Mais que Palavras escrita por Dark_Hina


Capítulo 1
Capítulo 1 - Palavras Amargas




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Prólogo:

Falar a verdade não é questão de magoar ou querer impor a opinião que tem a razão dos fatos... É simplesmente não se sentir pressionado a continuar com o que não se suporta mais.

Mesmo com a convicção de que suas palavras soariam de má fé e não seria certo lhe dizer aquilo por uma webcam... Era inevitável o fim, era necessário para os dois que tudo estivesse claro - e acabado.

“Olá, do sul da linha do Equador e de Puerto de Ayora. Estamos no mar faz mais de um mês. Você não acreditaria na tripulação: estudantes, ativistas, cientistas... As conversas no jantar são uma loucura! E tem um biólogo marinho que me lembra um pouco você. Gostaria que pudéssemos conversar pessoalmente, mas é o melhor que eu posso fazer.

Quero me desculpar por ter ficado sem dar notícias. Eu tenho pensado muito, apesar de tudo, sobre nós... Em todos os momentos...

Achava que poderíamos sobreviver a tudo.

Esta viagem fez com que as coisas ficassem mais claras.

No último ano em Vegas eu não podia respirar, muito menos pensar, mas agora pela primeira vez, em muito tempo, estou feliz... Antes de partir, você disse coisas que eu tentei não dar ouvidos, mas agora, acho que você está certo. Se um relacionamento não pode avançar, ele definha.

Estava esperando você decidir, mas, às vezes não tomar uma decisão é tomar uma decisão. Enfim, o que estou tentando dizer é que... Não tem mais que se preocupar comigo. Estou bem. Estou bem, mesmo! E, honestamente, acho que é melhor assim.

Sara Sidle"

Capítulo 1 – Palavras Amargas

A mão quente encostou no metal frio da maçaneta, ao abrir a porta a morena sentiu o braço arrepiar, a sensação foi estranha, como se toda a segurança de sua casa houvesse sido transformada em tensão.

Depois de entrar, retirar seus sapatos, jogando-os no outro lado do apartamento, ao dar o primeiro passo em direção a sala, sentiu o gelo do chão contra seu pé ser parcialmente anulado. “O aluguel já chegou?”, ironizou a chegada prematura de correspondência.

Ela recolheu o envelope amarelado com dificuldade para não deixar a sacola de papel cheia de compras que carregava cair. Ao levantar, com similar cuidado, deixou ambos em cima da mesa quadrada de vidro e se dirigiu para o banheiro.

Após tirar a pesada calça jeans clara e se desfazendo da regata marrom, encarou sua face no espelho quadrado, apoiando-se no mármore preto da pia. Percebeu com certo desânimo algumas olheiras, fazia tempo que elas não lhe perturbavam, para compensar a volta das 'velhas amigas' não viu marcas de expressão ou de idade, seu cabelo amarronzado na altura do ombro ainda exibia exuberantes cachos, para seus 42 anos ainda possuía toda a face, aspecto e vigor do auge dos 35.

Amarrou suas melenas castanhas e se permitiu tirar as peças íntimas, jogando-as no chão do banheiro ao lado da sua roupa comum. Abriu com cuidado o box do banheiro e ligando a água quente, pousou seu corpo em baixo do líquido tendo cuidado para não molhar o cabelo, estava cansada demais para esperar secá-lo e com certeza acordaria com muita preguiça para arrumá-lo.

Saiu do chuveiro com o vapor ainda lhe cercando, pegou uma toalha pendurada na parede, enrolou-a no corpo pegando a roupa caída no chão entre o caminho para sua cama, onde voltou a jogar todos os pertences. Olhou ao redor e em cima de uma bancada já havia uma regata de lã marrom e uma calça de moletom.

~♥~

Nunca uma taça de sorvete havia lhe gelado tanto a boca.

Ao deixá-la na mesa de cabeceira ao lado da cama viu a carta que havia esquecido lá mais cedo. Ela reconhecia a letra. Abriu com certa desdém se encolhendo nas cobertas para lê-la.

Para Sara Sidle

“Sara, quando recebi sua mensagem senti uma parte de mim ter apreciado o momento mais feliz desde sua última visita, os únicos momentos, desde que você foi embora, que eu senti a mais pura e bela alegria em simplesmente existir.

Juro que só esperava, e estava preparado, para um comprimento, uma notícia sua. Mas sabemos que não foi isso que aconteceu.

