Capítulo 6 - Um Príncipe Não Tão Encantado

Subi as escadas e fui arrumar minhas malas.

Em menos de duas horas já estava tudo arrumado. O closet tinha bastante espaço, e ficou praticamente vazio; o que me fez perceber que eu precisava fazer compras urgente, pois quase não tinha roupas de frio. Passava pouco das sete da manhã, então decidi sair e fazer uma caminhada, como planejado.

Coloquei uma calça preta e um moletom para não sentir frio. Peguei meu celuar e os fones de ouvido, e desci as escadas. Encontrei Jenna na varanda, concentrada em seu livro.

– Vai correr? - Perguntou ela.

– Vou sim. Quer vir?

– Ah, eu acho que vou passar. Correr não faz muito meu estilo.. - Ela disse com cara de preguiçosa.

– É deixa pra próxima então.. - Eu disse rindo. - Sabe de algum lugar que seja bom pra correr?

– Ah, tem a praça. É a cinco quadras daqui. Siga reto até o final da rua, e vire a esquerda. É pra lá que as pessoas vão para caminhadas e etc..

– Obrigada Jenna. Não demoro! - Fui na direção que ela me indicou, colocando os fones de ouvido e entrando em meu ritmo de corrida. Não demorou nada para eu chegar na praça. Era um lugar bonito, cheio de árvores e ar fresco. Bom, isso era o que não faltava por aqui. Não tinha mais ninguém na praça. Parece que as pessoas acordavam tarde nessa cidade.

Aproveitei a corrida e o vento frio que batia em meu rosto para pensar nas coisas, por a cabeça no lugar. Finalmente, fiz minha lista de prioridades:

1º - Eu ia ligar pro advogado e pedir para que ele apressasse as coisas no tribunal, pois eu precisava da herança de minha avó para não dar despesas à Jenna.

2º- Eu ia descobrir porque Elena tinha agido daquele jeito ontem.

3º - Eu ia descobrir mais sobre Damon antes de decidir se eu realmente estava pronta para um relacionamento ( o que era um pouco presunçoso de minha parte, já que eu nem sabia se ele queria um relacionamento comigo).

4º - Comprar um diário para desabafar, antes que eu enlouquecesse.

(...)

Quando cheguei em casa já era quase dez e meia. Não vi ninguém, então subi direto para meu quarto, para tomar um longo banho quente.

Quando saí já eram onze horas; como Damon tinha dito que viria meio-dia, resolvi me arrumar.

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Fiz uma maquiagem leve e coloquei o que precisava na bolsa.

Me olhei no espelho, e tinha que admitir: estava linda.

Bem na hora em que ia sair do meu quarto ouço a campainha. Ele era bem pontual.

Quando cheguei lá embaixo, Elena já havia aberto a porta, e eu pude ver Damon, encostado no batente, lindo de morrer. Elena falava baixo com ele, e ele ria por mais que ela parecesse extremamente séria.

– Bom dia Elena! - Eu sorri pra ela. Um sorriso forçado. - Oi Damon. Chegou bem na hora. - Eu tentava fingir que não tinha notado a tensão no cômodo.

– Oi Nikki! Eu não me atrasaria por nada. - Ele pegou minha mão e a beijou, como os homens faziam antigamente. - Você está linda.

– Obrigada. - Eu sorri pra ele. - Então, vamos? Elena, se não for incômodo, poderia dizer a Jenna que eu não demoro? Ela planejou um jantar hoje, não quero que considere desmarcar..

– Tudo bem.. - Ela disse um pouco mau-humorada. Qual era o problema com ela?

– Obrigada, te vejo depois.

– Vamos. - Damon passou o braço por minha cintura, me levando até seu carro. Ele abriu a porta e esperou que eu entrasse para fechá-la.

Antes que ele arrancasse com o carro, pude ver Elena ainda parada na porta, com uma cara nada satisfeita. Sério, eu ia descobrir o que estava acontecendo. Eu precisava.

Damon quebrou o silêncio.

