Tanya Denali escrita por AnnaJoyCMS


Capítulo 16
Capítulo 15. Amigos?


Notas iniciais do capítulo

N/A: Oi chará! Aí está o cap de hj! Que pena que a Andreia me abandonou...! :(



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15. AMIGOS?

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Da janela da cozinha do chalé era possível ver uma pequena barraca de camping montada, junto às primeiras árvores da floresta, que subia montanha acima. Será que ele estava suficientemente aquecido?

Havia iluminação lá dentro. Parecia uma lanterna bem potente ou algo do tipo. O que será que ele estava fazendo? Ele não disse que ia dormir? Será que ele precisa de tantas horas de sono quanto os humanos? Não parece que ele esteja dormindo... Para quê a iluminação durante o sono?

– O que você está fazendo aí? – perguntou Kate entrando na cozinha. Eu pulei de susto. Eu pulei de susto?!

– Oh! Nada... Só olhando... – respondi olhando para ela por sobre meu ombro e apontei com o queixo para a barraca.

– Você pensa que eu não sei o que está acontecendo com você? – perguntou-me ela, olhos estreitos como duas pequenas fendas.

Você sabe? – eu quase gritei. Ótimo! Então me diga! Porque eu não sei... Completei mentalmente.

– Toda essa história de vampira dourada mexeu com sua vaidade. – afirmou ela, vitoriosa. Eu não podia discordar dela de forma alguma. Tudo isso era de certa forma... Lisonjeiro! Mas não se tratava só de vaidade. Ia além disso e eu não fazia ideia de como explicar meu... Interesse?... Encanto?... Fascínio?... Deslumbre?... Eu, na verdade, não queria cogitar nenhuma dessas palavras. Ah, por favor! É de um lobisomem que estamos falando!...Nossas espécies deveriam causar repulsa uma à outra. Mas... Eu não me sentia assim. Os outros ainda estavam desconfiados. E eu aqui... Ansiosa pela próxima oportunidade de conversar com ele...

– Tanya? Taanyaaaa?! – Kate agora passava a palma da mão aberta na minha frente tentando chamar minha atenção.

– Sim. – Respondi retornando de meus devaneios. – Ah, sim. Vaidade, não é? Bom, talvez você esteja certa. – concordei com ela, vagamente. Era mais fácil do que tentar explicar o inexplicável. Mas, Kate não satisfeita analisou meu rosto por alguns segundos, sem se deixar enganar, e perguntou:

– É muito mais do que isso, não é? – ela me conhecia demais, eram praticamente dez séculos, afinal...

– Sim. Mas não é só ele – menti – acho que toda a história da família, a ascendência, a relação com Athenodora... É tudo fascinante... – eu sabia que não era só por isso. Era ele... Que... me fascinava...

– É verdade. – concordou ela, caindo. – Quem diria que você levantaria toda essa história quando partiu daqui há um ano?! – ela riu. Eu aproveitei para fugir.

– Onde estão os outros? – perguntei desconversando.

– Eleazar e Carmem estão na estufa com Nessie. Ela queria conhecer a coleção de orquídeas. Os outros estão espalhados pela sala e escritório, conversando, usando a internet, assistindo TV. Quando parar de nevar, Emmett pretende passar a máquina no lago e organizar uma competição de patinação no gelo.

– Bom, então, enquanto neva vou aproveitar para trabalhar um pouco. – ela assentiu, eu continuei. – Estarei no atelier, ok?! – antes de deixar a cozinha, não pude me controlar lancei um último olhar para a pequena barraca e a iluminação lá dentro se apagara.

Corri para o atelier. Nas últimas horas experimentei emoções demais, precisava extravasar aquilo de alguma forma. Da melhor forma: através da arte.

Escolhi a enorme e caríssima pedra de mármore libanês que eu havia comprado há quase três anos. Retirei o lençol branco que Carmem jogara sobre ela e a analisei. Eu já tinha preparado a peça, mas queria algo especial para ela, então ainda não tinha começado nada ali. Olhei para o meu pequeno obsidinium entalhado no gelo, que já começava discretamente a derreter, e resolvi que faria o mesmo com a peça de mármore: deixaria o instinto mover minhas mãos sobre ela, para ver o que sairia no final.