A mesma parte de mim que se alegrou quando sua mensagem chegou, acabou se quebrando em pequenos fragmentos... Naquela parte havia-se concentrado todos os sentimentos que eu possuía, todas as lembranças que eu tentava inutilmente reprimir no nada da minha cabeça, eu estava me negando sentir as altas dores, machucados esses que me fazia definhar só de pensar que existiam, que foram causados com aquelas suas palavras.

Eu perdi a vontade de trabalhar, eu não pensava direito... Ironicamente a parte que mais sentia emoções era minha parte lógica.

Eu tinha toda a convicção do amor quando se tratava de você, só que depois daquilo eu não sabia quais eram meus sentimentos... Eu sou um cientista, me apego a fatos e só sei andar com eles, o fundamento que eu baseei nosso amor havia sido contrariado pela principal outorgante dele. Eu tentei, tentei mesmo usar de todos os argumentos ilógicos e desvairados para negar o que havia acontecido, afinal que loucura em um mundo de loucos não tem seu fundo de verdade e seu pingo de lógica? Mas eu não consegui. Você sabe melhor que ninguém que várias mulheres consegue fazer o jogo de xadrez mental comigo, mas só você consegue me desarmar dele e relevar para mim mesmo que eu sou um homem e sou humano...”

A morena engoliu a seco, o conforto que estava sentindo até aquele momento havia acabado em uma velocidade assustadoramente rápida e para sua mente algo cruel e frio lhe apertava o coração, algo parecido com a angústia.

“Aquilo me acabou por dentro. Toda vez que eu pensava nas suas palavras sentia vontade de parar de existir, eu queria continuar vivendo, então tentei parar de pensar em você.

Como Shakespeare já disse, “Conservar algo que possa recordar-te seria admitir que eu pudesse esquecer-te”. Eu não preciso dizer que há um tempo eu respirava porque eu queria me lembrar da sua graça de simplesmente existir.

Eu tentei com muito custo, em vão, fingir que aquilo não era nada, mas eu acabei percebendo que aquilo só piorava as coisas. Então resolvi procurar ajuda, com toda a necessidade de um homem em caráter de ser humano fui a casa de Heather, dormi em sua companhia e mesmo...”

Sara engoliu a seco, seus olhos estava arregalados e sentia que um nó enorme havia se formado em sua garganta. “Eu li errado”.

“...fui a casa de Heather, dormi em sua companhia...”

Só podia estar lendo errado.

Quando a ficha finalmente caiu, ela fechou os olhos na tentativa de recuperar o ar que lhe faltava, ele não voltava.

Ela tentou amassar o papel em suas mãos, não pôde, estava com a mão tremula, a única coisa que podia fazer naquele momento era continuar a leitura e após mais uma engolida a seco voltou seus olhos para o papel.

“...e mesmo não querendo, a cada toque, eu desejava o seu.

Eu percebi naquele momento que todas as minha decisões não são conclusivas e me vi obrigado a admitir que não consigo encarar meu próprio 'eu', que em vários momentos é você.

Eu me lembrei de quando você estava perdida, eu estava assustado e só podia pensar em duas coisas, que aquilo tinha acontecido por minha culpa e que talvez não te visse de novo.

Eu sofri tanto quanto você.

E quando eu paro para pensar em tudo que aconteceu, sinto muito, sinto muito mesmo, mas vejo que sou eu que preciso de outra pessoa, alguém que não me faça lembrar o que minha incompetência causou, como meu lado humano é destrutivo, alguém que nunca chegue a ser melhor que você, mas que não seja você.

Isso não ajuda a justificar o que aconteceu entre nós dois, mas me ajuda a entender como aconteceu.

Está na hora da borboleta roxa procurar outro jardim. Foi eterno enquanto durou.

Gil Grissom.”

—Memórias perfeitas no existem, muito menos pessoas, eu é que sinto muito por você, Gil. Você também não é perfeito. – Sara disse baixo, expirando fundo e controlando o marejo dos olhos, a morena deixara a carta em cima do criado mudo ao lado da cama e se aninhou no seu edredom cinza e roxo. –Principalmente por você gostar de viver no erro.

O sentimento da morena foi normal, uma respiração oscilada, uma vontade de jogar tudo que o via para longe... Uma vontade quase que incontrolável de se jogar da janela do seu apartamento... E uma lágrima delicada e silenciosa escorrendo em seu rosto lhe abrindo as portas do sono e de outra ferida no coração.


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Notas finais do capítulo

Próximo capítulo semana que vem.