O Filho Pródigo e Deus escrita por Bardo Maldito


Capítulo 2
O Filho Pródigo e Deus


Notas iniciais do capítulo

Aqui está.Como dito antes,esta é a conversa que Charles tem com Deus,após visitar o Solarium.



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Após o selo ser feito,Charles sente apenas vácuo em todo lugar.Não há matéria,tempo,ou espaço.Há apenas a sensação de ir longe,vagar a uma velocidade e intensidade incalculáveis.

Lembrou-se exatamente quando experimentara essa sensação antes: em sua queda,há tantos anos atrás.

O corpo inteiro dói,mesmo seu corpo celeste parece estar prestes a se quebrar.Abrir suas asas espirituais,à essa velocidade,seria suicídio.Apenas há a velocidade,e não há nada a se fazer a não ser esperar.

Até que finalmente para.

Charles se vê em um ambiente totalmente iluminado,aonde não há nada,apenas luz.Uma luz pura,e uma paz imensa se reflete nesse grande vazio não-vazio

Então,Charles se lembra do que aconteceu.O selo.O que aquela caçadora fez com ele.

Mas para pra analisar melhor o lugar aonde se encontrara.

-Eu reconheço esse lugar... Es-estou... estou em casa? - fala para si mesmo,com a voz trêmula

Era o Solarium,a parte mais alta do Céu,aonde você habitara há muito tempo atrás.Sim,estava em casa.Era ali que ele desobedecera as ordens,divinas,e encarou seu Pai nos olhos.Ali,aonde foi caçado por seus irmãos serafins.Ali,o lugar mais sagrado de sua longa existência.

-Ei,parado!!

Charles ouve a voz forte quebrar o imenso silêncio que reinava naquele local.Então,se vê rodeado por mais três serafins.Os reconhece.São seus irmãos,de seus tempo antigos,aonde cultuava o trono de Deus.Serafins que já o haviam caçado,que o expulsaram do Solarium,que o renegaram em outras eras.

Os três estão em sua forma real,de pura luz divina,então não é possível distinguir suas feições com seus olhos humanos.Se não fosse sua alma poderosa de anjo,seus olhos já teriam ardido em chamas.

-Quem é você e o que faz aqui?-pergunta um dos serafins

-Eu sou Kadoshiel.-diz Charles,surpreso consigo mesmo por usar seu nome verdadeiro,seu nome de anjo,esquecido há tanto tempo.-Encarnado. Expulso de onde estava por um feitiço inconveniente.

-Então está cometendo um crime pior ainda.Ousou retornar ,após ter traído o Senhor nosso Deus!

-Não será poupado.Será morto agora!

Todos os serafins aumentaram mais sua luz.Embora não os enxergasse,Charles deduziu que todos haviam sacado suas espadas celestiais,feitas de pura chama sagrada.

-Nem pensar.-diz Charles,mais para si mesmo

Então,Charles bate as asas para longe,buscando fugir,sem perder tempo em batalhas.

Os serafins o alcançam,e,com um golpe de espada, um deles ceifa uma de suas seis asas com precisão cirúrgica.

-Devo desonrá-lo mais ainda ou aceitará seu fim honrosamente?-pergunta o serafim

-Aaroniel!Esraiel!Riryaza!!

Uma voz poderosa soa pelo local.

Todos param e ouvem essa voz poderosa.Todos a reconhecem,embora a tenham ouvido apenas uma vez em toda a sua longa vida.E apenas Charles conseguiu relacionar a voz a um rosto.

-Parem com isso!Tragam Kadoshiel à minha presença!

Charles,ainda estupefato com isso,diz,meio hesitante:

-Adonai?

Um dos serafins, trêmulo, ousa protestar:

-Mas...Senhor...ele ousou retornar a Paradísia,depois de ter fugido daqui...

A voz se torna mais branda,mas ainda firme:

-Meu filho pródigo retornou,e desejo falar com ele.Tragam-no à minha presença.

Charles interfere,envergonhado:

- Senhor... não sou digno... eu escolhi desobedecê-lo.

-Sim!Ele não é digno!Ele ousou desobedecer ao Senhor!!-diz um dos serafins,se agarrando às palavras dele como um afogado se agarra a uma boia

-Mas se está aqui,é porque decidiu voltar,não é?-perguntou a voz

-Estou aqui porque fui expulso de onde estava, no mundo físico. Tu sabes de todas as coisas.

