Preguiça, Gula e Vaidade escrita por Diego Lobo


Capítulo 21
Capítulo 20 - Sobre dois irmãos


Notas iniciais do capítulo

Gente esse é o penúltimo capítulo. Eu peço a compreensão por não estar revisado nem nada, mas é que falta tempo (com o livro e tudo mais).



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Capítulo 20 – Sobre dois irmãos

O jovem ao lado de Cherry dormia tranquilamente. Ela sentada começou a procurar por suas roupas, deixando que o cobertor escapasse de David perigosamente exibindo o seu tronco talhado. A garota pôs as mãos na cabeça se sentindo louca.

— Cherry sua idiota, o que você fez? — sentia vontade de chorar, mas era preciso sair daquele lugar.

Quando se pôs de pé e ela teve um vislumbre do corpo de David por inteiro veio à certeza de que aquilo realmente aconteceu. “Isso não está acontecendo!”.

— Você já vai? — perguntou David acordando aos poucos, parecia bêbado, mas incrivelmente atraente dessa maneira. Ele passou a mão nos olhos, sua boca estava rosada — Cherry?

Ela não tinha ideia do que dizer.

— Cherry, você está bem? — David olhava para garota de pé em seu quarto.

— David! — ela estendeu a mão para que ele não se movesse de seu lugar — Isso foi um erro total! Uma burrice!

David se sentou na cama, cobrindo suas partes. O peitoral saltando aos olhos de Cherry com aqueles traços que para ela significavam caminhos perigosos para os olhos.

— Lembre-se que quem apareceu em minha porta e me beijou foi...

— Isso não importa! — Cherry de repente começou a sentir algo. Ela não saberia explicar direito, mas era como se Alphonse conseguisse por os olhos sobre ela. Sentia que de alguma forma ele havia a localizado. “Ele esta vindo!”.

— Preciso ir — mas antes que ela desse as costas para David ela reparou uma coisa.

Ao lado de David, em uma pequena mesinha, se encontrava um telefone azul.

— Você não disse que o telefone ficava no corredor? — perguntou curiosa.

O garoto piscou uma vez e depois percebeu o que ela estava falando, afinal a pergunta fora inesperada demais.

— Ah...sim, eu troquei de lugar — disse ele.

Cherry correu para fora da casa. Ela esperava que uma das limusines do castelo a aguardasse, mas para seu azar não havia limusine alguma. Observou a rua deserta onde David morava, começava a suar frio. Começou a correr, mas já não estava em Newcastle.

Um deserto vermelho tomara sua visão. Uma ventania constante levantava a areia e Cherry tinha que se proteger com os braços. Stevan estava parado mais á frente.

— O que esta acontecendo? — perguntou, precisando gritar graças a ventania.

— Sua mente já não consegue diferenciar os dois mundos! — gritou em resposta — A porta ficou aberta!

— Mas e o meu corpo?

Stevan caminhou até ela.

— Continua no mesmo lugar, só que você está desligada para realidade...

Cherry sabia que não adiantava tentar sair, precisava terminar logo com isso. Sentia que estava quase no fim.

— Bem vinda ao deserto de fogo — disse a voz vinda do auto. Um jovem de cabelos loiros desgrenhados desceu delicadamente até a sua frente. Ele tinha asas vermelhas em suas costas — Então, você cruzou o gelo... e atravessou a floresta.

Ele caminhava ao redor dela. Esse anjo era diferente dos outros, não era duro, parecia possuir certa graça no andar e olhar.

— Você deve saber — disse ele com uma voz musical — Que quanto mais perto estamos da verdade, maior será a chama que nos impede de alcança-la.

— Ele esta divagando — alertou Stevan — Dirá qualquer coisa para que você fique confusa ou desista de chegar até o fim.

De repente algo estranho aconteceu. Os olhos do anjo fitaram a presença de Stevan, logo depois do alerta. Ele abriu um sorriso.

— Estranho... — falou Stevan surpreso.

— O que foi?

— Essa figura criada pela mente não deveria ser capaz de me enxergar...são como projeções. Cada qual carrega um pequeno texto consigo, como em um roteiro — O anjo continuava a encará-lo.

— Você está dizendo que ele tem consciência própria?

Stevan balançou a cabeça negativamente.

— Impossível — disse — Mas talvez a sua mente, ou a de Mike, tenha me visto como uma grande ameaça.

— O pequeno sonhador — falou o anjo de repente — Sempre invadindo terras distantes e se aventurando pelo conhecimento.

Cherry pode ver a expressão de Stevan congelar, completamente surpreso com o anjo falando diretamente com ele.

— Mas essa jornada não é sua e você deve pagar pelos mundos que invadiu e os segredos que arrancou — o anjo movimentou o braço rapidamente e uma gaiola de fogo envolveu Stevan imediatamente.

— Stevan! — gritou Cherry correndo ao seu encontro.

— Não se preocupe! — ele a impediu de avançar — Vou ficar bem. Esse ato nos mostrou que você esta muito perto. Tenho certeza que vai conseguir.

A gaiola afundou na areia vermelha. Apesar de tentar tranquiliza-la, o jovem não parecia muito confiante em suas palavras.

— O mundo interior deveria ser algo imaculado — disse o anjo observando o relevo que a gaiola deixou ao afundar na areia.

— Cale essa boca — disse ela caminhando em frente.

O anjo soltou uma risadinha e então foi tomado em chamas, desaparecendo. Ela caminhou por alguns minutos, mas estava de volta a rua.

— Perdida? — perguntou a voz, enquanto Cherry girava no mesmo lugar.

Sebastian estava encostado em uma árvore, de braços cruzados ele sorria para a garota.

— Você! — falou ela rangendo os dentes — Stevan esta em coma por sua causa!

— Em coma? — ele fingiu desapontamento — Pensei que estava morto...

Ela partiu para cima dele, mas Sebastian escapou facilmente.

— Vim aqui saber se você deseja evitar que outra pessoa acabe se machucando — falou tranquilamente.

Cherry lançou lhe um olhar assassino.

— Seu irmão, é claro — falou ele dando de ombros;

— O que houve com Mike? — perguntou rapidamente.

— Mike esta enfrentando Christopher, o avareza, neste exato momento.

Ela arregalou os olhos com a ideia, lembrando do jovem diabólico que a jogou no lago congelado.

— A única maneira de salvá-lo é chamando o seu querido Alphonse — disse ele — Sozinha você não poderá fazer nada para impedir que seu irmãozinho seja morto.

A garota respirava com certa dificuldade, ela podia sentir um perigo no ar.

— Então eu devo atrair o Alphonse para a sua armadilha idiota?

Ele sorriu e deu de ombros.

— Mas é claro que é uma armadilha, mas Mike esta realmente enfrentado aquele pecado — ele riu — Só que assim que Alphonse o destruir, ele mesmo será o próximo. Serão dois coelhos mortos!

— Alphonse não vai perder para um idiota feito você! — rosnou.

— Ótimo, então você vai chama-lo? — perguntou animado, mas desaparecendo em seguida com um clarão luminoso. Cherry soltou um gritinho nervoso.

Mike dirigia o carro em direção à casa de Muriel. Todas as virtudes restantes estavam no carro. O silencio durou apenas por alguns minutos.

— Ainda não consegui acreditar que a Lena se foi... — disse Edgar.

Era possível ver por um fração de segundo Sebastian revirar os olhos, mas Mike não deu importância para aquilo.

— Ainda acho que passar na sua casa é perda de tempo — comentou Sebastian sem encará-lo — Deveríamos seguir diretamente para o lugar onde o avareza se encontra.

— Não se preocupe, não vou demorar. Só preciso resolver algumas coisas.

Caleb estava em completo silencio em seu canto. Mãos e pés juntos ao corpo como se estivesse meditando. Félix e Caleb cochichavam alguma coisa baixinho enquanto Edgar deixava as lagrimas rolarem livremente pelo seu rosto rechonchudo

— E que tipo de coisas que você precisa resolver agora? — indagou Sebastian, claramente irritado — Quer dizer, estamos seguindo um plano bastante importante aqui!

Mike não demorou para responder.

— Preciso trocar de roupa, me despedir da minha família e fazer sexo com uma pessoa — Todos no carro ficaram em silencio completamente chocados.

Antes mesmo do carro estacionar Mike pulou para fora e disparou para a casa. Atravessou o gramado que parecia mais uma pequena floresta. Previu o ataque furtivo de Luca vindo de cima da árvore e o apanhou no ar. Ele o abraçou beijando sua testa e em seguida o arremessou de volta para a árvore, o garoto apanhou o tronco facilmente, mas estava surpreso com a reação.

Na frente da casa estavam Sophie e Muriel regando algumas plantas e conversando. Mike passou por elas apressado e carregou Sophie consigo.

— Usem um maldito preservativo! — berrou Muriel quando o jovem bateu a porta com o seu pé..

Sophie começou a rir sem folego, suas mãozinhas juntas contra o peito de Mike. Chegaram ao quarto dele, ele fechou a porta também e jogou a garota na cama, que estava coberta com vários materiais de pintura e desenho.

Mike a encarava com um olhar louco, retirou sua camisa em um movimento seguro, o tecido obviamente rasgou. Seu corpo estava ainda estava coberto de terra, parecia um bronzeado novo.

— Andou brincando com terra? — perguntou ela abraçando seus joelhos. Sophie usava seu habitual rabo de cavalo e a franguinha angelical que contornava sua testa. Seus lábios estavam livres de qualquer maquiagem, mas tinha uma coloração rosada.

Ela usava roupas leves. Uma camiseta branca justa e outra preta de tamanho menor que estava por baixo, ela tinha uma alça preta que prendia no ombro, enquanto a camiseta branca escorregava por seu braço delicadamente.

Sophie retribuía o olhar com seus olhos estreitos e cintilantes. Mike não se demorou depois de retirar seus jeans empapado de lama. Praticamente foi um ataque aos lábios da garota, que imediatamente ergueu os braços para que Mike retirasse sua veste, provavelmente sentido que a coisa seria rápida e voraz.

Mike a deitou, tentando ser o máximo delicado possível, mas o desejo era forte demais. Ele a beijava em impulsos, como uma onda que começava em seus quadris e terminava em sua cabeça, os lábios se encontravam e desencontravam repetidamente como um ato sexual.

Seu braço não se demorou para retirar o que restava de roupa da jovem, pois ele já estava nu. Enquanto rolavam conduzidos pela aquela energia extasiante, as pastas de tinta estouravam na pele dos dois jovens, era uma explosão de cor.

Sophie estava completamente submissa, Mike tinha o controle. Era doce, crocante, tudo tinha gosto, sabor. A garota tinha algo celestial que fazia com que o jovem tivesse desejos esquisitos, como se quisesse destruí-la, mas ela era poderosa demais que ele poderia tentar quanto quisesse que isso jamais aconteceria.

Do que aquela pele era feita? Ele se perguntava enquanto a tomava no ato. Era natural demais, mas ao mesmo tempo impossível. Ele sentia que Sophie á qualquer momento poderia dissolve em seu corpo e ele nadaria em sua existência. Porém, ao mesmo tempo que tudo parecia se desmanchar, a jovem se tornava rígida, como se fosse moldada especificamente para o corpo de Mike. Era uma ebulição de desejos.

Pela primeira vez Mike não se sentia preso em um clichê. Não naquela situação tão crua, suja, bela, pura, confusa. Os pequenos sussurros que Sophie soltavam eram compatíveis com o estado em que ele estava, afinal os dois estavam em uma sincronia sobrenatural.

Ao final ele se sentia completamente bêbado, seus dedos do pé se contorciam como uma câimbra, seu pescoço rígido e veias saltando. Seus rostos coloridos e risonhos fitavam um ao outro, era um momento feliz e real.

Tomou um banho rápido, seu corpo suplicava pela sua cama. Ignorou a vontade de desmaiar. Desceu as escadas, Muriel estava no quintal.

— Não se atreva a vir se despedir! — disparou ela quando viu o jovem se aproximando. Seus cabelos cinzentos e vestes engraçadas, parecia uma bruxa.

— Sou forte, vou fazer isso quer você queria ou não! — disse ele rindo e a abraçando a ponto de tirar a velha do chão.

— Onde você vai? — perguntou ela finalmente de volta ao chão — O que está havendo?

