Number Corp. escrita por Chacall


Capítulo 2
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Wow... capítulo interessante até pra mim mesmo. xD
Boa leitura ;D



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/118857/chapter/2

O despertador tocou mais cedo aquele dia. Sete horas da manhã. Atrasara na semana anterior por isso iria prevenir-se de chegar atrasado à escola. Mantinha-se de olhos fechados. Queria dormir um pouco mais. Sua mente dizia que tinha que acordar logo, mas seu corpo respondia o contrário. Esticou seu braço em direção a escrivaninha ao lado da cama procurando o despertador. Conseguiu. Desligou o inconveniente que o acordara e agora abria os olhos. Hora de levantar. Ajeitou os chinelos que estavam em baixo de sua cama e os calçou. Foi ao banheiro e se arrumou. Voltou ao quarto e abriu a janela. O sol estava no seu melhor estado. Estava generoso naquele dia, dividindo sua luz e seu calor com todos. Acompanhando-lhe, a brisa refrescava seu rosto. Os carros começavam a circular na rua em frente à sua casa. Não havia trânsito, o que era ótimo. Tinha de pagar um ônibus para chegar à sua escola, do outro lado do bairro. Colocou seu uniforme, calçou o tênis. Olhou-se no espelho, ajeitando seu cabelo negro e encaracolado. Pegou os óculos na escrivaninha e os colocou. Saiu de seu quarto e desceu as escadas procurando pelo pai que sempre vinha para casa após suas festanças noturnas. De certo, não seria diferente naquela manhã. Vasculhou a sala até encontrar o pé de um homem. Seu pai. Jogado no sofá. O chão, rodeado por várias latas de cerveja e algumas garrafas de cachaça, não dava vista para o carpete bege instalado em toda a casa. Aproximou-se do rapaz que cheirava mal. Sua camisa social estava desabotoada, deixando à mostra sua barriga. E não era das melhores. Seu pai comia muito e a barriga logo não caberia mais em camisa nenhuma.

-Pai, acorda! - gritou o garoto, chacoalhando o ombro do pai. - Pai, levanta! Eu já estou saindo.

-Hã? - atordoado, abriu apenas um olho para ver quem era. - Ah, é você Gabriel. Deixe-me dormir mais cinco minutos.

Renato voltou a fechar os olhos e a roncar como o motor de um trator. Não gostava de ser acordado cedo. Estava desempregado e por isso não tinha de acordar cedo todo dia. Toda manhã era a mesma coisa, principalmente aos fins de semana. Farreava a noite toda para chegar a manhã e dormir feito um condenado.

Gabriel foi até a cozinha. Avistou um copo sobre a mesa e o encheu de água gelada. Voltou à sala. Arremessou toda a água no rosto de Renato, dando-lhe um susto e o fazendo levantar às pressas.

-Ei, ei, Gabriel! Não precisava fazer isso com seu velho! - tremia Renato enquanto secava o rosto com sua própria camisa.

-Deveria se preocupar mais... - riu o filho. - Na sua idade, eu não dormiria até tarde.

Gabriel foi até o armário próximo da escada e pegou sua mochila. Ajeitou mais uma vez o óculos e adiantou-se até a porta.

-Ah, Gabriel! Esqueci de dizer? Essa manhã eu vou sair, então, vou deixar alguma comida preparada para você quando voltar da escola.

-Mais uma tentativa? - adiantou-se Gabriel que já adivinhava sobre o que se tratava.

-Sim, filhão. Tenho certeza que hoje é o dia! Seu paizão aqui vai voltar com um emprego hoje! - estufou o peito, sentindo-se com orgulho.

-É, pai. Na semana passada também era o dia. - virou-se para abrir a porta. - Boa sorte, então.

Fechou a porta e saiu em direção ao ponto de ônibus. Tinha que andar dois quarteirões até chegar na casa abandonada próxima do ponto. Normalmente não haviam muitas pessoas naquele ponto. Pelo menos, não naquela hora. Sabia que em sua vizinhança, várias famílias tinham carros de luxo, motos, caminhonetes, dentre outras coisas. Sabia que as crianças dali eram levadas de carro para a escola. Seu pai não tinha todo aquele dinheiro para ter seu próprio carro. Era sustentado por sua mãe, Angélica. Seus pais eram separados. No passado, o problema com a bebida fez que seus pais se afastassem cada vez mais, até decidirem se separar. Angélica é advogada, por isso ganha bem. Decidiram deixar Gabriel com seu pai, Renato, pare que tivesse alguma responsabilidade, ao menos com seu filho.