E pus mão à obra. Há muitos anos já não utilizava mais ferramentas artesanais no manuseio do mármore, como faziam há séculos, os grandes mestres desse estilo de escultura. Hoje, já tínhamos máquinas mais modernas que ajudavam muito no entalhe inicial, no polimento e na finalização. Eu, é claro, possuía todas essas máquinas em meu atelier e elas eram muito úteis.

Deixei minha mente vagar enquanto minhas mãos trabalhavam. Utilizei uma máquina no início, mas depois parti para o ‘ataque’ manual.

Esculpir, assim como toda forma de arte, era libertador. Minha espécie, com toda sua agilidade, sentidos aguçados e poder, mesmo quando não se possui qualquer talento inato como eu; tem uma tendência a vaidade, a se imaginar como superiores aos humanos. São muito comuns os vampiros que pensam assim. Eu e minhas irmãs nunca pensamos dessa forma, talvez por que nos relacionávamos com os humanos – principalmente os machos – de forma diferente dos outros vampiros. Sempre vimos as potencialidades humanas, nas artes, nos esportes e no campo filosófico e intelectual.

Então, quando eu trabalhava em uma escultura, sentia que estava desenterrando o pouco de humanidade que ainda restara dentro mim, dos escaninhos mais inconscientes da minha mente.

Eu deixava minhas mãos fluírem ao sabor das minhas emoções, dos meus desejos e aspirações mais íntimas. Desligava-me do mundo lá fora e isso era muito relaxante. Às vezes, era como se eu estivesse... dormindo!

Talvez por isso, passadas algumas horas, eu não tenha me dado conta dos passos que se aproximavam depressa do atelier. O perfume mesmo, só senti quando a porta já se movia com uma batida leve. Num salto puxei o lençol para cima da peça de mármore que eu esculpia e desci da bancada. Era ele!

– Olá. Falaram que você estava aqui... E eu...

– Sim, Lucca. Pode entrar. Você não atrapalha. – ele olhou timidamente para o lençol cobrindo a peça próxima a mim e confirmou.

– Tem certeza? Eu posso voltar...

– Não! – minha voz subiu uma oitava. – Eu já ia fazer uma pausa. – menti. Estava esperando mesmo que ele acordasse em breve, eu queria passar mais algum tempo com ele.

Lucca olhou para a peça em que eu obviamente trabalhava, coberta às pressas e levantou uma sobrancelha.

Eu mesma, trabalhando da forma que gosto, e me deixando levar, inconscientemente, pelas emoções e pensamentos, não tinha me dado conta de que começava a entalhar um busto masculino até que puxei o lençol.

Então, tremi só de pensar que Lucca visse o que começava a surgir em mármore ali, porque se ele não tivesse me interrompido, acho que acabaria sendo o rosto dele entalhado no mármore.

Um minuto de silêncio constrangedor se seguiu. Eu olhei alarmada para a escultura de gelo, mas já estava muito disforme, derretida. Ele não identificaria ali a pequena flor que denunciaria por onde anda minha cabeça. Por fim, ele olhou pra mim e riu.

Riu? Mas... O quê? Ah! Sim. Eu estava um completo caos. Cheia de pó de mármore, formando uma fina camada por todo meu corpo, cabelos, roupas. Tudo. Sacudi meus cabelos e roupas e bati o pó o quanto pude, levando uma fina nuvem ao meu redor e rindo também. Já estava acostumada a ficar assim, após passar horas trabalhando com mármore.

– Acho que preciso de um banho... – disse meio sem graça. Ele riu baixo, eu continuei oferecendo como boa anfitriã. – Você também deve querer...

– Eu já tomei. – ele me interrompeu. – Carmem me ofereceu um dos banheiros do segundo andar e pelo cheiro acho que era o do seu quarto.

– Ah! – foi só o que eu consegui dizer. Silêncio. Andei decidida em direção à porta, obrigando-o a me acompanhar e disse. – Acho que perdi a noção do tempo enquanto trabalhava. Vamos.

