Diario de um Semideus 2 - As Portas da Morte escrita por H Lounie


Capítulo 13
Zona do crepúsculo


Notas iniciais do capítulo

Contem trechos de The twilight zone, do Rush.



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Truth is false and logic lost. Now the fourth dimension is crossed

(Verdade é falsa e a lógica, perdida. Agora a quarta dimensão é cruzada)

A viagem até Yuma foi rápida. Contei aos outros o que sabia sobre o possível retorno de Gaia e a reação deles não me animou nenhum pouco. Esperava o momento certo para compartilhar apenas com Luke o quão perto estivemos de cometer o maior erro de todos os tempos.

O centro de arte pôde ser facilmente encontrado na cidade do sol e devo acrescentar, o templo de meu pai é bem mais bonito que o Intrepid de guerra de Ares. Faltava pouco para as 4AM, mas ainda assim consegui atender ao pedido de meu pai e ainda seguir a pista dada por Leto. E só para variar, agora tínhamos problemas e nossos problemas tinham nomes. Aquiles, bem, ele não era o maior problema agora, o maior problema seria Hécate.

– Bem vindos ao Yuma Art Center. Tirem os sapatos e contem em louvor ao deus Apolo. – Disse ao outros ao estacionar o carro. – Ei, uma fonte. Vou fazer um pedido.

Andei até a fonte e lancei uma moeda nela, sem fazer pedido algum, acho que apenas precisava ficar um pouco sozinha, mas claro que isso não foi possível

– Sei pai virá buscar o carro?

– Eu não sei Nico.

Ele continuou ali parado e atrás de nós, eu sentia que Annabeth estava a ponto de colocar Luke embaixo do carro e passar com ele por cima, desde que isso o fizesse não vir até a fonte.

– Acho que isso é seu.

Nico tirou um colar de seu pescoço e colocou no meu, com alivio senti que era meu arco dourado.

– Obrigada.

Ele não disse mais nada, apenas ficamos olhando a fonte, enquanto Luke e Annabeth brigavam atrás de nós.

– Acho que devemos passar a noite, ou o resto dela, aqui. Hécate provavelmente irá nos procurar, ou talvez Aquiles. Ou talvez qualquer monstro no raio de 50 quilômetros.

– Provavelmente. – Ele riu. – Vamos ficar por aqui então. Descansar um pouco.

Annabeth e Luke concordaram, então fomos até perto da fonte e nos sentamos ali.

– Ei, vocês estão com fome? Posso sair e arranjar umas coisas.

– Arranjar alá filho de Hermes? – Falei rindo.

– É o único jeito, não? – Luke sorriu. – Isso me lembra aventuras passadas, o que acha?

– Sabe que não sirvo pra isso, ia acabar estragando tudo.

– Vai me deixar ir sozinho? – Disse ele, fingindo decepção.

– Ah, vai lá Luke, confiamos em você. – Disse Nico, entediado.

Ele sorriu e saiu, gritando um ‘volto logo’.

Nem bem me encostei na fonte e já senti o sono pesar.

– Durma. – Disse uma voz firme.

– Não. Tenho que cuidar...

Nem mesmo terminei a frase, senti os braços de Nico me envolverem e caí no sono.

O lugar era fantástico e havia um homem que eu conhecia parado logo a minha frente.

– Papai?

– Você acabou de entrar na Zona do Crepúsculo, Lyra. Além deste mundo coisas estranhas são conhecidas, conhecidas só por mim e Ártemis. Acho que não preciso dizer que não poderia trazer você aqui. Tenho que ser rápido, Zeus pode perceber.

– É um sonho?

– Sim, é um sonho. Aqui tempo e espaço colidem.

O lugar parecia uma mistura de meus maiores sonhos, com raios de luz e estrelas cadentes. Havia brilho, havia música, efeitos, parecia um lugar feito para mim. Havia prateleiras e prateleiras de coisas que remetiam a minha infância, fotos, brinquedos, roupas, medalhas de concursos de músicas, esculturas feitas com argila e muitas outras coisas, era como se tivessem feito um museu em minha homenagem. E então havia meu pai e eu no centro de tudo aquilo.