— Coisa de virtude — falou ele dando de ombros, tentando observar bem a mulher — Preciso ir.

Precisou apanhar outro caminho, pois não suportaria se despedir de Luca novamente. Estava muito preocupado com os dois, desejava protege-los para sempre.

Sebastian parecia extremamente nervoso quando Mike finalmente voltou. Mas ele continuou a ignorá-lo e ligou o carro.

— Espero que tenha entendido o plano Mike — disse Sebastian depois de horas em silencio no carro, finalmente se aproximando do destino — Confesso que fiquei surpreso quando você concordou.

Sebastian parecia não dirigir as palavras para ele e sim para o restante do carro, como se esperasse que todos julgassem o jovem.

— Tenho a impressão que você não vai cansar de se surpreender comigo Sebastian — falou ele encarando-o.

Pode ver o ódio diabólico reluzir nos olhos do rapaz loiro.

— Nossa presença já foi notada — disse Caleb de repente.

— Tão longe? — perguntou Félix surpreso.

— Esse pecado não esta em estado normal — falou Caleb olhando para a mansão que se encontrava em certa distancia — É muito poderoso, eu consegui sentir sua presença há muito tempo.

— Isso não importa — falou Sebastian — Precisamos de tempo.

— Já combinamos ­— disse Mike — Eu vou cuidar dele.

— Não concordo com isso — Edgar se pronunciou — Por que Mike tem que enfrentar esse cara sozinho?

— Acho que um de nós deveria acompanhá-lo — falou Félix.

— Eu já expliquei várias vezes! — disse Sebastian nervoso — O luxúria nunca virá se Mike não estiver em real perigo.

Ninguém parecia muito convencido disso, mas Mike apoiava aquela ideia. Todo o caminho o jovem concordara com todo o plano de Sebastian, sem questionamentos. Ele desceu do carro, as virtudes desaparecem em um clarão enorme de luz. Agora estava por sua conta.

Era uma mansão branca no meio do nada. Parecia um tanto antiga e ao redor só havia o vasto campo verde. Pulou a cerca da estrada e começou a andar em direção ao lugar onde Christopher se encontrava. Não havia guardas ao redor, mas ele pode sentir a presença de algo se aproximando.

Aos poucos ficava claro em sua visão, os borrões de tinta. Os cães do azar, que anteriormente tentaram mata-lo. Ficou surpreso que aquelas coisas ainda estavam com vida. Enquanto Mike caminhava as criaturas rondavam a espreita. Estavam um pouco diferente. Maiores e com um som assustador.

Ele cerrou os punhos, movimentando-se rápido quando o primeiro investiu contra ele. Em um giro de corpo ele teve a certeza de esmagar o crânio da criatura com o seu soco. Mas outro conseguiu cravar os dentes no pescoço de Mike.

AARG

Puxou com força e afundou seu joelho contra o bixo, que explodiu em fumaça negra. Precisou repetir alguns golpes contra o restante, mas conseguiu dar conta das feras, o uivo de dor ecoou pelo campo solitário.

Chegou à entrada na mansão, algum dos pilares que sustentava a frente estava destruído. Uma onda gélida soprava para fora da casa. A porta não estava fechada, mas ele foi cauteloso e movê-la. “Apareça logo seu desgraçado!”, dizia em sua mente repetidas vezes.

O lugar era um total desastre. Haviam móveis e aparelhos espalhados por toda parte como se um furacão tivesse passado. Ao mesmo tempo o ambiente era extremamente gélido. Não havia iluminação alguma, as janelas foram lacradas com tábuas. Mike ficou nervoso com aquilo. Reparou em um armário jogado no canto.

Ele foi até o objeto e o ergueu no ar. Em seguida arremessou com força contra uma das janelas lacradas. A luz penetrou no lugar com um feixe belo. Foi possível ver outras coisas n mansão.

Mike estava em um gigantesco salão de entrada. Ao redor de todo o lugar haviam esquisitas torres de gelo que saiam do chão, perfeitamente retangulares. Ele arriscou se aproximar de uma delas e seu coração acelerou com violência.

Dentro do gelo havia uma pessoa congelada, os olhos arregalados em pânico. Todos os outros pilares de gelo continham uma pessoa. Mulheres, homens, crianças, velhos...

— Deus do céu! — falou assustado.

— Minha preciosa coleção...

Christopher estava no alto, onde havia uma escada que levava para o segundo andar. Seus aspecto era bizarro. Pálido como a neve mais alva, haviam veias de coloração azul que saltavam por todo o seu corpo, lembravam fios de energia expostos. Seus cabelos cinza caíram completamente do lado esquerdo, o que deu um aspecto muito estranho, como se fosse algum tipo de corte punk. Ele parecia completamente doente.

— Parece que eu não vou ter muito trabalho por aqui — comentou Mike rindo.

Christopher também riu, mas de forma diabólica.

— Vai ser tão bom acabar com sua vida — disse ele como se estivesse sussurrando a morte — Sentir o sangue quente no meu corpo...confesso que sinto falta do calor. Sinto falta de sentir qualquer coisa.

— Você não passa de uma múmia acabada — zombou Mike, ele caminhava encarando o pecado da Avareza — Vai pagar muito caro pelo o que fez com essas pessoas!

— São minhas, só minhas — falou o avareza, parecia completamente louco — Vou preservar todos comigo...

Christopher subiu em cima do parapeito que dava para o grande salão, acompanhado da escada. Seus joelhos dobravam bem devagar, sua boca aberta soltava uma fumaça branca. Ele saltou.

Mas Mike também saltara na mesma hora, e no ar ele conseguiu golpear o corpo fantasmagórico para a parede, obrigando-o o jovem a atravessar para outro cômodo.

Os berros monstruosos de Christopher faziam a mansão inteira tremer. No caminho Mike arrancou um pedaço pesado de madeira de um móvel jogado. Ele chutou a porta e girou a madeira com força, pois o Avareza avançou com força em sua direção assim que o rapaz entrou.

Christopher bateu em todo o resto do local até parar na parede. Um liquido azul saía de sua boca enquanto ele soltava uma risada enlouquecida.

— Seu desgraçado estúpido! — riu — Você caiu na minha armadilha seu pedaço de bosta!

A mão do avareza afundou no piso de madeira. Mike sentiu um arrepio subir por seu corpo e saltou na mesma hora. Um espeto de gelo gigantesco levantou do chão quase partindo o jovem no meio.

A porta que Mike arrombara não estava mais lá. No lugar um bloco de gelo maciço se encontrava tampando a passagem.

— Você é um asno! — atacou Christopher — Sempre foi e sempre será!

O lugar se tornara insuportavelmente gelado. Mike começou a perceber seu corpo tremer involuntariamente, somado com o seu cansaço causado pelo tempo que ficara no posso. Christopher estava de pé, a expressão louca se fora. De braços cruzados, como se os quisesse só para si, ele observou o jovem atentamente.

— Quando será que a verdade vai entrar nessa cabeça idiota — falou ele, andando normalmente pelo lugar como se Mike não o tivesse acertado — Sempre é o coitado da história, não é? Sempre o ultimo a perceber as coisas. Mike, o palhaço de todos!

A raiva pulsava nas veias de Mike com violência, seu corpo avançou em fração de segundo na direção do Avareza. Mas dessa vez o seu punho não acertou nada.

— O que? — disse confuso.

O corpo de Christopher se desfizera em névoa. Mas ele conseguia sentir a presença do jovem em toda a parte.

— Agora eu deveria acreditar que você já se tornou um homenzinho? — falava a voz no ar — Esta aqui para provar alguma coisa?

Os dentes de Mike batiam constantemente com o frio, era difícil de se concentrar naquela situação. De repente um algo o acertou com força em sua costela, fazendo o gritar.

O sogo de gelo do avareza perfurou sua pele como milhares de agulhas. Mas não foi só uma ou duas vezes, foram várias. Golpes vindo do nada começaram a acertar o jovem, que parado no mesmo lugar era um alvo fácil, se contorcendo como se fosse uma boneca de trapos.

Caiu de joelhos sentindo as dores de cada golpe. Uma presença pesada o empurrou no chão. Christopher estava sobre ele, esmurrava seu rosto com toda força. O corpo do pecado não estava completamente ali, parte da sua cintura para baixo fazia parte da névoa.

— Bem vindo ao meu inferno de gelo — disse ele no ouvido de Mike.

O rosto do rapaz estava vermelho de sangue. Mike estendia os braços procurando alguma coisa para certar em Christopher, mas não havia nada.

— Morra — disse ele.

O avareza tocou no peito de Mike. Mas nada aconteceu.

— Mais uma vez eu não consegui, eu não entendo! — resmungou Christopher rangendo os dentes — POR QUE NÃO FUNCIONA?    

Mike sentia seu corpo amolecer amis e mais, como se estivesse entregando os pontos pouco a pouco. Os dedos de Christopher se fecharam em volta do pescoço do jovem e começaram a apertar.

— Nã..— tentou dizer Mike, ele queria lutar, não queria desistir.

— Você veio até aqui e perdeu, agora aceite a sua morte — Christopher apertava mais o pescoço de Mike, que abria a boca em pânico, não conseguia mais se mover.

De repente tudo se movimentou com extrema violência. A névoa de Christopher foi arrastada para longe. Mike de olhos zonzos conseguiu ver o bloco de gelo que tampava a porta com um buraco enorme. Então, obrigou seus braços a se movimentarem mais uma vez, forçando a se sentar.

Uma figura entrou no lugar, a pouca iluminação não permitiu que ele visse quem era. A pessoa movimentou rapidamente um dos braços e as janelas lacradas estouraram para fora da mansão. A luz invadiu o que parecia ser uma sala de jantar. Muriel estava lá.

— Não! — falou Mike — Muriel fuja!

Mas a mulher ficou firme em seu lugar. Christopher estava de volta, dessa vez em seu corpo completo. Avançou com fúria.

— Má escolha — disse Muriel movimentando seus braços como se estivesse conduzindo uma orquestra. Vários objetos pesados da sala, como pianos e mesas, voaram para cima do jovem.

Algumas coisas acertaram em cheio o avareza, mas outras foram destruídas por seus golpes. Christopher se aproximou perigosamente da mulher, mas outra figura disparou pela sala e o golpeou em vários lugares ao mesmo tempo.

— Caleb! — disse Mike surpreso.

O jovem magricela de pele escura pela primeira vez estava lutando. Seus movimentos eram absurdos. Christopher parecia completamente assustado. Ele dobrou os joelhos para avançar, mas Caleb o acertou com um chute no ar devolvendo-o ao mesmo lugar.

O avareza levou sua mão até o chão, fazendo Mike gelar, pois ele sabia o que viria, mas Caleb imitou o movimento também colocando sua mão no chão. Espetos de gelo romperam do braço de Chritopher, que urrou de dor.

O jovem pecado se transformou em névoa mais uma vez, porém foi a vez de Muriel agir. Movimentando seus braços e mão, o movimentou da mulher era estranho, como se estivesse comprimindo um balão de ar invisível nas mãos, que diminuía cada vez mais. Era exatamente o que estava aconteceu com Chistopher. Sua presença de fumaça se reunia contra sua vontade no mesmo lugar, como se estivesse preso em uma bolha. Ele tentava escapar, mas Muriel não permitia.

— Agora! — berrou ela.

Caleb saltou com um de seus braços inclinados, a palma da mão ereta. Ele passou pela presença em formato de névoa, retirando dela o corpo de Christopher, arrancado a força daquele estado.

— Faça! — ordenou Muriel.

A mão de Caleb estava no peito de Christopher, que por algum motivo não conseguia se movimentar, seus olhar estava perdido em algum canto do quarto.

— Me perdoe por não ser capaz de salvá-lo, pois é tarde demais para o seu corpo — falou Caleb, finalmente dominando a língua.

Ele fechou os olhos e uma luz dourada rompeu do peito do avareza. O lugar começou a tremer com a intensidade do que estava saindo daquele lugar. Os dedos de Caleb deixavam o corpo delicadamente enquanto o corpo de Christopher relaxava.

— Eu senti — disse ele de olhos arregalados e a voz engasgada, um sorriso se manifestou — Obrigado.

O frio desapareceu. Mike correu ao encontro de Muriel.

— Como? — perguntou exasperado — Como você soube?

Ela pigarreou.