Saímos do atelier, era fim de tarde e a neve ainda caía. Eu subiria para me lavar. Andamos até a escada da varanda do chalé e eu comentei:

– É tão estranho olhar para você e imaginá-lo como pai do Marconi, até mesmo da... Gianna.

– É... – ele sorriu. – É estranho para mim também. E ainda mais agora... Um neto!

– Ou neta!... – completei.

– É. Não consigo parar de pensar nisso desde que deixei Marconi em Sluderno e vim para cá. – disse ele angustiado.

– Marconi me disse que você é filho de um dos bisnetos de Tirreo...

– Exatamente. Meu pai chamava-se Silvano e viveu entre os séculos XVI e XVII. – disse ele orgulhoso.

– Foi... Caius...

– Não. – ele me respondeu compreendendo. – Ele desapareceu quando saiu para caçar um grupo de vampiros no Oriente Médio.

– Eu sinto muito. – eu murmurei. Chegamos à porta da sala.

– Tudo bem. Eu já superei isso. – esclareceu Lucca, seu tom sério e baixo. – Eu era adolescente e vivia com minha mãe lá nos Alpes, no lugar que Marconi te mostrou. – eu assenti, ele continuou. – Ainda não havia começado a me transformar, mas sabia que era uma questão de tempo, uma vez que nasci com o Sinal. Décadas mais tarde, minha mãe me fez jurar, em seu leito de morte, que eu jamais faria isso. Não sairia vagando pelo mundo à procura suicida de vampiros. Ela dizia que eu era o último e deveria esperar a hora certa para enfrentar Caius. – e terminou de me explicar olhando profundamente em meus olhos.

– Bom, eu vou subir... – disfarcei, sabia onde aquilo ia chegar, fazia alguma ideia do que ele considerava como a hora certa...

Ele parecia nervoso, de repente, tenso, e me disse intensamente, antes que eu entrasse:

– Vou ficar te esperando... – olhos nos olhos, cheio de significados incompreensíveis.

Eu sequer consegui correr para subir as escadas como sempre fazia. Procurava entender aquele olhar, aquela intensidade... Voltei a ofegar e uma onda elétrica varreu todo meu corpo. Lá se vai minha tarde relaxante de trabalho no atelier... Ah! A quem eu quero enganar?! Era ele que eu estava esculpindo no mármore. Isso é ridículo!

Entrei no meu quarto entorpecida. O perfume dele era forte aqui. O que deu na cabeça de Carmem pra oferecer justo o meu quarto pra ele?

Enchi a banheira, escolhi minha roupa e entrei no banho totalmente entorpecida. Tentei não pensar muito, mas não tive muita eficácia. Ele esteve antes de mim, nu aqui nesta mesma banheira. Seu cheiro ainda estava aqui, e fazia meu corpo pulsar uma eletricidade como nunca senti antes.

A corrente elétrica do meu desejo era minha velha conhecida. Eu sabia reconhecê-la e a última vez fora no Brasil. Mas essa nova versão que Lucca despertava em mim, era inédita e totalmente assustadora.

Quando voltei ao quarto para me vestir, encontrei uma folha de papel dobrada sobre minha escrivaninha. Havia um manuscrito, parecia em bilhete. O perfume intenso de obsidiniuns indicava quem o havia deixado.

Estava dobrado várias vezes. Quando abri a primeira dobradura uma caligrafia desconhecida e elegante, reproduzia um trecho, que reconheci imediatamente, de um singelo, até infantil poema de Einstein.

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“Pode ser que um dia deixemos de nos falar...
Mas, enquanto houver amizade,
Faremos as pazes de novo.

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Pode ser que um dia o tempo passe...
Mas, se a amizade permanecer,
Um do outro há de se lembrar.

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Pode ser que um dia nos afastemos...
Mas, se formos amigos de verdade,
A amizade nos reaproximará.

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Pode ser que um dia não mais existamos...
Mas, se ainda sobrar amizade,
Nasceremos de novo, um para o outro.

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Pode ser que um dia tudo acabe...
Mas, com a amizade construiremos tudo novamente,
Cada vez de forma diferente.”

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A corrente elétrica que percorria meu corpo foi substituída por um jato de gelo.