Chegando ao local do ponto de ônibus, teve uma surpresa. Um rapaz moreno estava esperando o ônibus. Só passava um ônibus por aquele trecho da cidade, então provavelmente pegaria o mesmo que Gabriel. O rapaz trajava um sobretudo cinza. Encostado na parede, com as mãos no bolso e um de seus pés encostado no muro da casa abandonada, deu uma olhada no garoto. Voltou a olhar para a pista, observando o movimento de carros. Deveria ser um novo morador na vizinhança.

Ao longe, vinha chegando seu ônibus. O barulho do motor era inconfundível. Estendeu o braço, chamando atenção do motorista. Freou o veículo, abrindo a porta e dando passagem aos dois novos passageiros. Gabriel foi o primeiro a entrar, seguido pelo rapaz moreno de sobretudo. Se ajeitou na janela ao lado a fim de procurar seu bilhete no bolso que usaria para passar pela catraca. Ergueu o bilhete e o passou pela máquina que identificou e destravou a catraca. Passou por ela e, ainda de pé, guardou seu bilhete no bolso. Olhou para os bancos e viu somente três pessoas. Duas sentavam-se no fundo, uma em cada janela. A terceira era o rapaz de sobretudo que já se acomodara em um dos bancos ao fim do ônibus, próximo à janela. Acomodou-se em um dos bancos vazios com sua mochila em seu colo. Vinte minutos se passaram até chegar ao ponto que ficava de frente a sua escola. Levantou-se e apertou o botão que chamou a atenção do motorista, fazendo-o frear ao lado do ponto de ônibus. A porta dupla se abriu e Gabriel saiu do ônibus. Os garotos de sua escola já estavam entrando. Alguns grupos ficavam unidos conversando. Garotas tiravam o sarro de outras. O grupo de baderneiros continuava a fazer suas brincadeiras entre eles. Sua semana começava de novo. Apressou-se em ir para sua sala, no terceiro andar. Estava em seu terceiro ano do colegial. As férias de verão já se passaram e logo mais estaria se despedindo da escola. Estava ansioso. Seus anos de esforço na escola iriam finalmente ter fim, pois logo estaria terminando. Adentrou em sua sala e encontrou Felipe, seu amigo desde que entrara no colegial. Ele já estava sentado na ultima carteira da segunda fileira da janela. Gabriel sentou-se ao lado, na fileira da janela, e cumprimentou o amigo.

-Chegou cedo, Gabriel. - estranhou o amigo. - O que aconteceu? Seu pai te puxou da cama?

-Só estou me prevenindo dos atrasos futuros. - soltou uma risada, descontraindo a manhã. - E então, já decidiu o que fará depois que acabar a escola?

-Eu não queria fazer nada, mas, minha mãe insiste que eu tenho que fazer faculdade. Vida de preguiçoso é complicada, cara. Todo mundo fica implicando que você tem que fazer alguma coisa que sirva pro futuro. É um saco. - falou com uma voz de sono enquanto debruçava-se na carteira. - Mas e você, já decidiu?

-To pensando em fazer faculdade de direitos. Cê se lembra que minha mãe é advogada, né? Ela ganha uma boa grana por isso.

-Pultz, cara... Ser advogado é muito chato! Ficar resolvendo o caso de um bando de cara-de-pau... Prefiro fazer faculdade de preguiça.

Os dois riram ao mesmo tempo. Pensar no futuro era algo complicado mas Felipe parecia não ligar muito para o que fazer depois de terminar a escola. O professor chegou na sala e pediu para que todos se sentassem, iniciando a aula. Gabriel fazia todas as anotações necessárias em seu caderno. Estava ansioso para terminar o ano com notas boas, por isso iria se esforçar. Se quisesse ser um advogado no futuro, teria que estudar o máximo que pudesse. Foi assim que sua mãe, Angélica, se tornou uma advogada reconhecida. Era bem paga. Se orgulhava da mãe que tinha. Já o pai, Renato, era o contrário, um pinguço que passava mais tempo fora de casa do que com o próprio filho com quem morava. Ao menos ele se esforçava em arranjar um emprego pelo bem de Gabriel. Sua força de vontade deixava Gabriel contente, mesmo tendo que habitar com um pai que cheirava à cerveja todo dia.

Bateu o sinal na escola. Era o intervalo. Gabriel e Felipe arrumaram suas coisas e foram ao pátio interno da escola. Era lá onde encontrariam Sofia, a mais animada do grupo. Seu cabelo loiro e seus olhos azul faziam-na mais próxima de uma norte-americana do que brasileira. Tinha o mesmo tamanho que os dois e era magra. Sua personalidade era diferente das demais garotas do colégio. Ela era diferente, por isso os dois garotos a tratavam apenas como uma amiga de bagunça. Não haveria interesse algum por Sofia. Ela chegava a ser meiga, mas quando irritada, era forte.

