Humanoids In Action. Or Almost. escrita por milena_knop


Capítulo 1
Sorrisos limitados


Notas iniciais do capítulo

Primeiro capítulo



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Parei o carro do lado de fora da garagem, pois não tinha certeza se ainda iria sair, mesmo depois do que eu tinha acabado de fazer, que era com certeza agitação suficiente pra um dia só. Estava com as duas mãos apoiadas no volante, todas as duas ainda estavam vermelhas e pregando, aquilo estava realmente nojento. Respirei fundo e encarei as árvores em frente a minha casa. Eu não morava em um dos lugares mais movimentados por ali, pra mim realmente não fazia diferença. Mas confesso que era bem aconchegante morar quase que literalmente no meio do mato. Pelo menos assim ninguém ia ficar me encarando se perguntando se eu talvez tinha saído de uma festa fantasia em outra cidade.
Quando saí do carro, aquele ar fresco encheu os meus pulmões e me fez voltar a ser um pouco mais “normal”, ou o que eu podia ser quando estava em casa. Fiquei feliz por isso, pois era um peso a menos pra mim naquele momento. Mas só nesses momentos. Subi as poucas escadas meio devagar, pois por incrível que pareça, eu estava exausto. Não me lembro de qual foi a última vez em que dormi mais de 5 horas numa noite, mas mesmo assim, um descanso não estava nos meus planos.
Abri a porta de vidro escurecido da frente da minha casa devagar. Como eu previa, Tom, meu irmão, estava parecendo um macaco ou não sei o que, numa posição totalmente estranha, dormindo e babando no sofá. Pelo menos ele não era igual a mim, e eu o invejava por isso porque ainda não tinha me conformado por eu ter deixado uma coisa tão... Idiota me atingir e me alterar, mas isso não importa. Não agora.
Quando coloquei o pé no primeiro degrau da escada, ouvi um barulho e me virei tentando avistar o javali que eu tinha ouvido, mais era só um ronco que o Tom tinha soltado, e aquilo me fez rir de leve. Rir. Eu só conseguia fazer isso dentro daquela casa, com o meu irmão. E quando passava muito tempo fora, como nesses últimos dias, eu me sentia estranho quando sentia as rugas do meu rosto se alargarem para criarem um sorriso.
Voltei a me concentrar na escada e a ir em direção ao banheiro. Comecei a me despir, e um cheiro totalmente estranho tomou conta do banheiro. É, com isso eu acho que eu já tinha me acostumado, mas não significa que só porque me acostumei eu deva gostar. Abri o chuveiro colocando a água em uma temperatura mais quente, e mesmo que eu pensasse que não estava tão mal assim, vi o chão ficar todo vermelho em uma fração de segundos. Eu teria que inventar um jeito de matar um pouco mais pacífico.
Logo me distraí e me foquei no meu objetivo: Aquela garota novamente invadiu minha cabeça. Ela seria mais uma de nós, mas o que realmente me incomodava era que eu não podia, digamos, “vigiá-la” do mesmo jeito que eu já vigiei e protegi outros que estavam entrando pra nossa espécie. Às vezes o Tom tinha um bom senso humanitário que me dava medo e se oferecia pra poder passar uns dias tomando conta da garota (como se ela precisasse que alguém tomasse conta dela, 19 anos ela tinha...), mas essa era a minha, vamos dizer “missão”.
Saí do banho e fui pro meu quarto. Mal estava prestando atenção no que fazia: fui sobrepondo algumas roupas e num instante estava devidamente vestido outra vez. Me olhei no espelho que ocupava metade da parede do quarto e vi que se eu quisesse sair na rua como alguém normal, teria que passar o mais básico dos básicos no que se dizia respeito a maquiagem, porque as minhas olheiras quase tinham vida própria de tão grandes.
