Véspera de Natal.

Os pequenos flocos de neve caiam silenciosamente por cima do casaco de um tamanho desmedido. Os pés faziam orifícios demasiado grandes dificultando a caminhada. Naquele momento desejou ter pernas mais comprimidas.

- A mamã vai zangar-se comigo. – o coração afligia-se perante o sermão que ouviria quando chegasse a casa.

Olhou para o parque. Estava coberto de neve. Um garoto de cabelos claros fazia um boneco de neve. O sorriso era translúcido a quem reparasse com atenção. Não era meramente um levantar de lábios. Uns poderosos olhos azuis faiscavam de contentamento e satisfação naquele pequeno rosto que caberia nas mãos de um adulto. Assim como o seu. A questão veio. O que faria um menino de cinco anos na rua na véspera de Natal?

Ficou por tempo indeterminado a visualizado, tanto, que o rosto denunciava receio e embaraço quando foi descoberta. Os olhos verde-esmeralda exprimiam a vontade de se juntar a ele. A vergonha parecia calar o atrevimento de se aproximar.

O pequeno coração falhou uma batida, e por conseguinte, bateu mais depressa. Os cabelos curtos rosados foram o que chamou particularmente a sua atenção. Seria capaz de ir buscar uma folha de papel e lápis de cor para tentar desenhar o que via. O que sentia ao olhar para a pequena flor de cerejeira. Para ele, ela era comovedoramente bonita. Sorriu.

- Queres vir acabar o boneco de neve comigo?

- De-Desculpa, mas tenho de ir para casa. – apressou-se a dizer.

Aqueles olhos azuis, pareciam tão quentes, e ainda diziam, que normalmente, eram frios. Os olhos escuros do seu adorado Sasuke-kun, pareciam ter gelo ao contrário daquele par de esferas azuladas. Não sabia porquê, mas sentia que eram capazes de a fazer derreter. Afastou aquele pensamento.

Esqueceu-se do que havia ao seu redor, e atreveu-se a aproximar.

- Está bem, talvez fique um pouco contigo. – enrubesceu.

Naruto abriu um dos seus melhores sorrisos. A rosada viu o loiro estender-lhe um monte de neve sobre as suas mãos. A sua parte central, parecia estremecer. Seria o seu coração?! Mas, porquê?! Não era a adrenalina do medo. Porque ele tinha feito com isso passasse. A confusão abateu-se sobre a criança. A sua mãe é que tinha razão. O amor era complicado. E não tinha idade para pensar naquelas coisas. Além do mais, quem é que se atreveria a gostar dela?!

- Onde é que devo colocar a neve?

- Aqui ao lado, o boneco ainda está muito magrinho. – disse o loiro concentrado na tarefa que fazia. – Já agora, eu sou o Naruto.

- Ah, tu és aquele garoto, que toda a gente não gosta. – deu um saltinho para trás apontando para ele, mas, ao ver a expressão dele entristecer, apressou-se a dizer. – Desculpa, desculpa Naruto. – estava coradíssima. – Mas sabes uma coisa? As pessoas não sabem o que dizem.

- A sério?! – os olhos brilhavam mais do que nunca.

-Acho que sim. – sorriu. – Mas olha, tu é que tiveste a maioria do trabalho, porque o boneco já está quase pronto.

- Não faz mal. – deu uns passos para trás, para admirar a sua obra, mas acabou por cair no chão.

Estás bem Naruto?! – a rosada ajoelhou-se ao lado do Uzumaki.

- Estou óptimo Sakura-chan. – disse por entre risos.

- Como é que sabes o meu nome?!

- Bem, supôs. – viu-o a corar.

- Sakura? Sakura?! – ouviu uma voz familiar. – O que é que estás aqui a fazer?! Anda já para casa!

- Ai, a minha mãe. – colocou as mãos sobre a cabeça, como se a estivesse a proteger. – Vou ter de ir.

- Tudo bem. Obrigada pela ajuda. – o loiro continuava sentado no chão. O pequeno coração entristecia ao ter passado tão pouco tempo ao seu lado.

- Feliz Natal. – a medo, Sakura baixou-se novamente e os pequenos lábios, implantaram um beijo na bochecha rechonchuda do loiro.

Viu-a a distanciar-se a passos apressados, enquanto tacteava o lado da face, que tinha sido beijado. Nunca, desde a sua pequena e curta existência, tinha-se sentido tão feliz. Não conhecia Sakura desde aquele pequeno encontro, mas, desde já há algum tempo. Ao vê-la pela primeira vez, num dia de primavera, debaixo de uma grande árvore, enquanto a via a fazer coroas de flores, tinha jurado a si mesmo, que a protegeria e amá-la-ia. Essa promessa, estava dentro não só da sua mente, mas também, do seu coração. Quando voltou a olhar para o lugar de onde estava o boneco, este misteriosamente, tinha desaparecido.

*

As vozes dispersavam-se por todo o lado. A mesa estava composta com todas as iguarias típicas para aquela época. As velas douradas estavam acesas. Os enfeites estavam estrategicamente colocados por todo o compartimento e pequenas luzes piscavam. As pessoas naquela sala vestiam-se de vermelho e verde na sua grande maioria. As cores do Natal.