Apolo sorria como da primeira vez que eu o vi na Grécia. Ela estava com aquela mesma forma, os meus olhos que eu via toda vez que olhava no espelho, a mesma cor de cabelo e até o mesmo sorriso. As pessoas estavam certas, eu me parecia muito com meu pai, mais do que eu poderia imaginar até então.

– Sabe Lyra, coisas terríveis estão para acontecer. Com os deuses, com os semideuses, comigo, com você. Uma grande revolução que incomodará a todos no Olimpo e ela está apenas começando. Essa inimiga antiga é muito perigosa. É de vital importância que você siga os passos de minha mãe.

Ele andava de um lado para o outro em minha frente, a expressão triste o envelhecia muitos anos, como se os milênios de vida que ele viveu começassem a fazer seu efeito.

– Confesso que fiquei realmente assustado quando vi que você estava fazendo parte disso. Assustado e decepcionado. Como pode uma das maiores heroínas desde século mudar de lado assim? Mas havia um porém, eu entendia seu ódio, eu entendia o que você estava sentindo, principalmente em relação a mim.

Ele se aproximou, colocando as mãos em meus ombros.

– Não é por falta de vontade Lyra. Não é um simples desinteresse ou apenas um descaso da parte dos deuses.

E isso era o que sempre ouvíamos. Uma causa maior. Mas uma coisa me incomodava há muito tempo.

– Para que ter filhos se não podem cuidar deles?

A pergunta pareceu pegar Apolo desprevenido.

– Nunca pararam para pensar o quão assustadora é cruel é a vida de um semideus para que muitas vezes ele nem mesmo conheça seu pai ou mãe? Nunca pararam para pensar o quão terrível pode ser uma noite, sozinho na rua, lançado a sua própria sorte? Nunca pensou o quanto pode ser frustrante passar dias e noites com escudos ao peito gritando que suas batalhas são por seus pais quando estes nem mesmo se dão ao trabalho de aparecer de vez em quando? Já pensou o que é sentir que uma falha sua pode por tudo a perder?

– Não há um só dia que eu não tenha estado olhando por você. – Disse ele depois de uma longa pausa, se afastando de mim. – Há uma grande diferença entre não estar presente e não ser visto, Lyra. Sei a hora que costuma acordar, quando vai dormir, como mexe na ponta dos cabelos quando está nervosa, como agora. Conheço sua voz, seu choro, suas frustrações e seus medos. Sei o que mais te irrita, sei que às vezes não ouve as pessoas, sei que às vezes continua insistindo mesmo sabendo que está errada e sei como é impulsiva e como luta pelo que ama. Sempre admirei seu desempenho nas aulas de artes, ou como quando você continua acreditando na pessoa mesmo quando ela mesma não acredita mais.

Ele falava com uma admiração notável. Percorria o espaço fazendo movimento com as mãos e falando rapidamente como se jamais fosse ter tempo para terminar. Ora ou outra pegava uma foto ou um objeto e sorria, como se estivesse lembrando de algo.

– Sempre me surpreendo quando defende um amigo, sei como preza pela verdade, fiquei orgulhoso quando venceu seu primeiro concurso de talentos e me surpreendi com seu último projeto na feira de ciências. Sei o que sente pelo filho de Hades, sei que está confuso em relação ao filho de Hermes, sei que tem o costume de morder os lábios quando está assustada ou com medo e sei que você tem um tipo de sorriso para cada reação sua. E sei o quanto se parece comigo, não só fisicamente, e sei o quão assustador isso deve ser para você, porque sei que você percebeu.

Ele virou para mim novamente e sorriu mais uma vez, enquanto eu tentava assimilar aquelas palavras que me pareciam surreais demais. Enquanto eu o observava, mexia compulsivamente na ponta dos cabelos.

– Apesar de não poder cuidar, como você disse, indiretamente estou presente na vida de cada um de vocês, meus filhos. Conheço a cada um como a palma de minha mão. Admiro as qualidades de cada um. Observo a cada um.

Apolo parecia perceber minha dificuldade em aceitar o que ele dizia.

– A paixão Lyra. Arrebatadora, forte, cega. Você já experimentou isso. Eu entendo o que diz, todos precisam de uma figura materna e uma paterna sempre presente eu entendo isso. Eu entendo que não é justo, mas a paixão nos leva a isso. Vocês semideuses são conseqüência do amor.