-Meninos! Está chegando! - gritou a amiga que se aproximava dos dois, sentados ao pé da árvore do pátio.

-Quem? - respondeu Felipe.

-O fim do ano, idiota. O momento mais feliz de todo o ano. Talvez eu nem veja mais vocês dois.

-Tem razão... Isso vai ser um sonho realizado... Não olhar para Sofia... - brincou Felipe olhando para cima. - Vai ser o paraíso!

-Imbecil! - gritou Sofia, nervosa, dando um tapa na cabeça do amigo.

Gabriel riu. Aqueles dois viviam irritando um ao outro, mas no fim, Sofia sempre ganhava. Era animado estar com eles.

-Mas e você, Gabriel? Ainda com a ideia de faculdade?

-Acho que sim, Sofia. To pensando em seguir a mesma profissão que minha mãe. Virar advogado, sabe?

-Deve ser interessante. Eu quero virar dançarina profissional! Ou então tocar música. Quem sabe virar artista plástica. Ah, não sei. Tantas coisas!

-Que tal virar espantalho? - se recompôs Felipe. - Combina mais com você.

-Você tá pedindo pra apanhar hoje, Felipe. - ameaçou Sofia estralando os dedos.

Novamente a briga começou e Gabriel sorriu. Ajeitou os óculos e olhou em volta. A escola já estava marcada em sua memória. Iria deixar muitas lembranças depois que partisse. Todas aquelas pessoas que preenchiam o pátio, os professores, até mesmo os zeladores com quem conversava antes. Teria bastante histórias para contar no futuro. No momento só queria aproveitar. Nunca teve problemas difíceis para se preocupar. Em casa, na escola, onde estivesse, tudo ocorria muito bem. Seu pai, Renato, mesmo não estando muito presente em casa, nunca lhe dera motivos para irritar-se com ele, muito menos para magoar-se. Seu pai era tranquilo. Conversava com sua mãe toda semana por telefone. Angélica era uma mulher muito gentil. Seus vizinhos perguntam sobre sua mãe e sempre comentam que é uma mulher muito bondosa, sempre ajudando. Ele concordava. A voz dela acalmava qualquer um.

Mais um sinal soou pela escola. Hora de voltar às aulas. Gabriel e Felipe despediram-se de Sofia, que estudava em outra sala. Os dois subiram as escadas conversando até a sala e sentaram em seus lugares. O professor de Geografia pediu silêncio e começou a aula. Gabriel olhou pela janela à sua esquerda e observou o pátio externo da escola. Era grande, mas estava vazio. O portão da entrada da escola logo a frente estava trancado. Na rua, carros e caminhões circulavam. Alguns escondidos atrás de árvores da calçada. Do outro lado da calçada, casas e prédios. Um homem parado. Parado? O que estava olhando? Gabriel notou que já havia visto aquele homem. Era moreno, careca. Sobretudo cinza. Lembrou-se. Era o mesmo do ponto de ônibus de antes. O que estaria fazendo ali? Esperando alguém? Virou o olho para a sala quando percebeu que o sinal de saída havia tocado. Voltou-se para a janela. O homem não estava mais. Onde teria ido? Arrumou suas coisas e foi acompanhado de Felipe até a saída, encontrar-se com Sofia antes de ir embora. Olhou por toda a rua procurando o rapaz, mas ele tinha ido embora. Despediu-se dos dois amigos e foi ao ponto de ônibus a alguns metros da escola. Adentrou ao ônibus que seguiu para próximo de sua casa. Caminhou os dois quarteirões até sua casa e a destrancou. O pai não estava, como havia dito. Foi à cozinha e achou algumas panelas no fogão. Estavam quentes. O almoço teria sido feito há pouco tempo. Retirou sua mochila e a colocou no armário próximo a escada, como sempre fazia. Ajeitou o óculos. Subiu as escadas quando foi parado pelo telefone, que começou a tocar. Provavelmente era seu pai avisando sobre algo. O telefone de parede próximo à cozinha estava com o botão vermelho piscando. Estendeu sua mão mas parou. O telefone parou. Seu corpo paralisou. Não conseguia se mover. Calafrio. O que aconteceu com ele mesmo? Seus olhos percorreram pela parede branca onde estava o telefone. Avistou algo se mexer às suas costas. Uma sombra. Um homem. Adulto. Não conseguia virar o rosto. Apenas seus olhos moviam-se. Som de passos. O homem estava se aproximando. Era um sonho? O rapaz aproximou-se de Gabriel. Calafrios intensos. Se pudesse se mexer, suas pernas estariam tremendo agora. Uma frase. Uma frase foi o suficiente para seu corpo voltar a se mover.

-Não atenda.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Number Corp." morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.