Passei pouca coisa e terminei com o delineador, estava ótimo, pelo menos agora eu aparentava ser mais gente do que antes. Resolvi dar uma arrumada no meu cabelo e quase meti o pente no olho quando me assustei com um grito vindo do fim do corredor:
- MAIS O QUÊ QUE É ISSO?!
Demorei uns 3 segundos pra realmente entender o motivo do grito do único que estava na casa além de mim e comecei a rir mais alto do que ele tinha gritado. Ouvi o Tom vindo em direção ao quarto mais rápido do que o normal e tentei segurar o riso. TENTEI.
- Você gripou na noite passada? – ele perguntou, com a cara de irmão mais velho mais irônica que ele conseguia fazer.
- Não, não gripei Tom – estava concentrado em tentar colocar meu cabelo pra cima, enquanto olhava ele pelo espelho com um meio sorriso.
- Isso significa que seu nariz não está entupido, então... QUAL É A EXPLICAÇÃO PRAQUELA TRALHA TODA QUE TÁ JOGADA LÁ NO BANHEIRO? BILL DO C-É-U, POR FAVOR, AQUILO TÁ PIOR QUE BICHO MORTO!
Eu ri menos dessa vez. Falar em bicho morto me levava onde eu estava há uma hora atrás.
- Eu vou lá buscar Tom, fica tranquilo – Pronto, meu moicano estava terminado e minha franja estava arrumada.
Eu não queria que ele percebesse, mais o Tom notou que eu não estava a fim de sair. Quer dizer, ficar em casa eu não queria, mesmo que precisasse pra descansar um pouco; então eu só não queria sair necessariamente pra ter que vigiar a tal garota. Fazia só três semanas que eu a vigiava, mas parecia bem mais tempo, exatamente pelo fato de que ultimamente eu não prestava tanta atenção no que fazia, ou porque ultimamente eu não era tão... Eu.
- Como foi... Hoje? – o Tom perguntou, fingindo que estava apreciando a minha paciência em arrumar tanto cabelo.
- Foi do mesmo jeito de sempre, porém mais gente sofreu – eu dei um sorriso idiota. Não era de satisfação, mais eu estava aproveitando o momento, porque assim que eu saísse dali, eu não seria capaz de sorrir mais.
- Você ficou mais tempo fora dessa vez, era de se esperar que isso acontecesse – ele fez uma pequena pausa – Tem certeza de que...
- Tom, é sério, não precisa. Você sabe que eu é que tenho que fazer isso, dessa vez fui eu que recebi o estímulo.
- Dessa vez, dessa vez... – o Tom fez uma cara distorcida tão estranha que já me fez adivinhar o que ele iria dizer – Da última vez que recebi o estímulo, eu tive que ficar de olho naquele cara lá, o Evan.
- Ah, o Evan era super legal, é até hoje – Eu disse isso com a maior ironia que eu pude.
- É, MAIS ACONTECE QUE EU TIVE QUE VIGIAR UM CARA ENQUANTO VOCÊ VIGIA UMA... UMA COISA DAQUELAS! 
O Tom saiu do quarto do mesmo jeito que entrou, gritando, andando rápido e com surto de estresse instantâneo. Voltou depois de meio segundo:
- E trata de dar um jeito no banheiro.
Eu ri de leve. Ele jogava na minha cara sempre que eu estava reclamando de barriga cheia porque havia recebido o estímulo de uma garota e ele não. Ele a viu umas duas ou três vezes e se encantou. Novidade, até a moça da padaria ou então do açougue eram as coisinhas mais perfeitas pra ele. Olhando por esse lado, era até legal mesmo, eu poderia irritar ele com isso nos próximos 342 dias. 
O cheiro no banheiro estava realmente insuportável. Peguei tudo que estava jogado no chão e levei pros fundos da casa, busquei o álcool e coloquei fogo em tudo. Não queria mais usar as roupas que me fizessem obrigatoriamente me lembrar o que eu andava fazendo sem querer, porém sem poder evitar. Vendo tudo aquilo em chamas, já fiquei inexpressivo. Só me restou entrar no carro, fazer a trilha entre as árvores e ir pra cidade procurar a minha “protegida” que nem ao menos me importava em saber o nome. Mais eu sabia que era obrigado a saber.


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Notas finais do capítulo

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