Entre as Cerejeiras escrita por Vickawaii


Capítulo 1
Capítulo 1




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Iniciava-se a primavera, uma época muito romântica para todos os casais apaixonados e felizes por aí. Para mim, significava apenas um caminho absurdamente rosa de cerejeiras na ida e volta da escola. Para Suzumiya Haruhi, bem, teríamos que torcer para que ela não deixasse o dia chuvoso por conta de seu humor.

Após um dia de aula cheio de magia que a querida matemática proporciona, me encaminhei para a Brigada S.O.S como um condenado caminha para a cadeira elétrica. Eu devia ser masoquista, afinal. Infelizmente, dessa vez meu pensamento tinha um certo fundamento, pois a atmosfera da Brigada estava mesmo tensa: Nagato-san sentada em sua cadeira, lendo um livro, e Haruhi andando nervosamente, bufando.

- Onde está Asahina-san? – Perguntei, olhando para os cosplays jogados em uma mesa.

- Por aí, passeando pelas malditas cerejeiras! – Respondeu Haruhi brutamente. – Nenhum comprometimento com a Brigada!

- Certo, e Koizumi?

Haruhi mexeu no cabelo nervosa, fazendo um bico com os lábios, sem responder.

- Haruhi, o que você fez com ele? Não vai responder?

Silêncio, ela não iria falar. Apesar dele ser irritante, torcia para que Haruhi não o tivesse machucado, assassinado ou qualquer coisa do tipo.

- Tudo bem, então. Vou sentar aqui e...

- A Asahina está com o Koizumi!!! – Gritou Haruhi rompendo um choro, correndo em minha direção e procurando o meu abraço. – Eles estão juntos! Ah, Kyon, o que eu faço?!

Suzumiya Haruhi desesperada, chorando em meus braços. Haruhi, A Tirana, a deusa do universo, ou simplesmente uma garota muito mandona estava totalmente frágil, e eu que não era nenhum esper, alienígena ou viajante do tempo a consolando. Era uma cena inédita: o único modo de ter “Haruhi” e “está chorando” na mesma frase é quando tem um “não” no meio. Pelo menos era o que eu achava. E droga, chorar justo pelo Koizumi. Não tinha outra pessoa melhor?!

- Haruhi, calma. – Tentei dizer, desconfortável. – Você por acaso... Gosta do Koizumi?

Ela me abraçou com mais força, chorando. Caramba, não sabia o que raios estava acontecendo, muito menos o motivo. E o Koizumi! O que ela viu nesse cara? Como ele a fez chorar tanto assim?! Chegava a ser algo irreal.

- E-Eu não gosto do Koizumi! – Disse Haruhi entre soluços. – Eu não amo ninguém! O amor não existe!

Ótimo, agora eu estava lidando com uma menina solitária que não acreditava no amor. O que eu podia dizer, “bem-vinda ao clube”? Tentei com calma explicar que não era bem assim, que ela ainda tinha a vida pela frente e ainda iria encontrar a pessoa certa. Disse que o amor era algo mágico, não devia causar sofrimento, etc. O que ela concluiu do que eu falei?

- Você é um fracassado. – Disse Haruhi friamente, parando de chorar. E após isso, saiu. Simplesmente saiu.

Que menina desgraçada! Com que direito ela agia assim?! Peguei minhas coisas e fui embora também, para casa: não i a esperá-la e acompanhá-la até a entrada do prédio como normalmente fazia. Aliás, ela merecia mesmo encontrar Asahina-san e Koizumi de mãos dadas no parque. Gostar do Koizumi, como ela era boba.

Caminhando para casa, me dei conta que fiquei até incomodado com o sentimento da Haruhi pelo menino, mas nem me importei com o fato de Asahina-san estar saindo com ele. Ela sim que merecia alguém melhor, quem sabe eu ao invés do Koizumi. No entanto, eu me preocupava com Haruhi, totalmente antagônica à personalidade doce e bela da Asahina. Era como me preocupar mais com a Rainha de Copas ao invés da vítima, sei lá. O mundo era realmente estranho.