— Seus amigos me avisaram do que estava acontece — disse ela em um tom esquisito — Esse plano acaba agora!

Caleb fechou os olhos de Christopher e caminhou até Mike.

— Sebastian contou para ela sobre o que você estava fazendo — disse Caleb.

— Mas isso não fazia parte do plano!

— Sebastian trocou a informação do seu paradeiro pelo diário de sua tia — contou.

Mike ficou estático. Sebastian havia planejado aquilo desde o princípio, mas ele tinha certeza que ele não abriria a mão de acabar com Alphonse também.

— Ainda não acabou — falou Mike, surpreendendo Caleb e Muriel.

— Você não entendeu seu moleque, eu disse que acabou! — rosnou ela.

— Sebastian vai estar aqui a qualquer momento — disse Caleb olhando para os lados —­ Cherry também esta vindo.

A expressão de Muriel o mudou completamente. Agora era um raiva voraz.

— Que porcaria vocês vão fazer aqui? — questionou — Perdeu a sanidade?

— Vamos acabar com todos, hoje — disse Mike sem folego — Alphonse é o próximo.

— E sua irmã? — perguntou aturdida.

— Vai ser...uma armadilha — disse.

TAP

O rosto de Mike virou com violência, o tapa de Muriel era carregado de sentimentos.

— Esse não é você — falou Muriel bufando, parecia segurar algum tipo de sentimento — Você não vai trair sua própria irmã!

— Vou — disse Mike — Por uma causa muito maior. Não entendo você, a ideia toda de combater os pecados, de se tornar uma virtude, foi sua!

Muriel olhava para Mike aterrorizada, como se não conseguisse acreditar nas palavras do jovem.

— Faça o que quiser — disse ela, e em seguida deixou o salão.

Mike e Caleb permaneceram em silencio por algum tempo. Ele desejava que o amigo falasse alguma coisa, mas nenhuma palavra saiu.

Alphonse encontrou Cherry parada em uma rua deserta. O carro freiou fazendo um barulho alto. Ele saltou do veículo apanhando a garota em seu braços, por fração de segundos seus lábios quase se encontraram.

— Você sumiu! — disse ele preocupado ­— O que houve?

— Não temos tempo para isso agora! — falou ela nervosa — Mike precisa da sua ajuda, ele foi atrás de Christopher!

— Junto com as virtudes? — perguntou ele.

— Não — ele engasgou com o choro — Ele foi sozinho Al, você tem que ajuda-lo. Aquele cara é um monstro!

Alphonse olhou para o céu, completamente sem nuvens.

— Entre no carro, vamos! — ele correu de volta ao veículo e arrancou soltando uma fumaça e fazendo as rodas gritarem.

Cherry tombou para trás do carro, seu cabelo voava para trás. O conversível em campo desviava dos carros quando podia. Pedestres desavisados se jogavam para os lados desesperados.

— Sem matar ninguém pelo amor de Deus! — gritou ela tentando apanhar o cinto de segurança.

Ela reparou nas roupas rasgadas do jovem, tentou evitar olhar para o peitoral exposto com a ventania.

— O que aconteceu? — perguntou.

— Depois eu explico...

Cherry não estava mais presente. A ventania agora vinha do deserto vermelho. Seus braços desesperados e perdidos tentavam se apoiar em alguma coisa.

— Que droga! — resmungou caindo no chão.

Algumas mulheres passaram por ela pulando. Tinham cabelos vermelhos e estavam seminuas, mas com a ventania era impossível ver maiores detalhes. Pareciam ninfas alegres.

— Ei! — chamou ela.

Uma ninfa parou curiosa e a encarou. Seu rosto era engraçado, mas belo.

— Onde fica a porta? — tentou — Preciso encontrar a porta!

A ninfa soltou uma risadinha fina e continuou pulando. Cherry soltou um xingamento baixinho e resolveu seguir as mulheres. Ela reparou pela primeira vez que estava usando um vestido vermelho. Era um tanto transparente, sua roupa intima era negra.

A ventania desapareceu naquela parte. As ninfas dançavam em círculos, mas a sua frente se encontrava algo absurdo.

— Isso é sério?

Havia um verdadeiro mar de fogo a sua frente. Chamas vivas e poderosas seguiam um caminho extenso pelo deserto. Mas a verdadeira surpresa foi que bem próximo dali estava uma pequena escada que levava a uma porta. Mas o lugar estava cercado pelo fogo.

Cherry podia sentir sua pele arder com as chamas. A fumaça entrava por seu nariz fazendo seus olhos lacrimejarem. Havia uma placa antes do mar de fogo. Era pequena como a de um aviso para não pisar na grama.

“Eis um caminho que leva á um destino.

Não posso garantir que o fogo não vá queimar,

Nem que não vá te matar.

Não posso garantir que o destino é o correto,

Ou o mais seguro.

Não posso te garantir absolutamente nada.”

— Que porcaria de aviso é esse? — falou Cherry espantada.

Ela procurou alguma resposta olhando para as ninfas, mas elas não disseram nada. Apenas continuaram a dançar.

— Cherry? — chamou Alphonse ao seu lado.

Estava de volta ao carro.

— Só estou preocupada... — disse ela olhando para os lados.

— Estou com um pressentimento ruim. Depois que salvarmos Mike você vai deixar a cidade imediatamente junto com Jenny e os outros — falou ele com a voz firme.

— O que está acontecendo Al?

— O problema é o que vai acontecer — disse Alphonse olhando para estrada.

Demorou muito. Cherry apertara seus dedos nervosamente desejando que seu irmão estivesse bem. Estava quase escurecendo quando o carro se aproximou da velha mansão, que mais parecia um lugar abandonado.

— Até hoje algo me deixa curioso — comentou o jovem de repente.

— O que?

— Julius — falou Alphonse — Como ele conseguiu convencer Christopher a permanecer todo esse tempo quieto nessa mansão?

Cherry deu de ombros.

— Talvez Christopher soubesse que se ele voltasse para Newcastle você iria arrancar a cabeça dele.

— Pode apostar que sim! — riu ele confiante, sem perder seu charme sem vergonha.

Os dois saltaram do veículo e começaram a correr pelo campo em direção a mansão. Por vezes Alphonse puxava a garota pelo braço, mas Cherry não conseguia correr na mesma velocidade, mas tentou o máximo que pode.

— Essa falta de tempestade me irrita profundamente! — resmungou Alphonse.

Os dois entraram no local com cuidado. O mundo parecia ter desabado dentro daquela mansão. Cherry estreitou os olhos para enxergar pela escuridão. Ao longe um lugar meio iluminado chamou sua atenção.

— Fique atrás de mim o tempo todo Cherry, querida — pediu ele.

Ela conseguia ver alguém deitado no chão. No final do quarto pouco iluminado havia uma pessoa no chão, mas ela não tinha certeza se era Mike.

— Eu vou — disse ele afastando a garota com seu braço.

— É o Mike? — perguntou preocupada tentando enxergar melhor.

— Fique aqui! — ordenou Alphonse.

O jovem caminhou lentamente pelo quarto destruído. Havia muita agua no chão, como se alguma coisa tivesse derretido recentemente. Alphonse se aproximou do corpo, mas parou alguns centímetros antes.

— Al? — chamou ela — Quem é?

— Seu irmão — respondeu com uma voz esquisita.

Alphonse continuava parado e isso estava irritando Cherry. Ela não conseguia ver o rosto do jovem, ela deu passos para frente.

— Eu mandei não se aproximar! — vociferou ele.

— Então me conte o que diabos está acontecendo! — rosnou furiosa — Por que está parado feito uma estátua?

— Porque meu corpo não me obedece — disse ele com naturalidade.

Após Alphonse revelar o que estava acontecendo a pessoa deitada no chão se levantou rapidamente. Era Mike.

— Ele caiu na armadilha! — falou alto. Por de trás de Cherry outras figuras apareceram.

Alphonse caiu de joelhos, parecia que seu corpo pesava toneladas.

— Muito bem Mike! — disse Sebastian passando por Cherry — O diário de Muriel provou seu valor.

Mike deu uma rápida olhada no diário que estava no chão, onde ele estava deitado. Havia um circulo desenhado no chão, mas Alphonse não percebera isso.

— Mike! — chamou ela, mas alguém a segurou. Caleb estava lá e fez um sinal negativo com a cabeça.

— Interessante, não? — perguntou Sebastian passando por Alphonse — Com as instruções do diário da velha conseguimos capturá-lo com bastante facilidade.

Alphonse abriu um sorriso.

— É engraçado pra você? — perguntou Sebastian, também sorrindo — Devo pensar que você preparou outro meio de se fortalecer? Outro cabo condutor?

— Não — disse Alphonse sincero — Dessa vez estou completamente fodido mesmo.

Sebastian soltou uma gargalhada alta. Ele caminhou até Alphonse, colocando suas mãos nos ombros largos do pecado. Inclinou-se e disse:

— Completamente — repetiu Sebastian.

Alphonse soltou uma risadinha abafada.

— Você deve estar cheio de tesão agora, não é? — falou ele olhando para o jovem loiro.

Sebatian ficou totalmente desconcertado e mudou sua expressão para um olhar sério.

— Félix! — chamou ele.

Em segundos Félix estava ao seu lado. Ele inclinou-se para Alphonse e tocou a testa do jovem. Não demorou muito para que houvesse uma resposta.

— Alphonse mandou todos os outros pecados para fora da cidade! — disse energético.

Sebastian parecia nervoso.

— Qual á distancia? — perguntou rápido.

— Vamos perdê-los se continuarmos aqui. Alphonse vai tentar ganhar algum tempo provocando você — explicou Félix.

Alphonse soltou um xingamento em grego. Observou Cherry parada na entrada do quarto. Sua expressão era completamente vazia, como se estivesse em outro lugar. Em outro mundo.

— Cherry? — falou baixinho. Imediatamente ela piscou, desperta.

— O que está acontecendo? — perguntou ela confusa.

O jovem luxúria aos poucos deitava no chão, como se a gravidade o abrasasse cada vez mais.

— Era uma armadilha, afinal — disse Sebastian dando de ombros e sorrindo — Mike fazia parte disso.

Cherry fitou Mike surpresa.

— Me dia por favor que isso é mentira Mike — ela avançou em sua direção — Me diga que você não fez parte dessa besteira!

Mike virou o rosto sem responder nada.

— A resposta esta claramente na sua frente, por que precisa que ele diga isso pra você? — perguntou Sebastian, ele caminhava como um gatuno pelo quarto — Vamos, meus amigos!

Ela ainda encarava Mike, um sentimento esquisito circulava por todo o seu corpo. Era algo venenoso.

— Sabe Mike — disse ela com a voz engasgada — Não sei que tipo de laços nós ainda tínhamos...

Mike retribuiu o olhar, ainda sem dizer absolutamente nada.

— Mas ele termina aqui — falou Cherry amargurada. Correu em direção á Alphonse.

Sabia que tudo o que tinha que fazer era retirar aquele diário daquele lugar.

— Não! — gritou Alphonse, mas era tarde demais.

Cherry cruzou o circulo feito por Mike e seu corpo paralisou imediatamente.

— O que está havendo? — perguntou desesperada, tentando mexer seus músculos.

Sebastian soltou uma risada mais intensa.

— Minha suposição estava correta — disse ele, estava quase se retirando do quarto — Uma parte do luxúria se encontra dentro de você. É cheque mate, ganhamos.

Cherry caiu de joelhos se sentindo pesada. Lembrou-se da vez em que Alphonse a salvara, as duas vezes. Uma parte dele vivia dentro dela e aquilo a tornava igual á ele. Um pedaço da luxúria em seu corpo que sempre permitiu que o jovem a encontrasse. Ela havia se esquecido.

Seu corpo cedeu completamente ao lado de Alphonse. O chão estava gélido, ela podia ver o rosto colado do jovem observando sua expressão de pânico.

— O que vamos fazer quanto ao Alphonse? — perguntou Mike.

— Não temos tempo para matar uma luxúria original agora. Se fizermos perderemos todo o resto — disse Sebastian — Deixe-os aí, não vão poder se mexer até voltarmos.

As virtudes deixaram a mansão rapidamente. Alphonse e Cherry permaneceram colados ao chão frio.

— Al, me perdoe! — falou ela, quase como um guincho — Tudo isso é culpa minha! Sempre foi!