– Bom, essa cidade é um ovo, então eu pensei em te levar pro único lugar onde a comida presta.. Mystic Grill. Já foi lá?

– Ah, eu não me lembro.. Eu passava as férias aqui há alguns anos. Mas já faz muito tempo.

– Acho que você vai gostar. Não é nada demais, e mal chega a ser um restaurante.. mas a comida é boa. E podemos jogar sinuca se quiser. - Ele olhou pra mim e piscou ao dizer a última frase.

– Claro, porque não? - Respondi sorrindo. Porque da última vez você quase furou a mesa com o taco e isolou a bola no garçom; respondi em pensamento.

Não foi tão ruim; revidei. (Sim, eu estava discutindo comigo mesma. Fantástico.) É claro, não foi tão ruim.. Tiveram que chamar a ambulância e eu fui proibida de chegar perto da mesa de sinuca, mas tudo bem. Acidentes acontecem..

Bufei alto de meus pensamentos, e Damon se virou para mim de novo, com olhar interrogativo. Ótimo, agora ele ia achar que eu era louca.

Balancei a cabeça como quem diz 'esquece', e ele voltou a encarar a rua.

Não percebi o tempo passando, até que Damon parou o carro e disse "Chegamos".

Descemos do carro e eu o segui até o local. Ah, eu me lembro daqui! Reconheci ao entrarmos; as mesas espalhadas, o bar nos fundos e a mesa de sinuca.

– Que tal essa mesa? - Ele disse puxando uma cadeira para mim.

– Ótimo. Obrigada. - Eu disse me sentando. O Grill ainda estava meio vazio, mas provavelmente era o horário.

– O que achou daqui? - perguntou Damon, me tirando de meus devaneios.

– É muito legal. Eu me lembrei que já estive aqui sim. Há alguns anos.

– Aqui está o cardápio, quando quiserem pedir.. Damon? - Um garçom que devia ter a minha idade chegou com os cardápios, e reconheceu Damon.

– Oi Matt. Essa é Nicole, não sei se vocês se conhecem. - Disse Damon olhando um pouco impaciente para o garoto. - Nikki, esse é Matt Donovan, amigo dos Gilbert, e vocês serão colegas de escola. Matt, Nicole Gilbert, prima da Elena.

– Muito prazer, Nicole. - Disse Matt, estendendo a mão para me cumprimentar.

– O prazer é meu, Matt. - Eu disse apertando sua mão. - Me desculpe a intromissão, mas você é o mesmo Matt que namorava Elena?

Eu me lembrava vagamente de Elena comentando sobre seu namoradinho Matt, de como ele era loiro e lindo, tão gentil e blá blá blá..

– Ah.. sim. Era eu. Ainda somos bons amigos. - Disse ele um pouco sem-graça. - Damon disse que você vai pra nossa escola.. Está morando aqui? - Perguntou sorrindo.

– Ah sim, cheguei ontem. Eu morava na Flórida. Parece que vou ficar aqui por uns tempos..

– Que ótimo! Teremos tempo de nos conhecermos melhor. - Disse simpático. - Quando você vai começar a ir na esco..

– Sim, sim. Serão grandes amigos e terão tempo de conversar depois, que seja. Será que podemos pedir agora, garçom? - Disse Damon com uma voz cínica.

Eu trinquei os dentes ao ouvir isso,e Matt ficou sem-graça com a hostilidade. Maldita regra de 'os clientes tem sempre razão'..

– Ah, claro. Me desculpe. - Ele respirou fundo, provavelmente para conter a raiva. Eu me esforcei para me manter sem expressão, fria. Ah, mas Damon ia se ver comigo.

– O que vão querer?

– Hum, Nikki, o que acha de lasanha á bolonhesa? É deliciosa.

– Claro. - Eu disse sem alteração na voz, como um robô.

– E.. vejamos.. Nikki, você bebe?

– Eu tenho 17.

– Ah, claro. Você respeita a lei.. Uísque pra mim e uma coca pra ela. - Disse ele entregando os cardápios para Matt. - Já pode sair agora.