Dia seguinte fui para a Brigada com o mesmo sentimento de dever que um soldado tem ao ir para a guerra, e encontrei Haruhi entediada, jogando paciência no computador. Nagato-san lia, e os outros dois não estavam ali. Sentei ao lado dela e fiquei a observado por um bom tempo. Mesmo com a expressão de raiva, Haruhi era realmente bonita. Imagino que na cena de ontem ela devia parecer incrivelmente fofa e delicada. Se estivéssemos num anime como Ouran High School Host Club, certamente teria uma legião de meninas gritando “moe” para nós. Mas ela era Haruhi, não fazia questão de parecer sensível e até mesmo humana. Estava certo que em trinta segundos ela iria me encarar e brigar comigo.

- Você quer parar de me irritar?!

Ótimo, levou apenas quinze segundos para que ela se virasse e alegasse que eu a estava irritando. Isso que me sentei ao seu lado apenas para ver como ela estava. Por esse motivo, Haruhi se irritou. Imagina se eu fosse tão irritante quanto o Koizumi, ela me mataria com uma bazuca.

- Voltou a ser você mesma, hein. Está melhor?

- Eu nunca deixei de ser eu mesma. Eu nunca estive mal! – Declarou voltando-se à Paciência. Como ela era arrogante. Mas no seu olhar, percebi que ela ainda estava triste. Talvez pensasse que não havia pessoa certa. Talvez estivesse descrente quanto à vida. Talvez eu tenha presenciado a sua primeira decepção amorosa. Foi aí que, insensatamente, como se Voldemort tivesse lançado Imperius em mim, meu braço se pôs em torno dos seus ombros. Péssima idéia: Haruhi esquivou violentamente e me olhou com raiva.

- O que você pensa que está fazendo?! Você é maluco?!

Vamos analisar a sitaução. Haruhi fundou um grupo para procurar espers, alienígenas e viajantes do tempo: primeiro sinal de insanidade. Depois, aparenta estar gostando do Koizumi, segundo sinal. Agora, como se não bastasse, tratava mal a única pessoa normal e tolerante para não só chegar perot dela como para oferecer um ombro amigo. Quem estava maluco afinal?!

- Eu penso que estava tentando te ajudar, Haruhi. Você não está bem.

- É óbvio que estou, Kyon. Eu tenho tudo sob controle!

- Ah, é? Agora fiquei curioso. O que você vai fazer afinal?

- Simples: vamos ao parque e você fingirá ser meu namorado.

Se eu estivesse ingerindo algum líquido ou alimento, certamente iria passar mal. Ou se uma bela melodia estivesse tocando, esta iria travar imediatamente. O que Haruhi estava querendo, afinal?! Será que ela queria apenas me usar para enciumar o Koizumi? Será que ela faria com que eu comprasse sorvete para ela, carregasse a sua mochila, a levasse para casa e fizesse o possível para mantê-la confortável e feliz? Oh, espera, eu já fazia isso. De qualquer forma, a idéia de namorá-la era absurda.

- Haruhi, eu não posso fazer isso.

- O quê? – Ela riu de forma irônica. – Deixa de ser bobo Kyon, claro que pode!

- Não, Haruhi, seria estranho. – Suspirei.  Apesar dela ter falado “brincando”, tinha certeza que mentalmente já escolhia uma arma para me matar. Ou me obrigar a aceitar sua idéia, sei lá. – Não quero ser um alicerce para você tentar enciumar Koizumi, isso não é certo nem com ele nem comigo.

- Kyon...  - Começou ela numa mescla de calma e impaciência. – Não estou pedindo sua opinião. Eu sou a Chefe da Brigada! Você VAI fazer isso.