— Sua culpa? — perguntou intrigado — Não vejo por que...

— Eu sabia que era uma armadilha! — explicou ela apertando os olhos como se as palavras precisassem ser vomitadas — Eu sabia que Sebastian estava preparando uma armadilha pra você...mas eu perdi a cabeça quando ele disse que Mike estava em perigo real.

— Então — ele suspirou — Você só fez o que achava correto para salvar seu irmão. Não vejo nada de errado nisso.

— Não Alphonse! — falou gemendo — Não está certo! Eu apostei a sua segurança para salvar Mike! Isso jamais poderia ser considerado algo correto!

Ele não disse nada, somente fechou os olhos.

— Eu pensei que seria uma armadilha fácil de você escapar...você sempre consegue! — ela engoliu a saliva dolorosa — Eu não suportaria perder você! Fui estúpida como sempre! Egoísta!

Ela observava o jovem deitado no chão frio, parecia um anjo caído. Os cabelos espalhados de maneira matemática, como uma pintura.

— Eu não sei o que aconteceu comigo...acho que pirei — confessou ela.

— Cherry, querida — falou ele ainda de olhos fechados — Eu sabia que se tratava de uma armadilha. Estava óbvio demais. Então pare de se culpar, pois eu estava ciente.

Ela olhava surpresa para Alphonse.

— Alphonse, pelo amor de Deus! — disse ela irritada, mas querendo chorar — Você sabia que era uma droga de armadilha e mesmo assim veio? Sem pensar? Mas por que droga? Por que?

Ele abriu os olhos.

— Por que você me pediu — disse ele com suavidade.

Uma explosão dolorosa no peito de Cherry alcançou o rosto da garota em segundos. Seus olhos vazavam descontroladamente enquanto sua expressão se contorcia em dor, os dentes rangendo em quanto ela soluçava alto. Soltava um gemido zangado misturado com o desespero de seu coração. O pânico de sua alma.

Chorava sem parar.

Ela fora morar com Alphonse para que os dois descobrissem uma maneira de ficar juntos. Tudo aconteceu menos aquilo. Cherry observava a trajetória que teve durante o ano. Fechada completamente em seu mundo, não conseguia mais se lembrar quando fora a última vez que passara algum tempo juto com ele. Ela não conseguia pensar em nada que viesse de sua parte. Nada que ela tenha feito.

Sempre fora Alphonse. O baile em sua homenagem, os presentes constantes, a biblioteca, tudo. A única coisa que o jovem sempre exigira dela era que Cherry retribuísse o sentimento. Que acreditasse como ele que aquilo daria certo. Mas uma vez ela não fizera nada daquilo.

Como Alphonse suportara tanto? Por que valia apena lutar por Cherry? Gastar tempo e energia em alguém que não retribuíra jamais. Ela olhava para ele em prantos. Sentia sua cabeça explodir em dolorosamente. Falta de ar além do normal. Seu coração apunhalando seu peito

— Você vai acabar se afogando Cherry querida — comentou ele sereno.

— Me...per — ela estava engasgada com tudo — Me perdoe!

Alphonse sorriu.

— Me xingue, brigue comigo — suplicou — Por favor Alphonse, eu mereço!

— Vadia.

Cherry riu, ao mesmo tempo que suas lagrimas escorriam. Os dois permaneceram ali olhando um para o outro.

— Você é tudo o que eu tenho — disse ela — Eu quero que se dane minha fala clichê, mas é verdade!

— Continue falando — pediu ele fechando os olhos e sorrindo.

Mas ela fez outra coisa. Com muito esforço ele moveu o seu braço em direção a ele, ignorando a dor. Alphonse percebeu seu movimento e fez o mesmo. Os dedos conseguiram se tocar.

— Cherry — falou ele baixinho — Obrigado por estar em minha vida...

Ela fungou.

— O brigado por me permitir estar na sua vida! — disse ela.

— Vou te dar um último presente — Alphonse fechou os olhos.

— O que?

— Aquilo que você procurou todo esse tempo — falou ele quase sussurrando — A chave para o seu segredo...

— Estava com você todo esse tempo? — perguntou surpresa.

— Sim — ele sorria cheio de dentes — Não ia perder a chance de ser a peça essencial nessa sua jornada maluca.

Cherry sentiu vontade de soca-lo, mas se permitiu sorrir em resposta.

— Agora me faça o favor e abra logo aquela maldita porta! — pediu ele, jogando Cherry de volta no deserto vermelho.

No carro Mike não conseguia impedir seu corpo de tremer. Estava sozinho, pois as virtudes foram na frente utilizando seus poderes. Não tinha ideia do que iria encontrar. Havia a certeza de que Richard estaria lá. Sebastian acabaria com ele rapidamente?

A estrada ficava cada vez mais escura. Ele chegaria imensamente atrasado para a batalha, mas sabia que sua presença seria essencial. Um elemento surpresa. Se sentia completamente diferente, não sabia explicar por que. Tentava afastar a imagem de sua irmã deitada no chão, sem poder se mexer.

“Não sei que tipo de laços nós ainda tínhamos...mas ele termina aqui”. Aquela frase ecoava constantemente em sua mente. Ao longe Mike pode visualizar dois faróis solitários na estrada escura.  O jovem sentiu a presença de todos que estavam naquele lugar. Finalmente chegara.

— O que aconteceu? — perguntou, reparando que virtudes e pecados estavam em extremidades diferentes. Não se moviam.

— Anna Belle está aqui — falou Sebastian encarando alguém.

Mike pode ver. Dois carros estavam parados ao lado do grupo de pecados. Richard e seus subordinados, Jenny e Julius. Mas havia outra pessoa lá. Se aproximando mais da cena finalmente reconheceu que Sophie estava lá também.

Jenny estava mais ao fundo, parecia bastante assustada. Julius estava apoiado em um dos carros. De braços cruzados e olhos fechados ele parecia estar dormindo, ou tomando coragem. Richard e seus subordinados estavam á frente dos demais. Sua avó estava ao seu lado. A mulher tinha uma postura firme e segurava um pequeno livro.

Anna Belle usava um vestido purpura esquisitíssimo. Os cabelos arrumados em formato de coração, como sempre.

— Com o diário dela não podemos nos arriscar avançar — comentou Félix ao seu lado.

Sebastian carregava uma espada japonesa que emanava uma luz intensa. Mike observou os outros rapidamente. Edgar estava á frente, Gasper e Caleb se encontravam em um lugar de pouca luz a espreita.

— Ficaremos assim por toda a noite? — perguntou Anna Belle com sua voz tediosa.

— Não — respondeu Sebastian sorrindo — Muito em breve um de vocês irá morrer!

Jenny encolheu em seu lugar.

— Como vamos atacar? — perguntou Mike, seus olhos pregados em Sophie. Sua mente começava a elaborar um plano para retira-la daquele lugar.

— Seu nome é Richard, não é? — perguntou Sebastian de repente, Mike se surpreendeu com a inciativa.

O jovem loiro deu alguns passos á frente. Richard lançou lhe um olhar furtivo.

— Aquela ali atrás é a famosa Sophie? — Mike foi pego de surpresa novamente, seu coração acelerou imediatamente. Richard também estava surpreso — É uma garota bastante interessante, preciso admitir. Agora entendo porque uma virtude e um pecado se apaixonaram tão facilmente.

Um silencio calou todo o lugar. Richard piscava confuso enquanto Mike se enchia de raiva por Sebastian.

— Do que diabos você está falando? — perguntou Richard.

Sebastian fez sua famosa falsa surpresa e sorriu.

— Você não sabia — ele riu — Odeio contar essas coisas para as pessoas, mas... Sua querida namoradinha tem um pequeno caso com nosso amigo Mike!

— Sebastian! — repreendeu Edgar.

Richard parecia respirar com dificuldade, como se estivesse prestes a soltar chamas pela boca. Ele encarou Sophie como se estivesse perdido, mas a jovem não retribui o olhar. Aqui o deixou arrasado.

— Apareça! — vociferou Richard — Apareça!

Sebastian lançou um olhar provocativo para Mike, com o sorriso ardiloso no rosto.

— Você queria sua chance — disse ele — Aqui está ela.

Mike estava sério. Lançou um olhar fulminante para Sebastian antes de se apresentar. Richard exibia veias enormes em seu pescoço, os braços tremiam deixando chamas vorazes saírem de seu punho.

— Não Mike! — disse Sophie.

A jovem não conseguia esconder a verdade das palavras de Sebastian. Seu olhar e voz indicavam tudo aquilo que Richard não sabia. O jovem foi consumido pela chama da ira.

Por muito pouco Mike não conseguira se esquivar do primeiro ataque de Richard. O rastro de fogo indicava o caminho que o punho fizera até o chão. Sebastian e as outras virtudes se afastaram dando espaço para os dois lutarem.

Tudo se resumia a aquele momento, pensou Mike. Ele não aceitaria morrer sem ao menos derrubar Richard. Seus golpes eram repelidos pela ira do jovem, mas Mike também não se deixara acertar.

— Você vai morrer! — disse a voz vinda do fogo.

— Não! — disparou Mike de volta — Eu não vou!

Finalmente um golpe acertara, mas foi Mike que levou. O soco no estomago quase apagara sua consciência. O impacto fora tão grande que o jovem deixara o chão, erguido pelo poder avassalador. Aquilo fora uma grande perda, pois não havia mais tempo de desviar do próximo ataque.

TUM

A impressão que dava era que uma maquina gigante de construção estivesse golpeando o concreto do chão. Tudo tremia enquanto Mike recebia cada soco.  Ele juntou os braços para proteger o rosto, mas seu corpo começara a ceder com o impacto absurdo e a dor lasciva.

Mike fora arremessado para trás.

— Mike! — gritou Sophie, aumentando a chama de Richard mais e mais.

Anna Belle não movia um musculo, apenas assistia Mike ser espancado. Os subordinados de Richard sorriam com energia enquanto Jenny abraçava Sophie tentando fugir daquela cena.

— Não vou ficar olhando! — disse Edgar indo ao auxílio de Mike.

Richard pulou em cima do jovem, seu corpo ainda em chamas, fazendo Edgar urrar. Mike não conseguia enxergar direito, seu corpo não respondia. Concentrou no desejo de mover cada musculo, movido pelos gritos de dor.

Gasper e Félix também entraram na luta, mas Caleb e Sebastian permaneceram onde estavam. Entravam em choque com os corpo em andamento, pecado e virtude. Mike pode visualizar rapidamente um dos subordinados de Richard explodir literalmente depois que Gasper acertou-lhe com um de seus feixes de luz poderosos. Não restava mais nada do jovem.

Edgar estava gravemente ferido, agonizava em um canto. Mike se arrastava na direção do amigo, não conseguia movimentar suas pernas. Félix golpeava Richard sem parar e voltava a se movimentar com agilidade, mas o pecado da ira não demonstrava nenhuma alteração. Suas chamas continuavam intensas e mortais.

Dois subordinados restantes seguravam Gasper, que tentava se livrar dos braços em chama. Richard conseguira golpear o rosto de Félix, Mike só pode ouvir os seus gritos. Parecia o inferno.

— Faça alguma coisa! — ele tentou gritar, mas sua voz saiu rouca e fraca em direção a Sebastian.

Richard caminhava em sua direção. Cada pegada deixava um rastro incandescente para trás. O corpo de Mike gritava por descanso, desejando o fim da luta. Chegara a seu limite.Os olhos cediam aos poucos e a presença de Richard estava cada vez mais próxima. Mas ele não conseguia avançar mais e aquilo deixou Mike curioso.

Observou melhor o jovem em chamas. Suas pernas e braços lutavam o máximo para dar mais um passo á frente, mas havia algo o impedindo. Os olhos cansados do jovem foram obrigados a olhar para outra direção. Muriel estava lá.

— Mike! — gritou ela em sua direção. Seu rosto velho iluminado pelas chamas amareladas da ira. Os braços estendidos indicando que de alguma forma era ela quem estava impedindo Richard de chegar mais perto — Mike tente se mexer!

Ele fez um careta indicando que estava tentando bastante. Seus braços dobraram para que o corpo se mexesse ao menos alguns centímetros, mas tudo estava dormente. Muriel apresentava uma expressão preocupada, hora olhando para Richard, hora olhando para Mike. A ira não parecia ceder jamais, era apenas uma locomotiva incontrolável de ódio.