Meu sangue ferveu. Esperei Matt se afastar.

– E então, sobre o que estávamos falando..? - Ele deu mais um de seus sorrisos galanteadores, mas dessa vez não tiveram efeito nenhum sobre mim.

– Como você pode ser tão rude? Matt estava sendo gentil e você o desrespeitou daquele jeito! - Eu disse com raiva.

Ele pareceu surpreso com minha reação. Depois se recuperou e ficou cínico de novo.

– Não sabia que se preocupava com a criadagem..

– Não é criadagem! É um garoto, amigo dos meus primos, e que pelo visto não é um idiota como você! - Me controlei para não começar a gritar no meio do restaurante. -Quem você pensa que é pra falar com as pessoas desse jeito?

– Escuta aqui garota, eu falo com quem eu quiser do jeito que eu bem entender. Então nunca mais use esse tom de voz comigo. Se não fosse por mim você estaria perdida naquela droga de estrada até agora.

– Eu preferiria morrer naquela estrada do que ter aceitado sair com você! Você é um grosso metido que se acha superior aos outros. Em pensar que toda aquela gentileza era só um teatrinho..

– Cala essa sua boca. Fica aí se achando a certinha sendo que foi uma tola ingênua à ponto de acreditar que eu poderia sentir alguma coisa por uma pirralha chorona como você! - Disse ele com um olhar de desprezo.

Admito, essa teria doído se eu não estivesse transbordando de ódio. Levantei-me da mesa e peguei minha bolsa para ir.

– Eu não sou obrigada a ficar aqui ouvindo desaforo.

– Onde pensa que vai? Eu te trouxe, você vai embora quando eu quiser te levar.

– Vai se fuder, Damon! - Eu disse, provavelmente meio alto, já que vários olhares se voltaram para nós. Não que eu me importasse com isso agora. - Eu não quero ver sua cara nunca mais!

Sai com que me restava de dignidade (sim, a maioria das pessoas tinham ouvido a discussão. Agradeci mentalmente por ele não ter me seguido.

Ao chegar à calçada, percebi que estava chovendo. Muito.

Ótimo, quem liga de ficar perdida numa minúscula cidade, à pé e na chuva? Eu que não! Suspiro.

A cidade era tão pequena que nem táxi não tinha. Só perto da rodoviária. Pois é.

Comecei a caminhar na direção contrária a que eu tinha vindo. Eu consigo, eu pensava a cada quarteirão desconhecido. Eu consigo, eu consigo, eu consigo.

Acertou quem apostou que eu não conseguiria. Eu estava ensopada, e em uma rua que eu tinha certeza que não conhecia. Nem fazia parte do percurso 'casa/Grill'. Droga.

Peguei o celular e liguei para Jeremy. Porque não tinha ligado antes? Porque seria muito humilhante pedir para meu priminho vir me buscar de um encontro que tinha sido um fiasco e porque eu não sabia nem voltar pra casa. É.

– Alô? - Disse ele após o quarto toque.

– Oi, Jeremy. Sou eu, Nicole.

– Nicole? Aconteceu alguma coisa? Não estava no encontro? - Perguntou ele.

– Jer, é uma longa história, eu te conto depois... - Disse emburrada. - O negócio é o seguinte: deu tudo errado, Damon é um idiota completo. Eu saí de lá e tentei voltar a pé, mas acabei me perdendo..

– O que? Porque não me ligou antes? - Ele disse preocupado.

– Eu.. achei que seria um tanto humilhante.. - Admiti.

– Não seja boba, Nicole! Em que rua você está?

– Ahn.. - Olhei a placa. - Estou na North Washington Street.

– Tudo bem, já estou indo. Não é muito longe. Chego daqui a pouco.

– Obrigada Jeremy. Beijos.

Desliguei. Fui até a casa mais próxima e me sentei na escadinha de entrada, o teto da sacada me protegia da chuva.

Nicole.. você se mete em cada uma..