- Já chega! – Levantei da cadeira com empolgação, falando com mais emoção que o necessário. – Você tem se comportado de forma horrível ultimamente, Haruhi. Você NÃO pode mandar assim e nem tentar estragar o sentimento de Koizumi por Asahina. – Olhei firmemente para Haruhi. Desgraçado do Koizumi, conseguiu as duas! – Eu me recuso terminantemente a participar disso com você.

Meia hora depois, estávamos cercados pelas malditas cerejeiras. Não é como se eu não quisesse estar ali, afinal. Talvez fosse uma experiência interessante. Ou enriquecedora. Ou...Certo, estava ali unicamente por causa da Haruhi. Não era minha culpa: havia algo nela que me magnetizava, que sempre me obrigava a ficar. Koizumi diria que era medo que a menina destruísse o mundo, agora eu diria que era algo mais. De qualquer forma, ficamos um bom tempo tomando sorvete em um banco (eu sabia que ia acabar tendo isso) até que finalmente aconteceu alguma coisa.

- Olha os dois ali! Olha, olha! – Gritou Haruhi animadamente.

- Haruhi, seja mais discreta, eles... – Ela tapou minha boca com a mão instantaneamente, puxando-me para trás da árvore. De fato, Asahina-san e Koizumi caminhavam bem na direção do banco em que estávamos antes, a garota com as bochechas rosadas e uma expressão nervosa. Em outras circunstâncias, eu a acharia incrivelmente bela e invejaria Koizumi, mas naquela hora o corpo de Haruhi estava irritantemente perto para eu pensar em qualquer outra coisa sem ser nela. Conseguia ver cada brilhar em seus olhos, e mesmo que fosse um brilho assassino e dominador, aquilo tinha um quê de especial. Alguns minutos se passaram até que Koizumi e Asahina-san sentaram-se onde nós estávamos (para estudar, olha que coisa emocionante), e Haruhi declarou o próximo passo.

- Vamos sair e cumprimentar eles!

- Quê? Haruhi, não...

- Oooi pessoas!

Mesmo sabendo de sua inocência, fiquei tentando adivinhar o que Asahina-san imaginou quando nos viu saindo de trás de uma árvore. Talvez tenha sido por causa do Koizumi, mas ela estava realmente muito vermelha. Koizumi nos recebeu com um sorriso e Haruhi estava com aquela cara de maníaca. E eu estava ali, tentando manter a calma. Era engraçado pensar em que atitudes tomei no início de tudo para gerar essa sequência bizarra de acontecimentos.

- Suzumiya-san, que bom vê-la! – Saudou Koizumi. – O que fazes por aqui?

- Monitorar os integrantes da Brigada! E claro, dar um passeio com o meu Kyon! – Respondeu. Ótimo, agora eu era o “seu Kyon”. Faltava apenas uma coleira.

- Fico feliz por vocês dois. Hey, que tal se...

Misteriosamente, depois estávamos todos a ir ao cinema. Não um karaokê, um cinema. E eu esava acompanhando Haruhi, não tinha lógica naquilo. O curioso é que no caminho, enquanto Koizumi estava há mais de oito mil metros de distância de Asahina-san, Haruhi segurava minha mão com força. Koizumi não parecia estar incomodado com isso, mas Haruhi continuou a segurá-la, e eu sentindo aquela mão pequena e quente junto à minha. E droga, talvez isso me fizesse bem.

- Kyon, compre a pipoca! Você está muito disperso hoje! – Falou Haruhi com um sorriso no rosto. E naquele momento, mascarado naquela expressão alegre e fofa, pude ver que era um sorriso demoníaco. Haruhi não estava apenas enciumando Koizumi, ela queria me enlouquecer. Ela sabia todos os efeitos que causava sobre mim, e incentivava tudo aquilo de propósito. Mas peraí, e aquele choro triste e meloso do dia anterior?! Seria tudo coisa da minha cabeça?!