O destino era Mike.

— Tente moleque! — berrava ela em angustia — Precisa tentar.

Mike soltou um grito de dor. Cotovelos no chão seu peito se erguia do chão lentamente. Todo seu corpo tremia em uma dor fora da realidade. De repente os dois jovens que seguravam Gasper soltaram a virtude e começaram a correm em direção de Mike.

Gasper só teve chance de desintegrar um deles.

Tudo aconteceu rápido demais, pois Mike só conseguia enxergar borrões em andamento. O subordinado á sua frente com a vontade assassina no rosto. Seu corpo fora arremessado metros de distancia em um segundo.

O fogo intenso que estava sendo contido fora liberto por Muriel, que precisou fazer isso para salvar Mike. Era tudo incrivelmente rápido, mas dessa vez parecia uma câmera lenta brutal, quando tudo aconteceu. O jovem ao chão pode ver um baque estranho, um choque de corpos. O som do corpo de Muriel caindo ao seu lado era abafado, simples, mortal.

Ao seu lado o rosto da velha senhora o fitava eternamente, a ultima lagrima escorria para os lados. Mike observava cada detalhe daquele rosto, que aos poucos perdia toda a vida e calor. Aquilo era real? Seu rosto começou a arder, os olhos deixaram de piscar. Podia escutar a batida de seu próprio coração bater como uma badalada.

Mike levantou, não soube como. Seu rosto fora dragado para junto do corpo sem vida de Muriel. Olhos arregrados e dentes e apertando violentamente. A mulher continuava a olhar para o lugar que o jovem estava segundos atrás. Ele agitava o corpo no chão, mas nada acontecia.

O que estava acontecendo?

O som aos poucos começava a retornar. Seus olhos fazavam um liquido em chamas enquanto seu estomago revirado enviava uma onda dolorosa até a sua garganta e boca.

— MURIEL! — urrou enlouquecido agitando mais e mais a mulher sem vida — MURIEL!

Era macabro ver que ela não respondia a nada daquilo. Sua expressão continuava a mesma, não havia absolutamente nada em seus olhos. Mike berrava o seu nome, berra simplesmente. Suas mãos apertavam as vestes de Muriel, ele balançava a cabeça como se quisesse que alguma coisa passasse. Seria um pesadelo?

— NÃO! — dizia alto, sua garganta explodia em prantos.

Todos os momentos perfuraram a sua mente de uma vez. A casa, a comida, Muriel ainda tinha o cheiro de cigarro. Os momentos rindo, as brigas, os concelhos. Muriel olhando para ele, comentando sobre qualquer coisa que fosse, viva. Ela estava viva há minutos atrás, viva quando ele entrou naquela casa, viva na velha mansão. Mike chorava sem controle. Um choro infantil, um choro desesperador. Os olhos apertados até provocar dor. Seu coração parecia sangras, uma dor impossível e lasciva devorava o seu ser por completo. Soluçava.

— Não Muriel, não — suplicou para o corpo da avó — Não...

Ele encontrou sua testa nos lábios ainda quentes de Muriel. Suas lagrimas escorriam sem parar, os dentes trincando tentando conter sua agonia. Tocando ela pode sentir a causa da morte, o ventre empapado de sague, como se algo tivesse a golpeado. Suas mãos vermelhas mergulharam o jovem na triste realidade de vez. Ao longe ele pode visualizar Claire, a ceifadora, deixando o local lentamente. Seu olhar lançado até ele, os lábios soltaram um sincero “Me desculpe”.

Muriel se fora.

Os olhos de Mike alcançaram Richard com violência. O jovem pecado estava parado observando ele, não estava mais coberto por chamas, como se a morte de Muriel tivesse o despertado por um momento. Mike estava de pé.

Richard piscou e voltou sua atenção para o jovem a sua frente. Os olhares se encontraram. Mike não sentia dor nenhuma, nem medo. O ira sabia o que o rapaz iria tentar fazer, então permitiu que seu corpo fosse tragado pelo fogo mais uma vez.

Um segundo foi o tempo que Richard precisou para pisar fundo no chão e avançar em sua velocidade sobre-humana em direção a Mike.

TUM

O lugar inteiro estremeceu ao som da força infernal da Ira. O soco carregado de poder e força avançou voraz em direção a Mike, porém o resultado fora diferente.

— Como? — perguntou a voz vinda do fogo.

O soco brutal de Richard fora totalmente contido por uma das mão de Mike. O jovem estava posicionado com a mão para frente, os músculos saltando, o olhar fulminante. Não houve tempo algum para a ira digerir o que aconteceu naquele momento, pois Mike se movimentara tão depressa que isso foi impossível.

Fora um soco tão forte que a cabeça de Richard quase deslocara perigosamente. O jovem de fogo cambaleou sem direção para trás. Mike apenas deu alguns passos em sua direção, uma mão apanhou seu ombro e a outra recolheu-se um pouco, como se ele estivesse puxando alguma coisa muito pesada, mas era só uma distancia mortal para acertar outro soco na Ira.

Um, dois, três golpes! Richard precisou ficar inclinado, pois Mike golpeara seu estomago. O fogo desapareceu, o jovem tinha uma expressão de pânico misturada com a falta de fôlego.

Mike não sabia o que estava acontecendo com ele, mas o seu sangue fervia descontroladamente. Acertou mais um golpe do rosto de Richard, que fora ao chão. Ele queria matá-lo.

— Faça Mike! — disse Sebastian concentrado — Acabe com isso de uma vez! Era isso que você queria!

 Aquela fala o despertou. Observou afigura de Richard no chão, fraca e indefesa. Aos poucos ele sentia que a força que ele ganhara de repente estava o deixando, enquanto a tristeza da perda por Muriel parecia retornar. Mike caminhou até ele e o apanhou, segurando o jovem por trás, suas pernas tremiam fracas.

— Faça você Sebastian! — disse ele com dificuldades para falar — Se não fizer agora eu vou soltá-lo!

Sebastian observou Anna Belle, uma estátua, segurando seu caderno. Pela primeira vez ela se moveu, dando passos para trás aumentando o espaço entre eles. O jovem loiro puxou sua espada fina e luminosa.

— Segure-o Mike! — pediu Sebastian, ainda atento a Anna Belle.

— Não Mike, deixe-o! — suplicou Sophie ao longe.

Mike apertou os olhos, ele não queria outra morte, mas haveria muitas outras se Richard continuasse vivo.

— Seja rápido Sebastian — falou Mike, desejava que ele acabasse com Richard de uma maneira sem dor.

Sebastian deu alguns passos, observava agora o rosto de Richard, Mike teve a impressão que aquele seria o alvo. Rápido e indolor. Quando ele pulou, avançando em direção a ira, realmente não houve dor alguma. Na verdade não existiu qualquer sensação.

Mike Se surpreendeu quando ele próprio cuspiu sangue de sua boca. Sebastiane estava muito perto de seu rosto, já que Richard parecia desacordado e sua cabeça pendia para o lado, mas não fora cortada. O jovem virtude estava com o corpo colado ao da Ira, um dos braços dobrados contra o peito. Um sorriso se manifestou.

— Dois problemas resolvidos — disse ele baixinho.

O olhar de Mike pendeu para a lamina luminosa que atravessara Richard e ele ao mesmo tempo, bem no peito. Cuspiu sangue mais uma vez. Sebastian tocou os seu lábios com os de Mike lentamente e disse:

— O jogo acaba para você Mike...

A visão do jovem escurecia aos poucos como se ele estivesse mergulhado no poço mais uma vez. Se afastava daquela cena, mergulhando na escuridão.

Sebastian removeu sua espada. Os dois corpos caíram no chão, Jenny e Sophie gritaram. Mike envolto a uma poça enorme e vermelha. Não estava mais ali.

Cherry corria no deserto vermelho o máximo que podia. Não ventava mais, não havia ninfa alguma.

— Sevan? — chamou ela ao ver a gaiola aberta e caída sobre a areia.

Não havia sinal algum do jovem, mas o que chamou realmente a atenção de Cherry era que ela se encontrava no lugar onde um mar de fogo queimava intensamente. O fogo se fora e a porta estava a sua frente.

Seu coração acelerou quando ela subiu os degraus até a porta. A chave apertada em sua mão, ela girou tremula o objeto na fechadura. Um lugar completamente diferente a aguardava por de trás da porta.

Um corredor com luzes, tudo era branco. Ela caminhou lentamente pelo lugar, só havia uma única direção para seguir. Podia sentir que chegara o mais fundo possível em sua mente. Concluiu que aquele era um hospital.

— É isso — disse ela em tom conclusivo observando uma porta feita de madeira no final do corredor, não havia fechadura nela.

Talhado na madeira havia uma flor com pétalas voando em relevo. Cherry respirou fundo, percebia que uma luz violeta escapava por de baixo, aquilo só a deixou com a curiosidade mais acelerada. Estendeu o braço, os dedos roçaram na maçaneta antiga. “O meu segredo...”.

Sua atenção, porém, foi atraída para sua direita. Ao contrario do resto do corredor hospitalar, havia ali naquele final um cortina na parede, como aquelas que separam por muitas vezes um paciente do outro. Ela esvoaçava tranquilamente.

Cherry observou mais uma vez a porta com a flor, mas queria saber o que existia atrás daquela cortina. De repente a porta que a garota viera se abriu, ela pulou de susto. Uma garotinha de cabelos dourados corria pelo corredor, ela pensou que a criança iria até a porta com a flor, mas a pequena espiou atrás da cortina e entrou.

— Ola? — chamou Cherry, se aproximou da cortina. Respirou fundo mais uma vez e abriu a cortina em um só movimento.

Era um quarto pequeno de hospital. Havia muitos aparelhos no canto perto da janela. Uma cama com alguém deitado, a garotinha na ponta do pé conversava com a pessoa que estava ali. Cherry a achou muito semelhante a Jenny com aqueles cabelos tão dourados.

— Quem está deitado aí? — perguntou Cherry, mas a garota parecia não escutá-la.

— Está doendo muito? — perguntou à pequenina, aparentava ter uns cinco anos de idade. Talvez menos.

— Muito... — respondeu uma voz fraca.

Cherry se aproximou da cama com maior cuidado. O lugar era gelado demais e estranhamente triste. O barulho das maquinas tinham uma sinfonia tediosa.

— Vai ficar tudo bem — sorriu a menina inocentemente.

Na cama um garotinho loiro, aparentando ter a mesma idade da garota, estava deitado. Haviam tubos por toda a parte e ele estava muito magro e pálido. Contornando os seus olhinhos havia um mancha escura. Cada respiração parecia um grande sofrimento. Cherry sentiu vontade de chorar.

— Papai... — tentou dizer a criança — Estava chorando.

— Todo mundo está chorando — disse menininha dando de ombros — Não sei por que.

— Não gosto de ficar aqui — confessou o garoto — Minha boca está com um gosto ruim.

— Você dormiu muito — disse a menina — Quase sempre estava dormindo...

— Eu sonhei com uma bruxa — falou a criança na cama.

A pequena fez uma careta.

— Uma bruxa?

— Sim — falou ele com toda a inocência de uma criança tão pequena — Mas ela não era má. Disse que eu ia ficar bem...

— Toda bruxa é malvada — falou a menina — Não existe bruxa boa.

— Você não sabe de nada... — falou ele enfraquecido.

A pequenina ficou observando as maquinas, acompanhando o trajeto dos sinais vitais que passavam nos aparelhos.

— Cherry... — chamou o pequeno.

Cherry se aproximou se assustou com o seu nome, mas foi a garota quem respondeu.

— O que?

Ele olhava para ela meio perdido, como se não conseguisse realmente ver a garota.

— Eu queria sair daqui — falou.

— Mamãe disse que você não pode Mike! — falou aborrecida — Já te disse!

Cherry arregalou os olhos estarrecida com o nome “Mike”.

— Mas eu quero! — falou com a voz chorosa.

A garota de repente começou a se mexer desengonçada. Ela subiu em cima da cama do pequeno Mike. Seu corpinho leve não fez a cama se quer tremer.

— Trouxe um presente pra você — disse a menina.