-Não existe acaso,Kadoshiel.Tudo acontece por um motivo.Vocês três,por favor nos deixem.Preciso ter uma conversa a sós com seu irmão renegado.

Os serafins,mesmo contrafeitos,obedecem e voam para longe.

Charles se ajoelha,humildemente,diante da presença do Deus-Pai Todo-Poderoso.

-Eu não sou mais um servo como seus outros filhos fiéis, Senhor.Eu caí, e me alegrei com minha vida terrena.Sei que nada na existência acontece sem vosso consentimento. E já que tu dizes, ó Senhor, que nada vem do acaso, não foi por acaso que me deparei com aquela fenda perto do oblívio, entrei no universo e encontrei o mundo que planejaste.

Charles aponta cada um de seus atos com rejeição,como se tivesse cometido um crime terrível.O que,de fato,cometera,segundo seus irmãos serafins.

Mas a voz do Senhor se torna suave e paternal:

-Kadoshiel...você esteve na Terra até agora...então sabe o que acontece com os pais.

Charles não ousa levantar os olhos para encarar seu Pai uma segunda vez.Não sentia seus olhos puros o suficiente para tanto.Mas se surpreende com as palavras e o tom de seu Pai.

-Eles tem filhos...sempre os tem perto de si...protegendo,amando,cuidando...depois de um tempo,eles crescem,descobrem o mundo...e se tornam independentes,mesmo não deixando de amar os pais.

Charles se sente surpreso.O Pai...estava consolando ele?

-Seus irmãos...como esses três que lhe cortaram a asa...são crianças.Você cresceu.E me orgulho de ti.

-Mesmo voando para longe, meu respeito pela sua presença sempre viveu em mim, mesmo reputando-te por um deus que não mais vivia.-disse Charles,aliviado com as palavras do Pai

-E por isso sempre me orgulhei de ti.Você é um anjo,mas,no fundo,possui um coração humano.Ao decair,você conseguiu conquistar por si próprio a maior dádiva de minha maior criação: o livre-arbítrio.É cheio de defeitos,como qualquer um,mas é mais um filho de minha criação.Eu nunca deixei de amar nenhum de vocês.Nem mesmo Lucibel,que agora reina no Abismo.

-Bendito seja o seu santo nome... agradeço, Senhor.

Charles mal cabia em si de tanta alegria.Ele estava ali,conversando com seu pai,e entendendo que seu suposto crime não foi um crime,mas sim um progresso.Entendendo que sua vida inteira era digna,e que seu Pai continuava olhando por ele.Essa alegria permaneceu marcada em sua feição.

Então,Charles se lembra dos seus 3 amigos serafins.

-Mas, se me permites perguntar, Adonai.... onde estão aqueles que permaneceram de pé junto comigo, contemplando sua face?

-Yala,Artazai e Liel.Eles lhe seguiram,mesmo em sua queda.São irmãos fiéis.Pretende encontrá-los de novo?

- Seria um momento de júbilo, meu Senhor.

-Entendo.Para isso deverá fazer uma escolha,meu filho.

- Qual?

-Cada um de seus irmãos decaiu,mas para planos diferentes da Terra que está acostumado.Como bem sabe,existem outros planos,apenas alcançáveis pelo acaso ou pela minha vontade.Seus irmãos estão,respectivamente,em Arcádia,Spiritum e Arkanum.Longe,muito longe de onde qualquer anjo já pisou.Assim como você,eles são inalcançáveis.Apenas o acaso poderia trazê-los de volta.Então deves fazer a escolha.

Charles já deduzia qual seria a escolha que o Pai lhe pediria pra fazer.Mas,mesmo assim,apenas suspirou e esperou humildemente que o Senhor falasse.

-Eu posso mandá-lo para longe daqui,para um desses lugares.Mas não seria possível resgatá-lo posteriormente.Seria a sua escolha permanecer ali.O mundo é feito de escolhas,Kadoshiel,e mesmo eu não posso alterar a Roda dos Mundos para modificar as escolhas.Então,daqui há a sua escolha.Podes ir para Arcádia,Spiritum ou Arkanum,para junto de um de seus irmãos.Mas,ao fazer isso,deixará para trás tudo que construiu na Terra.Ou poderá ficar aqui em Paradísia.Seus irmãos o perdoarão,e poderá voltar aos tempos antigos.Ou ainda voltar à Terra,aonde voltará ao xadrez celestial que seus irmãos armam,mas poderá salvar vidas e se reunir novamente aos de seu convívio.Faça uma escolha sábia,meu filho.E lembre-se sempre que eu o perdoarei e amarei,seja qual for sua escolha.

