Passa-se quase um ano desde que Saga se tornou mestre do Santuário. Como ele havia prometido a Shion, ele vinha sendo um ótimo Grande Mestre. Bondoso, justo. Não havia nem mais sombra daquele jovem orgulhoso e arrogante. Ele até parecia ter envelhecido uma década.

            Yasmin estava muito feliz. Saga era muito carinhoso com ela, a tratava como uma filha, e ela, em troca, o idolatrava. Todos no santuário, a tratavam de uma maneira um pouco mais respeitosa, alguns com sinceridade, outros, por obrigação. A menina fez algumas amizades sinceras: Mu, discípulo de mestre Shion, tinha grande carinho com ela. A tratava como uma irmã mais nova. Aioria, discípulo e irmão mais novo de Aioros, gostava muito de Yasmin, mas ela estranhava seu jeito de gostar. Ele parecia ter ciúme de tudo e todos e só ficava ao lado de Yasmin quando ela estava sozinha. Yasmin não se preocupava muito e enxergava aquilo como timidez.

...

            Era primavera. O dia estava tão belo que Yasmin sentia que nada de ruim podia acontecer. De repente, ouve-se um grito vindo da sala do Grande Mestre. Yasmin corre. Shion jaz inerte nos braços de Saga. Ele vê Yasmin entrando, olha para a menina com expressão assustada e diz:

            - Yasmin, o mestre, Shion... – Saga abaixa a cabeça e começa a chorar copiosamente.

            Yasmin se aproxima de Saga, ajoelha, pega em sua mão e o acompanha em um choro que parece interminável. Em alguns minutos, todos os cavaleiros dourados já estão no recinto. Aioros pergunta:

            - Saga, como foi?

            Saga demora muito para responder, não parece estar em condições de conversar naquele momento. Mas com grande esforço, responde:

            - O Mestre me chamou para conversar, se aproximou, pegou em minhas mãos, disse que estava muito feliz, que era para eu cuidar de todos. De repente ele simplesmente caiu em meus braços. Eu chamei por ele e suas últimas palavras foram que ele poderia morrer em paz.

            Todos ficam chocados com a súbita morte do Mestre. Nesse momento, Yasmin se afasta de Saga e vai consolar seu melhor amigo, que chora a perda de seu querido mestre.

            Saga solta carinhosamente o Mestre no chão, se levanta e diz para todos:

            - Vamos nos preparar para a cerimônia.

...

            O tempo, sábio que é, sempre ameniza as feridas. Dois meses depois da morte de Shion, tudo parece voltar ao normal no Santuário. Saga é um mestre muito parecido com seu antecessor: sábio, bondoso, justo. Ele é respeitado e querido por todos os seus subordinados.

            Yasmin, apesar de ainda sentir falta de seu querido velho mestre, se concentra em suas obrigações. A principal delas, a que o mestre lhe incumbiu, a de estar sempre ao lado de Saga. A menina não entende, racionalmente, o porquê de o mestre ter lhe pedido isso, mas sabe que é algo de suma importância.

            Ela ostenta agora, apesar de ter apenas 6 anos, um ar de maturidade, diferente da pequena menina que chegou no Santuário. Porém, quanto a sua deficiência, continua a mesma: não diz uma única palavra, mas entende de maneira excepcional tudo o que os outros dizem. Dá-se a impressão que ela entende mesmo sem fazer leitura labial. Alguns já chegaram até a comentar que ela só não fala porque não quer.

...

            A felicidade, diferente do tempo, não tem sapiência em si. O sábio se apodera da felicidade...

            Era uma manhã aparentemente tranqüila, como todas que se sucederam naqueles últimos meses. Yasmin se encontrava sentada ao lado do trono de Saga. Era seu lugar favorito. Ela dificilmente era vista em outro lugar, a não ser na companhia de seu mestre. Saga saía pouco, passava horas por dia no trono que havia sido de todos os seus antecessores. Parecia que, sentado ali, ele sentia a energia dos sábios que por ali passaram.

            Quebrando o calmo silêncio, entra um guarda do santuário:

            - Mestre, tem uma assistente social e policiais lá embaixo. Querem ver a menina com um responsável.

            Saga leva um susto. Isso era algo muito inesperado para a rotina do santuário, que raramente recebia pessoas que não fossem cavaleiros. Yasmin parecia acordar de uma longa viagem de calmaria e felicidade, mas não se recusa a descer. Ela olha para Saga e faz um gesto afirmativo com a cabeça.

            Chegando lá embaixo, a mulher olha para Saga e sem nem se identificar, nem cumprimentar, vai logo dizendo:

            - Eu vim buscar a menina.

            Saga novamente se assusta, não esperava ouvir tais palavras. Yasmin sente que seu mundo caiu. Ela não quer, não PODE deixar Saga. Ele então pergunta, sem nada entender?

            - Por que? Ela está muito bem aqui.

            A mulher responde, de maneira fria e alheia.

            - Como o senhor que tinha a guarda dela faleceu, ela pertence novamente ao orfanato. Mas ela acaba de ser adotada, então ela tem que vir comigo imediatamente.

            Nem bem a mulher acaba de falar, os policiais já vão puxando Yasmin. Ela vai se esperneando e olhando para Saga. Ele estica a mão na direção da menina. Sua vista começa a embaçar, suas pernas cambaleiam e ele cai de joelhos no chão, nada podendo fazer para impedir aquela situação. Yasmin, olhando para Saga e chorando muito, faz algo inesperado:

            - Sagaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa!!!!!

            A menina grita com toda a força. É sua primeira palavra.

            Chorando copiosamente, Saga tenta se levantar e ir atrás de sua amada menina, mas seu corpo, acometido de um súbito mal estar, não lhe permite. Ele só consegue pensar:

            - O que está acontecendo? – e cai, desmaiado.