Ela retirou do bolso uma estrela feita de um papel brilhoso. Com sua mãozinha alcançou o ferro que segurava o soro conectado a Mike. Havia uma pequena linha amarrada á estrela, ela fez um nó atrapalhado, mas conseguiu prendê-la.

Desceu da cama orgulhosa. Mike tremia, mas os olhos amarelados reluziram ao ver a estrela girar em cima dele.

— Faça um desejo — falou a pequena Cherry — Essa é uma estrela dos desejos.

O sangue parecia ter fugido do rosto de Mike. Os olhos extremamente cansados se fecharam.

— Fale pra mim — falou ela — Eu guardo segredo.

Mike apanhou a mão da irmã e apertou, como se estivesse caindo em um abismo.

— Quero... — falou ele meio engasgado — Melhorar.

Cherry não soltou a mão de Mike. Ela observava o irmão se contorcer em agonia, não conseguia entender o que estava acontecendo ali. Então, a pequena se inclinou e beijou a testa do irmão. Apertou os olhos junto com ele, como se os dois estivessem desejando a mesma coisa.

A jovem Cherry parada ali no quarto levou as mãos á boca, completamente espantada. Estava em choque. Aos poucos o cabelo da pequenina Cherry ganhava um tom mais escuro, parecia castanho.

Mike também.

— Eu me lembro... — disse ela — Eu me lembro de tudo!

De repente o pequeno Mike começara a respirar aliviado, como se aos poucos ele finalmente estivesse descansando do sofrimento. A pequena Cherry se afastou, parecia um pouco perdida e confusa. Ela lembrava-se daquilo, da cabeça estranhamente pesada. Uma estranha infelicidade...

Ela sabia, entendia as coisas.

— Mike! — falou ela aterrorizada, deixando o quarto.

A porta com a rosa continuava ali, mas havia algo maior para ser resolvido.

— Alphonse me acorde! — disse ela olhando para cima — Preciso acordar!

E assim ela estava de volta ao chão frio da velha mansão. Alphonse olhava para ela confuso.

— E então? — perguntou ele — Descobriu finalmente o seu segredo?

— Não — falou ela — Mas descobri o de Mike, precisamos sair daqui imediatamente!

Alphonse não conseguia entender. Ela se remexeu  o braço estendido para o do jovem, começava a ganhar uma nova direção.

— O que esta fazendo? —perguntou ele.

Cherry se esforçou como pode para movimentar mais o seu ombro. Seus dedos finalmente apontados para o diário de Muriel aberto próximo a eles. Ela fechou os olhos e novamente usou sua força para fechar os dedos em sua mão.

Alphonse com os olhos virados dolorosamente conseguiu ver a cena. O diário de Muriel se fechando lentamente conforme os dedos da jovem se juntavam, até que finalmente as páginas bateram e o livro tombou para o lado fechado. Seus músculos relaxaram imediatamente. Os dois se abraçaram.

Na estrada escura três corpos encontravam-se inerte no chão. Sebastian limpou sua espada fina em sua calça e caminhou de volta para o lado das virtudes. O diário de Muriel estava no chão.

— O que você fez? — perguntou Félix aterrorizado.

— O necessário — respondeu Sebastian sorrindo.

Lançou um olhar vitorioso para Anna Belle, mas algo estranho aconteceu. A mulher que durante todo o tempo estava parada feita uma estátua, começou a pender para trás lentamente, até cair estirada no chão. Completamente imóvel.

O seu diário também caiu, fechando imediatamente.

— O que diabos... — comentou Gasper surpreso com a cena, mas sem deixar o amigo Edgar, muito ferido, sem auxílio.

Sebastian relutou por um minuto, mas avançou. Usou seu braço invisível para apanhar o diário de Anna Belle no chão, entregando para Caleb ao seu lado. Fitou os pecados restantes, um sorriso diabólico indicava o que ele desejava fazer em seguir. Observou a mulher estirada no chão, olhos abertos, mas não havia resposta alguma. O jovem sorriu.

— Acabou para vocês — disse — Cheque mate — ele gargalhou — Nem se quer fora um jogo, não houve contra ataque, nada! Ganhamos. Tudo ocorre exatamente como eu havia planejado.

Jenny chorava assustada nos braços de Sophie, que também parecia triste. Mas Julius saltou de onde estava e começou a caminhar.

— Eu tenho que admitir — falou com sua naturalidade de sempre — Que não esperava que um de vocês fosse capaz de fazer isso.

Ele apontou para Richard e Mike no chão. Sebastian soltou mais uma risadinha enquanto Julius analisava os corpos no chão.

— No fim, todos acabam movidos pelo sentimento. O impulso — disse Julius. Seus cabelos castanhos caindo delicadamente até os ombros, sua presença divina era fora do contexto para naquela estrada tão sinistra.

— Julius, o vaidade — riu Sebastian — Me diga, qual diabos é o seu poder de pecado? Revele o seu segredo!

Julius observou a expressão de extrema satisfação de Sebastian. Estava calmo, mas relutou um pouco para responder.

— Se eu te contar você vai me matar de qualquer jeito, não?

Sebastian sorriu.

— Imaginei que sim — suspirou o jovem vaidade — Sou capaz de projetar um espelho invisível na minha frente. Com ele sou capaz visualizar meu reflexo sempre que quiser e repelir qualquer ataque...

A jovem virtude colocou a mão na boca, tentava conter uma gargalhada.

— Não posso negar que imaginei que seria qualquer coisa do tipo — ele chorava com sua própria felicidade. Retirou sua espada — E você, é claro, cogitou me contar isso pensando que eu não me arriscaria em te atacar.

Os olhos de Julius se arregalaram quando a lamina perfurou o seu corpo, ele soltou um gemido seco.

— Seu espelho patético pode até repelir raios, bolas de fogo, seja lá o que for...mas ataques como este ele não pode fazer nada não é? — a expressão em pânico de Julius confirmou a suspeita de Sebastian.

Removeu sua lamina de Julius e deu meia volta.

— Meus amigos hoje vamos limpar a Inglaterra de sua maior ameaça — anunciou, e assim apontou para Jenny — A Gula é nosso ultimo alvo!

Jenny soltou um gritinho, mas foi um assovio estranho que chamou a atenção de Sebastian.

— Como eu disse, sempre agindo pelo impulso de emoções.

Todos que observaram a cena compartilharam da mesma expressão de surpresa. Julius se recompunha de sua posição de dor, como um ator no meio de uma peça de teatro.

— Impossível! — soltou Sebastian, não demorando para avançar contra o pecado e perfurar seu corpo mais uma vez. Mas dessa vez Julius não fingiu surpresa.

Sebastian o golpeou mais uma vez.

— No começo é difícil de aceita — disse Julius com a mesma naturalidade de antes — É realmente difícil de aceitar.

O jovem loiro fitava assombrado as feridas cicatrizarem instantaneamente até desaparecer. Julius o olhava com certa curiosidade, como se ele fosse um animal que pela primeira vez estivesse diante de um espelho e não compreendesse o seu reflexo.

— Imortal... — concluiu Sebastian aterrorizado, sua mente em chamas trabalhando a uma velocidade absurda — É claro.

Ele deu passos se afastando de Julius, que mostrava uma indiferença sobrenatural.

— Jamais houve registro de outro pecado da Vaidade —  disse ele com os olhos trabalhando sem eu pensamento — Por que só houve apenas um!

— Precisamente — confirmou Julius.

— Primeiro, único — Sebastian arregalava tanto os olhos que parecia que em qualquer momento iriam saltar de seu rosto — Nunca existiu outro pecado como você, porque você nunca morreu!

Félix e Gasper reuniram-se junto a Edgar, deixando Sebastian com sua espantosa descoberta. Apenas Caleb estava ao seu lado, mas com certa distancia.

 — Você estava lá! — falou Sebastian — Adão e Eva! A criação!

Julius deu de ombros.

— Algumas coisas foram contatadas da maneira que mais agradavam alguns...mas sim, eu estava lá. Nunca morri, minha alma não precisou reencarnar em nenhum ser humano. Só existe apenas um pecado original, realmente original, e esse sou eu.

Sebastian parecia ter concluído mais alguma coisa, mas Julius continuou.

— Stevan pode sair — pediu.

De repente a porta do carro onde os pecados se encontravam começou a abrir. Stevan desceu do carro, ainda usando as vestes de hospital.

— Eu imaginei que você fosse uma mulher — comentou Stevan olhando para Sebastian — Gostei de jogar com você.

O jovem loiro encarava os dois com uma seriedade no rosto, deixando o sorriso se tornar apenas uma lembrança distante.

— Anna Belle... — tentou dizer ele, mas Julius sorriu.

— Ele merece algum crédito, pois é muito inteligente — falou ele para Stevan.

— Anna Belle sempre foi apenas um fantoche — falou Stevan com sua voz de sonolenta — Eu utilizei meus poderes para deixa-la em um estado de sono tão profundo que qualquer um poderia controlar o seu corpo usando minhas habilidades como um meio de entrar em sua mente.

Julius apontou para si mesmo e sorriu.

— E antes dele? — perguntou Sebastian apontando para Stevan

— Antes de Stevan eu recorri á outras preguiças, que foram de igual importância.

— Por que ela? — perguntou Sebastian novamente — O diário?

— É mais complicado do que isso — explicou Julius — É algo muito maior...

Alphonse olhou o céu irritantemente livre de nuvens. Cherry estava pensativa de olhos fechados.

— Cherry, querida — tentou — Podemos ir de carro...

— Não temos tempo — disparou ela — Alphonse, sei que você conhece outro jeito. Eu quero que me perdoe por amis uma vez arriscar sua vida por motivos egoístas, mas dessa vez eu posso sentir que Mike está em real perigo. Algo muito ruim vai acontecer!

Ele observou a expressão aflita da jovem, se sentiu imensamente atraído por aqueles detalhes de suplicia. Seu corpo se arrepiou com seus pensamentos a ponto de morder os próprios lábios. Alphonse sabia que havia outra maneira, mas realmente era perigosa.

— Não tenho certeza de que seja seguro pra você... — admitiu — E se eu não conseguir te levar também? É melhor esperar aqui!

— Não posso! — vociferou ela sem querer — Fiz um grande besteira e preciso concertar imediatamente!

Alphonse não conseguia compreender o que Cherry queria dizer. A única maneira dele se transportar seria usando sua própria energia interna. Lembrou do que Albert havia lhe contato sobre o uso da energia vital e como era perigosa. Ele não só faria isso como teria que levar Cherry junto.

— Não preciso mais pensar á respeito — sorriu , ele estendeu a mão para ela — Vamos?

Cherry também mordeu os lábios.

— Vai ter que me chamar de vadia de novo, promete? — pediu ela.

— Prometo! — disse ele sorridente.

A jovem apanhou a mão de Alphonse e sua mente entrou em curto circuito. Não ficou claro como sempre acontecia quando os dois trafegavam pelas nuvens. Parecia uma mistura de cores, sabores, odores...uma explosão infernal dos sentidos.

De repente ela estava na estrada escura, haviam dois carros parados logo a frente.

— Alphonse! — exclamou quando viu o jovem despencando no chão. Seu corpo piscava como se fosse uma lâmpada falhando.

— Vá! — ordenou — Não vou conseguir me mover por um tempo.

— Você vai ficar bem? — perguntou preocupada, mas Alphonse desmaiara.

Cherry correu em direção aos veículos.

Mike sabia exatamente onde estava. O corredor, túnel, gruta, seja lá o que fora aquela construção de pedras que ele sempre visitava quando estava entre a vida e a morte. Havia tochas com chamas que dançavam conforme ele caminhava.

Precisou caminhar bastante até encontrar o trono onde Richard estava sempre o aguardando. Mike parou de caminhar alguns metros antes.

— Eu vou voltar? — perguntou a Richard, banhado parcialmente pela escuridão como sempre.

— Não dessa vez — respondeu a voz imponente — Já teve chances demais.

Sebastian circulava Julius e Stevan. Olhos cerrados tentando compreender aquilo tudo.

— Todo esse tempo... era você! — dizia — Mas por quê?

— Quando se tem milhares de anos, meu caro, você aprende a agir por outras maneiras — ele sibilou por um segundo — Na verdade...Mesmo que seja obvio que eu iria conseguir da mesma maneira, usar de outros meios para chegar a esse objetivo torna tudo muito mais interessante. Não tenho pressa alguma, sabia que teria sucesso.