Charles sabia que teria que escolher.Há muito se conformara com o fato de que nunca veria seus irmãos novamente.Mas também se conformara com seu destino de nunca mais falar com seu Sagrado Pai,e este fora possível.Suas esperanças se renovaram,mas apenas para murcharem novamente.Ainda assim,Charles não se arrepende de sua decisão e a diz em voz alta a seu Pai:

- Senhor... Eu não sou mais um espírito. Pelo menos não apenas, agora. Eu tenho sangue pulsando em minhas veias, e tenho ossos. Eu vejo meu novo mundo não muito diferente de um olhar humano. Eu amo aquilo que me tornei, e amo o meu lar terrestre. Não o deixarei para trás.Mas vos pergunto: eles sofrem onde estão? Conseguem viver como podem?

-Cada um deles sofre as consequências dos próprios atos.Isso é tudo que posso lhe dizer.-lhe responde o senhor

Charles sabia que a resposta seria algo enigmático assim.Desanimou e abaixou a cabeça.

-Mas não perca a fé.-diz o Senhor-O acaso o trouxe aqui.Algum dia,o acaso pode uní-los novamente.Quem sabe?Talvez nem eu saiba.Minha criação repetidamente surpreende até a mim...

Era um fato...era surreal pensar que mesmo o ser mais poderoso de todo o Universo,o Grande Arquiteto,possa ser tão humilde,ao ponto de reconhecer que até ele próprio pode se enganar...

-Ao voltar,apenas lhe peço para pensar com a cabeça,e não com o coração.Aprenda a amar teus inimigos,assim como eu amo a todos vocês igualmente.Se lhe baterem em uma face,ofereça a outra.Se este machucar a mão ao bater-lhe,cuide de sua mão ferida.

-Senhor, lembre-se do que tu falaste por intermédio de Isaías...O dia da Vingança está próximo.Respeito é um bem escasso.Um troféu àqueles que merecem.Aos demais apenas posso ser gentil.

-Tenha piedade dos fracos,Kadoshiel,e sobretudo dos que vivem sem amor.Não seja como Miguel e Lucibel,que lutaram e macularam Paradísia por motivos pessoais.Sangue derramado sempre é um desperdício.Não deixe que sua cólera faça alguém chorar.A Justiça é algo belo e terrível.Faça o que achar correto,Kadoshiel,e sofrerá as consequências depois.Sejam elas boas ou más.Você conquistou o livre-arbítrio.Saiba usá-lo sabiamente.

Charles ouvia as palavras do Senhor.Pura bondade e justiça...foi isso que ele viu ao contemplar sua face,e que fazia jus às suas atitudes.Sabia que estava na Terra por um propósito,e não se arrependia de suas ações.Sabia,como o Senhor disse,que sofreria as consequências de seus atos.Para o bem...e para o mal.Por isso,apenas diz:

-O inocente sempre será poupado, Adonai.

A figura de Deus parece sorrir para seu filho.Em seguida,diz com uma voz doce,que irradia de cada nota uma paz e tranquilidade infinitas:

-Que minha Graça sempre esteja convosco.

Então,a luz suprema começa a aumentar mais e mais,até chegar ao ponto em que o próprio corpo do Serafim não podia ser visto.

E foi aumentando cada vez mais,e mais,até que finalmente escureceu.Charles Fountain,então,se descobriu em um solo de terra batida,com uma cratera imensa à sua volta.Reconheceu o cheiro de Terra,viu as estrelas no Céu.

Quase via,no Céu,seu pai sorrindo para ele.

Charles sorri, ao mesmo tempo que respira profundamente.

-Vejo que saciei algumas nostalgias...-diz ainda deitado.Ele chega colocar as mãos sob a cabeça.

Então,lhe ocorre o que acontecera.Os caçadores.Eles o mandaram pra longe.E agora estavam sozinhos com Bonnie e os dois demônios.

-Hmm, acho que devo retornar, lá.Bem nervoso,suponho... mas me sinto tão tranquilo.Que seja, retornarei...

Então,Charles percebe que sua sexta asa milagrosamente retornara.

Um milagre divino.

Impossível?Surpreendente?

Não para um Anjo Renegado que acabara de receber o perdão do Senhor.Se isso épossível,o que é impossível?


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Notas finais do capítulo

Aí está.
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