Saga Sillentya: Espelho do Destino escrita por Sunshine girl


Capítulo 4
III - Enclausurada


Notas iniciais do capítulo

Trazendo mais cedo o 3º capítulo...

Espero que gostem!

Boa leitura!



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Capítulo III – Enclausurada

Minha mão, trêmula, hesitou um pouco na maçaneta da porta. Eu sabia que era tolice temer aquilo, mas mesmo assim, mesmo que enchesse meus pulmões de ar, repetisse para mim mesma que não havia perigo algum, que não havia motivo para temer aquela pequena confraternização, eu continuava receosa, com as mãos suadas e trêmulas, e as pernas bambas.

Respirei fundo, fechando meus olhos e finalmente abri a porta do quarto, cruzando o corredor estreito, ignorando as outras portas brancas que havia ali, e procurando pelo salão principal, no primeiro andar, onde Christian dissera que estaria me esperando.

Quando finalmente encontro a enorme escadaria, estaco, observando, pasmada, o grupo que me encarava, alguns com sorrisos nos lábios, e que até mesmo acenavam para mim, como Ramon e Daisuke. Christian encontrava-se em um canto qualquer, recostado despreocupadamente na parede, e sorriu maliciosamente assim que me viu.

Além destes, vi uma mulher de aparência deslumbrante, estatura alta, magra, elegante, com os cabelos caindo em ondas douradas até os seus ombros, e os olhos castanho-claros, como o mel, os lábios rosados estavam repuxados em um sorriso belíssimo, mas... Havia algo na forma como ela me olhava, algum tipo de ternura e carinho, quase como um instinto maternal.

Ela estava de mãos dadas a Damien, o garotinho que invadira meu quarto, e ele sorriu para mim, os olhinhos azul turquesa cintilando.

Havia também uma moça, mais ou menos da minha idade, mas esta me olhava com indiferença, parecia até, de certo modo, irritada com minha presença ali. Notei que o tom de sua pele era tão moreno quanto o de Ramon, na verdade ambos eram parecidíssimos, ela também tinha os olhos pretos como piche, os cabelos cacheados, caindo até sua cintura, e estava com os braços cruzados, fulminando-me com os olhos.

Desviei o olhar, ruborizada, e eles automaticamente recaíram sobre um idoso, um senhor de idade, de cabelos grisalhos, barba espessa recobrindo todo o contorno de seu maxilar, e um sorriso amigável nos lábios, um sorriso que chegava aos seus olhos verdes, e fez-me, instantaneamente, sentir-me melhor.

Por último, mas não menos importante, estava no centro do semicírculo, um homem de aparência e presença marcantes. Digo não apenas devido ao tom hipnotizador de seus olhos, o mesmo azul turquesa dos olhos de Damien, mas talvez porque seus olhos eram ainda mais belos, maiores, como duas pedras preciosas desconhecidas.

Os cabelos eram de um caramelo perfeito, curtos, a pele era tão branquinha como a neve, e a satisfação por eu estar ali, parada como uma estátua, no alto da escada, não era contida. Então aquele eram Lucius Wolfgang, o destemido líder de Ephemera, era incrível, até mesmo a aura em torno de seu corpo emanava a difícil capacidade de liderar. Um grande líder, um grande homem de coração nobre e valente.

- Seja bem-vinda, Agatha! – disse-me ele com sua voz de anjo, os braços estendidos, um sorriso gentil nos lábios rosados.

Desci as escadas, degrau por degrau, e estaquei diante do semicírculo, a primeira a me cumprimentar foi a moça loura bela, ela soltou a mão de Damien, caminhou em minha direção, movendo-se tão graciosamente como se dançasse, e puxou-me para um abraço.

Retribui o gesto, ainda sem entender um pouco sua atitude, mas então me lembrei da forma como ela me olhara, e deixei-me levar por tanto carinho. Ela afastou-se, ainda com as mãos delicadas em meus ombros, sorriu novamente e finalmente apresentou-se para mim:

- Sou Stella Lebriski, estou muito feliz por finalmente conhecê-la!

Sorri, um pouco desconcertada, e quando ela recuou, o ancião aproximou-se de mim, pegando em minha mão e cumprimentando-me com sua voz rouca.

- É um prazer finalmente conhecer a filha de Henry! Sou Giuseppe Vanolli.