— Sucesso... — refletiu Sebastian fulminando com os olhos os dois pecados a sua frente — Anna Belle era mediadora para algo muito maior. Um plano dentro de outro plano!

Mike tentava aceitar as palavras de Richard, “Não vou mais voltar”.

— Então... — tentava dizer — O que estou fazendo aqui? Não deveria simplesmente terminar?

— Terminou sim para você — explicou sério — Entretanto, o fim é apenas seu.

O jovem estranhou aquela fala, ele sentiu uma sensação esquisita. Essa visita era diferente, mas não sabia o que era.

— Os conhecimentos de Anna Belle? ­— falou Sebastian — A forma de transformar alguém em pecado!

— Fui eu quem passou essas informações — Julius sorriu com suavidade — Anna Belle ainda era jovem naquela época, não havia necessidade para controla-la ainda, mas separá-la das virtudes já seria um começo.

— Você sabia sobre nós! — disparou Sebastian surpreso.

— A conclusão menos inteligente — falou Julius desapontado — Tenho muito tempo de vida, é claro que a presença de vocês não passou despercebida. Só que nunca foram uma real ameaça para mim.

Sebastian não disse nada, apenas ficou em silêncio.

— Vocês ajudaram a controlar a população de pecados, é importante que exista um equilíbrio. Até hoje isso era importante.

— Até hoje? — perguntou Sebastian, odiando estar confuso naquele momento.

— Toda minha espera se resumiu a este momento — disse Julius calmo acariciando seu cabelo — Tudo vai mudar.

Mike caminhou até Richard dando passos lentos. Não podia negar que gostaria de achar alguma brecha, alguma saída que o fizesse voltar. Não queria mais acreditar que aquele era o fim.

— Mas é o fim — comentou Richard — A culpa disso é totalmente sua. Eu não queria isso.

— Não queria? — indagou ele rindo — Você queria arrancar minha cabeça!

— A sua cabeça não me interesse nenhum um pouco — falou Richard sério.

— O plano de Anna Belle... — falou Sebastian começando a ficar com raiva — Era seu plano. Sete pecados em um!

Julius sorriu.

— Então me faça desaparecer! — pediu Mike para Richard, ele caminhava para frente, sua mente tentando elaborar um plano — Não existe motivo para me manter aqui!

— Não estou fazendo nada garoto estúpido! — falou Richard nervoso — Eu já disse que você fez isso consigo. Agora acabou para você.

— Você fala de acabou — Mike chegava cada vez mais perto, pensava em ataca-lo — Mas se acabou, por que ainda estou aqui?

— Você tentou reunir os pecados, mas falou miseravelmente nisso — zombou Sebastian — O que me consta somente você e Alphonse são pecados originais!

— Não tenho mais interesse em Alphonse, já arranjei um substituto — falou Julius — Uma Luxúria e uma Gula originais, foi muita sorte descobrir que os dois tinham uma ligação. Poupou bastante tempo...

— Inveja, Avareza, Preguiça? — perguntou Sebastian.

— Incrivelmente fáceis de encontrar — Julius estava perdendo o interesse — Essa nunca foi à questão...

Mike chegava extremamente perto do altar de Richard.

— O que faço aqui? — perguntou, tentando distraí-lo ainda mais — Por que você continua aparecendo para mim? Mesmo muito tempo depois de ter bebido aquela coisa que seus subordinados me deram.

— Você se esqueceu de um ponto crucial — falou Sebastian, voltando novamente a sorrir — A grande falha no seu plano.

Julius levantou as sobrancelhas.

— E qual é?

Mike sentia medo daquela presença imponente sentada no trono, sem saber se seria facilmente enganado por seu ataque furtivo. Enquanto ele se aproximava perigosamente cada vez mais.

— A ira! — disse Sebastian triunfante — Com seus milhares de anos, me conte. Houve alguma Ira original?

Julius não respondeu.

— Não precisa responder, pois eu sei que não houve — ele riu — Por que se tal criatura tivesse existido o seu plano teria ocorrido com sucesso antes!

Mike sabia como poderia atacar, sentia que seria veloz o bastante. Precisava dar um ultimo passo.

— Você nunca compreendeu — disse Richard — Sempre enxergou da forma como lhe melhor atendesse suas expectativas.

— Você esta certo — confessou Julius — Foi exatamente isso que me impediu por todos esses anos.

Sebastian abriu um sorriso e buscou olhar para Caleb que segurava os dois diários, mais uma vez ele sentia-se no comando. Mike deu o seu ultimo passo de frente a Richard e seu mundo congelou.

— Foi exatamente isso me impediu — continuou Julius — Até hoje.

Mike de olhos arregalados, o assombro dominou sua alma por completo. Ele se sentiu fora do chão.

— O que é isso? — perguntou aterrorizado ao olhar a sua imagem perfeita sentada no trono.

— Do que diabos você está falando? — perguntou Sebastian sem paciência.

Julius olhava para o local onde Richard e Mike encontrava-se inerte.

— O que é isso? — perguntou Mike novamente, sentia que a qualquer momento iria enlouquecer.

— A verdade — disse ele mesmo sentado no trono.

— Richard? — perguntou Sebastian como uma careta — Está morto! Esse era seu trunfo?

Julius balançou a cabeça negativamente.

— Não estou me referindo á Richard — falou.

Sebastian observou com desprezo Mike.

— Impossível! — disseram Sebastian e Mike.

— Essa é a verdade que você nunca conseguiu enxergar — explicou o outro Mike — A verdade que sempre estivera sentada aqui.

— NÃO! — berrou Mike — Richard estava sentado nessa porcaria de trono!

— Estava? — perguntou o seu outro eu — Ou você desejava que estivesse?

O pensamento perfurou o crânio de Mike com fúria. Mike jamais vira o rosto da pessoa sentada no trono. Mas postura e voz sempre o fizeram pensar que se trava de Richard.

— Você viu o que queria ver — disse  o seu reflexo sério.

— Isso não faz sentido algum — disparou Sebastian — Mike era uma virtude! Eu podia sentir sua presença.

— Não você não podia — falou Julius — Você sentiu algo que não entendia, mas seu orgulho lhe disse que se tratava de uma virtude. Simplesmente isso.

De repente o corpo do jovem no chão foi tomado por uma chama intensa, muito maior que a de Richard. Como se o ódio estivesse emergindo daquela carne em forma de fogo.

— Não pode ser! — falou Sebastian aterrorizado, as outras virtudes compartilhavam da mesma expressão.

— Não pode...ser — falou Mike de joelhos para o trono — Não!

— Você é o corpo que se recusava á morrer — explicou o outro Mike — A casca. Algo necessário para que minha presença se estabelece por completo. Mas agora ela foi rompida.

Mike começava a sentir sua presença formigar, como se ele fosse um vapor.

— E o que acontece agora? — perguntou de olhos bem abertos.

— Você termina e eu começo — concluiu ele mesmo.

Lá estava. Diante de todos na estrada, Mike de pé.

— Que merda é essa? — disparou Sebastian, retirando sua espada imediatamente.

O jovem de pé tinha uma expressão completamente diferente da habitual. Não era raiva, não era medo, era uma indiferença poderosa. Uma presença soberana. Mike olhava para cada um, mas parecia observar muito mais do que suas meras presenças.

Sebastian disparou rápido em direção a Mike, mas ele só conseguiu ver um borrão se movimentar para outra extremidade. Ao lado de Julius ele ignorou a jovem virtude que agora estava em seu lugar ao lado de Richard.

— Finalmente desperto meu irmão — falou Julius sorrindo.

Mike lhe lançou um reluzente de desprezo.

— Então, finalmente você conseguiu — falou ele com a voz constante e controlada — Me trouxe de volta para esse inferno!

Julius soltou uma risadinha.

— E você não mudou nada pelo o que vejo — Mike analisou Julius de encima a baixo — Se recusou a encarnar em outra pessoa como o restante dos seus irmãos.

— Foi uma longa jornada até aqui — falou Julius.

Mike suspirou, mas de uma maneira extremamente incomum.

— Faça como quiser — disse — Só desejo voltar para o outro mundo. Não me importa quais são os seus planos, minha presença aqui será finita.

— Só depois que eu conseguir o que eu quero — falou Julius, pela primeira vez se alterando.

— Não me importo — repetiu Mike.

— NÃO ME IGNOREM! — berrou Sebastian ordenando seu braço invisível estender-se até Mike.

Mas algo estranho ocorreu. Mike movimentou seu braço no ar e ali o deixou. Seus dedos pareciam segurar alguma coisa invisível. Sebastian tentava se mover, mas seu corpo não se mexia para trás, como se algo estivesse preso.

— SOLTE! — urrou Sebastian.

— Quem são? — perguntou Mike entediado.

— Virtudes — explicou Julius ao seu lado — Seres enviados para dar um fim a nossa existência.

Mike observou profundamente Sebastian.

— Esse corpo... — falou — Possui um ódio profundo contra essa pessoa.

AAAARG

O braço de Sebastian começou a pegar fogo. Os dedos de Mike soltavam uma fumaça constante enquanto seguravam o braço invisível da virtude. O jovem se debatia em seu lugar tentando se desprender de seu próprio braço.

Mike parecia completamente indiferente aos gritos de agonia de Sebastian.

— Mike? — chamou a voz.

Cherry finalmente chegara no local, ofegava bastante. Tentava assimilar tudo o que estava vendo. Muriel, Richard, as virtudes. Jenny com uma expressão de pânico no rosto.

— Cherry! — gritou Jenny — Fuja!

Mike soltou o braço de Sebastian, não restava quase nada do braço verdadeiro do jovem.

— Quem é essa? — perguntou Mike levemente intrigado.

— Essa, meu caro, foi a causadora de tudo isso — explicou Julius sorrindo.

Cherry queria entender, mas estava muito confuso. Ela se aproximou um pouco, mas não queria se arriscar a chegar perto de Sebastian. Tinha uma expressão louca no rosto.

— O que esta acontecendo Mike? — perguntou ela.

— Não é uma dessas virtudes, nem uma de nós — disse ele em direção de Julius.

— Não importa — Julius deu de ombros — O papel da garota já se cumpriu.

Cherry não conseguia pressentir seu irmão, ela estranhava aquela sensação já que ele estava bem a sua frente. Ela reparou em sua avó estirada no chão.

— Precisamos realmente explicar? — perguntou Julius — Creio que nessa altura você já saiba.

Julius caminhou até o carro, Mike o seguiu.

— Não tenho interesse em nenhuma das duas — falou ele para Sophie e Jenny, que imediatamente correram para o outro lado.

— COMO? — gritou Sebastian querendo saber.

Julius encarou Stevan, revirou os olhos e sorriu.

— Melhor esclarecer as coisas — disse — Vai ser divertido.

Stevan suspirou. Ele desviou o olhar de Cherry e voltou-se para Sebastian.

— É impossível! — falou Sebastian chorando de dor — Nenhum ser humano pode suportar a Ira quando criança! O corpo não suporta!

— Correto — falou Stevan — Mas havia uma maneira de contornar a situação.

Sebastian pensou um pouco, seu rosto muito vermelho. E ele olhou para Cherry.

— Quando pequenos Mike estava para morrer, pois seu corpo não suportava a ira — contou Stevan — Mas não aconteceu.

— Cherry o salvou — falou Julius tranquilamente — Seu misterioso poder confinou parte do pecado da ira nela mesmo. Ela construiu uma espécie de lacre.

— Eu teria percebido! — disparou Sebastian munido de raiva — Todo o mosteiro teria percebido se ele fosse um pecado.

— Não teria — disse Stevan — O poder de Cherry escondia por completo a presença do pecado da Ira de Mike. Junto com o dela mesmo a impressão eu passava é que Mike era alguém com poder — ele coçou a cabeça — Mas como nenhum de vocês conseguiu identificar uma certeza de ser uma virtude ou pecado, acabaram por supor que seu poder ainda não estava completamente desperto.

— Isso é mentira! — disse Cherry.

— Eu sabia Cherry — falou Julius — Sabia que na sua família nasceria um pecado da Ira. Sempre soube onde meu irmão reencarnava, mas não podia fazer nada á respeito.

— Como teve a certeza de que ela iria salvar Mike? — perguntou Sebastian louco.