Se tudo fosse coisa da minha cabeça, então eu estava imaginando muitas coisas. Durante o filme, além de dirigir todos os comentários a mim, Haruhi inclusive colocou a cabeça em meu ombro, sendo que Koizumi e Asahina-san nem ao menos se falaram. Confesso que uma parte de mim estava gostando da situação, mas sempre que eu tentava me aproximar ela recuava. Recuava e me dava um sorriso. E antes que eu pudesse perceber o dia estava terminando e eu estava aborrecido por não ter acontecido nada. Sério, tinha que ter alguma coisa estranha naquele sorvete.

- Vou te acompanhar até sua casa. – Disse, quando Koizumi e Asahina já tinham ido.

- Não precisa...

- Está ficando tarde, Haruhi, eu faço isso.

- É, mas eu não quero!

Haruhi estava muito boazinha para ser verdade! Eu a levava para casa todo santo dia, por que raios hoje eu não poderia fazer isso?! Estava realmente ficando meio tarde, e não se pode cobrar segurança de uma garota que se veste de coelho para atrair membros para a Brigada. Peguei sua mochila e saí andando pela rua, sem me importar com seus gritos de protesto e ameaças a minha saúde. Eu já estava acostumado, afinal. Contudo, não andávamos mais de mãos dadas e Haruhi se distanciava de mim como se eu tivesse alguma doença contagiosa.

- Não respeita a chefe da Brigada. – Murmurou. – Que insolência...

- Haruhi, não estou entendendo sua intenção. – Declarei, jogando as mochilas no chão.

- O quê? Enciumar o Koizumi, óbvio.

- Nós dois sabemos que ele nem se importou. Eu diria... Diria até que ele ficou feliz com a gente.

- Só porque ele disse? – Ela riu. – Kyon, você é tão bobinho...

- Não, Haruhi, você está fazendo isso de propósito. Você passou o maldito dia me provocando. – Respirei. Eu podia ser bastante tolerante normalmente, mas não sou um monge budista. E um monge budista não era um adolescente, por mais diferente que eu fosse eu tinha que aceitar minha condição. – Sabe, se eu fingi ser seu namorado andando de mãos dadas, te abraçado e tudo o mais, eu poderia...Você sabe...

- Poderia o quê, Kyon?

- Poderia fazer isso.

Imediatamente, antes que Haruhi pudesse fugir ou dizer algo, eu a segurei pelos braços e a beijei. Beijei Suzumiya Haruhi, um beijo longo e envolvente. Não sei o que me levou a fazer aquilo, mas a sensação foi muito melhor do que a de quando eu fiz só para salvar o mundo. Foi como se eu entendesse todos os casais apaixonados que passeavam pelas cerejeiras, como se eu entendesse o significado disso. Olhei para Haruhi, a surpresa e a ternura tão presente em seu rosto e...

- Por que raios você fez isso, Kyon?! – Exclarou Haruhi com uma expressão irritada. Era uma boa pergunta. Por que Deus quis? Por que as vozes me mandaram? Sério, não tinha uma resposta. Pelo menos não uma plausível: ela era Haruhi.

- Pensei que você fosse gostar. – Eu disse.

- Que eu fosse gostar?! Ora, eu... Hum... Me leve para casa!

Ela ficou desconcertada. Pegou as mochilas e entregou ambas para mim, enquanto falava do porquê não se deve beijar superiores hierárquicos. Haruhi podia ter sido mais romântica e sensível, mas afinal acho que o verdadeiro motivo do passeio não tinha nada a ver com Koizumi, e sim com o que aconteceu. Sei disso porque eles nunca mais faltaram à Brigada, e Haruhi não estava nem um pouco brava com eles. De todo modo, Haruhi estava sorrindo, e foi assim até chegar a sua casa. Ela me desculpou pelo ocorrido, com a promessa de eu levá-la mais vezes ao parque. Por mim, tudo bem.


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Notas finais do capítulo

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