Sakura estava a um canto, tentando passar despercebida. Olhou pela janela, e via os flocos de neve, um por um, a descer preguiçosamente até ao chão, que já se encontrava totalmente coberto de branco. Inspirou grandes golfadas de ar. A realidade, é que não queria estar ali. Estavam todas as pessoas importantes para ela, naquele pequeno espaço, até o próprio namorado, Sasuke, apesar disso, o coração aclamava, por algo, ou quem sabe, por alguém especificamente.

- Sakura, porque não te juntas a nós? – ouviu a voz do moreno.

- Preciso de fazer uma coisa. – uma luz invadiu a mente, e fê-la agarrar no casaco. – Volto dentro de instantes. – fechou a porta.

*

Era um completo idiota emocional em relação á maior parte das coisas. Quando o nome de Sakura Haruno fazia-se ouvir passava de um estado normal, a um estado nostálgico, principalmente nesta altura do ano. Todos os anos, na véspera de Natal, fugia por momentos de todos, e ia para o parque fazer um boneco de neve.

Gostava de relembrar aquele momento que apesar de ter sido curto, tinha sido tão importante para ele. A sua menina, que agora era mulher, com o jeito inocente, o rosto corado, e o beijo que lhe foi dado. Era capaz, passados tantos anos, de ainda sentir, os lábios quentes sobre a sua pele, que estava fria devido ao arrefecido próprio do Inverno.

Não tardaria em voltar, antes que alguém desse pela sua falta. Olhou uma vez mais para o boneco de neve, preparando-se para se levantar do chão, onde antes encontrava-se sentado.

- Naruto? Não tens frio aí sentado?!

- Sakura-chan?! – admirou-se. – Não, estou bem assim, já ia regressar para junto de vocês.

- És um completo baka, podes ficar doente! – aproximou-se sentando ao seu lado. – Porque estás aqui sozinho?

- Por nada. – sorriu. – Mas agora também vais ficar doente.

- Lembras-te?!

- Do quê? – voltou-se ficando de frente para a rosada.

- Oh, tu sabes. – o loiro sentiu o coração a serenar ao vê-la corar. – Quando vi-te aqui, a fazer o boneco de neve.

- Claro, claro que me recordo.

- Foste tu que fizeste o boneco de neve? – a rosada olhou para o boneco enorme, para depois o olhar cair novamente sobre Naruto.

- Sim, foi eu. – começou a rir-se constrangido.

- Porquê?! Algum motivo em especial? – a rosada acabou por deixar deslizar a pergunta pela língua.

- O que eu quero é nada, é por isso que estou aqui. – olhou-a intensamente.

- O quê?!

- Sakura-chan, não me obrigues a isto.

- Ora, dizes coisas á toa que eu não entendo, e depois não explicas!

- Aquele momento que tivemos aqui os dois foi mais importante do que tu alguma vez possas imaginar. Porque é que eu não quero nada?! – fez uma pausa, olhando para Sakura. – Porque o que eu quero é esquecer. O que eu quero é esquecer-te, e eu não consigo.

- Naruto… - a voz parecia muda.

- Não Sakura-chan, não te preocupes, eu supero isto, como sempre faço com tudo. – sorriu abertamente, tentanto acalma-la, fazendo menção para se levantar.

Sakura no instante seguinte, colocou-se de joelhos, ficando de frente para o loiro. Pousou as mãos sobre os ombros largos, baixando o rosto. A respiração era tão quente e envolvente. Tocou os seus lábios com os do loiro e nunca pensou que beijar alguém fosse tão bom. O loiro instintivamente, puxou-a num abraço, fazendo-a sentar no seu colo. O beijo acabou por tornar-se mais intenso, mas, nunca fugindo do controlo. Acabaram por colocar todos os anos, todo o amor, toda a inocência, de um beijo que devia ter sido trocado há muito mais tempo.

- Sakura-chan, tu não podes… - o loiro acabou por se lembrar de que ela estava comprometida com o moreno, e o pior de tudo, ele era o seu melhor amigo.

- Não posso fugir ao amor. Eu consigo vê-lo.

- O amor não se consegue ver.

- Claro que se consegue. – a rosada sorriu.

- A sério? – disse o loiro curioso. – Mostra-me.

Com as duas mãos envolvidas numas luvas brancas, Sakura juntou um monte de neve.

- Foi no momento que me deste a neve, que eu soube, talvez não conscientemente, que eu ficaria contigo. Foi tudo graças ao boneco de neve, porque ele mostrou-me quem era o amor, e eras tu. Será que ainda estou a tempo de ficar com ele?

- Bem, acho que sim. – puxou-a para mais perto. – Mas e o….

- Não te preocupes. Tenho a certeza que ele vai entender. – os olhos desviaram-se para o boneco de neve. – Olha, o boneco de neve, desapareceu?!

- Pois, o amor parece que o faz derreter. – sorriu ao relembrar-se que o mesmo tinha acontecido a anos atrás.

Fim.