A tristeza e o desamparo me deixaram como uma estátua de mármore, mais gelada do que a que eu estava fazendo no atelier.

Era disso, então, que se tratava? Amizade. Foi o que eu mesma lhe ofereci, não foi? Na última vez que nos falamos?... “Amigos”, eu disse. Porque a amizade permanecia apesar de todos os obstáculos; assim como dizia o poema: o tempo, a distância, até a morte, o nada... A amizade permanece. Então porque me senti totalmente desamparada e sem chão, só de imaginar a possibilidade de me afastar dele?

Ficar sem falar com ele... Impossível!... A ideia de que Lucca pudesse, de alguma forma, deixar de existir me causou pavor e eu voltei a ofegar.

Notei que abrindo a segunda dobradura do bilhete havia mais um breve manuscrito. Mesma caligrafia; uma frase, uma citação:

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“As mulheres podem tornar-se facilmente amigas de um homem; mas, para manter essa amizade, torna-se indispensável o concurso de uma pequena antipatia física.” (F. Nietzsche)

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E agora... essa frase de Nietzsche? O que ele quer dizer com isso? Eu não sabia.

Mas eu ia descobrir. Guardei o bilhete. Terminei de me arrumar e desci.

Minha família estava por todos os cantos. Pequenos grupos afins buscando distração. Na varanda somente Edward, Bella e Nessie. Não vi nem sinal de Lucca, em nenhum lugar. Olhei para o três e Edward rapidamente me respondeu sem que eu lhe perguntasse nada:

– Ele foi para a estufa... – apontou com o queixo, reprimindo o riso. Típico!...

Ele sabia que não precisava me dizer nada. Se eu quisesse encontrá-lo, eu encontraria. Edward com isso, queria me dizer é que sabia de toda essa... Confusão que eu sentia... E isso era... Irritante!...

Quando entrei na estufa, ele contemplava a preciosa coleção de Carmem e Eleazar. Então ele me olhou, sorriu e comentou:

– Vocês têm edelweiss... – não pude deixar de lhe devolver o sorriso. Ele continuou. – Imagino que você tenha encontrado meu bilhete?... – eu assenti, aproximando-me dele.

– Encontrei. Mas não o compreendi totalmente. – aproximei-me devagar.

– Nietzsche! – ele riu. Tratei de arquivar, cuidadosamente o som daquela risada à memória.

– Nietzsche... – eu lhe fiz eco em tom explicativo.

– Me... Desculpe.  – pediu ele olhando para o chão. – Eu não devia ter escrito aquela citação no verso... O trecho de Einstein era para ser uma resposta a sua gentil oferta de hoje cedo, mas ele não dizia muito do que realmente vai na minha alma, então... – seus olhos faiscaram para os meus, me prendendo de maneira injusta, porque eu já não podia mais raciocinar.

– E o que realmente vai em sua alma? – sussurrei. Podia sentir as ondas escaldantes do seu corpo me envolvendo.

– Eu não sei... – ele se aproximou mais. O perfume era intenso, inebriante.  – Mas sei que não é tão somente amizade. – Minha respiração desnecessária tornou-se pesada, ele continuou, sussurrando; fitando minha pele do rosto, pescoço e colo. – Você esculpe no mármore... Queria poder tocar, só uma vez, esta escultura de mármore, perfeita que está bem aqui ao alcance da minha mão... – sua mão direita agora fazia um caminho lento pelo ar em direção ao meu rosto. Mas quando seus dedos iam me tocar... A porta da estufa se abriu...

Tanya! – surpreendeu-nos Kate. Ambos, Lucca e eu, nos sobressaltamos com a invasão e imediatamente nos recompomos. Kate fitava-nos séria, as sobrancelhas arqueadas, braços cruzados no peito. Lucca pediu licença e se retirou.

Quando a porta da estufa bateu atrás dele, Kate perguntou com a voz alterada; duas oitavas acima do normal:

– Mas o quê está acontecendo aqui?


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Notas finais do capítulo

N/A: Gostou??? Posto outro amanhã ou depois, tá?!
Obrigada por ler e não deixe de comentar...! *-*
bjokas! ;*