- O prazer é meu. – respondi, só me dando conta de que ele havia mencionado o nome de meu pai quando uma figurinha pequenina agarrou minhas pernas, levantando seus olhinhos brilhantes para mim, fazendo-me rir um pouco.

- Também estou feliz por te conhecer, moça bonita!

- Obrigada, Damien.

No instante seguinte, ele correu para os braços de Stella, que o recebeu como uma mãe. A dupla de antes, Ramon e Daisuke, apareceu também para me cumprimentar, ambos com sorrisos engraçados nos lábios.

- Já nos conhecemos, pequena, então acho que não precisamos repetir as apresentações.

Assenti, e Daisuke complementou:

- Seja bem-vinda, Agatha!

- Obrigada.

Mas quando Ramon aproximou-se de mim, somente para bagunçar meus cabelos de novo, foi impossível conter o riso.

- Isso aí, pequena, sinta-se em casa! Somos uma grande e unida família!

Eu ri de leve, mas petrifiquei quando a moça morena que ainda me fuzilava com seus olhos negros, aproximou-se, um pouco relutante, de mim. Seus lábios estavam comprimidos em uma linha rígida, e ela não parecia contente com minha presença ali.

- Sou Madelina Santiago, muito prazer. – mas enquanto dizia, seus olhos mal me fitavam, e ela nem mesmo estendeu a mão para me cumprimentar. Suspirei, decepcionada, não se podia agradar a todos.

Ramon notou meu desconforto, enlaçou a morena pela cintura e deu-lhe um delicado beijo na bochecha esquerda.

- Não ligue para a minha irmã rabugenta, Agatha, em pouco tempo você se acostuma a tanto mau humor. – e riu suavemente ao terminar de proferir tais palavras, causando a ira de Madelina que o fuzilou com os olhos e retirou-se da sala em passos duros.

Eu corei, não estava acostumada a tanta hostilidade, quer dizer, pensando melhor, eu estava sim, mas havia me desacostumado depois de conhecer meus dois melhores amigos, Peter e Tamara. Só não conseguia entender a fúria de Madelina, eu mal havia chegado ali...

Lucius deu um pigarro, chamando a atenção de todos, e caminhou elegantemente até mim, pegou em uma de minhas mãos e a segurou com delicadeza por vários segundos.

- Seja muito bem-vinda, Agatha! Estivemos esperando durante muitos anos por você!

- Esperando... por mim? – repeti, um pouco confusa, deixando que meus olhos percorressem cada semblante, cada pessoa que estava presente ali, mas tornei a fitar Lucius assim que sua voz pronunciou-se novamente.

- Sim, talvez devamos discutir esse assunto em um local mais apropriado – ele estendeu sua mão para mim, era um convite, com certeza –, venha comigo até meu gabinete, por favor.

Vi que imediatamente o semicírculo desfez-se, cada um seguindo um rumo diferente, Stella com Damien, Ramon com Daisuke e Giuseppe... Bem, Giuseppe foi sozinho. Somente Christian, eu e Lucius permanecemos no salão, mas não por muito tempo, pois logo ele nos guiou através de um longo e estreito corredor, na ala oeste da casa, a ala oposta onde ficava meu quarto.

Christian caminhava, silencioso, atrás de mim, e eu seguia Lucius, olhando as belíssimas pinturas retratadas nos quadros com molduras folheadas a ouro, penduradas nas paredes, e estas por sua vez, continham tapeçarias finas e elegantes.

Os sons de nossos passos eram abafados pelo carpete grosso que se desenrolava a nossa frente, os candelabros de bronze, com suas velas de chamas dançantes, iluminavam todo o trajeto, e quando finalmente, finalmente as mãos de Lucius giraram a maçaneta dourada de uma porta reluzente, eu mal contive meu alívio, podia ter aquelas perguntas que tanto me assolavam respondidas.

Lucius não entrou primeiro, espremeu-se na parede do corredor para ceder passagem a mim e a Christian, e depois que nós adentramos, ouvi o som da porta sendo fechada, mas toda a minha atenção estava direcionada ao requinte e a suntuosidade do gabinete que Lucius falara.

Havia estantes recostadas nas paredes, também recobertas por finas tapeçarias, repletas de livros de todos os tempos e temas. Filosofia clássica, moderna, contemporânea, sociologia, antropologia, conceitos a respeito da criação do universo, alquimia, física quântica, moderna, livros e mais livros de história.