— Não tive — Julius riu — Pela primeira vez em toda minha vida imortal eu não tinha certeza, mas arrisquei. Pude contar com a bondade da garota, felizmente.

— Depois disso Julius só precisou esperar o momento certo para investir em romper essa proteção que a Cherry criou — explicou Stevan.

— A prisão de meus pais! — falou Cherry de repente.

— Sim — confirmou Julius — Quando tive a certeza de que o pecado estava intacto e poderoso dentro de Mike, era hora de tentar libertá-lo. E traze-los para Newcastle era melhor opção.

— Você controlou Anna Belle com esse proposito — concluiu Sebastian.

— Os conhecimentos dela quanto os pecados e virtudes eram de grande importância — falou Julius — Mas sua real utilidade era separar os dois.

Cherry não gostava do rumo daquilo. Sentia que estava em um pesadelo.

— Mike teria que ter o seu ódio desperto — explicou Stevan — Anna Belle o tratou com desprezo com o intuito de descontruir tudo o que uma vida tranquila nos Estados Unidos proporcionou para ele. Precisava sentir raiva.

— E você Cherry, minha cara — riu Julius — Precisava perder a pureza, a bondade.

— Uma vida de luxúria — completou Stevan com vergonha de encarar a garota.

Cherry sentia uma mágoa crescer em seu peito, as lagrimas já saiam caíam livremente. Julius e Stevan revelados, aquilo era o mais fundo que poderia chegar?

Não.

— Foi então que Alphonse entrou na história — disse Julius, observando o jovem se aproximar cambaleando. Olhava para todos sem entender o que acontecia.

— Do que você esta falando? — perguntou Cherry.

Julius soltou uma risadinha e mexeu em seus cabelos. Parecia apreciar a expressão da garota como se ela fosse algum tipo de animal exótico.

— Você realmente acha que Alphonse entrou na sua vida por acaso? — perguntou ele, dessa vez Stevan permaneceu em silêncio — Como é tola.

Ela procurou respostas no rosto de Alphonse, mas ele também não conseguia entender.

— Anna Belle ordenou que ele flertasse você Cherry — contou — Desde o começo, Alphonse foi ordenado a isso. Não me importa o que aconteceu depois disso, mas a iniciativa foi inteiramente planejada.

— Cale essa boca! — falou Alphonse — Stevan, o que é isso?

Julius soltou uma risadinha feminina.

— A tarefa de Alphonse era que ele retirasse a sua virgindade e a sua habilidade de esquecer faria todo o resto. Seria o fim da sua inocência — falou ele cantante — Mas algo muito melhor aconteceu.

Alphonse também procurou alguma resposta em Cherry, mas ela desviou o olhar. O corpo do jovem estava enfraquecido, ele mal conseguia se manter de pé.

— Alphonse acabou se apaixonando — continuou Julius — A sua teimosia em ceder para ele fez com que ele criasse uma obsessão louca e isso arrastou toda a sua atenção.

Cherry apertou os olhos querendo impedir as palavras de entrarem em sua cabeça.

— Você ignorou por completo o seu irmão e partiu em uma jornada patética para encontrar um jeito de ficar com Alphonse — ele ria — nada mais importava para você!

— Nada disso é verdade Cherry! — disparou Alphonse — Não escute o que ele diz!

Julius encarou Alphonse com os olhos alegres.

— Como deve ser frustrante — comentou — Não conseguir se lembrar de absolutamente nada. É o álibi perfeito!

— Não se atreva... — ameaçou Alphonse.

— Pergunte a ele Cherry, minha cara — pediu Julius — Pergunte se ele consegue se lembrar do rosto da mãe.

— CALE A BOCA! — gritou Alphonse, deixando Cherry assustada.

— Esse foi o motivo de Alphonse concordar em obedecer Anna Belle! — falou Julius duro — Ele se esqueceu da própria mãe e sua avó lhe prometera devolver essa lembrança. Mas sabemos que isso é impossível!

Alphonse apertava sua cabeça com força, ele chorava nervoso.

— Ele sabe que é verdade, mesmo que não se lembre de nada disso— Julius cruzou os braços — Acho que lá no fundo ele sabia que Anna Belle estava sendo controlada por mim, mas resolveu deixar-se enganar e abraçar a ilusão de relembrar da mãe.

Cherry buscou em todas as suas memorias. Alphonse falando da mãe com tristeza, os milhares de porta retrato espalhados por toda parte. Alphonse olhava sempre com intensidade, como se obrigasse a sua mente a lembrar. Era tudo verdade.

— Mas a história aqui nunca foi sobre você e Alphonse Cherry — disse Julius — Sempre foi sobre dois irmãos.

— Isso rompeu os laços dos dois? — perguntou Sebastian — Patético!

— Hora, meu caro — falou Julius com alegria — Por favor não pense que você não contribui para isso!

Julius deu um tapinha nas costas de Stevan pedindo para que ele continuasse.

— Mike precisava estar determinado — explicou Stevan — Os pecados agiram bem em deixa-lo vingativo. Acabou vivendo com Muriel que o encorajou a se tornar uma virtude.

Sebastian arregalava os olhos.

— Julius sabia que Mike passaria por uma dura aprovação e que isso mudaria seu caráter completamente, aumentando cada vez amis a distancia entre os dois irmãos — Stevan olhou para Sebastian — Acredito que você tenha contribuído para isso, não?

— Eu fui apenas uma peça? — Sebastian tremia em seu ódio — Fui usado?

— Sim — falou Stevan — Percebi que você seria útil assim que os ataques começaram. Quando os subordinados de Richard começaram a morrer.

— Cada lado trabalhava aos poucos para a quebra desse laço = disse Julius — Em um lado Mike era massacrado pela dura realidade de uma vida de pecados mortais, por outro Cherry se afundava em sua busca por resposta.

Cherry laçou um olhar ameaçador para Stevan.

— A busca pelo meu segredo! — exclamou ela — Fazia parte do plano, não é?

Stevan hesitou, tentou se livrar do olhar da garota.

— Sim...

— Stevan sabia que Alphonse não permitira que você exagerasse na sua busca, então ele buscou outros métodos — Julius bateu nas costas do jovem novamente — Vamos, conte!

Stevan hesitou mais uma vez.

— A outra preguiça...no meu computador — explicou — Foi proposital que você tivesse conhecimento daquele garoto. Sabia que você buscaria ajuda com quem quer que fosse para voltar ao seu mundo. Eu sabia eu ele a ajudaria, mesmo que eu me negasse.

— A minha armadilha? — perguntou Sebastian em fúria.

— Usei em meu favor — disse Stevan — Se Cherry pensasse que eu estivesse em perigo se sentiria culpada e na obrigação de continuar na busca por seu segredo.

Cherry lembrou de algo que Stevan disse que fez seu coração saltar.

— Então disse para Cherry que... — a hesitação deixou Julius levemente impaciente — Que ela só poderia prosseguir com a busca se os laços entre ela e Mike terminassem.

— Não... — disse ela baixinho caindo de joelhos. Ela sabia que chegaria á aquilo e odiava estar certa em sua conclusão. “ Seja qual for o laço que ainda temos...ele termina aqui”, fora sua exatas palavras? Ela não se lembrava. Apenas chorava observando a expressão indiferente de Mike.

Um silencio passou levemente no local.

— Você estava tão ocupada vivendo essa sua fantasia, que não percebeu o que realmente importava — disse Julius — Você desejava tudo, não é? Mas terminou sem nada, pois algo que posso afirmar com toda a certeza é que em toda essa minha longa vida eu jamais vi um pecado da Luxúria se recordar de alguém depois do contato verdadeiro entre os corpos.

Alphonse cerrava os dentes.

— Não tem maneira — soltou Julius cheio de vontade — Não tem milagre, magia, nada! Alphonse jamais irá se recordar de você. Não tem outro caminho, solução, seja lá qual for à ilusão que esteja se agarrando. Esse é o fato e fim.

— Eu te acoli em minha casa — disse Alphonse com dificuldade — Pensei que fossemos amigos...

Julius soltou um longo suspiro e cruzou os braços encarando os dois jovens. Refletiu sobre suas palavras por um momento.

— Entenda que eu não sou alguém que sempre teve o intuito de destruir a vaidade de vocês — ele era simples nos gestos, mas espantosamente belo em suas feições — Eu não tive interesse em causar mal a você, meu amigo. Em alguns casos confesso ter me divertido convivendo com alguém como você. Toda essa sua juventude e energia.

Ele encarou Cherry.

— Como poderia ter algo contra você, minha cara? — ele sorriu — Nunca foi pessoal...

— Não posso acreditar! — disparou Alphonse fulminando Stevan com os olhos — Eu me recuso!

— Eu esperei tanto por isso, que pouco me importa a felicidade de vocês — confessou Julius — São sacrifícios necessários, eu não sou o vilão da sua historinha. Sou alguém que quer muito algo e que fez de tudo para conseguir.

Cherry caminhou até Mike, ela o olhava esperando que o jovem respondesse. Mas o rapaz retribui com um olhar vago.

— O que você fez com ele? — perguntou ela.

— Eu? — indagou Julius — Absolutamente nada.

Ele estendeu o braço para Sebastian, Cherry, Alphonse, todo o restando.

— Foram vocês — disse.

Mike observou Sophie ao fundo, seu rosto movimentou-se levemente, como se estivesse assimilando a imagem da jovem. Julius pôs as mãos na cintura e inspirou fundo.

— O odor da calmaria — falou a Vaidade — Quando finalmente tudo esta em paz. Quando cada uma das pessoas finalmente aceitou a realidade.

Stevan observava Cherry, mas quando a jovem percebeu o olhar ele desviou imediatamente. A garota se sentia anestesiada.

— Adeus meus amigos — disse Julius estendendo seu braço em direção ao céu — Vivam suas vidas como bem quiserem.

De repente uma ventania estranha tomou a estrada, era muito forte. Julius mexia seus dedos como se estivesse conduzindo uma sinfonia. Os carros se moviam com a potencia dos ventos.

— Estou lhe devolvendo as nuvens Alphonse — disse Julius.

Era um pequeno tornado. Tinha uma cor escura, como se fosse feito de uma poeira escura da estrada.

— Vamos? — chamou ele, Stevan e Mike concordaram.

A jovem preguiça caminhou até Cherry, parecia completamente envergonhado. Primeiro seu olhar demorou-se em Alphonse no chão, que se recusou a retribuir o olhar. Depois Stevan voltou-se para a jovem.

 — Se isso for te confortar... — falou ele — Eu jamais olhei o que tem atrás daquela porta.

Cherry não conseguia sentir ódio pelo garoto, mas não podia perdoá-lo pelo o que tinha feito.

— Eu também não. — confessou ela.

Stevan demonstrou surpresa.

— Por que, não?

Ela sorriu amargurada.

— Por que no fim eu percebi que não tinha importância — explicou ela com os olhos em lagrimas — Percebi que tinha algo mais importante... Só que era tarde demais.

O jovem analisou Cherry por um pequeno instante e se retirou, entrando no tornado negro. Mike também caminhava em direção aos ventos, mas ela não conseguia assistir seu irmão partir. Correu ao seu encontro puxando um de seus braços e chamando por seu nome.

— Por favor! — suplicou chorando. Julius assistia tudo tranquilamente sem interromper — Mike! Acorde Mike!

O olhar do rapaz era de uma indiferença profunda, como se não conseguisse dar real valor ao ser humano a sua frente. Como se Cherry fosse uma existência tão frágil como um pluma no ar. Algo belo de se ver, mas sem importância. Julius sorriu e entrou também no tornado.

A mão de Cherry sedia no braço de Mike. Ela não conseguia enxergar Mike, não podia sentir. Soluçava com o seu choro preso na garganta, suas pernas cediam ao chão. O jovem observava a garota definhar, sem demostrar emoção alguma.

— Nunca foi um conto de fadas — disse a voz de Julius no ar — Vamos meu irmão.

Mike caminhou novamente até o tornado, mas parou centímetros antes. De costas, parado feito uma estátua. Cherry sem entender observava o irmão se se mover.

O rosto se curvou alguns milímetros para trás.

— Ele pediu para dizer... — falou sério — Por favor, cuide do Luca pra mim.

E assim Mike entrou de vez no tornado negro, desaparecendo imediatamente da vista dos jovens na estrada.


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