– Consequência soa como erro.

– Erro? Jamais. Como você, por exemplo, poderia ser um erro?

– Eu quase pus tudo a perder com uma simples escolha.

– Exatamente, você quase pôs tudo a perder. Existe uma linha, muito frágil, mas ainda existe uma linha entre o fazer e o quase. E quanto ao poder da escolha, bom, todos podem errar, não podem?

– Não quando esse erro causa mais danos ao outros do que a quem fez a escolha errada. Estou falando de estupidez em uma escala gigantesca. E estupidez é uma arma que está apontada para quem atirou.

Começava a me perguntar qual era o real motivo daquela visita, se é que eu poderia chamar de visita.

– Lyra, apenas entenda, uma conseqüência do amor jamais pode ser um erro.

– O amor me assusta. Não o entendo. Mesmo amando você deixa de amar, sentindo deixa de sentir ou às vezes um simplesmente deixa de amar e o outro não, é isso... É tudo tão rápido.

– Sim, é sempre tudo tão rápido. – Disse ele, distante, pensativo. - As coisas não podem demorar. Nós temos que deixar vocês rápido, antes que consigam se lembrar de muita coisa. Temos que deixar o amor mais rápido do que gostaríamos, é assim que as coisas devem ser.

Não, não era assim que as coisas deviam ser.

Deixa, Apolo, o correr tão apressado. Não te leva o amor, leva-te o engano, com sombras de algum bem a mal dobrado. E quando seja amor será forçado e se forçado for, será teu dano.

Recitei um trecho de um soneto de Camões, o mesmo que eu havia usado para abrir a porta do mundo inferior no central park.

Porque menos mal é tendo-a presente, sofrer sua crueza, e teu tormento, que sentir sua ausência eternamente. – Continuou papai. – Vê? Camões concorda comigo querida. É melhor sumir rápido, deixar o tempo se encarregar de curar as feridas. É melhor ser odiado do que continuar por perto, trazendo perigo. Foi o que pensei quando soube que você voltou e o que estava fazendo. Seria melhor sentir seu desprezo do que continuar sentindo sua ausência eternamente.

E era contra esse cara que eu pensava em lutar há alguns dias atrás. Era contra tudo que ele me disse que eu pensava em lutar. Entregá-lo ao castigo, fazê-lo pagar por algo que ele não era culpado. Só em pensar me sentia mal, me sentia o pior dos traidores. Sem nem pensar duas vezes, corri até ele e o abracei, chorando como nunca.

– Sentir medo nem de longe é uma fraqueza de caráter, pequena. Faz parte do ser humano.

Ele repetiu a primeira coisa que falou para mim há tantos anos atrás.

– E não é só isso. – Disse em meio a lágrimas. – Tem vergonha também. Pai, me desculpe.

– Não tem por que pedir desculpas Lyra, eu entendo você. Sabe, eu também não tive um pai muito presente, sei bem como é, mas em compensação, tive uma mãe excepcional, assim como a sua. Agora eu devo ir, Zeus acaba de perceber o que eu estou fazendo. Parece que Afrodite também estava no sonho de Piper tentando lhe mandar uma mensagem.

Ele segurou uma pequena caixa nas mãos, andou até mim e a colocou dentro de minha mochila.

– Pai, Aquiles voltou.

– Eu sei. – Disse ele, visivelmente irritado.

– Ele está com o amuleto de Hera.

– Não. O que ele tem faz parte de um conjunto que forma o amuleto de Hera.

– Desculpe, eu não...

– Use a chave, destranque a porta. Veja o que seu destino pode ter guardado para você. Vá explorar a criação dos seus sonhos. Eu tenho certeza que dei algo importante para você, devo agradecer a Héstia. – Disse pensativo, como se anotasse aquilo mentalmente. - Ah, tenha cuidado quando acordar querida.

Papai me abraçou mais uma vez. Então o sonho se desfez e eu acordei em meio a uma pequena batalha.

Look up to see a giant boy. You've just become his brand new toy. No escape, no place to hide

(Olhe para cima para ver um garoto gigante. Você acabou de tornar-se seu mais novo brinquedo. Sem escapatória, nenhum lugar para se esconder)


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