Também havia uma elegante e estreita mesa de madeira, funcionando como escrivaninha, com uma cadeira enorme de madeira mogno toda entalhada, e assento acolchoado, do tipo que muito se via em filmes de época.

Um lustre de cristais pendia do centro do teto anguloso, um tapete persa recobria todo o assoalho e havia mais quadros pendurados nas paredes, e também algumas esculturas de artistas desconhecidos por mim.

Permaneci assim, encantada e deslumbrada com o requinte do cômodo, até que a voz de Lucius novamente interrompeu meus devaneios.

- Espero que esse ambiente esteja lhe agradando.

Tornei a fitá-lo, corando lamentavelmente, e baixando os olhos para meus pés.

- Sim, senhor, a casa é muito bonita.

Pude sentir que minhas palavras o haviam feito sorrir e sustentei meu olhar, girando o rosto para a silhueta de Christian, bem ao meu lado. Lucius soltou uma gostosa risada, e contornou a estrutura da mesa, sentando-se na cadeira, depois gesticulou para as duas outras de frente para ele, claramente convidando-nos a nos sentar.

Eu obedeci, puxei a cadeira, sentando-me e vendo que Lucius cruzara as mãos sobre a mesa, apoiando seus cotovelos nela, os olhos procurando pelos meus.

- Certamente deve estar se perguntando sobre o que te falei, não é mesmo, Agatha?

Assenti, um pouco tímida, e senti que Christian apoiara suas mãos no encosto de minha cadeira, curvando seu rosto até mim, eu o olhei, e nossos olhares se cruzaram por meros segundos, o que o fez sorrir, indubitavelmente.

- Não se preocupe, estou garantindo que você não cairá da cadeira e se esborrachará no chão quando ouvir a “bomba”.

Uni as sobrancelhas e crispei os lábios, confusa.

- Que “bomba”?

Mas ele deu de ombros e tornou a fitar a face serena se Lucius, irritada por não receber respostas fiz o mesmo, percebendo que Lucius já retirara um livro da estante abarrotada atrás de si, e agora o folheava despreocupadamente.

Ele pigarreou e fechou o livro, tornando a sorrir amistosamente, um sorriso que alcançava seus olhos, e parecia-me muito sincero.

- Muito bem, Agatha, como pode perceber, somos de diferentes nacionalidades, diferentes etnias, isto porque estamos em todas as partes, em todos os cantos do mundo. Meu irmão e eu, Frederich, viemos originalmente da Alemanha, tivemos de nos mudar depois que Ducian descobriu nosso segredo, então, fomos obrigados a viajar até a Itália e buscar a proteção de Ephemera. Mas – o sorriso em seu rosto alargou-se ainda mais – como deve ter notado, o único aqui que realmente é italiano, isto é, nasceu e fui criado aqui, é Giuseppe, ele é um dos membros mais antigos de Ephemera, depois de Madame Mabelle Champaudry é claro, mas isso seria outra história.

- E quantos anos ele tem? – indaguei, cruzando as mãos sobre meu colo.

- Oitocentos e cinqüenta e três, e acredite em mim, Giuseppe ainda tem a disposição de um adolescente. – e riu delicadamente.

“Mas, como você deve ter notado, como sei que é a garota esperta que me contaram – ele direcionou seus olhos para Christian –, sei que reparou que Ramon e Madelina são irmãos, e que vieram da Espanha, mais precisamente de Sevilha. Daisuke é por enquanto nosso campeão de distância, veio de Tokyo no Japão, Stella veio de Varsóvia, na Polônia, tendo tido uma mãe americana e um pai polonês, morou muitos anos em Nova York, até buscar refúgio aqui na Itália”.

Ele pausou durante alguns segundos, buscando por ar, e por uma maneira de iniciar aquele assunto.

- A verdade, Agatha, é que cada um de nós possui uma história diferente, uma perda diferente, passou por um trauma diferente, um trauma que nos trouxe até aqui, um trauma causado pelas Sete Tristezas, mais precisamente pela opressão a que Ducian nos submete. Cada um de nós passou uma experiência traumática de quase morte de maneira diferente, o que desencadeou o rompimento do selo, e nos forçou a nos unir e lutar com as armas que temos contra tantos anos de dor e perseguição.

