Pouco menos de cinco anos se passaram desde aquela tarde de terça-feira em que ele a viu pela primeira vez.
Quase dois anos foi o tempo que transcorreu desde a última despedida. Desde que ele teve a coragem de se declarar, mas a não a força para enfrentar a resposta – negativa ou positiva que fosse.
Os passos apressados de uma garota - agora já não tão jovem e muito menos tão inocente como no começo - se confundiam com o barulho da forte tempestade que caia, enquanto a pele da mesma parecia ficar ainda mais branca debaixo do luar que não hesitava em aparecer entre uma nuvem e outra.
A água da chuva em seu rosto misturava-se com suas lágrimas, e seus soluços deixavam um rastro de desespero junto aos seus gritos de medo por aquelas ruas desertas de um bairro qualquer nas vizinhanças de Hiroshima.
Os trovões pouco a pouco começavam a ressoar nos estornos, e assim os gemidos de temor aumentavam na mesma forma, ao ponto de – em certos momentos – fazer com que ela mesma não ouvisse mais nada.
A certo ponto, um aconchego que ela já tinha provado antes se apoderou de seu corpo e da sua mente. Uma mão se enfiou por entre seus castanhos e longos cabelos, e outra se manifestou puxando-a para outro corpo tão molhando quanto o dela.
Uma única frase foi possível ser ouvida naquela cena.
...A qual era familiar.
A mesma de dois anos atrás.

Vinte dias antes, em um avião que sobrevoava um ponto qualquer do Japão...
- Etto... Hikaru?! – Kaoru começou a balançar o irmão adormecido, na tentativa de acordá-lo.
- Nani, Kaoru? – Resmungou o ruivo num tom arrogante, levantando-se.
Eles ainda eram iguais. Eles ainda dormiam na mesma cama, do mesmo quarto, da mesma casa. Os dois ainda estudavam juntos. Os irmãos Hitachiin ainda tinham seu próprio mundo. Aquele mesmo mundo egoísta e simplório que carregaram por toda a vida, mas que por curtos três anos parecia ter desaparecido. Mas... O intruso já tinha deixado seu lugar há muito tempo.
E isso doía. Doía tanto ao ponto de não poderem mais nem mesmo pronunciar aquele nome.
- Ah, é que nós já estamos chegando. – Kaoru disse após um leve sorriso – Ei, Hikaru... – Continuou, olhando para o lado oposto ao anterior – Você sabe que dia é amanhã...?
O irmão mais velho suspirou. Olhou a face desapontada de Kaoru, e percebeu do que ele estava falando.
- Hai... – Respondeu com receio.
- Esses dois anos demoraram a passar, não é? – Kaoru proferiu calmamente, com outro sorriso sobre a face, agora tendo coragem para olhar o irmão.
Hikaru notou que algo tinha mudado nele. Aquele sorriso... Aquela linha meio curva que a boca de Kaoru tinha formado...
Era algo para consolar a si mesmo. Mas ele sabia tanto quanto Hikaru que não funcionava.
E jamais funcionaria.
- É... – Assentiu, também o encarando de forma tímida.
O avião aterrou sem problemas no aeroporto privado deles.
Aquele era o último dia da primavera, e as férias estavam por terminar junto com a mesma.
No dia seguinte as aulas iriam voltar ao normal, e a faculdade de engenharia mais famosa de todo o Japão abrigaria mais uma vez os dois irmãos.
Os gêmeos Hitachiin.
Eram conhecidos deste modo.
Nada mais. Não havia Hikaru e Kaoru. Eles não passavam de duas pessoas iguais para as demais pessoas. O único conforto que eles ainda possuíam era o fato de que nem sempre foi assim.
Mas a dor que carregavam era saber que aquele episódio da vida deles jamais se repetiria.
Nunca mais.
- Hikaru, você está bem? – Kaoru perguntou pela terceira vez seguida.
Respostas não saíam de dentro da boca do jovem de vinte anos.
Ele não deveria ser mais uma criança. Ele deveria ter crescido e mudado, ter ficado mais maduro.
Mas ele não tinha motivos para mudar. Não mais.

Flash Back ON.

- POR QUE, HIKARU? – Haruhi deixava com que as lágrimas escorressem por seu pálido rosto, sem se importar muito com o resto das pessoas que a olhavam assustadas – POR QUE VOCÊ TEM SEMPRE QUE ACABAR COM OS SONHOS DOS OUTROS, EIN? VOCÊ É TÃO EGOÍSTA ASSIM?
Ela deu uma pausa. Ele não respondia.
Estavam em um parque. Era noite, mas as luzes dos lampiões deixavam tudo muito claro. Os comentários maldosos de todo aquele publico pareciam não chegar até as orelhas dela.
Um sorriso forçado se manifestou por entre os lábios do ruivo garoto.
- Por quê... – Ele parou para refletir, mas já não tinha por que esconder aquilo. – Eu te amo, Haruhi. – estremeceu a voz na palavra ‘Amo’, mas mesmo assim foi capaz de pronunciá-la – Você quer sair comigo?

Flash Back OFF.

- VOCÊ QUER ME ESCUTAR, HIKARU? – Quando ele finalmente notou, tinha seu irmão praticamente sobre si.
- O QUE VOCÊ QUER?! – Berrou, finalmente respondendo-o.
- Achei que você tivesse em um êxtase. – Kaoru falou assustado – Não é que você andou pegando drogas?
- Mas do que você está falando, baka? Eu estava pensando nas aulas de amanhã e de quem estaria na nossa classe! – Inventou uma desculpa qualquer.
Mas não funcionaria.
Kaoru poderia quase ler os pensamentos de Hikaru – mas não vice-versa. Ele sabia que o irmão era apaixonado...
Pela mesma garota que ele.
Pelo intruso...
Que chegou e arrasou o mundo deles.
Irreparavelmente.