente o fato de não termos escolhido nossos nomes falsos com antecedência, peguei a caneta que a mulher havia me oferecido e anotei no livro de registro “Alice” e “Peter”.
Ela nos entregou a chave do quarto e ia nos dispensar, quando seus olhos pararam nos nomes que eu havia posto.
- Quando eu disse “nomes”, me referi a eles completos. – disse, nos fitando com os olhos semicerrados.
Engoli em seco e olhei para Frank, pedindo mentalmente que ele fizesse alguma coisa.
- Desculpe, é que ela está um pouco enjoada, por conta da viagem. – e para tornar mais concreto aquilo que estava dizendo, Frank pressionou as costas de sua mão na minha testa, franzindo o cenho em seguida.
- Que seja. Só coloquem o nome direito e sumam daqui.
Antes que a situação ficasse pior do que já estava, peguei a caneta e ao lado de cada nome anotei “Harker”.
A mulher nos olhou de soslaio, enquanto subíamos as escadas apressadamente.
- Sobrenomes iguais? – questionou Frank, depois de depositar as malas no canto do quarto.
- Somos irmãos, acredita? – resmunguei, revirando meus olhos dramaticamente.
O quarto não era nada parecido com o que eu estava residindo na faculdade, mas também não era tão ruim.
Havia duas camas de solteiro com duas mesas de cabeceira no centro do cômodo e um banheiro que dispunha de uma banheira limpa e com água quente. Estava quase me perguntando se havia serviço de quarto por ali, quando avistei um mini-freezer, próximo à janela. Sentia-me exausta e com fome, pelo que abri a pequena porta e sorri, aliviada por saber que não nos preocuparíamos com comida aquela noite.
Assim que saí do banho, vesti um pijama e comi um dos potes de creme de amendoim que havia dentro do mini-freezer, me dirigi até uma das malas e retirei um sache, contendo o feitiço Protezione.
Frank me olhou com reprovação, quando viu o sache nas minhas mãos.
- O que foi? - questionei.
- Acho que isso não irá nos ajudar. Mas, vá em frente. Se isso a faz se sentir mais segura...
Fitei o pequeno pacote nas minhas mãos e percebi que, mais uma vez, Frank tinha razão. Até Melanie havia me dito que o feitiço não funcionava.
- É, você está certo. Desculpe. Droga, eu preciso me acalmar. – murmurei, enquanto guardava cuidadosamente o sache.
- Eu sei que você está com medo, mas pense bem: não fazemos idéia de como funciona isso aqui. Se eles usarem camareiras e você esquecer esse troço esquisito aqui, elas vão ver e tudo o que menos queremos é chamar atenção, certo?
Assenti, já sentindo o peso do cansaço se abater sobre mim. Bati duas vezes os travesseiros, para espantar toda a poeira e em seguida me deitei, agradecendo mentalmente por estar confortável. Frank também se preparava para dormir.
Estava quase entrando em um sono profundo, quando a última coisa que ouvi foi sua voz dizendo:
- Até amanhã, se tivermos sorte.
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