“Provavelmente você já conhece minha história, de como perdi minha esposa e meu segundo filho em apenas uma noite, ou de como perdi meu irmão, em uma época ainda mais remota. É verdade que somos minoria, comparando-nos com a força esmagadora que as Sete Tristezas possuem a seu dispor, mas o que gostaria de ressaltar, Agatha, e que você compreendesse, é que não damos o primeiro passo, nós não o provocamos, não o confrontamos diretamente, tudo o que podemos fazer é nos escondermos, omitir a nossa presença, ocultar nossas identidades. Esse é nosso único modo de sobreviver. Gostaria de deixar isso bem claro, aqui, você não será treinada em algum tipo de campo de treinamento para partir para o confronto, o máximo que posso prometer a você, é que encontraremos uma maneira de romper seu selo sem que a prejudique, e depois ensiná-la a controlar suas habilidades, como um tipo de defesa pessoal, não um poder de destruição em massa”.

- Eu entendo. – murmurei, desde o principio eu não estivera planejando nada desse tipo. Despertar meus poderes para depois desencadear uma onda de violência e destruição contra Sillentya. Na verdade, se houve um motivo pelo qual vim para cá, foi apenas para proteger minha mãe, para evitar que ela fosse envolvida em tudo isso.

- Ótimo! – ele exclamou, tornando a cruzar as mãos, agora sobre a capa de veludo do livro – Eu realmente não alimento o ódio pela raça dos Mediadores, Christian já deve ter te contado que não há apenas descendentes de Vírsico aqui, como pessoas ligadas às Sete Tristezas, pessoas que se arriscam para passar informações crucias para mim, mais precisamente, informantes.

- Sim, ele me contou sobre... – fiz uma pequena pausa, vasculhando em meu cérebro atrás do nome do homem que o havia treinado, uma Tristeza que desertou – Solomon O’Grady e outros Mediadores.

- Também gostaria de alertá-la, Agatha, sobre algumas restrições que você terá enquanto estiver nossa proteção. É claro que você tem livre acesso à mansão, exceto pela ala oeste, que é onde os informantes transitam e me procuram, você também pode caminhar livremente pelos jardins, mas...

Suspirei, percebendo exatamente onde ele queria chegar, e acabei por completar sua frase inacabada, as palavras que ele segurara na ponta de sua língua.

- Não posso deixar a mansão, eu acho que posso compreender.

Lucius recostou-se novamente no encosto da cadeira, os olhos azul turquesa semicerrados.

- Não quero lhe dar a impressão de que estou a aprisionando aqui, mas você deve entender que discrição nesse caso é algo essencial, na verdade é nossa maior defesa.

Enclausurada. Era exatamente assim que me sentia. De que me adiantava estar em uma cidade tão bela e mágica quanto Roma, se não poderia deixar os limites daquelas sólidas e grossas paredes?

Mas eu podia entender. Não gostava daquela sensação de estar aprisionada, de certa forma ela despertava o meu lado claustrofóbico, mas podia lidar com isso.

- Outra coisa, Agatha – continuou ele –, seus estudos não serão prejudicados por sua estada aqui, tenho certeza de que poderá terminá-los nessa mansão mesmo, Stella, Giuseppe, todos poderão auxiliá-la enquanto estiver aqui, temos uma biblioteca muito bem abastecida aqui dentro, com uma vasta coleção. E assim como Daisuke, Ramon e Madelina, você pode terminar seus estudos aqui.

- Tudo bem. – respondi, mecanicamente, então Lucius mudou sua posição na cadeira, relaxando novamente, as costas tornando a recostar-se no encosto da cadeira.

- Christian também me contou sobre o que você foi capaz de fazer durante os cinco dias sem nome, como ele deve ter lhe explicado, durante esses dias tudo é alterado, tudo passa por uma série de mudanças, tantos os Mediadores, que tem as suas habilidades enfraquecidas, quanto nós, os Elementais, que podemos ter acesso a uma pequena parcela de nossos poderes suprimidos pelo selo.

- Ah, aquilo não foi... Aquilo não foi nada. – sussurrei, corando um pouco, eu odiava quando o assunto voltava-se para mim, e para minhas habilidades destrutivas.

Lucius sorriu de forma singela, tornou a abrir o livro que havia sobre a mesa, folheando as páginas amareladas com desinteresse.

- Acredite em mim, o que você fez não possui nada de comum, aliás, a maioria dos Elementais cujos poderes ainda estão suprimidos pelo selo nem mesmo consegue conjurá-los, o que dirá controlá-los com a perfeição e domínio que você demonstrou.

- E o que isso quer dizer? – perguntei-lhe, tentando manter a postura relaxada, mas sabendo que estava adentrando a um campo minado: minhas habilidades bizarras.

- Isso quer dizer, Agatha, que você está muito acima da média de outros Elementais. Significa que tem um enorme poder em suas mãos, um potencial imenso, e que, se algum dia, você concordar em passar pelo ritual de rompimento do selo, e aprender a controlar perfeita e corretamente os seus poderes... Bem, acho que você pode se tornar uma das mais poderosas Elementais de todos os tempos.

Permaneci boquiaberta, sem voz alguma, apenas imaginando as reais chances daquilo acontecer algum dia.

Lucius fechou o livro que folheava com um baque, fazendo-me retornar à realidade.

- Mas claro que isso seria uma escolha somente sua. Ninguém pode forçá-la a tomar uma decisão como essa, principalmente quando se tem tanta coisa envolvida, como a sua segurança, por exemplo, se você decidir romper o selo, terá de aceitar a idéia, primeiramente, de se tornar um alvo das Sete Tristezas. Embora Ducian sempre encontre uma maneira de perseguir aqueles cujo selo ainda permanece intacto. Portanto, a decisão é sua, e pode ter todo o tempo que quiser para pensar a respeito disso.

Assenti novamente, desta vez um pouco mais tranqüila, eu ainda não tinha idéia do que faria. Havia acabado de chegar ali. Ainda bem que Lucius disse que essa decisão seria apenas minha, eu não sabia se estava preparada para dar um passo tão grande assim.

Então era essa a bomba que Christian havia me dito. Nem fora tão surpreendente assim, bom, só um pouquinho. Tentei me levantar e deixar o gabinete para que Lucius pudesse cuidar de assuntos mais interessantes do que uma adolescente problemática, porém Christian impediu-me, segurando-me na cadeira.

Olhei para ele, aturdida e irritada.

- O que foi?

Ele revirou os olhos, e isso causou o riso em Lucius.

- Você não terminou de ouvir tudo, ainda nem ouviu o que Lucius tinha a lhe explicar.

Tornei a fitar a figura risonha a minha frente, e cruzei os braços sobre o peito, irritada por todos estarem me tratando como uma criança ingênua.

- O que há de tão importante que eu deva saber? – indaguei, deixando que meus olhos percorressem todo o escritório suntuoso.

Lucius inclinou-se para mim novamente, repousando o queixo nos dedos entrelaçados e respondeu de forma direta, sem rodeios, o que fez meu queixo despencar, e meus olhos esbugalharem.

- Sua família.

Pisquei, atônita, tentando assimilar os fatos, eu ouvi direito?

- Po-pode repetir, por favor?

- Sua família, Agatha, ou pelo menos, o que restou da família de teu pai.

Sacudi a cabeça, tentando reorganizar meus pensamentos, desfazer o turbilhão de confusão em minha cabeça, tirar aquele zunido irritante de meus ouvidos.

- Meu pai não tem família... – sussurrei, relembrando-me do que minha avó me contara no hospital, logo depois de ter sofrido o acidente – Os pais biológicos dele morreram, e os pais adotivos também, meu pai não tem parentes vivos!

Lucius descruzou as mãos e levou-a até a minha, que só agora havia notado, estava agarrada à beirada da mesa. Ele segurou minhas mãos cuidadosamente, medindo suas palavras, enquanto meu coração acelerava.

- Agatha, seu pai possui uma família sim, quero dizer, uma família bem aqui.

- E quem são? – perguntei, imaginando os rostos que vira lá embaixo, cogitando quem poderia se enquadrar nesse quesito, mas a voz de Lucius novamente interrompeu meus devaneios.

- Sou eu, Agatha, seu pai era meu sobrinho, o único filho de meu irmão mais velho, Frederich, assassinado por Ducian há muitos anos atrás.

Minhas mãos tornaram-se gélidas no mesmo instante. Minha mente tornou-se oca, e eu não conseguia pensar em mais nada que não fosse o fato de que aquele homem diante mim era meu tio-avô, e seu meigo filho era meu primo em segundo grau.

- Agatha – recomeçou ele, lentamente, apertando minhas mãos entre as dele –, você é neta do meu irmão. Está me entendendo?

Respirei profundamente, soltando todo o ar que havia prendido. Baixei o olhar, tentando raciocinar corretamente, mas a verdade era inegável, Lucius e Damien eram meus parentes, eram parentes de meu pai, e possuíamos um laço forte e indestrutível: um laço sanguíneo.

- Sim, eu entendo... – sussurrei, minha voz estranhamente triste. Engraçado, sempre quando pensava na minha família, ela reduzia-se a minha querida mãe, minha adorável avó materna, e recentemente mais uma figura juntara-se a ela, o noivo de minha mãe, John.

Mas, agora... Agora mais duas pessoas juntaram-se a minha família. Só então percebi, de alguma forma, meu pai estaria comigo de agora em diante, verdadeiramente, ainda que através dos membros da família dele. Bem, já era um bom começo.

Levei a mão livre à testa, esfregando-a, mesmo que não houvesse nada, e ainda de olhos vidrados no carpete, finalmente respondi a Lucius.

- Desculpe-me, eu só preciso de tempo para me acostumar a essa idéia. Acho que não esperava por isso.

Lucius sorriu novamente, o que me fez olhá-lo instantaneamente.

- Você terá muito tempo para se acostumar a essa idéia, não se preocupe, mas, agora, está livre, pode ir.

- Mas... Você não vai me contar como conheceu meu pai? Quer dizer, você conhece todo o passado dele, não conhece? – perguntei, desesperada por detalhes da vida de meu pai, qualquer coisa seria importante para eu saber naquele momento.

Christian puxou-me da cadeira então, enlaçando-me pela cintura, enquanto os olhos azul turquesa de Lucius cintilavam.

- Talvez outra hora, uma coisa de cada vez, Agatha. – e sorriu novamente.

- Venha. – sussurrou Christian ao pé do meu ouvido, o que me fez corar, é claro. Mas antes que sequer pudéssemos deixar o escritório, Lucius interrompeu-nos novamente.

- Peça a Stella que lhe mostre os cômodos da ala leste da mansão, tenho certeza que você adorará a coleção da biblioteca.

E nós saímos, a porta fechando-se diante de nós. Estaquei no corredor estreito, e Christian recostou-se na parede, as mãos nos bolsos de seus jeans. Eu ainda tentava aceitar aquela verdade, uma família... Eu tinha uma família, bem aqui!

Tornei a fitar Christian, vendo que ele encarava-me, parecendo um pouco preocupado com minhas reações. Mas dei de ombros e decidi que aceitaria tudo com bom humor: nada de deixar a mansão, terminar os estudos, reconhecer os membros da família de meu pai, e, principalmente, pensar a respeito da proposta de Lucius.

Submeter-me ao ritual para que o selo em meu ombro seja rompido, e eu possa ter pleno acesso aos meus poderes, nada de assistir inerte às batalhas, enquanto pessoas que eu amo pelejam para me defender. Seria um grande passo, realmente, mas somente de imaginar-me podendo proteger as pessoas que são importantes para mim, como eu havia feito algumas semanas atrás em South Hooksett, meu coração enchia-se de esperanças.

Talvez eu realmente pudesse interferir nisso, nessa guerra. Talvez eu pudesse lutar pelo meu povo, protegê-lo da arrogância e da discriminação de Ducian. Talvez eu realmente pudesse fazer a diferença, algum dia.


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Notas finais do capítulo

Rá, e a Agatha ganhou mais 2 parentes! Damien é tão fofinho! *e Lucius é tão lindo* abafem... rsrsrsrsrs...

E o que será que ela vai decidir a respeito da proposta do Lucius?

Existe um motivo por trás da grande afeição que a Stella tem pela Agatha, um segredo relacionado ao pai dela e será revelado em breve!

E essa Madelina é azeda mesmo!

Então, de quem vcs gostaram mais agora?

Próximo cap, Agatha dará uma volta escondida por Roma, advinhem na companhia de quem?

Reviews?

Até a próxima...

Beijinhos!!!!